Nesta semana observei um artista na construção de sua obra, a Onça-Sucuri, um felino réptil saltando dos ares. O artista sugere uma jaguar serpente a invadir nossa área comum de direitos ou desejo.
Ao mesmo tempo encontro a cidade invadida por onças, reflexão artística para garantir a sobrevivência da onça-pintada e a integridade dos ecossistemas.
Na semana também perdi um amigo devorado por onça, em sua aldeia no Xingu; fato que se intensificou nos últimos anos, na área remota da Terra Indígena. As onças fugidias das regiões de lavoura e queimadas, felinos sem eira nem beira, refugiam-se nas florestas que restam, os territórios indígenas.
São tempos de notícias trágicas.
Em setembro, vieram pelo céu suas manchas pretas, tão negras em fome vespertina, anunciando os anjos caídos durante as queimadas na Amazônia. Agora pelas águas, o monstro viscoso, o óleo grosso dizendo que o petróleo é nosso, tal Cavalo de Troia, lula gigante, medusa, onça preta tresloucada a invadir nossa praia, marcando suas manchas na areia.
Começo a ouvir dizer nas ruas, um zum zum zum, que o petróleo é nosso, que vaza na fenda. Recordo desenhos antigos.
A arte, a poesia ou morte,
é onça.
Memoro o último verão, aquele vendedor de óculos que conheci na Bahia não terá a quem entregar seu produto nessa estação. Praias proibidas se anunciam, haverá carestia na areia.
Há momentos em que palavras perdem qualquer função, são totalmente dispensáveis diante da boa fotografia.
Boas fotografias muitas vezes são pura tristeza, mazelas.
Nesse momento que vejo as praias em pranto, tanta areia branca deprimida, campo de guerra e refugiados, apenas uma dúvida tenho, se graxa é melhor do que óleo de peroba para os que trazem a cara de pau por natureza, por descaramento.
Praias de Itapuama e Xáreu, cidade Cabo de Santo Agostinho. Litoral Sul de Pernambuco.
En Santa María del Tule, Oaxaca, se yergue un árbol espectacular que tiene, por cierto, el tronco más ancho el mundo. Se trata de un precioso ahuehuete que, según estimaciones, tiene más de 2,000 años de edad. Su tronco tiene 14 metros de diámetro y se necesitarían a unas 30 personas agarradas de las manos para envolverlo en un precioso abrazo.
Há no México uma árvore extensa, gulosa, tão antiga como o tempo da vida na Terra, chão de indígenas. Não há muito o que dizer de uma árvore. Uma árvore é uma árvore, e isso basta. Imagens nos libertam das palavras, dispensam letras, construções difíceis da língua.
Escrever tem suas complicações. Incautos preferem falas fáceis, param o carro e pronunciam loucuras, não sabem muito escrever. Gente assim confunde substantivo com adjetivo, dão qualidades tresloucadas aos seres, dispersam prazeres entre obsessão.
Tende piedade, não sabem o que dizem. Tão raso o que veem.
Quando criança, recordo-me, meus avós de roça diziam que a árvore era coisa boa. Mandavam-me com os primos para lá, lugar de sombra, manga, balanço, passarinhos.
Fascinava-nos o tamanho das árvores a desafiarem sempre escaladas, travessuras, novos horizontes, conquista. Subir na árvore era uma honra, bravura, nos sentíamos como índios, tão livres. Sem árvores não haveria honra ou passarinhos, assim entendi o mundo quando pequeno. Era como andar de avião, imaginação de criança, ver o mundo por cima. Descer, pousar, era outra questão ou machucados, tudo nos fazia crescer.
Cinquenta anos depois, ouço o presidente da nação mais verde dizer que árvore é porra, palavra que encerra todo prazer, palavra abjeta nesse momento. Gente assim deve ter brincado com estilingue, espingarda de chumbinhos, aniquilando qualquer movimento alegre no mato quando criança. Melhor matar que se aventurar, creio, brincavam assim os valentões de hoje.
Enfim, devo citar poesia. Desaforo é coisa de poderes, prefiro a mata virgem.
“ÁRVORE”
( MANOEL DE BARROS )
Um passarinho pediu a meu irmão para ser uma árvore.
meu irmão aceitou de ser a árvore daquele passarinho.
No estágio de ser essa árvore, meu irmão aprendeu de sol,
de céu e de lua mais do que na escola.
No estágio de ser árvore meu irmão aprendeu para santo
mais do que os padres lhes ensinavam no internato.
Aprendeu com a natureza o perfume de Deus.
Seu olho no estágio de ser árvore, aprendeu melhor o azul.
E descobriu que uma casa vazia de cigarra, esquecida no tronco das árvores só serve para poesia.
No estágio de ser árvore meu irmão descobriu que as árvores
são vaidosas. Que justamente aquela árvore na qual meu irmão
se transformara, envaidecia-se quando era nomeada para o
entardecer dos pássaros e tinha ciúmes da brancura que os
lírios deixavam nos brejos.
Meu irmão agradecia a Deus aquela permanência em árvore
porque fez amizade com as borboletas.
Pequenos aviões e pistas de pouso, terra firme entre roçados, antigas fazendas ou aldeias indígenas, sempre traziam fortes emoções. Pousar era sempre uma vitória da liberdade de voar. Até a década de 70 era bem arriscado descer numa pista nas terras de Mato Grosso, muitas vezes se arremetia o pequeno avião, por haver um bando de veados pastando na pista, um boi arredio.
Em março de 2016, Victoria Tauli-Corpuz, relatora das Nações Unidas sobre direitos dos povos indígenas, visitou várias aldeias em regiões diversas, no Brasil.
Victoria Tauli-Corpuz segura a mão de Valdelice Veron e seu povo ameaçado, dançam em volta de mais um túmulo que brota em antigas terras tradicionais dos Guarani.
Repudiou assassinatos e ataques constantes às comunidades do Mato Grosso do Sul, pedindo providências urgentes das autoridades.
Naquele momento, Dilma Rousseff ainda estava no governo e o assassinato de indígenas Guarani Kaiowá estarrecia a nação, denúncias de longa data. O governo de Michel Temer nada fez contra o genocídio denunciado.
Victoria Tauli-Corpuz recebe documentos de velhos caciques, relatos fartos dos que padecem.
Jair Bolsonaro, insensível à questão tão grave, esforça-se para o enfraquecimento de Victoria Tauli-Corpuz, segundo notícia publicada no UOL,esse enfraquecimento da relatoria minaria a capacidade de grupos indígenas de levar suas denúncias à entidade internacional. O argumento seria que, com a ampliação do mandato de outros mecanismos dentro da ONU, não haveria a necessidade de manter uma relatora exclusivamente ao tema.
A relatora das Nações Unidas dançou e chorou com os indígenas brasileiros, visitou seus túmulos cavados em terra vermelha, encaminhou as denúncias recolhidas entre os povos à ONU.
Às vésperas da abertura da Assembléia Geral, em Nova York, onde o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sequer foi convidado para um evento paralelo, a Amazônia Possível, os povos indígenas do Brasil estão perplexos com os gestos e palavras a serem ditas na tribuna em astucioso momento.
As maracas tocam nas aldeias, cantam para espantar os maus espíritos.