A cada dia ou a cada hora vêm à toma os números da tragédia provocada pelo desgoverno Bolsonaro nos diversos setores, principalmente na educação pública. Em Alfenas, no Sul de Minas, centenas de alunos da Universidade Federal (Ufal) tiveram de abandonar os mais variados cursos e voltar para casa, muitos deles chorando, após receberem a notícia de que 400 bolsas de auxílio moradia foram cortadas pelo desgoverno federal, assim como o direito de se alimentarem no Restaurante Universitário.
A cidade é um polo de ensino universitário no Sul de Minas e os estudantes acabam dando vida ao município. Imagina o reflexo disso para os estudantes, suas famílias e para o comércio do município!
A instituição teve mais de R$ 11 milhões bloqueados pelo desgoverno federal. Pelo menos 70 projetos de pesquisa da universidade paralisados. Entre as consequências está o fim dos atendimentos odontológicos gratuitos para a população. A clínica de odontologia faz cerca de 3 mil atendimentos por mês.
Segundo o reitor da Unifal, Amadeu Cerveira, a universidade teve o bloqueio de 30% da verba de custeio, ou R$ 11 milhões. A verba de capital, destinada a reformas e investimentos, era de cerca de R$ 1 milhão e também foi cortada em 90%. O resultado é que 89 funcionários terceirizados foram dispensados.
Na vizinha Universidade Federal de Lavras (Ufla), que tem no curso de agronomia o seu forte, o corte foi de 26% do orçamento de 2019, que é de pouco mais de R$ 62 milhões. Portanto, o corte ficou em pouco mais de R$ 16 milhões.
Na Unifei, em Itajubá, também no Sul de Minas, o corte foi de 20% do orçamento deste ano: cerca de R$ 8 milhões, enquanto nos institutos federais do Sul de Minas, foi de 39,86% do orçamento, o que representa cerca de R$ 16 milhões para este ano. Na região há institutos federais em oito cidades.
Também profundamente afetada, a Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte, divulgou a seguinte nota pública a respeito dos cortes:
Segundo a Polícia Federal, a operação “Esperança Equilibrista” investigou que o recurso entregue à UFMG, cerca de R$ 4 milhões de reais não teria sido repassado corretamente e que haveriam fraudes na Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), responsável pelos fomentos à pesquisa na instituição, que incluem o pagamento de pesquisadores e estudantes para realizarem os trabalhos de maneira pedagógica.
Jaime Arturo Ramires e Sandra Regina Goulart Almeida foram conduzidos coercitivamente nesta manhã (06) para a PF de Belo Horizonte, localizada no Bairro Gutierrez em Belo Horizonte. Também foi presa a professora Silvana Coser, organizado da exposição sobre a anistia no Centro Cultural da UFMG, e outras 11 pessoas. Uma grande mobilização da comunidade acadêmica e dos movimentos sociais está no local acompanhando as ações que, segundo os manifestantes, visa impedir que as ações de memória, verdade e justiça, que contam a história da anistia, sejam realizadas, pois as mesmas não seriam de interesse do atual governo golpista. Sandra, atual vice-reitora e eleita reitora para a próxima gestão, já foi liberada, e às 14 horas haverá uma entrevista coletiva na Assembleia Legislativa de Minas Gerais sobre o assunto.
O Memorial foi idealizado ainda em 2008, quando o presidente do Brasil era o Luiz Inácio Lula da Silva, e visava manter viva a história dos que morreram e lutaram no período da ditadura e sobreviveram para ver seus torturadores e executores de tantos outros anistiados, já que a lei foi ampla e irrestrita, contemplando militares e sociedade civil organizada.
A Comissão da Anistia do Ministério da Justiça vem tendo dificuldades há vários meses em realizar as ações do projeto, devido à mudanças no Ministério feitas durante o Governo Temer, que barram os avanços e as pesquisas. Um dos exemplos é o caso da exposição realizada no Centro Cultural da UFMG, que ficou aberta até o fim de julho deste ano mesmo com tentativas impedir a sua abertura e obrigá-la a fechar antes do previsto.
Confira as fotos do ato em defesa da UFMG realizado em frente à Polícia Federal de Belo Horizonte:
É possível evitar soluções prontas e modelos falidos de segurança pública no nosso país. Fugir da segurança militarizada racista, que trata a população como inimiga e que é uma das principais responsáveis pelo genocídio do povo negro no Brasil. Pode-se refletir, debater, propor e construir outro caminho para um modelo de segurança.
Nesse espírito, foi lançada, no dia 12 de setembro, a Campanha Segurança Humanizada SIM, PM no Campus NÃO. O movimento surgiu por parte de estudantes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte (MG), que buscam reforçar a necessidade de boa iluminação, de aumento da ocupação do espaço, de melhores treinamentos para a guarda universitária, bem como a realização de debates, seminários, rodas de conversa e mesas redondas sobre a segurança.
Apostando em medidas que humanizem as relações de segurança na universidade, que encarem os problemas como sociais e complexos. Mesmo sabendo dos limites de uma possível segurança humanizada, é preciso apresentar ideias além do senso comum. Uma proposta alternativa à (não) solução que é a militarização ostensiva da universidade por parte da Polícia Militar. A campanha é ainda uma resposta à Reitoria da UFMG, que boicotou os Conselhos Universitários, não consultou a comunidade e autorizou o reforço do Policiamento Militar no Campus.
A iniciativa partiu de estudantes da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG. Está buscando envolver mais setores da universidade: outras unidades, coletivos, grupos e movimentos que atuam dentro e fora da UFMG. Seu objetivo é levantar o debate de segurança de modo positivo e propositivo. Ser um ponto de confluência de possibilidades, de argumentos e das pessoas críticas à militarização e à violência ostensiva representada pela Polícia Militar.
O Campus Pampulha passou por uma série de problemas de segurança. Assaltos e furtos seguidos aconteceram em um curto espaço de dias. Essa situação provocou a proliferação de mensagens, posts nas redes sociais -Twitter por Exemplo – e nos chats de WhatsApp. A criação de grupos, o surgimento de rumores e o sensacionalismo da violência alimentou um clima de terror e insegurança que logo tomou conta da universidade.
Nesse sentido, a campanha começou e tende a crescer nos próximos dias. Está sendo articulada a produção de materiais gráficos, camisetas, adesivos, cartilhas e painéis que apresentem e levem o debate da campanha para o conjunto público da universidade. Entidades, coletivos, movimentos, artistas, ativistas, militantes e apoiadores se somam à essa causa.
Reforça-se nesse momento a necessidade de tratar a questão com a delicadeza precisa, discutindo antes soluções distintas às sempre impostas. Pensando que essas imposições pouco resolvem a segurança, mas, ao contrário disso, fomentam o ciclo vicioso da violência, considerando outros problemas profundos, como a desigualdade social.
*Gabriel Lopo é coordenador-geral do D.A. da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG **Pamela Barbosa é presidente do D.A. da Faculdade de Letras da UFMG
“É o tal do empoderamento: criar condições de acesso a oportunidades que transformem as mulheres em cidadãs, cidadãs de direito”, disse a ex-Ministra Chefe da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres do Brasil, professora e socióloga Eleonora Menicucci de Oliveira
Foto: Isabela Abalen / Jornalistas Livres
Mesmo sendo a maioria nas escolas e universidades – em todos os níveis -, é comprovado que a partir do mestrado e o mercado de trabalho há uma queda brusca na presença feminina. Essa queda não depende, na grande maioria das vezes, do interesse e esforço delas – segundo levantamentos de She Figures e SAGA (STEM and Gender Advancement), UNESCO -, mas sim de processos de seleção que as excluem, da dificuldade de conciliar trabalho fora e doméstico, do machismo que as enxuta diariamente e da falta de estrutura e preparo institucional para receber a mulher. Além disso, de acordo com pesquisa do Datafolha divulgada em 2017, 503 mulheres brasileiras são vítimas de violência a cada hora.
Tendo em vista esses problemas e muitos outros, as professoras, pesquisadoras e militantes do feminismo Alice Rangel de Paiva Abreu (UFRJ), Márcia Cristina Bernardes Barbosa (UFRGS) e Eleonora Menicucci de Oliveira (UNIFESP) discutiram, na última quarta feira, os diários desafios das mulheres e suas recentes conquistas em uma mesa de debate na 69ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte.
Alice Rangel. Foto: Isabela Abalen / Jornalistas Livres
Alice Rangel iniciou a conversa apresentando um panorama da participação da mulher na ciência, avaliando os estudos de gênero como importantes para a primeira percepção concreta da desigualdade no setor e para a implantação de mudanças na área. Já são duas décadas pensando gênero e ciência que, segundo a professora, querem fazer jus aos direitos e à justiça social, que prometem igualdade de oportunidades. “Quem tem que se reformar são as instituições, globalmente” disse ela com relação aos moldes institucionais de promoção de cargos e possibilidades.
Se analisadas as bolsas de pesquisa do CNPq nacionais, as mulheres só aparecem com maior frequência quando se tratam das bolsas institucionais que são escolhidas internamente por cada grupo de estudo. Quando se tratando de cargos maiores, a escolha da vaga é concebida ao Comitê Nacional Centralizado no Órgão, de enorme presença masculina.
Sendo assim, as mulheres são raríssimas. Mulheres negras, mais ainda.
De toda forma, o Brasil é – segundo o levantamento do Gender in the Global Research Landscape -, junto à Portugal, o país com maior número de publicações femininas, com 49% do total. O reconhecimento, porém, é menosprezado. Alice Rangel convida a usarmos de uma “lente de gênero que busque a equidade”, reivindicando processos de seleção mais equânimes, horários adequados de trabalho e atendimento melhor às necessidades das grávidas. Alice participa do projeto GenderInSite e promove a inserção das mulheres e seus direitos na ciência.
Depois dela, Márcia Cristina – premiada internacionalmente pelo Prêmio L’Oréal-UNESCO para mulheres em ciência – tomou a palavra já com uma inquietação: uma foto do seu grupo de trabalho. Pelo menos treze homens e ela. “Tem algo errado nessa imagem”, iniciou. “Uma ciência com participação efetiva da mulher é uma melhor ciência”; as maiores empresas do mundo são justamente as com mais mulheres; há mais elas que eles se educando, profissionalizando e idealizando projetos. Então por que os números são tão diferentes? De acordo com a cientista, toda a sociedade está estruturada para favorecer o homem. “Estamos condenando a sociedade a acreditar ter mulheres simpáticas e homens inteligentes”, disse. Como argumento, um estudo feito pela revista Science perguntou a crianças de 5 e 7 anos se um exemplo de pessoa inteligente teria o sexo feminino ou masculino. Aos 5, meninos responderam masculino e meninas responderam feminino. Aos 7, a maioria optou pelo masculino.
Sendo assim, a professora defende as ações afirmativas como capacitadoras de mudanças no cenário da mulher na ciência e nas áreas em geral, como a política. Essas ações se valendo de maiores artifícios além das cotas. Citando o caso de Hipátia de Alexandria, matemática em 415 a.C. que definiu que as órbitas eram elípticas e, ao não retirar o dito, foi assassinada pelo governo, Márcia acredita que há potencial o suficiente nas mulheres e muita luta à frente. Elogia iniciativas como Tem Menina no Circuito e finaliza: “A gente tem que trabalhar juntos e juntas, homens e mulheres, e é já”.
“Eu fui uma resistente, guerrilheira, lutei contra a ditadura civil-militar e fiquei presa 3 anos. (…) E existiam 14 lideranças sempre procuradas, eram 13 homens e uma mulher. Quem era a mulher? Eu”. Eleonora Menicucci se apresentou depois de Márcia com um discurso mais geral da questão mulher e sociedade, apresentando políticas públicas a favor delas. “Muita gente me pergunta quando eu descobri o feminismo. Eu descobri o feminismo na tortura. (…) Eu tinha uma filha de 1 ano. Estávamos presos eu e meu então marido e ela só foi torturada e ameaçada na minha frente, na dele não. Alguma coisa estava errada. Não que eu quisesse que ele também sofresse, mas por que em mim? Porque a mulher é o sexo frágil”.
Eleonora afirmou que passamos por uma difícil conjuntura brasileira e que as mulheres devem se analisar dentro dessa. Segundo ela, passamos por uma vigência de golpe parlamentar, midiático, fundamentalista, patriarcal, sexista e judiciário. O sexista do golpe vem do fato de que tiraram a primeira mulher eleita e reeleita no Brasil, com 54 milhões de votos. E se fosse um homem no poder, seja Fernando Henrique ou Lula, não se teria chegado a esse ponto. Parafraseando Simone de Beauvoir, Menicucci lembrou que, em tempos de crise, as mulheres são as que mais perdem. Além delas, os jovens. Se considerarmos a etnia: mulheres e jovens negros.
Eleonora concluiu admitindo a perda de “tudo”, “desde a Secretaria de Políticas para as Mulheres até todos esses direitos conquistados”. Ela disse não acreditar em democracia sem voto, nem em equidade de gênero sem democracia. Incitando a busca por Diretas, juntou-se às outras palestrantes e a esperança e a próxima luta das mulheres e sociedade foram discutidas. Alice Rangel lembrou: “todo mundo fala em gênero, a gente introduziu esse tema” e, já em acordo que há esperança, definiu: “há necessidade de uma equidade de gênero, e isso tá tomando consciência. Há muitos projetos novos com esse objetivo”.
Antes do fim, Eleonora pôde convidar: “precisamos de um pacto com os movimentos sociais, os partidos, a comunidade científica, as instituições de conhecimento, o povo. Todos temos que sentar na mesa, e a grande mesa são as ruas”.
Um dia após a votação e a aprovação do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff pela Câmara dos Deputados, representantes de áreas das ciências humanas de Minas Gerais se reuniram para um debate sobre a democracia. O evento, ocorrido na noite de segunda feira, 18 de abril, foi sediado na Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa, localizada na Praça da Liberdade, região centro-sul da capital do estado, Belo Horizonte.
“Há uma necessidade de se discutir o modelo de capitalismo selvagem em que vivemos. Nele, as grandes empresas lucram e sempre lucraram às custas do desrespeito das leis e sanções trabalhistas impostas a elas. Agora, o que se vê, é o mesmo movimento (dano eficiente) sendo levado ao Direito Constitucional.”
– Bárbara Lobo – Professora de Direito Constitucional e de Direito do Trabalho (PUC-MG) –
A roda de conversas levou doze dos principais nomes do Direito e da Filosofia de Minas a debaterem sobre o “Estado Democrático de Direito” existente no Brasil. Organizado pelos professores de Direito Marco Antônio Alves e Lucas Gontijo, nomes como o do professor José Luiz Quadro de Magalhães – mestre e doutor pela UFMG, professor da PUC-MG e UFMG, e coordenador regional da Rede pelo Constitucionalismo Democrático latino americano -, Bárbara Lobo – professora de Direito Constitucional e de Direito do Trabalho pela PUC-MG – e, Marcelo Cattoni de Oliveira – professor de Direito Constitucional pela UFMG – estiveram presentes no encontro.
“As pessoas foram pra rua defender o regime democrático sem saber o que, de fato, é a democracia. Nosso pensamento já vem pronto e perdemos a capacidade de dialogar. Democracia não é ir pra rua e defender interesses exclusivamente privados e deixar de lado discussões e interesses públicos. Isso dá margem ao autoritarismo. Ele é feito de ideias prontas e sem argumentações.”
– Daniela Bonaccorsi – Professora de Direito Penal (PUC-MG) e advogada –
Com o teatro da biblioteca totalmente ocupado por mais de 250 pessoas, entre estudantes e advogados, os professores e juristas se revezaram em uma roda de conversas e pautaram, principalmente, as consequências geradas no atual modelo democrático do país. Temas como a atuação desordenada do poder judiciário – sobre decisões promovidas pelo juiz Sérgio Moro na condução do processo da “Lava-Jato” – e a imposição de uma opinião previamente orquestrada pela grande mídia foram abordados. Levantou-se, também, a importância e necessidade de uma redemocratização do poder judiciário e da mídia no Brasil (considerados por eles, os principais articuladores do movimento criado para a desmoralização de pessoas e consequente afastamento de um governo, democraticamente eleito, do poder).