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  • INQUISIÇÃO: Fundamentalistas perseguem ONG de católicas e Justiça faz coro

    INQUISIÇÃO: Fundamentalistas perseguem ONG de católicas e Justiça faz coro

    Agora vai, Brasil! A 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que a ONG Católicas Pelo Direito de Decidir não poderá mais usar a palavra “Católicas” em seu nome.

    Católicas Pelo Direito de Decidir existem desde 1993 e se caracterizam pela defesa intransigente da descriminalização e legalização do aborto. Segundo o grupo, no interior do catolicismo “há vozes diversas, há teologias diversas”. “Essa pluralidade existe, ainda que o pensamento único fundamentalista queira negá-la”, dizem elas, que se reivindicam feministas.

    As Católicas falam em fundamentalistas e foi exatamente uma organização fundamentalista dessas, a Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura que resolveu levar aos tribunais sua contrariedade com o nome da ONG feminista.

    O Centro Dom Bosco parece não confiar muito na fé do rebanho católico e é reincidente em tentar calar divergências religiosas na Justiça, em vez de convencer os corações dos fiéis. Foi esse grupo da ultra-direita católica que processou a Igreja Universal do Reino de Deus por causa de uma revista em quadrinhos (!!??!) chamada “A Força”, porque conteria “mentiras e ofensas à Igreja Católica”. Os inquisidores do Centro Dom Bosco queriam que a Justiça retirasse de circulação a publicação. Perderam!

    Também foi o Centro Dom Bosco que processou o coletivo de humoristas Porta dos Fundos, depois que este produziu um especial de Natal em que retratou Jesus como homossexual. Os “guerreiros da fé” do Centro Dom Bosco queriam retirar o especial de Natal da plataforma de streaming Netflix e bani-lo pela eternidade. Mas perderam também.

    Agora, o grupo colhe uma recentíssima vitória, já que ainda passível de recurso, com a decisão do TJ de São Paulo. Se prevalecer, as Católicas terão de adequar o estatuto social e retirar a expressão “católicas” de seu nome em 15 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000.

    O relator, desembargador José Carlos Ferreira Alves, escreveu um textão de 61 páginas para justificar o acolhimento do pedido do Centro Dom Bosco. Coalhado de referências ao Código Canônico, ao Catecismo, a textos de clérigos ultraconservadores, a homilias papais, a ideólogos da Opus Dei e até, pasme-se, a Olavo de Carvalho, com a citação de sua obra “Católicas, uma ova”, lavrada naquele estilo inconfundível pela falta de educação, o relatório do desembargador parece esquecer que o Brasil é um País laico e não uma pequena paróquia de um obtuso rincão conservador.

    Quer o desembargador católico que “nenhuma associação adote a designação de ‘católica’, a não ser com o consentimento da autoridade eclesiástica competente, segundo as normas do cânone 312” [do Código Canônico]. O Código de Direito Canônico é o conjunto das normas que regulam a organização da Igreja Católica, a hierarquia do seu governo, os direitos e obrigações dos fiéis e o conjunto de sacramentos e sanções que se estabelecem pela infração das mesmas normas. Impor aos cidadãos brasileiros a obediência a esse tal Código Canônico é um ultraje à Constituição do Brasil.

    Ferreira Alves diz que o uso da expressão “católicas” constitui “flagrante ilicitude e abuso de direito (…) pela notória violação à moral, boa-fé e bons costumes na atuação [da ONG]”. Trata-se de acusação gravíssima que, entretanto, não dispõe de um único argumento que a ponha em pé.

    A guerra contra as mulheres: uma história de violências

    Acusar mulheres, identificando-as a seres imorais, dotados de má-fé e de comportamento maligno tem dado, desde sempre, ensejo a perseguições e a toda série de violências e iniquidades (incluindo a tortura) praticadas contra o gênero feminino desde o século 12. Agora não é diferente.

    As Católicas Pelo Direito de Decidir, que conheço desde seus primórdios, pela catequese feminista de Maria José Rosado, fundamentam sua militância na crença de que a Igreja de 2.000 anos é capaz de errar (muito) e de se auto-reformar mediante a crítica —muitas vezes heroica— dos dissidentes (ou hereges).

    Foi assim com Giordano Bruno e Galileu Galilei, opositores da tese segundo a qual a Terra estaria no centro do Universo. Pela sua petulante defesa da Ciência, Galileu acabou condenado por desobediência e por difundir conteúdos contra a doutrina católica. Com Giordano Bruno, foi pior. A Inquisição o considerou culpado e ele foi queimado na fogueira no Campo dei Fiori, em Roma, em 1600. No ano 2000, o Papa João Paulo II finalmente pediu desculpas por todos os erros cometidos pela Igreja Católica nos últimos 2.000 anos, incluindo o julgamento de Galileu Galilei pela Inquisição. Será que João Paulo II não era muito católico?

    Mas tem muito mais erros! A mesma Igreja Católica ainda hoje condena o divórcio, as pesquisas científicas com embriões humanos, a eutanásia e os contraceptivos artificiais, o sexo antes do casamento, a homossexualidade e o uso de preservativos. Apesar disso, o Papa Francisco acaba de dar seu OK às uniões civis entre homossexuais, mostrando que a Igreja (também ela) é permeável ao espírito do tempo, e que a luta dos homossexuais católicos por reconhecimento valeu a pena. Será que Bergoglio também não é muito católico?

    As Católicas consideram-se católicas, mas católicas que lutam contra o machismo e a misoginia das instituições católicas, que proíbem a ordenação sacerdotal de mulheres, mantêm o celibato clerical e estão na base dos milhares de casos de abusos sexuais cometidos contra meninos e meninas em todo o mundo.

    Quem são o desembargador José Carlos Ferreira Alves e seus colegas na 2ª Câmara de Direito Privado, José Joaquim dos Santos e Álvaro Passos, para dizer que elas não podem mais se dizer católicas? Ainda mais usando como argumento um código estranho ao ordenamento jurídico do Brasil, como é o Código Canônico?

    Ou será que vamos também usar o “Evangelho Segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec, ou “As 95 Teses”, de Martinho Lutero, para orientar os juízes sobre quais condutas serão consideradas lícitas ou ilícitas pelos tribunais brasileiros?

    A decisão do TJ de São Paulo é mais um barbarismo a atestar que a generosa Constituição de 1988 está sob grande ameaça. É preciso resistir. Ou logo as fogueiras serão acesas!

    Homofobia, armas e Educação de meninos: Veja quem é e o que defende o Centro Dom Bosco
    https://www.facebook.com/watch/?v=608039206566114

  • Lucas “Vou ali na delegacia provar que sou inocente e já volto”

    Lucas “Vou ali na delegacia provar que sou inocente e já volto”

    Preso há mais de um mês, Lucas Bispo da Silva de 19 anos, foi acusado de roubar uma moto BMW em seu próprio bairro. O jovem cabelereiro de Heliópolis, zona sul de São Paulo, afirma ser inocente e vê sua família lutar para provar sua inocência. É outro jovem que se enquadra no perfil-padrão e facilmente acusável pelo racismo vigente na polícia: ele é negro e periférico.

    No último dia 16, o Tribunal de Justiça do Estado concedeu liberdade provisória a Lucas, frente às “contradições” presentes nos relatos policiais e da vítima. Além disso o promotor Nilson Xavier de Souza afirma que os “relatos de pessoas que colocam o paciente [Lucas] em local diverso, [afirmando que ele] estava trabalhando, cortando o cabelo de um cliente quando foi abordado, bem como a circunstância do roubador estar usando capacete, ainda que com a viseira aberta, tornam temerária a manutenção da prisão, que é medida sempre excepcional antes de sentença penal condenatória”.

    Lucas agora aguarda o CDP 2 de Guarulhos cumprir a decisão do desembargador para voltar à liberdade.

    Um desses relatos é de um colega de Lucas no salão, G., que escreveu uma carta reconhecida em cartório afirmando que presenciou a abordagem de Lucas no salão, contradizendo a versão policial de que o jovem foi preso junto a moto roubada.

    PM acusa Lucas de roubar moto, mas provas apontam que ele estava em casa na hora. Liberdade provisoria foi concedida, mas a prisão ainda não liberou
    Foto: Arquivo pessoal

    A família juntou também provas de que Lucas estava em sua casa no momento do crime e não poderia ter participado, aponta que existem contradições nas versões apresentadas pela polícia e busca mobilizar a comunidade, em conjunto com a Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio, já tendo realizado um ato e organizando outro para denunciar sua inocência. A ativista da Rede, Marisa Fefferman, entende o caso como “um caso exemplar de como o nosso sistema de segurança e de justiça funcionam” e que “o caso de Lucas é um caso em que aparece todos os erros e que mostra como se pode forjar um caso de um rapaz que é um trabalhador”.

    Lucas foi preso em flagrante e a juíza Adriana Barrea, que na audiência de custódia converteu a prisão em preventiva, entendeu não ter necessidade de soltar Lucas, mesmo que a “circunstância do paciente possuir condições pessoais favoráveis como primariedade e excelente reputação não é suficiente, tampouco garantidora de eventual direito de liberdade provisória”. No dia oito de janeiro deste ano o Ministério Público apresentou a denúncia contra   Lucas. Na denúncia o MP ignorou a defesa e acompanhou o inquérito policial. A próxima etapa do processo foi definida para o dia 5 de março, sendo a audiência de Instrução Debates e Julgamento.

    Sua irmã conta que ele “sempre quis ser cabelereiro. Só que a gente nunca teve condição de pagar um curso. Então ele aprendeu a cortar cabelo sozinho. Cortava de graça em frente a minha casa e depois que aprendeu e pegou as manhas, cobrava só cinco reais. No salão sempre ia morador de rua cortar lá, já que ele não cobrava. Hoje o que ele tá fazendo dentro da cadeia é trabalhando cortando cabelo”.

    O caso

    Segundo sua irmã, no dia 13 de dezembro, Lucas acordou as 10h para atender um cliente no salão em que trabalha desde setembro de 2018. Lucas estava no salão quando foi abordado por dois policiais que, primeiro, tiram uma foto sua e depois levaram o jovem para a 95º Delegacia de Polícia (D.P.) em Heliópolis, onde ele foi reconhecido pela vítima. A irmã conta, ainda, que os policiais que prenderam Lucas foram até o salão porque, meses antes um outro funcionário teria sido preso por roubo e desde então o local ficara marcado.

    Na carta de G., colega que trabalha com Lucas no salão, ele conta como foi a abordagem

    Conforme nossa rotina, estávamos exercendo nossa função como barbeiro em nosso local de trabalho” quando “dois policiais passaram em frente a barbearia dentro de uma viatura, quando o policial desceu armado nos intimidando. Logo após o mesmo policial intimou o Lucas Bispo da Silva, logo depois me chamaram pedindo meu RG, e o mesmo que intimou pediu fotos nossas e nos interrogaram sobre uma moto roubada, principalmente interrogaram o Lucas como se ele fosse o culpado sendo que ele não sabe pilotar nenhum tipo de moto. Após isso o Lucas retornou para dentro da barbearia para terminar o corte de seu cliente, e assim que acabou foi para fora com os policiais, e eles chamaram o Lucas para acompanhar até a delegacia. Lucas entrou na barbearia, pegou sua camiseta, e perguntamos ‘Vai para onde?’, ele respondeu ‘Vou ali na delegacia provar que sou inocente e já volto’

    Já no Boletim de Ocorrência (B.O.) e no Inquérito policial os depoimentos são outros. O roubo da moto, segundo o testemunho da vítima, ocorreu por volta das 07:20h daquela manhã, na da Av. Comandante Taylor, quando ele parou a moto em um dos faróis e “viu uma moto ao seu lado, com dois ocupantes. Estavam com os capacetes abertos e pôde ver seus rostos. Notou que um deles, o garupa da moto, tinha um sinal no rosto. No farol seguinte, passando o viaduto, estes indivíduos o abordaram. O garupa, da moto, com o sinal no rosto, portando uma arma de fogo (com o cano quadrado e prateada) anunciou um roubo”. Sem levar a carteira ou celular pegou a moto e “a levou, entrando em avenida que dá acesso ao Heliópolis. Quanto ao outro, saiu na sequência atrás do primeiro”.

    Os dois PMs afirmam no B.O., que antes do roubo, “se encontravam em patrulhamento pela Av. Comandante Taylor, quando avistaram uma motocicleta de porte grande com dois ocupantes. Informa o depoente que observou-os atentamente, por se tratar de moto diferente das que são habitualmente vistas na região. Ambos os componentes da moto eram magros, de pele parda, um com blusa preta e calça jeans (garupa) e o outro de bermuda e moleton (conduzindo a moto) e ambos estavam com a viseira do capacete aberta. Contudo, consultou seu emplacamento e não havia nada registrado”. Depois de saberem do roubo eles passaram a procurar pela moto e a encontraram “estacionada na Rua Michel da Silva, 19”. Em seguida notificaram a vítima e passaram a “patrulhar pela região a fim de localizar os indivíduos que vira na moto pouco antes. Na esquina na Rua Michel da Silva com a Rua Almirante Nunes acabou se deparando com o indiciado de prenome Lucas, aquele que estava na garupa, de bermuda e moleton”.

    Segundo o relato dos policiais, só então encontraram e prenderam Lucas, que “negou ter qualquer envolvimento com o crime, sendo trazido a esta Delegacia, junto da moto, solicitando-se à vítima de roubo a se dirigir também a esta sede. Aqui chegando, à vítima fora mostrado o indivíduo, em sala preparada, tendo esta o reconhecido”. Com ele, nada foi encontrado que o ligasse ao crime.

    Já a vítima conta outra versão “quando estava retornando para sua casa, foi informado que sua moto fora recuperada. Os policiais foram buscá-lo onde se encontrava, e, de viatura, foi levado ao local onde estava sua moto. A seguir, no percurso para esta Delegacia, em local próximo aonde estava sua motocicleta, viu o roubador, aquele que tinha o sinal no rosto e que conduziu sua moto, encostado em uma parede. Informou os policiais sobre isso e o indivíduo foi trazido a esta Delegacia. Aqui chegando, em sala preparada, reconheceu o indivíduo”.

    Liberdade provisória

    Na decisão que concede à Lucas a liberdade provisória o desembargador Nilson Xavier de Souza aponta as contradições levantadas pela defesa

    considerada a relevância das questões postas pela Defesa, algumas ponderações são necessárias. No auto de prisão em flagrante, os policiais em um instante dizem que o condutor da moto usava bermuda e moletom, enquanto o garupa vestia blusa preta e calça jeans e, na sequência, nos mesmos depoimentos, dizem que Lucas, que foi preso, era o garupa, vestindo bermuda e moletom (fls. 23 e 25). Tem mais. Pelos relatos dos policiais, eles faziam diligências após confirmação do roubo e avistaram o suposto garupa Lucas vestindo bermuda e moletom. Então conduziram Lucas à Delegacia e convidaram a vítima a lá comparecer para realizar o reconhecimento. Já a vítima disse que, após noticiar o roubo, estava indo para casa. Então foi informado a respeito da localização de sua moto. Os policiais foram buscá-lo. No caminho até a Delegacia, na viatura, viu o roubador na rua. Avisou os policiais, que efetuaram a detenção de Lucas.

    A defesa

    A família e seu advogado, Paulo Sergio Pisara Victorino, apresentam a versão de Lucas somadas ao depoimento do porteiro do prédio onde Lucas mora. No depoimento o porteiro afirma que o jovem só teria saído de casa por volta das 10:00h e, junto com o relato que apresentaram para a juíza, apresentaram imagens das câmeras do prédio nas quais é possível ver Lucas saindo de bicicleta por volta das 10h.

    Além disso a defesa apontou as inconsistências dos depoimentos que “em depoimentos confusos, trocam até a vestimenta dos roubadores, pois uma hora o garupa estava de calça jeans, outra estava de bermuda” e na localização de Lucas na hora da prisão “que o acusado não estava na via pública quando de sua detenção, mas sim cortando um cabelo, onde os militares esperaram que o mesmo terminasse o serviço para leva-lo até a delegacia”.

    Para confirmar a versão de que Lucas não estava junto à moto na hora da prisão, mas em seu local de trabalho, a família conseguiu a declaração de seu colega, G., e de S., dona do salão onde Lucas trabalha, que também confirma a versão “Eu estava voltando da escola onde meu filho estuda, passando em frente ao salão, onde também resido, e avistei dois policiais abordando Lucas e G., ouvi Lucas perguntar que se poderia terminar de cortar o cabelo, então entrei para dentro de casa para fazer serviços domésticos… assim que minha mãe, chegou em casa, ela me informou que Lucas teria sido encaminhado para a 95° DP”.

     

  • Suspenso o despejo de 100 pessoas em #SP

    Suspenso o despejo de 100 pessoas em #SP

    Por Luiza Rotbart e Silmara Silva | Jornalistas Livres

    O imóvel que supostamente pertence ao contrabandista Law Kin Chong, foragido da polícia, hoje é a habitação de 100 pessoas, que há um ano trabalham duro na revitalização do espaço. São 43 famílias compostas por 10 idosos, 25 crianças, 7 adolescentes, 49 mulheres e 13 homens adultos.

    Os jornalistas livres fizeram a denúncia no mês passado sobre a situação do imóvel e das famílias.

    43 famílias da ocupação Almirante Negro pedem socorro!

    A juiza Andrea de Abreu e Braga, da 10ª Vara Cível de São Paulo, não se sensibilizou com a causa e os apelos dessas famílias, disse: “aqui não é lugar para caridade, se querem caridade procurem uma freira”.

     

    Somente após um ato que ocupou a Praça da Sé e a frente do Tribunal de Justiça de São Paulo na tarde de ontem, 28.11.2019, o Desembargador Almeida Sampaio, determinou a suspensão da reintegração de posse e declarou a nulidade absoluta dos atos processuais. A determinação do desembargador Almeida Sampaio impediu que mais de cem pessoas fossem para as ruas de São Paulo.

    Suspenso o despejo depois de apelos e muita luta

    A reintegração de posse (despejo) contra os moradores do local, estava marcada para domingo 01.12. A juiza Andrea de Abreu e Braga, da 10ª Vara Cível de São Paulo, foi irredutível na sua decisão, o que fez com que os moradores recorressem ao Tribunal de Justiça para reverter a decisão.

    Os moradores haviam feito apelo também ao Vereador Suplicy, que enviou carta à Juiza este semana, veja a íntegra.

    Excelentíssima Juíza Dra. Andrea de Abreu e Braga,

     

    Fui procurado na semana passada pelos moradores da Ocupação Almirante Negro, cuja desocupação do imóvel está em discussão nos autos do processo  1026859-66.2019.8.26.0100, sob a responsabilidade de Vossa Excelência. Eles relatam que a operação de reintegração de posse estaria agendada para o próximo domingo (1º) e que não tiveram qualquer atendimento social e habitacional do Poder Público até o momento.

     

    Como Vereador, tenho sido procurado semanalmente por diversas ocupações da cidade solicitando apoio para a articulação de atendimento às famílias que sofrerão algum processo de remoção. Inclusive, sou autor do Projeto de Lei nº 200/2019, que justamente estabelece um Protocolo Unificado para Remoções na cidade de São Paulo, e prevê, entre outros pontos, a articulação de serviços e equipamentos diversos para minimizar os danos sociais (e até humanitários) às pessoas que sofrem algum processo de remoção. Além do dilema da moradia, essa população geralmente já está em uma situação de vulnerabilidade grande, o que se agrava com uma medida dessas, principalmente para as famílias que têm filhos em idade escolar.

     

    No presente caso, quando procurado, minha primeira atitude foi conversar com o Núcleo de Mediação de Conflitos da Secretaria Municipal de Habitação, que informou já ter encaminhado o relatório produzido pela SEHAB, solicitando, ao fim, a prorrogação do prazo para cumprimento da medida de reintegração de posse. Minha manifestação vai ao mesmo sentido. Tenho visto exemplos concretos do quanto uma remoção sem qualquer suporte do Poder Público agrava ainda mais situação de vulnerabilidade e pobreza de famílias que não têm moradia. Embora o direito de propriedade deva ser resguardado, é muito importante que os danos de uma medida como essa sejam reduzidos ao máximo. É importantíssimo para o desenvolvimento das crianças e adolescentes da ocupação que possam bem concluir seu ano letivo escolar, o que acontece em escolas da região.

     

    Em outros casos em que meu gabinete atuou, tivemos êxito na articulação com juízes e promotores, a fim de encaminhar o caso para os cuidados do GAORP, que detém de maior força institucional para viabilizar esse atendimento social nesses casos. Diante disso, questiono a possibilidade de que seja adotado encaminhamento semelhante no presente caso, ou que, pelo menos, seja adiada a medida a fim de que se conclua o ano letivo das crianças e adolescentes e de que essas famílias não tenham que passar as festas de fim de ano na rua. 

     

    Coloco-me à disposição, dentro da competência institucional, para colaborar com o que for preciso em prol da boa solução dessa medida de remoção. Agradeço imensamente sua atenção e na oportunidade manifesto votos de elevada estima e distinta consideração.

     

    Atenciosamente,

     

    Eduardo Matarazzo Suplicy

    Vereador

    APELO DOS MORADORES

    Os moradores também enviaram apelo, em carta aberta aos membros do judiciário, que finalmente se sensibilizaram, revertendo a decisão do despejo que estava marcado para o próximo domingo.

     

    Abaixo, a nota que foi enviada pela comissão de moradores da Ocupação Almirante Negro:

    Excelências

    Do judiciário, do executivo, do legislativo e das forças de segurança, não deixem a injustiça prosperar.

    Somos 43 famílias compostas por 10 idosos, 25 crianças, 7 adolescentes, 49 mulheres e 13 homens adultos. Ao todo, mais de 100 pessoas. Trabalhamos duro para sustentar as nossas famílias e por absoluta falta de condições materiais e desprezo do poder público, não encontramos meios para pagar aluguel. Vivemos com dignidade, mas em estado de necessidade. Frente a essas condições, em 18 de Abril de 2018 ocupamos o imóvel abandonado na Rua Carlos de Sousa Nazaré, 630 – Parque Dom Pedro II. Encontramos o prédio completamente destruído, sem fios elétricos, sem encanamentos, nem portas e janelas, pias, vasos sanitários. Servia como ponto de consumo de drogas. E por vezes, ocorria assassinato, e até um corpo foi encontrado na caixa d’agua. Possuía muito lixo, ratos, pernilongos criadouros de dengue. Enfim, era câncer um urbano. 

    De acordo com o código civil art. 1.228 é uma propriedade ilegal e abandonada. Seu suposto proprietário é o senhor Law Kin Chong, um fora da lei, contrabandista, constantemente às voltas com a polícia e a justiça. Entendemos que essa propriedade, além de abandonada, foi adquirida por recursos ilícitos. Não foi adquirida por execução do trabalho, mas pelas atividades do contrabando. Observando estas condições, ocupamos o imóvel e reconstruímos tudo: Alvenaria, elétrica, hidráulica, portas. Deixamos em condições de acomodar nossas famílias. Já moramos ali por mais de 1 ano. Trabalhamos no entorno e nossos filhos frequentam as escolas da região.

    Entretanto, a juíza Andrea de Abreu e Braga, da 10ª Vara Cível de São Paulo, concedeu a reintegração de posse (despejo) contra todos os moradores do local. Violou nossos direitos assegurados pela nossa Constituição, pela Convenção de Direitos Humanos, pela Bíblia que tem a moradia como direito sagrado. Violou ainda o código civil que estipula requisitos para o direito à propriedade. Obedeceu a um pedido da esposa do injusto possuidor do prédio. E mais, solicitou forças policiais armadas para arrancar as famílias e suas crianças de seus lares. Para completar, se recusou a dialogar com os moradores. Disse que, “em 18 anos de carreira, nunca falou com populares, sempre por advogados”. Revelando assim, seu total desconhecimento da vida de nosso povo. E por esse comportamento da juíza, fica comprovado que o judiciário não faz justiça. 

    Por isso estamos aqui, para que as autoridades anulem essa sentença injusta e desumana. Para que respeitem nosso ordenamento jurídico e assegurem os nossos direitos. Queremos continuar morando no local porque deixamos o prédio apropriado para acolher as nossas famílias que correm o risco de irem parar nas ruas de São Paulo. Que o imóvel seja desapropriado e sejam abertos programas de financiamento de moradia popular que contemplem os trabalhadores de baixa renda, permitindo que as famílias continuem morando no local. Não podemos aceitar que as autoridades nos tratem como se fossemos sacos de lixo, para proteger os bens de um contrabandista.

    São Paulo, 28 de novembro de 2019

    Comissão dos Moradores da Ocupação Almirante Negro

    SEGUE AQUI A COMEMORAÇÃO DA VITORIA DOS MORADORES

     

  • Justiça manda soltar militante por moradia

    Justiça manda soltar militante por moradia

    A 14ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu, hoje, soltar Angélica dos Santos Lima, do movimento por moradia. Ela estava presa desde o dia 24 de junho, quando foi deflagrada uma grande ofensiva para criminalizar as lideranças que lutam pelo direito constitucional por habitação digna e de qualidade, e que logrou, de imediato, as prisões de Edinalva Silva Franco, Janice Ferreira Silva, a Preta, e de Sidney Ferreira Silva, além da própria Angélica. Os mandados de prisão de outros 15 militantes da luta pela moradia também foram expedidos pela juíza Érika Mascarenhas, da 6ª Vara Criminal.

    A decisão da 14ª Câmara de Direito Criminal do TJ levou em consideração que Angélica é primária e de bons antecedentes, possui trabalho lícito e residência definida. Trata-se de medida judicial destinada a reduzir os evidentes danos da prisão preventiva (antes do julgamento de mérito), “a qual, nos termos do Código de Processo Penal, representa a mais extrema das restrições cautelares, cabível apenas em hipóteses excepcionais”, conforme consta no acórdão.

    Assim, Angélica será colocada em liberdade provisória, enquanto aguarda o julgamento, sendo adotadas as seguintes medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal: comparecimento mensal em juízo para informar e justificar suas atividades, bem como aos atos do processo; proibição de frequentar os locais de ocupação dos movimentos sociais; proibição de manter contato com vítimas e testemunhas, bem como com os demais acusados; proibição de ausentar-se da comarca, salvo prévia autorização judicial; recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga.

    São restrições, ainda, mas preferíveis ante a violência extrema de uma prisão antes mesmo do julgamento. Agora, é preciso ampliar esse benefício para todas as lideranças ainda presas ou sobre as quais incide a decisão da prisão preventiva. Liberdade para todos os presos da luta por Moradia!

    Veja também a entrevista com Milena Golveia, lutadora pela moradia: