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  • Hospital público francês mostrou-me o que o SUS ainda poderá ser

    Hospital público francês mostrou-me o que o SUS ainda poderá ser

    Taquicardia. O sono interrompido. Susto de dor e febre. Vômito. Diarreia. Nada acabou, pensei, e a dor estava maior ainda. Passei à noite muito mal, mas achei que dormindo tudo melhoraria, mas não. O mundo girava, estava difícil ficar em pé, mas precisava me resolver, não dava para continuar assim, peguei meu celular e comecei a procurar por um hospital…

    Hôpital Lariboisière, construído no século XIX, que é até considerado um monumento histórico, é um hospital público que financia suas próprias pesquisas, 80% da conta é paga pelo governo francês, enquanto você (ou o seu convênio) é responsável pelos 20%. Funciona bem. Eles têm orgulho em colocar na conta que você é responsável pelas pesquisas e por fazer com que o sistema seja acessível à todos, mesmo que você não tenha os documentos necessários. Hospital público francês garante os direitos dos contribuintes, e até dos que não contribuem.

    Cheguei na emergência e fui atendida por uma jovem enfermeira negra, que estava dando risada e brincando enquanto ensinava sua colega, branca de olhos azuis, como fazer o procedimento, que papéis ela deveria preencher. Só fui saber depois, mas entrei no hospital com um pouco de febre, 38.2, e me colocaram imediatamente em um quarto. Demorou muito para um médico aparecer, mas eles só me dariam remédio depois de terem certeza do que se tratava. É o procedimento aqui (e admito que fiquei com raiva disso, no começo, porque tudo o que queria era que a dor passasse).

    O médico apareceu: o que você está sentindo? Vi no seu formulário que já esteve aqui há um mês. São os mesmos sintomas? Me fez uma série de perguntas, as quais tentei responder porque estava com muita dor. Na primeira vez eles acharam que era só uma cólica, não me pediram nenhum outro exame além do de sangue e mandaram para casa.

    Dessa vez não. Como apresentei os mesmos sintomas, eles queriam pesquisar melhor o que eu tinha. Pedi para o médico por um remédio para dor, e ele perguntou porque eu ainda não havia tomado, que preciso comprar remédios para dor e tê-los em casa. Chamou a enfermeira, receitou um soro e um remédio para dor. Eram umas 3 ou 4 horas da manhã.

    O remédio para dor não funcionou, e eu não dormi nada. Mais tarde um outro médico passou, e ele me mandou a um ginecologista, receitou uma radiografia, e para finalizar encontraria com gastros. Um dia todo de exames, e com muita dor, mas ainda assim, se fosse no Brasil só teriam me dado remédios para dor e me mandado para casa.

    Um enfermeiro gordinho, muito simpático, me levou de maca pelos corredores do imenso hospital, onde vi anúncios dos sindicatos nas paredes contra a privatização da saúde, contra cortes de gastos, etc. Um hospital bem ativo politicamente. Na França todos fazem política, e isso não é criminalizado como no Brasil. Na foto abaixo observamos uma parte do hospital fechada para atender os casos do COVID 19:

    Parte do hospital estava fechada para tratamento dos pacientes com COVID 19

    Cheguei na sala do ginecologista, onde esperei literalmente duas horas pela consulta. Depois uma enfermeira veio e me levou em uma outra maca para fazer a radiografia, na qual examinaram meu intestino, acreditaram que eu poderia ter o COVID 19, que pode se apresentar de formas diferentes em cada pessoa.

    Voltei para a emergência do hospital, fiquei na enfermaria, não no quarto, mas logo uma enfermeira veio, e tive que fazer exame de fezes e de urina, o que em um hospital brasileiro público demoraria horas para ficar pronto, em alguns minutos os médicos já tinham os resultados, mesmo com parte do hospital fechado por causa do COVID 19.

    Pouco depois vieram dois médicos gastros, uma moça branca e um moço negro, ambos cirurgiões gastrointestinais, me avisar que eu estava com apendicite e que precisaria ser operada o mais rápido possível, mas que não era para eu me preocupar que seria uma cirurgia rápida, e me explicaram que o procedimento seria feito pelo meu umbigo com uma câmera, muito moderno e simples.

    Fiquei surpresa com o acesso rápido a tantos médicos, a facilidade com os exames, a tecnologia disponível em um hospital público, além do aspecto da enfermaria, limpa, tranquila, e até vazia. Veja no vídeo abaixo como é uma enfermaria em um hospital público francês.

    Nunca havia sido operada de nada, e não estava ansiosa para fazê-lo em um país desconhecido no meio da pandemia, que se refletia no uso de máscaras por todas as pessoas a minha volta, no senhor indiano que não queria usar a máscara, e com o qual à enfermeira francesa gritava para que colocasse a máscara de volta porque o resultado do teste de COVID 19 dele ainda não havia saído.

    Antes de terem certeza de que eu poderia ser operada no dia seguinte, fiz o teste de COVID 19: um cotonete no meu nariz, e foi isso. Alguns minutos mais tarde o resultado estava pronto, e tinha sido negativo, portanto no outro dia seria operada. Enquanto esperava pela cirurgia na manhã seguinte, me levaram para um pequeno quarto.

    Não me deram remédios para dor, apenas antibióticos, por isso não dormi nada. Depois eles atrasaram para me levar para a sala de cirurgia, onde esperei e esperei por horas, porque um moço todo engessado (até a cabeça, e negativo para COVID 19), e uma moça, cujo grito rouco é uma lembrança terrível (positiva para o COVID 19), passaram na minha frente para a cirurgia.

    A anestesista era de descendência portuguesa (e por isso falou em português comigo, me distraiu fazendo piadas), enquanto a cirurgiã era italiana, e o enfermeiro um jovem africano. Todas as enfermeiras que eu conheceria depois da cirurgia também eram negras e estrangeiras. A vida da França está na mãos dos imigrantes.

    Passei mais dois dias no hospital depois disso, não foi fácil, mas sei que o que tive acesso ali não teria em nenhum outro local público no Brasil. É o que o SUS ainda poderá ser.

    Foto tirada do quarto em que fiquei, quando o sol estava se pondo
  • Em Cuiabá, cruzes denunciam morte de enfermeir@s

    Em Cuiabá, cruzes denunciam morte de enfermeir@s

    A morte de cada profissional da enfermagem que atuava na linha de frente do combate ao coronavírus importa. Em menos de dois meses, o país já perdeu 98 profissionais, mais do que Espanha e Itália juntos. Não foi por acaso. Os governos neoliberais que promoveram sucessivos cortes de recursos, entre outras políticas voltadas à privatização da saúde pública são os grandes responsáveis por essas perdas. E essa é a denúncia de trabalhadores de Cuiabá organizados na Frente Popular em Defesa dos Serviços Públicos e de Solidariedade ao Enfrentamento da Covid-19 nessa terça-feira, 12/05, Dia Internacional da Enfermagem.

    Em abril, Mato Grosso também registrou a morte de um enfermeiro. Athaíde Celestino da Silva, de 63 anos, faleceu em decorrência da Covid-19 após 37 dias de internação. O 37 também marca os anos de dedicação do servidor à Saúde Pública. Segundo o Conselho Federal de Enfermagem (http://observatoriodaenfermagem.cofen.gov.br/ ), outros 106 profissionais da Enfermagem estão infectados no estado; no Brasil, já são cerca de 13 mil (acompanhe aqui a atualização do Confen).

    Como não poderia deixar de ser, o ato dessa terça-feira – em defesa da vida, do Sistema Único de Saúde (SUS) e em homenagem aos profissionais da Enfermagem – foi realizado sem aglomeração. Desde as 8h, na Prainha, próximo ao Morro da Luz, região central de Cuiabá, os transeuntes podem ver uma cruz e uma vela para cada um dos profissionais que morreram nessa guerra. Nos arredores também há faixas com reivindicações e sons reproduzidos mecanicamente.

    A ideia é chamar a atenção da população para o número de mortos no Brasil como efeito do descaso dos governantes de todas as esferas – federal, estadual e municipal –, representada pela falta de investimentos e, consequentemente, equipamentos de proteção.

    Por mais que os representantes brasileiros se preocupem em demonstrar esforços para conter a pandemia agora, o mundo percebe a diferença entre os países que investem na saúde pública e os que não investem. Nos extremos, a Alemanha aparece como exemplo pelo baixo número de mortalidade, e seu histórico de investimento na saúde pública; na outra ponta, os Estados Unidos da América (EUA), cujo sistema de saúde é limitado pelos interesses do mercado, é o triste líder do ranking de mortalidade.

    Nessa terça-feira, foi possível acompanhar o ato realizado em Cuiabá por meio de uma live, transmitida pela página oficial da Adufmat-Ssind e SINASEFE no facebook. Alguns poucos organizadores estiveram presentes no ato distribuindo 500 máscaras, o que já está sendo feito pelas entidades que compõem a Frente desde o início de abril.

    Foto: Sandra Duarte, Sinasefe e AAMOBEP

    Em entrevista ao repórter Khayo Riberiro, do HNT/HiperNotícias, a professora aposentada da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso, Rosa Lúcia, apontou que o movimento cobra urgência em ações que assistam aos profissionais expostos ao coronavírus no exercício de suas atividades.

    “Hoje é o Dia Internacional da Enfermagem e essa movimentação que está acontecendo é uma manifestação silenciosa, de luto pelo número de profissionais de saúde e mais especificamente de enfermagem que já tombaram no Brasil por conta da infecção da Covid-19. Até ontem tínhamos o número de 98 profissionais de enfermagem que tinham morrido”, apontou a professora, que faz parte da comissão organizadora do movimento.

    Na reportagem, o jornalista cita ainda uma fala do

    presidente do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), Manoel Neri, dizendo que o Brasil enfrenta hoje uma situação grave no que diz respeito à evolução da pandemia entre os profissionais da saúde.

    “A situação no Brasil é crítica. O Observatório da Enfermagem, criado pelo COFEN para monitorar a evolução da pandemia entre profissionais de Enfermagem, já registra mais de 13 mil casos e 100 óbitos associados à Covid-19. A maior parte desses profissionais integrava pelo menos um grupo de risco. É inadmissível que estivessem expostos na linha de frente, contrariando as diretrizes sanitárias indicadas pelo Ministério da Saúde”, apontou Neri.

    Foto: Sandra Duarte, Sinasefe e AAMOBEP
  • Documentário “Na fila do SUS” traz o impacto do sucateamento da saúde pública no Brasil

    Documentário “Na fila do SUS” traz o impacto do sucateamento da saúde pública no Brasil

    texto: Pedro Santi, para os Jornalistas Livres

    Saúde. Direito básico do cidadão

    Os serviços públicos são interesse popular, e boa parte do povo brasileiro necessita deles para sobreviver. Com o SUS (Sistema Único de Saúde) não é diferente – saúde é um direito básico de todo cidadão e em tempos de calamidade, como a pandemia do coronavírus, fica mais evidente a necessidade de um bom serviço de saúde pública. O Documentário “Na fila do SUS”, dirigido pela profissional e pesquisadora da área Ellen Francisco, retrata o impacto que o sucateamento do SUS têm na vida dos brasileiros mais vulneráveis socialmente.

    Manifestação contra o sucateamento do SUS

    “Na fila do SUS”. São Paulo, Rio e Amazônia

    Reconhecendo o sistema único de saúde como uma luta popular, a obra apresenta essa reflexão a partir de três diferentes situações e regiões do Brasil. Em São Paulo, o foco é com moradores de rua e dependentes químicos. A cidade não tem hoje políticas públicas para essa população, e isso implica em falta de ações como redução de danos e ressocialização. Pessoas em situação de rua vivem em constante ameaça de doenças respiratórias e dermatológicas, como tuberculose e escabiose, além de doenças psicológicas, fruto da falta de cuidado com a saúde mental dessas pessoas.

    No Rio de Janeiro, o debate gira em torno da precarização da atenção primária nos postos de saúde e hospitais. As Clínicas da Família sofreram com esse desmonte e isso gerou uma crise na rede. Funcionários com meses de salários atrasados e pacientes relatando superlotação e restrição de atendimento. Consequência direta da desestruturação do atendimento básico.

    Por último, “Na fila do SUS” denuncia a influência do agronegócio nas áreas de preservação ambiental da Amazônia. E o impacto disso na saúde dos povos indígenas. Como o sucateamento do SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena) e a transferência para os precários serviços de saúde da rede municipal, a região carece de atendimento de qualidade para esse povo que vem sofrendo com doenças causada pelos impactos ambientais.

    “Na Fila do SUS é uma iniciativa para debatermos a importância da saúde pública e do SUS na vida do povo brasileiro. Se a situação já estava difícil em diversas capitais, agora em tempos de Coronavírus a coisa ganhou ares desesperadores. É uma produção urgente para mostrar que tem muita gente defendendo o SUS e a saúde pública.” diz Vito Ribeiro, roteirista do filme.

    Agentes comunitários da saúde participam de manifestação a favor do SUS

    Luta de classes na saúde

    O documentário, com a opinião de pesquisadores e acadêmicos especialistas no assunto, traz essa crítica ao poder político que precariza e limita a capacidade do SUS de atender os menos favorecidos. Dentre os responsáveis estão os planos de saúde privados, empresas, partidos e candidatos políticos – os interesses particulares nesse meio acabam causando esse desmonte, e milhões de brasileiros são prejudicados.

    A previsão para o lançamento de “Na fila do SUS” é de junho de 2020, na plataforma de documentários independentes Bombozila. O projeto faz parte de uma campanha de financiamento coletivo – para colaborar, basta entrar na página da vaquinha online e apoiar. O documentário também pode ser encontrado no instagram: @NaFiladoSus. Confira o trailer abaixo:

     

    https://www.youtube.com/watch?v=fTkq9BNu3Uc

  • Coronavírus já atinge o mundo inteiro, mas médico explica que não há motivo para pânico

    Coronavírus já atinge o mundo inteiro, mas médico explica que não há motivo para pânico

    A Organização Mundial de Saúde (OMS) classificou nesta quarta-feira (11) a doença causada o novo coronavírus (Sars-Cov-2), a Covid-19, como uma pandemia. Trata-se de uma medida técnica, que não afeta as ações atuais. “A descrição da situação como uma pandemia não altera a avaliação da OMS da ameaça representada por esse vírus. Isso não muda o que a OMS está fazendo, nem o que os países devem fazer”, declarou Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.

     

    Segundo o médico sanitarista Pedro Tourinho, pandemia nada mais é do que declarar que um vírus se espalhou e tem potencial de contaminar milhares de pessoas no mundo todo. Nesse sentido ele explica que a declaração da OMS tem um papel fundamental para fortalecer as ações governamentais na criação de medidas para conter a difusão do vírus.

     

    “Não há razão para pânico, mas temos que ter clareza de que o vírus vai se espalhar por todo o Brasil. Isso significa que vai morrer todo mundo? Não. A mortalidade do vírus é baixa. Mas é de suma importância criar políticas para proteger grupos específicos da contaminação, como pessoas idosas”, explicou Tourinho, que também é professor na faculdade de medicina da PUC-Campinas.

     

    Em coletiva de imprensa, o diretor-executivo do programa de emergências da OMS, Michael Ryan, pontuou que é preciso desenvolver políticas específicas para a situação em cada país. “A declaração de uma pandemia não é como a de uma emergência internacional – é uma caracterização ou descrição de uma situação, não é uma mudança na situação”.  Segundo ele, é hora dos países seguirem para além da mitigação, estratégia de saúde pública que busca sobretudo cuidar dos doentes e públicos prioritários.

     

    MORTALIDADE

     

    A mortalidade da gripe no Brasil é de 0,1%, ou seja, uma pessoa a cada mil, mas ninguém se preocupa em morrer de gripe, exemplificou Tourinho. A medida de contenção, como está ocorrendo na Itália, é importante para pessoas com mais de 80 anos, já que nesses casos a chance de morte chega a 14%, ou seja, 140 pessoas para cada 1.000 infectadas. O coronavírus mata oito vezes mais na Itália do que na Coreia do Sul porque 22% da população tem mais de 65 anos – o país tem a população mais velha da União Europeia. Quando contabilizamos também as pessoas com menos de 40 anos a mortalidade cai pra 2 mortes a cada mil infectados.

     

    COMO EVITAR A CONTAMINAÇÃO

    É importante manter a higiene respiratória. Evitar levar a mão ao rosto e lavar sempre as mãos com bastante água e sabão. É imprescindível o uso de máscaras para quem está tossindo. Mas no caso de não ter uma à disposição, é importante usar um lenço ou tossir próximo ao cotovelo – nunca usar as mãos. Evitar aglomerações também é recomendado, uma vez que nesses lugares a chance do vírus se proliferar é ainda mais alta.

     

    Cancelar eventos é uma medida prudente e não motivo de pânico, explica Tourinho. “Não quer dizer que é preciso deixar de trabalhar, mas esses lugares com muitas pessoas facilitam muito a disseminação do vírus”.

     

    Na primeira imagem abaixo vemos uma curva que representa “um pico” de contaminação, que resulta na sobrecarga no serviço de saúde. Já na segunda podemos ver que a contaminação aconteceu de forma mais gradual, fazendo, assim, com que o sistema de saúde consiga desafogar, então é possível mitigar a situação.

     

     

    O médico sanitarista afirma que não há razão para desespero, mas que também não dá pra tratar como “só uma doideira midiática”. “Não precisamos pensar em quarentena no Brasil, mas a expectativa é que exista um pico de contaminação do coronavírus dentro de 2 a 4 semanas. Tudo depende das políticas adotadas pelo governo”, explica.

     

    A IMPORTÂNCIA DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

     

    O desmonte do SUS iniciado no governo de Michel Temer, que assumiu a presidência depois de um golpe de estado, pode ser um fator importante na contaminação por coronavírus da população brasileira.

     

    “Essa situação do coronavírus é um momento muito importante pra gente compreender a importância do sistema de saúde estar funcionando bem e com um bom financiamento. Atualmente o sistema tá sendo estrangulado pela falta de recursos. Só no ano passado ele perdeu 20 bilhões de reais em termos orçamentários – em relação ao que seria a legislação de financiamento antes da Emenda Constitucional 95, de 2016, criada por Michel Temer, e esse ano vai perder mais 9 bilhões. Estamos vivendo um momento que é preciso uma revisão – e vários países do mundo vão fazer isso – das normas draconianas de austeridade impostas pelo sistema financeiro, pelas estruturas do capital internacional que, diariamente, estrangulam o sistema de proteção social. Então é uma oportunidade pra gente fazer essa reflexão e tomar medidas que revertam esse tipo de situação”, explicou o médico.

     

    Nesse sentido, o fortalecimento dos sistemas públicos de saúde, como é o caso do SUS brasileiro, é fundamental. Assim, diferente do que está sendo apresentado para votação urgente no Congresso, não é hora de ameaçar cortes nos salários e jornadas de funcionários públicos, como proposto pela PEC Emergencial, e muito menos de diminuição do piso de investimentos na saúde, como prevê a PEC do Pacto Federativo.

     

    MEDIDAS NO BRASIL

    Segundo o Ministério da Saúde até ontem 34 pessoas estavam infectadas pelo coronavírus no Brasil. Hoje, um estudante do Departamento de Geografia, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo – FFLCH USP, foi confirmado como portador do vírus. O Conselho Departamental da universidade decidiu suspender todas as atividades no dia de hoje, 11, e avisou aos estudantes por e-mail que novos encaminhamentos seriam enviados por este canal.

     

    E-mail enviado aos alunos sobre caso de coronavírus no Departamento de Geografia
    E-mail enviado aos alunos sobre caso de coronavírus no Departamento de Geografia
  • Nova Política Nacional de Saúde Mental, aprovada pelo governo Temer, precariza a saúde e pede a volta dos manicômios

    Nova Política Nacional de Saúde Mental, aprovada pelo governo Temer, precariza a saúde e pede a volta dos manicômios

    Matéria feito por Rodrigo de Novaes, do Jornal Empoderado

    Na mesma linha das mudanças recentemente organizadas pelo governo federal, intransigentes e buscando retrocesso dos avanços duramente conquistados pela sociedade, foi aprovada a nova Política Nacional de Saúde Mental. A medida, há anos concebida em moldes gerais pela Associação Brasileira de Psiquiatria, tem viés puramente mercadológico. Busca concentrar as ações de saúde mental nas mãos dos psiquiatras e sinaliza para a volta dos manicômios. Distancia os outros profissionais de saúde do cuidado e, o que é mais grave, precariza os Centros de Atenção Psicossocial.

    De todos os retrocessos encabeçados pelo governo Temer, este é talvez um dos maiores.

    A reforma vai contra todo um movimento iniciado na Itália no século passado que visava mudar radicalmente a forma de se acompanhar a pessoa com problemas de saúde mental. Vale lembrar, Foucault e tantos outros escreveram sobre isso, que as sociedades ao longo da história da humanidade procuraram sempre segregar o paciente com problemas de saúde mental. O “ louco” ( termo leigo com o qual nos acostumamos) fora sempre apartado do convívio com os outros. Muitos morreram, acusados de heresia. Outros foram lançados em barcos pelos rios da Europa ( a famosa nau dos loucos). A maioria, entretanto, era confinada em lugares insalubres, segregada, tratada com o cuidado que se dá aos animais. A realidade, antes sob a forma de celeiros e depois nos lúgubres manicômios, perpetuou-se até a nossa história recente. Filmes como “ Bicho de sete cabeças” abordaram o tema no contexto do nosso país.

    Este contexto começou a mudar no início do século passado a partir de modelos como o do psiquiatra italiano Basaglia, que vislumbrava uma linha de cuidado do paciente com doença mental que agregasse humanização e inserção na sociedade. Suas experiências foram rapidamente adotadas pelos maiores centros de referência e sua concepção é hoje a mais aceita pelos teóricos. No Brasil surgiram na cidade de Santos os NAPS ( Núcleos de Atenção Psicossocial) que mais tarde inspiraram a criação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), existente em todas as cidades do Brasil. Em consonância com as teorias mais recentes, nosso país viu médicos, psicólogos, sanitaristas e terapeutas ocupacionais entre outros encabeçarem a bem sucedida Reforma Psiquiátrica, que visava mudar radicalmente a forma como eram abordados as pessoas assistidas.

    A nova Política Nacional de Saúde Mental pretende, entre outras coisas, reduzir drasticamente os investimentos em aparelhos humanizadores como os CAPS e endossar investimentos em enfermarias. É a trágica volta dos manicômios. Conseguimos, bizarramente, ir contra tudo o que se pensa em saúde mental na atualidade.

    Muitos psiquiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais, sanitaristas e membros da sociedade organizada tem se posicionado contra o retrocesso. Cabe a todos nós, brasileiros e cidadãos, lutar por uma forma mais digna de abordar as pessoas em sofrimento mental.

    Leitura relacionada:
    https://www.google.com.br/amp/s/saude.abril.com.br/blog/com-a-palavra/saude-mental-o-brasil-voltou-30-anos-no-tempo/amp/

    http://imirante.com/brasil/noticias/2017/12/14/comissao-vota-mudancas-na-politica-de-saude-mental-entidades-criticam.shtml

    http://www.redebrasilatual.com.br/saude/2017/09/entidades-repudiam-intencao-do-governo-temer-de-retomar-a-politica-manicomial-em-saude-mental

    http://www.esquerdadiario.com.br/Coordenador-de-Saude-Mental-de-Temer-defende-retorno-do-modelo-psiquiatrico-manicomial

    http://atarde.uol.com.br/bahia/salvador/noticias/1923874-mudancas-na-politica-de-saude-mental-sao-alvo-de-criticas

    https://www.google.com.br/amp/m.folha.uol.com.br/amp/cotidiano/2017/12/1942890-nova-politica-de-saude-mental-dara-sobrevida-a-hospitais-psiquiatricos.shtml

    https://www.google.com.br/amp/agenciabrasil.ebc.com.br/amphtml/geral/noticia/2017-09/governo-quer-nova-politica-de-saude-mental-especialistas-criticam-manicomios

    https://www.google.com.br/amp/m.folha.uol.com.br/amp/cotidiano/2017/12/1943294-sob-protestos-governo-aprova-politica-que-da-aval-a-hospitais-psiquiatricos.shtml

  • Tristes Trópicos

    Tristes Trópicos

    O rapaz gritava ajoelhado: pegaram até meus documentos! Ao lado, uma adolescente ninava uma boneca abrigada do choro da chuva num posto de gasolina junto a outros 300 seres humanos varridos de sua própria existência. Quando um ser humano sofre, todos sofrem.

     

    fotos TIAGO MACAMBIRA
    Imagens do desmonte da cracolândia, dia 21/5/2017, na região da Luz em São Paulo


    É tristeza de doer os ossos.

     


    “De um lado esse carnaval, do outro a fome total”; num domingo chuvoso de uma virada cultural, os versos de Gil ornam com aquele território.

    fotos TIAGO MACAMBIRA
    Imagens do desmonte da cracolândia, dia 21/5/2017, na região da Luz em São Paulo

    Uma criança, sabe-se lá que idade tinha, saiu ressabiada da multidão munida de um cachimbo de crack, de sua curiosidade e incumbida de uma missão: saber quem eu era. Mostrei as fotos, mas ele queria ver minha cara, meus olhos. Ali, mais vale sua intenção impressa em sua postura, seus gestos, seu olhar, do que seu discurso. Então vc é dos Diretos Humanos, afirmou a criança já voltando à multidão. Aquela autoridade portadora de duas câmeras fotográficas já não era uma ameaça pra eles.

    fotos TIAGO MACAMBIRA
    Imagens do desmonte da cracolândia, dia 21/5/2017, na região da Luz em São Paulo


    Sandálias, óculos, colchões, bolsas, bíblia, broches, toucas, cabides, sofás, estantes, pratos… a casa de todos espalhada pela sarjeta depois do tsunami “apolítico”, que não se manifestava desde 2012.

     


    -Olha o que eu achei, a adolescente mostra uma bala de revolver recolhida a pouco; e completou: revolver ninguém perde, né?
    O Largo Coração de Jesus era um vazio molhado cheio de restos.
    O colega fotógrafo francês que surgiu ao meu lado na chuva resumiu aquela cena trava-linguas: Tristes… Tristes… Tristes Trópicos*.

    fotos TIAGO MACAMBIRA Imagens do desmonte da cracolândia, dia 21/5/2017, na região da Luz em São Paulo

    *Livro do antropólogo francês Claude Lévi-Strauss escrito na década de 1930 após sua viagem ao Brasil. Mas também podia ser a música de Itamar Assumpção:

    “O trópico tropica
    Emaranhado no trambique
    A treta frutifica
    E tritura todo o pique
    A trapaça trina e troa
    E extrapola cada dique
    O tratado é intrincado
    Destratado é truque chique
    O grito atravancado
    Tranca até que eu petrifique
    Tristes gregos e troianos
    Desbragado piquenique”

     

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