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  • Curitiba resiste contra Temer

    Curitiba resiste contra Temer

    O protesto foi convocado pelas redes sociais a partir da iniciativa do Coletivo CWB Contra Temer

    Na “República de Curitiba” a resistência contra o golpe parlamentar também tem vez e vai à luta. Logo no dia do impeachment, centenas de pessoas, a maioria jovens, tomaram ruas da capital paranaense para protestar contra o golpista Michel Temer.

    A concentração aconteceu por volta das 18 horas, na Praça 19 de dezembro. No início, o clima de tristeza pelo golpe sacramentado e as roupas pretas dos participantes lembravam uma espécie de funeral da democracia, tanto que no momento de decidir o trajeto da manifestação surgiu a sugestão de ir ao Cemitério Municipal. A tristeza foi momentânea e, quanto mais chegavam pessoas, a atmosfera ganhava em animação, ativismo e pluralidade.

    O protesto foi convocado pelas redes sociais a partir da iniciativa do Coletivo CWB Contra Temer. “Temos aqui uma juventude que chegou a participar da Primavera de 2013 e não foi cooptada por grupos de direita como o MBL. A luta por democracia é um debate muito vivo nas universidades e deve ir para as ruas. Antigos grupos políticos tomaram o poder para ter o controle da sociedade de volta, mas ninguém aguenta mais. Todo mundo quer mais liberdade”, disse o estudante de direito Thiago Régis, um dos organizadores da manifestação.

    Sem carro de som, tampouco megafone, a coordenação era feita na base da garganta. Ao lado de Thiago, o estudante de artes visuais Rafael Alves também soltava a voz no meio da multidão. Para ele, o futuro do país será difícil. “Se os golpistas mantiverem o poder teremos nossa liberdade tolhida. Levaremos de 10 a 15 anos para reerguer politicamente, economicamente e estruturalmente o Brasil. Vamos nos ferrar muito”.

    Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres
    Foto: Leandro Taques/Jornalistas Livres

    O movimento também atraiu trabalhadores preocupados com os efeitos do golpe. “É um dia que ficará marcado na história como infame, é o início do retrocesso. O golpe ainda não chegou no fim e não acerta só a Dilma e o PT. Mira os direitos da população, atingindo principalmente as camadas mais pobres e os trabalhadores”, alertou a bancária Marisa Stédile. “Espero que nossa resistência e luta faça brotar a consciência coletiva sobre a importância da democracia”, completou.

    A esperança da bancária estava refletida nas palavras do jovem estudante do ensino médio Eduardo Costa. “Não se trata de defender a Dilma ou um partido. Vim aqui para lutar pela democracia e por nossos direitos. Passaram por cima da Constituição. O país vai virar um caos. Está difícil arrumar emprego e só vai piorar para os trabalhadores e os estudantes”.

    Fotos: Isabella Lanave/R.U.A Foto Coletivo
    Fotos: Isabella Lanave/R.U.A Foto Coletivo

    Já com a Praça tomada, os manifestantes decidiram bloquear a Avenida Barão do Serro Azul durante protesto em frente à Federação das Indústrias do Paraná (Fiep), entidade apoiadora do golpe. A passeata seguiu até Praça Santos Andrade, local da Faculdade de Direito da UFPR e onde leciona Sérgio Moro, herói togado da direita. Foi o momento mais tenso da manifestação. Um grupo que também se organizou pelas redes sociais, porém bem menor, saiu do Centro Cívico em cima de um caminhão de som. Eram menos de dez pessoas que foram provocar. Felizmente só houve troca de xingamentos antes da Polícia Militar retirá-los do local.

    Três horas depois do início, por volta das 21 horas, a manifestação terminava com ato na Boca Maldita, tradicional local de protestos da capital. O grupo CWB contra Temer convocou novo protesto para esta quinta-feira (02), a partir das 18h00, novamente na Praça 19 de Dezembro. O golpista não tem arrego até na terra do Moro.

  • R-existência no corpo incrível dos B-Boys

     

    Meninos ágeis, fortes e elásticos fazem movimentos impossíveis ao som da batida forte de músicas sampleadas. São lindos meninos que dançam break num domingão, disputando o duelo que acontece na quadra da Escola Estadual Doutor João Ernesto Faggin, na Vila Clara, periferia do Jabaquara (Z/S de São Paulo)

     

    É puro amor pela arte, pela criação, pela vida.

    Se você só é capaz de mexer seus músculos ou mobilizar a sua inteligência se tiver grana envolvida, saiba que esses gênios da dança entregam de seis a sete horas de suas vidas por dia para treinar os passos das coreografias sensacionais que exibirão numa quebrada como a da escola Doutor João Ernesto Faggin. Ao vencedor será dado um troféu. Grana, nenhuma.

    A escola que abriga o duelo neste domingo tem grades para todos os lados. A pintura está desgastada. Mas basta os meninos começarem a voar e rodopiar dentro do quadrado de decorflex no chão da quadra de esportes –a pista de dança — para que o espaço se transforme. Torna-se o coração da liberdade, do sonho, da cultura.

    Mauricélio de Lima Barros, 21 anos, o Mauri Lima, foi o campeão da disputa que envolveu 35 dançarinos de vários estados. Mauri é um rapaz sério e tímido. Nasceu em Diadema, na Grande São Paulo, e hoje divide-se entre São Bernardo do Campo e Juazeiro do Norte, terra do Padre Cícero. Ele se torna um gigante quando entra no decorflex.

    Membro de um time de B-Boys conhecido como RootsFavela Crew, Mauri vive para o hip hop, embora não tenha conseguido, até aqui, viver do hip hop. Ele treina muito, ouve rap, tenta uns versos, e observa. Observa muito.

    Seu colega de time, Marcos Rafael Freitas da Silva, 21 anos, que se consagrou vice-campeão no duelo deste domingo, explica que ele e os amigos observam muito todos os movimentos: “Se estou tomando banho e passo a mão na cabeça para lavá-la, pode estar aí um movimento que incorporo na minha dança”, diz. “O tempo todo penso nos movimentos que faço com meu corpo e observo os movimentos que as pessoas fazem com os delas”.

    O Brasil já é uma potência nos duelos internacionais de B-Boys. E a tradição vem da década de 1990, quando pioneiros como Edcarlos Faustino Guilherme, hoje com 36 anos, começaram a treinar os primeiros passos. Hoje, Edcarlos é um empresário do setor de transportes que, nas horas vagas, gosta de estimular a abertura de novos espaços para a prática da dança.

    A meca dos B-Boys, por incrível que possa parecer, é Seul, na Coréia do Sul. É estranho porque se sabe que a dança de rua nasceu nos anos 1970 entre os negros e latinos de Nova York. Mas os B-Boys coreanos incorporaram aos movimentos do hip hop elementos de danças tradicionais coreanas, como o pungmul e também de lutas, como o taekwondo.Caiu no gosto do país.

    Hoje, os duelos de B-Boys na Coréia envolvem grana alta de patrocinadores, a vibração de platéias lotadas e vultosas somas em dinheiro para os grandes artistas.

    No Brasil, Marcos Rafael explica que também está buscando “vitaminar” a dança de rua com elementos da sua cultura de origem. Pernambucano de Recife, o menino coloca em suas coreografias as influências explícitas do frevo, do xaxado e do coco –tradicionais do nordeste, ligados à força das culturas negra e indígena, misturadas. “Fica diferente, e fica muito legal”, ele garante.

    A B-Girl Karen, brasileira que vive em Copenhagen (Dinamarca) há 23 anos, estabelece bem a diferença entre a cena B-Boy brasileira e a do país europeu. “Aqui no Brasil, os B-Boys vêm das comunidades. É um movimento ligado existencialmente às comunidades pobres. Isso dá uma autenticidade forte e imprime indelevelmente a marca da cultura popular. É notável, por exemplo, que os movimentos dos B-Boys brasileiros têm muita dinâmica e muita acrobacia. Não tenho dúvidas de que isso se deve à influência determinante da capoeira”.

    Para manter os corpos tão leves e alongados quanto musculosos, os meninos usam a receita mais tradicional possível: alimentam-se de arroz, feijão, frutas, legumes. Pouca carne. Frituras e óleos são quase banidos. E nada, nada mesmo, de bolas e anabolizantes.

    Cansados e felizes com o resultado da prova, os heróis da equipe RootsFavela Crew saíram do duelo deste domingo e foram, juntos, pegar o ônibus que os levaria de volta a São Bernardo. Nenhum deles tem carro. Nada de ostentação. Sua riqueza são seus corpos. Dali a duas horas, estariam em casa. No caminho, avisam, vão pensando nas músicas, nas coreografias, em como melhorar. Eles amam o hip hop.

    PS: se você quiser ver uma batalha de B-Boys, não perca: dia 31/10, no Okinawa Club de Diadema, vai acontecer a festa de 30 anos da Back Spin, com toda galera do hip hop presente. Avenida Sete de Setembro N°1.670, telefone 11 7850–7917 .