Jornalistas Livres

Tag: Resistência ao golpe em 2016

  • EDITORIAL – UM GOLPE COM SANGUE NOS OLHOS

    EDITORIAL – UM GOLPE COM SANGUE NOS OLHOS

    Por Flávia Martinelli, para os Jornalistas Livres

    Foto e vídeo: Sato do Brasil/Jornalistas Livres

    Começou com sangue nos olhos. Um globo ocular dilacerado, cego e, por uma dessas ironias amaldiçoadas, esquerdo. Deborah Fabri, a estudante de 19 anos atingida por estilhaços de bala na primeira manifestação depois do golpe, foi perfurada em muito mais do que em seu direito de se manifestar. Figura de linguagem já não cabe mais na retórica da repressão inaugurada pelo golpista.

    Houve também uma câmera fotográfica destroçada. A quantidade pedaços quebrados denuncia a ira do arremesso. E, ainda, centenas de olhos inflamados por spray de pimenta. Choro de gás e de inconformidade. “Mão na cabeça e cara virada pro muro, filho da puta! Olha pro chão, vândalo do caralho!”, é a clássica ordem de prisão policial da tropa de Geraldo Alckmin. E não dá para esquecer do olhar dos refletores do poder.

    Lentes de TV estão seletivas. Só registram o vidro do caixa eletrônico quebrado. O noticiário da Globo adora um quebra-quebra. Os editoriais, espaços para a defesa do ponto de vista dos jornais, pedem mais repressão. A Folha e o Estado de S.Paulo tipificaram os manifestantes por um único grupo de meia dúzia de queimadores de lixo, pneus e quebradores de vidraças bancárias. Justificam a porrada, incutem medo na classe média, querem medidas mais duras para conter quem protesta.

    O presidente golpista atendeu no mesmo dia. Temer autorizou as Forças Armadas a atuarem na Avenida Paulista no domingo (04/09) marcado para inúmeras manifestações. A “garantia da lei e da ordem” tem como desculpa a passagem da tocha olímpica no local. O governo do Estado gostou. Emitiu nota avisando que protesto não pode, não. Estão todos de olho, nas palavras dos jornais, nos “vândalos”, “arruaceiros”, “milicianos”, “fascistas”, “criminosos”, e, claro, “baderneiros”, definição preferida dos apoiadores do golpe.

    Mas o que é “baderna” diante de um complô de corruptos, grandes instituições financeiras, indústrias e mercados internacionais capazes de derrubar uma democracia? E que massa é essa de “soldados da arruaça” ou “fanáticos da violência” como diz a “Folha de S.Paulo” que, depois de apoiar o golpe – esta sim a violência superlativa – se vitimiza de forma patética ao ter sua fachada pichada por manifestantes?

    Os repórteres de gabinete não viram, por exemplo, que entre os incendiários de lixo havia um pai de família de 54 anos, professor da rede pública, puto por ter seu voto roubado. Se ele botou fogo para fazer barricada contra a tropa de choque, é miliciano e ponto final. E dá-lhe bomba, diz o jornal. E bomba na cara, age a PM.

    “Nos últimos dias, eu testemunhei policiais fazendo mira na cabeça de manifestante”, diz a jornalista Kátia Passos que, muito antes de ser Jornalista Livre, há um ano, é mãe de uma estudante secundarista e registra praticamente todos os atos de estudantes em São Paulo. “Nesses três últimos atos não teve conversa. Eu sempre falo com os comandantes como, ouço o outro lado. Não consegui trocar uma palavra. Eles se recusam a negociar.”

    Kátia reconheceu todas as cinco forças da polícia nas manifestações: Tática, Tropa de Choque, helicóptero, cavalaria e Polícia Militar. “Não via esse esquema de repressão desde o massacre de 2013, quando os policiais perderam completamente o controle e saíram atirando a esmo. A polícia não está na rua para dispersar, mas para encurralar.”

    No dia do golpe, (31/08), havia mais de mil policiais em ação na manifestação. Num trecho da rua da Consolação, sem saídas laterais, eles passaram a comprimir os manifestantes, cercando o grupo num círculo. “Bombas foram lançadas no meio da passeata. A única maneira de escapar era passar pelos cordões policiais com risco de levar tiro de borracha à queima-roupa”, lembra o Jornalista Livre Adolfo Várzea.

    No dia seguinte, Lucas Porto, repórter, fotógrafo, rotineiro cinegrafista de transmissões ao vivo das manifestações do Jornalistas Livres chegou a ser, literalmente, caçado por uma matilha de oficiais. Lucas sabe que sempre esteve marcado. Mas dessa vez, o grupo de policiais não se contentou de correr em seu encalço. Lucas ganhou uma bomba exclusiva, só pra ele, numa calçada praticamente vazia. Só não foi apanhado pelos PMs porque outro colaborador dos Jornalistas Livres, Caco Ishak, se colocou diante dos policiais. Caco foi atropelado por uma moto da tropa na calçada, derrubado no chão, imobilizado e levado para a delegacia. Só saiu de lá depois das 4 da manhã.

    O parâmetro da violência policial deixa claro a que veio o golpe. É a opinião dos fotógrafos Christian Braga e de Sato do Brasil, ambos Jornalistas Livres. Christian vê uma escalada crescente de violência nesses últimos dias. “Tá punk, sim. E tem bala de borracha pra caramba, os caras nem pensam antes de atirar.” Sato estava próximo ao prédio da Folha de S.Paulo na última quarta-feira (31/08), quando os manifestantes picharam o portão blindado da entrada e jogaram pedras na fachada no jornal.

    “Vi de longe quebrarem a câmera do fotógrafo ali. Ele estava sentado com as costas na parede. O policial simplesmente tirou o capacete da cabeça dele, arrancou a câmera, jogou no chão e pisou no equipamento.” Sato deu de cara com um PM e avisou: ‘Sou imprensa, sou imprensa’. Ele respondeu: ‘Foda-se, sai daqui! Quer tomar tiro na cara?’”. De fato. Àquela altura, a estudante Deborah já havia perdido a visão. Não era força de expressão. O golpe quer tirar sangue dos nossos olhos.

     

  • [Porto Alegre] Dilma é ovacionada em evento na capita gaúcha

    [Porto Alegre] Dilma é ovacionada em evento na capita gaúcha

    PRIMEIRAMENTE, FORA TEMER!

    O lançamento do livro “Resistência ao golpe em 2016” em Porto Alegre, nesta sexta-feira (3), iniciou com o grito mais popular para aqueles que lutam contra o golpe: o “Fora Temer!”. O grito de “Volta querida!”, por sua vez, nunca esteve tão forte na capital gaúcha. As dezenas de pessoas reunidas no Teatro Dante Barone, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, aproveitaram a presença da presidenta Dilma Roussef para assinar, simbolicamente, um acordo com a conterrânea: não haverá apoio aos retrocessos anunciados pelo presidente interino Michel Temer.


    Em Porto Alegre, Dilma fez o que tem feito em todas as cidades que visita, se defendeu das acusações de corrupção e falou contra a direita que aplica o golpe. “Se vocês olharem as gravações da Câmara no dia da votação do impeachment e pegarem as justificativas dos deputados, vocês verão que nenhum dos que votaram a favor citaram os seis decretos suplementares e o Plano Safra”, afirmou.

    Enquanto falava, Dilma pediu do público um “Fora Cunha!”. “É bom vocês falarem fora porque ele está afastado, mas continua trabalhando ativamente no golpe”, afirmou a presidenta. Além disso, Dilma falou a favor do Bolsa Família, que está sendo atacado pelo governo Temer, do Sistema Único de Saúde (SUS), do Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Ministério da Cultura (MinC). “Colocaram na educação uma pessoa que votou contra a cota nas universidades”, disse.

    Dilma aproveitou a oportunidade para se defender na acusação do jornal O Globo que, para ela, trabalha em tentativa de sujar a sua imagem. “Sou uma pessoa incômoda, não tenho acusações de desvio, nem contas no exterior. A acusação agora é com a conta do meu cabelereiro. Só que eu tenho os comprovantes de todas as passagens e serviços de cabelo. Mas parece que eles ligam o cabelo com Pasadena. Mas Pasadena foi em 2006 e neste ano eu nem conhecia este ótimo cabelereiro.”

    Antes da presidenta, um dos autores, José Carlos Moreira, que também é professor universitário, mandou um recado àqueles que insistem na ideia de que existe um processo de impeachment válido e dizem lutar contra a corrupção. “Todos que estamos aqui somos conscientes de que o combate da corrupção por si só, vazio, é uma falácia. Ele não pode vir desassociado de um projeto político popular, melhor para o nosso país. Quem vai às ruas pedir a saída do governo sem se preocupar com o que vem depois não está pensando no país de fato”, disse.

    Tarso Genro, que também assina a co-autoria do livro, esteve presente e denunciou o “oligopólio da mídia”. “A mídia é financiada por entidades com interesses escusos e destinados a derrubar uma presidenta que recebeu 54 milhões de votos”, enfatizou.

    Tarso alertou que a consumação do golpe desencadeia a desestruturação da soberania democrática e popular na América Latina, o que é visto por ele como um desastre. “O grande objetivo do golpe é a lucratividade do capital financeiro global, que perde resistência com a saída da presidenta do poder”.

    Recepção Calorosa 

    Dimae

    Com flores e palavras de ordem como “Volta Querida!”, “Empurra o Temer que ele cai”, centenas de mulheres recepcionaram a presidenta Dilma Rousseff na capital gaúcha. Assim como em todo país, em Porto Alegre as mulheres se mobilizam contra o golpe em curso e o perigo que o governo interino representa às políticas sociais femininas.

    As manifestantes se reuniram na praça da Matriz (praça Marechal Deodoro) para a entrada da ALERGS e seguiram em caminhada, às 17h30, com a presidenta até a Esquina Democrática para o III Ato Contra o Golpe e em Defesa da Democracia.