Há quem sugira que entramos em parafuso com a crise de 2008. Há quem sugira que tudo começou em 2013. Eu proponho que nossa transição para lugar nenhum começou em 2015. Toda periodização elege um critério. O meu é a ascensão e queda da extrema-direita no nosso país.
Por Rudá Riccicientista político e presidente do Instituto Cultiva
Com efeito, a crise econômica de 2008 (subprime nos EUA) provocou um abalo nas estruturas da ordem social da Europa e provocou uma explosão migratória que teve ápice em… 2015, minha data de referência de quando entramos no túnel do tempo defeituoso. Em 2014, a direita ultranacionalista já atingia entre 25% e 30% dos votos no Reino Unido, na França e na Dinamarca. Contudo, em 2017, Marie Le Pen se projeta nacionalmente na França; em 2017, foi a vez da Alternativa para a Alemanha; em 2018, a União Cívica Húngara. Michael Lewy, num artigo de dezembro de 2015, analisava a ascensão do conservadorismo e extrema-direita na Europa e no Brasil. O autor sugere uma subdivisão dessas forças extremistas europeias: a) Partidos de caráter diretamente fascista e/ou neonazista: como o Aurora Dourada, da Grécia; o Jobbik, da Hungria; o Setor Direito, da Ucrânia; o Partido Nacional Democrata, na Alemanha. b) Partidos semifascistas, caso da Frente Nacional, da França; do FPÖ, da Áustria; e do Vlaams Belang, da Bélgica, cujos líderes fundadores tinham ligações estreitas com o fascismo histórico e com as forças que colaboraram com o Terceiro Reich c) Partidos de extrema-direita que não possuem origens fascistas mas compartilham do seu racismo, xenofobia, retórica anti-imigrante e islamofobia, como a italiana Lega Nord, o suíço UDC (União Democrática do Centro), o britânico Ukip (Partido de Independência do Reino Unido) No Brasil, o Instituto Vox Populi identificou o ápice do discurso fascista e pró-regime militar em dezembro de 2015. Este foi o momento em que o discurso histérico de extrema-direita teve maior repercussão na formação da opinião pública. A partir daí, declinou lentamente. Este período de reverberação do discurso de extrema-direita prosseguiu até o final do primeiro semestre de 2016. Que fique claro, extrema-direita é rejeitada pelo conservadorismo e não mantém relações com certa literatura que já surgia no Brasil desde 2012. O pensamento conservador aceita mudanças, desde que não sejam bruscas e, por este motivo, rejeitam discursos revolucionários e reacionários (este último, caso da extrema-direita). O importante é notar que se conservadores e ultraconservadores decidiram atacar a esquerda numa grande ofensiva desde 2015, ao longo deste ano perderam o controle e deram lugar ao discurso extremado que os colocou na mesma cesta dos corruptos e elites.
O começo do fim de Aécio Neves está vinculado a esta segunda onda que encobriu a que ele fez de tudo para gerar. Os ataques nas redes sociais eram intensos, criando o famoso efeito manada. A listagem de personalidades “comunistas” crescia, envolvendo qualquer crítico. Até que começou uma primeira reação no segundo semestre de 2016, vinda das articulações entre centrais sindicais. As manifestações da extrema-direita começaram a demonstrar menor volume que as sindicais. Finalmente, em abril de 2017, ocorre a maior greve geral da história do Brasil. Mais de 150 cidades registraram paralisações, envolvendo adesão de 40 milhões de pessoas. Contudo, a partir do segundo semestre de 2017, muitas lideranças sindicais acusavam o golpe da reforma trabalhista enviada pelo governo Temer ao Congresso Nacional. A reforma atingia duramente as fontes de recursos financeiros de todo movimento sindical. Também se dizia, nos bastidores, que havia movimento em vários partidos de esquerda para iniciar a preparação para a eleição de 2018. O fato é que a mobilização sindical iniciada no segundo semestre de 2016, refluiu a partir do segundo semestre de 2017, logo após a greve.
Minha tese é que a vitória de Bolsonaro não foi fruto da ascensão da extrema-direita. Foi, antes, um ruído. As forças de extrema-direita estavam dispersas naquele momento, com atos isolados. Lula figurava em primeiro lugar nas pesquisas para a Presidência em agosto de 2018. O casuísmo vergonhoso que levou à prisão e impedimento da candidatura Lula embaralhou as cartas naquele processo eleitoral. PT demorou para indicar o candidato oficial. Somente em 11 de setembro o PT anunciou oficialmente que Haddad seria o novo candidato do partido. Mesmo assim, com um candidato sem grande expressão nacional, o PT chegou ao segundo turno. Até a fatídica facada, Bolsonaro oscilava ao redor de 20% de intenção de votos. A partir deste acontecimento, chegou a 26%. Haddad aparecia com 8%.
A tese que estou defendendo procura alinhar uma interpretação que cria uma perspectiva para a falta de sustentação popular do governo Bolsonaro após sua eleição e a sua ida, cada vez mais clara, em direção ao Centrão. Bolsonaro se elegeu com 55% dos votos válidos. Em dezembro de 2018, o IBOPE revelava que 75% dos brasileiros tinham expectativas positivas em relação ao seu governo. Contudo, após a posse, a queda de aprovação foi despencando. Caso a extrema-direita estivesse em ascensão, qual seria o motivo para não sustentar o governo federal que teria apoiado e por qual motivo não continuou nas ruas, procurando desestabilizar as instituições que procuravam domar Jair? Esta é minha tese: a eleição de Bolsonaro foi um repique em meio a um momento de crise política generalizada em nosso país que envolveu até mesmo as forças de extrema-direita. A movimentação atual de Bolsonaro em direção ao Centrão – e a tímida reação de apoiadores de 2018 -, além do silêncio ensurdecedor do “gabinete do ódio” indicam a fragilidade das forças extremistas do Brasil, assim como a fragilidade da tese da ascensão dessas forças.
Obs. A ilustração que abre este artigo é de autoria do argentino Al Margen
Em nossa contribução ao livro Do Fake ao Fato (des)atualizando Bolsonaro procuramos usar as palavras “atualizados” e “obsoletos”, entrecruzando-as com as definições clássicas de direita e esquerda, para compreender a base bolsonarista. Esse cruzamento pareceu-nos útil para entender a relação desses eleitores com o tempo, como atualizados de direita e de esquerda; e obsoletos de direita e de esquerda. É partindo dessa compreensão teórica que aqui nos perguntamos: Como reagir ao crescimento vertiginoso de candidaturas evangélicas e militares em nossas últimas eleições?
Mayra Marques, Mateus Pereira, Valdei Araujo, professores da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) em Mariana
Frente a um tempo agitado e marcado pela chamada destruição criativa, somos levados a nos compreender como atualizados ou obsoletos em um ambiente hostil que parece nos cobrar um preço sempre mais alto pelo simples direito de existir. Essa sensação é parte do que temos chamado de atualismo, uma ideologia hegemônica que avalia e divide as pessoas por seu grau de atualização. O sujeito atualizado pode ser no máximo um surfista que tenta se equilibrar nas ondas de atualização e teme a todo momento se afogar em um oceano de coisas, comportamentos, linguagens e tecnologias consideradas obsoletas. Nessa metáfora, a história é um profundo oceano de esquecimento no qual estamos ameaçados de afundar.
O sujeito rotulado de obsoleto existe com a contínua sensação de sua incapacidade de sobreviver à próxima onda de atualização. Não por acaso, o vocabulário da extinção é continuamente invocado para caracterizá-lo: ele é o peixe fora d’água ou o dinossauro que se recusa a desaparecer. Atualizado e obsoleto são as duas condições que a ideologia atualista reserva aos humanos, atribuindo valor exclusivo ao estar atualizado. O atualismo pretende nos convencer que apenas o que é atual merece existir. Essa ameaça existencial do atualismo produz ansiedades e ressentimentos que são amplamente explorados pela direita. Curiosamente, a mesma direita que patrocina a visão de um mundo em que apenas os mais fortes (atualizados) merecem viver, tem sido exitosa em capitalizar com o medo de extinção de setores dos grupos sociais que se enxergam como maiorias. Neste grupo, os militares e religiosos conservadores se destacam.
Comecemos por relembrar um fato ocorrido na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2020, que em decorrência da pandemia de Covid-19, aconteceu de forma remota. Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro fez um discurso no qual, dentre várias informações distorcidas, fazia “um apelo a toda a comunidade internacional pela liberdade religiosa e pelo combate à cristofobia”[1] e encerrou a sua fala afirmando que “o Brasil é um país cristão e conservador e tem na família sua base”. Nota-se que o esforço em manter os laços com a comunidade cristã, em especial a evangélica, não foi algo que se restringiu aos palanques eleitorais; assegurar este importante apoio é uma constante de Bolsonaro, mesmo estando há quase dois anos na presidência: após vetar o projeto de lei que pretendia perdoar as dívidas das igrejas, Bolsonaro declarou, no Twitter, que ele mesmo derrubaria seu próprio veto, caso fosse um senador ou deputado[2]. Desta forma, mesmo quando parece não agir em favor das igrejas, o presidente reforça a sua imagem como um defensor e propagador da religião cristã.
Alguns meses antes da Assembleia da ONU, a Deutsche Welle noticiou que muitos pastores apoiavam o discurso de Bolsonaro, que diminuía a gravidade da Covid-19 e defendia a reabertura do comércio, e mantinham suas igrejas abertas, embora a maioria dos fiéis preferisse ficar em casa[3]. Para Edir Macedo, quem nada teme não precisa se preocupar com o vírus; já, para Valdemiro Santiago, a doença seria uma vingança divina. O primeiro é um bispo evangélico fundador da Igreja Universal do Reino de Deus e proprietário de uma das maiores emissoras de televisão do Brasil, a Rede Record, enquanto o segundo é fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus e possui um programa na Rede Bandeirantes. Além do fato de ambos possuírem fortunas dignas de serem relatadas na Revista Forbes e de possuírem programas religiosos na TV aberta, outro fato os une: os dois têm o apoio a Bolsonaro.[4]
O atual presidente foi eleito com grande adesão do eleitorado evangélico. Cerca de um terço da população brasileira é de alguma denominação evangélica, dentre os quais 42% ajudaram a eleger Bolsonaro[5]. Embora seja católico, o atual presidente, que até então era apenas um capitão “excêntrico” que defendia o lobby corporativo dos militares, foi batizado pelas mãos do pastor e deputado Everaldo Dias, em 2016, no rio Jordão, e costuma frequentar cultos com sua esposa na Igreja Batista. Seu lema de campanha “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”, assim como o combate a pautas progressistas, como a legalização do aborto e o casamento homo-afetivo, fizeram com que muitos pastores o apoiassem e aconselhassem seus fiéis a votarem nesse candidato.
É bom destacar que o discurso de Bolsonaro nem sempre manteve essa ênfase na religião: entre 2004 e 2012, por exemplo, os seus temas principais eram o anticomunismo e o favoritismo ao militarismo, mas, a partir de 2013, ao se aproximar do então presidente da Comissão de Direitos Humanos, o pastor Marcos Feliciano, ele passou a ter mais contato com a “Bancada Evangélica”, incluindo aspectos religiosos às suas falas. Marcos Feliciano, pastor da igreja neo-pentecostal Catedral do Avivamento e vice-líder do governo no Congresso, e Silas Malafaia, pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, foram incluídos entre seus principais conselheiros.
A Frente Parlamentar Evangélica, popularmente conhecida como Bancada da Bíblia, compõe parte considerável do Parlamento: dos 594 parlamentares, 203 pertencem ao grupo, sendo 195 deputados e oito senadores, o que significa mais de 30%. Os partidos que têm maior adesão a esta frente são: o Partido Social Liberal (PSL), Partido Social Democrático (PSD), Republicanos, Partido Liberal (PL), Progressistas (PP) e Movimento Democrático Brasileiro (MDB), embora haja representantes de diversos outros partidos, incluindo o Partido dos Trabalhadores (PT) . Em 2019, a Frente Parlamentar Evangélica foi considerada, pelo “Estadão”, a bancada mais governista dos últimos cinco mandatos presidenciais, pois 90% dos seus votos foram a favor do governo . Após a saída de Bolsonaro e seus filhos do PSL, houve a tentativa de criar o partido Aliança pelo Brasil, que fracassou. Assim, a ex-mulher do presidente, e seus filhos, Carlos e Flávio Bolsonaro, se filiaram aos Republicanos, partido que contém 24 parlamentares na Frente Parlamentar Evangélica. Jair Bolsonaro segue sem partido, mas não seria de se espantar que ele também se filiasse ao Republicanos, pois além deste partido ser um dos mais presentes na Bancada Evangélica, também é o partido do atual prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, sobrinho de Edir Macedo e bispo da Igreja Universal do Reino de Deus.
Santinho da campanha de Crivella
Crivella busca a reeleição no pleito deste ano e, para isso, tentou uma aliança com a ala bolsonarista do antigo partido do presidente, o PSL. No entanto, o partido preferiu não se associar ao atual prefeito do Rio devido ao seu suposto envolvimento em um esquema de corrupção. Mesmo assim, Crivella optou por uma candidata a vice-prefeita bastante simbólica, pois tem duas características que podem ser bastante atrativas para os apoiadores do presidente: ela é militar e católica. Enquanto o catolicismo da tenente-coronel Andrea Firmo pode arrebanhar votos de mais cristãos, englobando os católicos, ela ainda tem uma carreira militar digna de nota: ela foi a primeira mulher a comandar uma base da ONU na África. Assim, essa candidatura tem tudo para agradar as duas principais alas do bolsonarismo.
Segundo um levantamento feito pelo Observatório das Eleições, o número de candidatos a prefeito, com títulos militares, aumentou em mais de 300% desde 2016, enquanto o aumento no número de vereadores que seguiram a mesma “estratégia” foi de 56%. Embora o crescimento da porcentagem de candidatos com títulos religiosos tenha sido menor, ele ainda existe: mais de 10% dos candidatos a prefeitos e mais de 40% dos candidatos a vereador[6].Os partidos que lideram este crescimento são os mais próximos a Bolsonaro: o PSL é o partido com mais candidatos militares, enquanto o Republicanos é o partido com mais candidatos religiosos. Os gráficos abaixo mostram que os eleitores conservadores terão muitas possibilidades de escolha em 2020:
Fonte: Observatório das Eleições
O antropólogo Juliano Spyer identifica uma transição religiosa no país: caso o número de evangélicos continue crescendo no ritmo que estamos assistindo, até 2032 eles serão maioria. Para o antropólogo, uma das razões fundamentais para este crescimento é o papel que muitas igrejas desempenham como uma espécie de “bem-estar social informal”, promovendo uma melhora na qualidade de vida de muitas pessoas pobres que o Estado não consegue promover de forma satisfatória[7]. Ainda que seja uma explicação insuficiente, ela ajuda a explicar o crescimento que assistimos, já que seria preciso, inclusive, construir distinções entre igrejas propriamente ditas de corporações disfarçadas de igrejas.
E é preciso lembrar que há personalidades políticas que também são evangélicas, mas com tendências progressistas, como Benedita da Silva e Marina Silva, mas com posicionamentos bastante diferentes dos de Bolsonaro e seus seguidores. Já, em relação aos militares, é possível trazer políticos relacionados à segurança pública para o campo progressista, como mostram as candidaturas, bastante contestadas, por militantes e filiados, de Denice Santiago, ex-major da PM, como candidata à prefeitura em Salvador pelo PT; e do ex-coronel da PM e católico praticante, Ibis Pereira, como candidato a vice-prefeito no Rio de Janeiro pelo PSOL. Oportunidade para dizermos que a esquerda também pensa em segurança pública? Talvez.
De todo modo, o nosso ponto é que no interior da nossa tipologia, entre atualizados e obsoletos, a hierarquia superior, entre militares e evangélicos, tende a ser mais atualizada, ao passo que a “base” tende a ser classificada e algumas vezes se considerar obsoleta frente aos valores que se apresentam como atualizados. Assim, um dos desafios do campo progressista passa, obviamente, por criar pontes e conquistar parte dos setores atualizados e obsoletos desses segmentos, em especial, os últimos, pois como vimos acima os pastores-políticos atualizados são hábeis em mudar de lado, caso o vento mude. Considerar estas pessoas como líderes religiosos é não entender o principal de suas atuações, justamente a dissolução das fronteiras entre política, religião, entretenimento e negócios.
No entanto, parece que só o campo progressista pode atuar em vantagem em um aspecto. Essas duas possibilidades existenciais, atualizados e obsoletos, parecem cegas para os verdadeiros operadores do atualismo, as grandes empresas e corporações que monopolizam o novo mercado de dados, o que Shoshana Zuboff, em The Age of Surveillance Capitalism, chamou de “capitalistas da vigilância”: “A combinação entre conhecimento e liberdade funciona para acelerar a assimetria de poder entre os capitalistas da vigilância [Google, Facebook, Amazon etc] e as sociedades nas quais eles operam. Este ciclo será quebrado apenas quando reconhecermos como cidadãos, sociedades, e mesmo como civilização, que os capitalistas da vigilância sabem demais para se qualificarem para a liberdade”.
Em outras palavras, queremos dizer que no Brasil o capitalismo de vigilância adquire uma “cor local” quando percebemos que há uma aliança tática entre as grandes corporações do capitalismo de vigilância com outras duas corporações e seus líderes atualizados: a militar e a evangélica, não excluindo aqui certo conservadorismo católico. E essa aliança constrói guerras culturais de atualização bastante específicas e estranhas a uma parte considerável do campo progressista, pois está assentado em discursos, práticas e tradições que pensávamos superadas.
Mateus Pereira, Mayra Marques e Valdei Araujo escreveram o Almanaque da Covid-19: 150 dias para não esquecer ou o encontro do presidente fake e um vírus real. Mateus Pereira e Valdei Araujo são professores de História na Universidade Federal de Ouro Preto, em Mariana. Também são autores do livro Atualismo 1.0: como a ideia de atualização mudou o século XXI e organizadores de Do Fake ao Fato: (des)atualizando Bolsonaro, com Bruna Klem. Mayra Marques é doutoranda em História na mesma instituição. Agradecemos à Márcia Motta e aos grupo Proprietas pelo apoio e interlocução neste projeto.
O Projeto de Lei (PL) 529/2020, de autoria do governador João Doria (PSDB), teve o texto base aprovado na madrugada desta quarta, em manobra dos governistas da Alesp. A primeira etapa da votação contou com 48 votos favoráveis e 37 contrários. Hoje está prevista a votação dos destaques. Votaram, em bloco, contrários ao PL 529 o PT, PSOL e Novo. DEM e PSDB, em bloco, votaram favoravelmente.
O PL que, entre várias medidas, extingue empresas e autarquias do Estado de São Paulo, propõe um aumento de 3% para 4% na alíquota do IPVA, possibilita um aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), coloca um Plano de Demissão Incentivada (PDI) e permite a venda de diversos patrimônios do Estado, como terrenos ou prédios.
O projeto, justificado pelo governo por conta da crise da pandemia do coronavírus (COVID19) e do suposto rombo de bilionário nas contas estaduais, chegou na casa legislativa em agosto e recebeu mais de 600 emendas, para alterar o texto original. Diversos deputados se manifestaram contrários ao projeto, juntado partidos que normalmente são rivais como PT, PSOL, PCdoB, PSL e NOVO. O relator Alex de Madureira (PSD) ignorou as emendas, mas algumas alterações serão feitas por meio dos destaques, que devem ser confirmados na votação de hoje.
O processo de tentativa contra o 529 se iniciou assim que ele chegou na Alesp e teve atos contrários ofícios de diversos prefeitos de todo o estado, diversas manifestações dos servidores dos órgãos que serão extintos além da sociedade civil, que será afetada.
Também estão previstos para essa votação, a não extinção da FURP, do ONCOCENTRO, do IMESC e do ITESP e retirada do confisco dos Fundos da PM.
Mas a maior parte do projeto 529 continua como veio do palácio dos bandeirantes e para isso contou com a ajuda do presidente da Alesp, Cauê Macris (PSDB), que forçou diversas votações relâmpagos colocando o texto como urgente, para ser válido já para o ano que vem.
Extinção das seguintes entidades descentralizadas: Fundação Parque Zoológico de São Paulo, Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo – CDHU, Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU/SP), Superintendência de Controle de Endemias (SUCEN), Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (DAESP) e Instituto Florestal;
Venda dos terrenos e imóveis da entidades descentralizadas;
Alienação de 89 imóveis com área total de 6.832.465 metros quadrados sem informar o valor que podem alcançar;
O projeto pretende obter autorização para concessão de exploração de serviços ou de uso, total ou parcial, do Parque Villa Lobos, Parque Candido Portinari, Parque Fernando Costa – Água Branca, Parque Estadual do Belém Manoel Pitta, Parque Chácara da Baronesa, Parque da Juventude – Dom Paulo Evaristo Arns, Parque Ecológico do Guarapiranga e o Complexo Olímpico da Água Branca, Conjunto Desportivo Baby Barioni e do Casarão Melo Franco;
IPVA: aumento de 3% para 4% do imposto para veículos que usem, exclusivamente, os seguintes combustíveis: álcool, gás natural veicular ou eletricidade, ainda que combinados entre si. O PL 529 propõe que as isenções aos portadores de necessidades especiais seja dada apenas aos deficientes físicos com deficiência severa ou profunda e que permita a condução de veículo automotor especificamente adaptado e customizado para sua situação individual;
ICMS: renovação automática dos benefícios;
Iamspe: aumento da contribuição para pessoas com mais de 59 anos de 2 para 3% e “contribuição para beneficiários de contribuintes”, hoje isentos;
Programa de Demissão Incentivada (PDI) para servidores públicos considerados estáveis e da Administração Direta, Autarquias e Universidades, podendo atingir, diretamente, mais de 5 mil trabalhadores.
A aliança do PT com o MDB, PCdoB e PSB poderá levar a esquerda de volta à prefeitura de Contagem, importante polo industrial da Grande Belo Horizonte, com população de cerca de 650 mil pessoas. É o que mostra hoje pesquisa do instituto DataTempo/Quaest realizada entre os dias 1º e 3, quando foram ouvidos/as 850 eleitores e eleitoras. A ex-prefeita do município por dois mandatos (2005/2012), deputada estadual Marília Campos, do PT, disparou na disputa eleitoral com grande vantagem diante dos outros 15 concorrentes.
Marília, que tem como vice o fisioterapeuta e ex-deputado estadual Ricardo Faria, do MDB, tem mais do dobro de intenções de voto de seus concorrentes somados. Todos eles estão tecnicamente empatados, considerando-se a margem de erro da pesquisa, que é de 3,4 pontos percentuais para mais ou para menos.
Marília Campos pode voltar à prefeitura de Contagem pela terceira vez
A candidata do PT começa a disputa com 40% das intenções de voto na pesquisa estimulada, quando a lista de candidatos é mostrada ao eleitor. Em segundo lugar aparece Doutor Wellington (Republicanos), com 4%. Já em terceiro está o Coronel Fiúza (PTC), com 3%, enquanto quatro candidatos somam 2% cada: Wellington Silveira (PL), Alfredo (Patriota), Ivayr Soalheiro (PDT), e Professor Irineu (PSL). Quatro candidatos têm apenas 1%: Kaka Menezes (Rede), Lindomar Gomes, PMN), Maria Lúcia Guedes (PV) e Felipe Saliba (DEM). Pelo menos 21% dos eleitores disseram que não votariam em ninguém ou votariam em branco ou nulo.
Marília Campos e seu candidato a vice, Ricardo Faria, em campanha
A pesquisa também buscou saber em quem os eleitores votariam por meio do levantamento espontâneo, quando os nomes dos candidatos não são apresentado aos entrevistados. Nesse levantamento, Marília soma 19%.
“É um resultado que nos estimula e mostra que estamos no caminho certo. Mas, ainda existe uma margem de indecisos elevada e o trabalho de convencimento não pode parar. Faço um chamado aos nossos apoiadores para continuarem procurando as pessoas, apresentando nossas propostas e pedindo o voto. Não existe eleição fácil nem eleição ganha”, afirmou Marília Campos em sua página no Facebook.
Nada menos que 61% dos eleitores de Contagem consideram a administração de Alex de Freitas (PSDB) ruim ou péssima. Entre os pesquisados, 76% dizem que desaprovam a sua gestão e 19% aprovam.
Independente do que aconteça em dezembro, as eleições municipais deste ano já estão marcadas pela tentativa dos partidos de esquerda em produzir seus próprios quadros militares. Têm destaque aqui as candidaturas de Denice Santiago, ex-major da PM e candidata à prefeitura de Salvador pelo PT, e Ibis Pereira, ex-coronel da PM e candidato à vice-prefeito na chapa do PSOL, no Rio de Janeiro.
Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia
As candidaturas de Denice e Ibis são alvo de críticas dentro da própria esquerda. Alguns acusam o PT baiano e o PSOL fluminense de estarem colaborando para a “militarização da política”.
Ibis Pereira, ex-coronel da PM do Rio, candidato a vice-prefeito pelo PSOL – Reprodução Instagram
Bom, um rápido passeio pela história no Brasil mostra que o engajamento dos militares na política não é nenhuma novidade entre nós. A própria República nasceu com uma quartelada e se consolidou com uma ditadura militar. Outras duas ditaduras ainda sangrariam a sociedade brasileira, uma civil, com Getúlio Vargas, e outra genuinamente militar, entre 1964 e 1985. Nas duas ocasiões, homens fardados estiveram em posição de poder, interferindo diretamente nos destinos da nação.
Existiram também os militares de esquerda, movidos por ideias progressistas. Luís Carlos Prestes, o “cavaleiro da Esperança” eternizado nas páginas de Jorge Amado, e Henrique Lott, o Marechal da Legalidade, estão entre eles.
Nos últimos anos, o perfil do engajamento político dos militares mudou bastante. Não é mais o Exército a única fonte institucional do ativismo político dos militares, mas também as PMs.
O resultado das eleições de 2018 são taxativos: o número de agentes da segurança pública eleitos para o Congresso Nacional saltou de 14 para 73, um crescimento de mais de 500%. A força desses parlamentares é tão grande que eles conseguiram formar uma “frente ampla da segurança pública”, que defende o endurecimento do poder punitivo do Estado e o afrouxamento do controle legal sobre a atuação dos policiais.
Pesquisas de opinião mostram que a violência urbana é vista como o principal problema do país pela sociedade civil. As esquerdas, limitando-se às agendas da desmilitarização das PMs e da descriminalização das drogas, nunca participaram efetivamente desta discussão. A avaliação é de que as polícias militares são o principal problema da segurança pública brasileira, como se o fato de homens armados sitiarem territórios não fosse problema social dos mais graves.
Os dados eleitorais mostram que a população não concorda com essa avaliação.
São muitos os relatos de famílias pobres que foram expulsas de suas casas por traficantes varejistas, que tiveram filhas assediadas. Trabalhadores e trabalhadoras convivem com assaltos diários, com constantes ofensivas contra o pouco patrimônio que possuem.
Tudo isso acaba fomentando no imaginário coletivo a ideia de que a violência policial é um problema menor, ao mesmo tempo em que os políticos de esquerda estariam “defendendo bandido”.
Quando o PT e o PSOL trazem para o primeiro plano de seus projetos eleitorais em duas importantes capitais quadros egressos das PMs, o objetivo é exatamente mostrar que a esquerda tem, sim, um plano para a segurança pública, que não passa pela rejeição à polícia e tampouco pela leniência com criminosos.
Não há projeto de segurança pública viável e digno de confiança que se sustente na rejeição à polícia, que não reconheça a importância do uso legítimo da força pelo Estado.
Ibis Pereira entrou para a reserva da PM em 2016 – Reprodução Socialista Morena
Tanto Denice como Ibis têm em sua ficha funcional histórico de bons serviços prestados à população, na forma de uma polícia educativa, cidadã e respeitadora dos direitos humanos. Denice se destacou comandando a “Guarda Maria da Penha”, que protegia mulheres vitimas de agressão doméstica. Ibis é conhecido no Rio de Janeiro por sua atuação em projetos sociais de educação popular.
Denice e Ibis foram policiais. Mas não eram policiais que executavam e torturavam, simplesmente porque não precisa ser assim. É possível ser diferente, porque dentro das corporações há bons servidores, lideranças que podem ser disputadas e servir como gatilho para um debate institucional que mostre aos próprios policiais que, do jeito que vai, não está bom pra ninguém. A polícia mata e também morre.
Do outro lado, a esquerda tem a chance de amadurecer projetos para a segurança pública que consigam conquistar a confiança da população, que em geral só quer viver uma vida tranquila, usufruindo da pouca propriedade que tem. Quando é pouca, propriedade é ainda mais valiosa.
Não, definitivamente, a polícia não tem que acabar. As polícias são fundamentais para o contrato social civilizado, são a garantia de que eu, pessoa privada, não preciso usar a força pra proteger minha vida e a minha família. A polícia precisa mesmo é mudar e o fato de termos Denice e Ibis mostra que isso é possível.
Provavelmente, nenhum dos dois será eleito. Ao que tudo indica, as esquerdas brasileiras sofrerão mais uma dolorosa derrota. Mas se as candidaturas de Denice e Ibis forem capazes de despertar novas lideranças progressistas, sem o vícios da militância caricata e capazes de se reconectar com os sentimentos do nosso povo, já teremos lampejo de esperança.
O ministro Ricardo Lewandowski, do STF, decidiu hoje que a decisão do TSE sobre a proporcionalidade de financiamento e tempo de TVs e rádio para candidaturas negras já vale para as eleições municipais deste ano. A decisão foi tomada de forma liminar pelo ministro, ou seja, feita em caráter de urgência para garantir um direito, mas é provisória e vai para o plenário.
No último 25 de agosto o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidiu que o valor do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e o tempo para candidatos em rádios e na TVs deve ser proporcional ao total de candidatos negros que o partido tiver nas disputas eleitorais.
Para a advogada Tamires Sampaio, candidata a vereadora pelo PT na cidade de São Paulo, a decisão foi acertada
“isso sendo aprovado no TSE, não havia motivo para que já nessa eleição não passe a ser utilizado. A não ser mais uma das estratégias dessas estruturas racistas que fazem de tudo para impedir que a população negra não tenha acesso aos seus direitos. É uma vitória, que precisamos comemorar, mas precisamos fazer com que, de fato, essa decisão passe a valer mesmo. E que nessas eleições as candidaturas negras tenham o direito a ter o fundo eleitoral de forma proporcional”
A decisão, que teve o placar de 6×1 favorável às mudanças, começou após a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), em conjunto com a ONG Educafro, provocar o TSE sobre a possibilidade de estender a proporcionalidade, que já é garantida em lei para candidaturas femininas, para as candidaturas negras. Mas os ministros haviam deixado apenas para as eleições de 2022 a obrigatoriedade da decisão. A justificativa foi o princípio da anualidade, que dispõe sobre o tempo em que passam a valer mudanças eleitorais.
Após o resultado no TSE, o PSOL entrou com uma ação para adiantar a validade já para 2020. E Lewandowski entendeu que era, de fato, “possível constatar que o TSE não promoveu qualquer inovação nas normas relativas ao processo eleitoral, concebido em sua acepção mais estrita, porquanto não modificou a disciplina das convenções partidárias, nem os coeficientes eleitorais e nem tampouco a extensão do sufrágio universal”.
A decisão de Lewandowski, por ter sido feita de forma liminar, agora vai para o plenário do STF, mas ainda não tem data marcada para ser trabalhada.
Histórico
A decisão do TSE foi comemorada, mas também criticada exatamente por não valer já para as eleições municipais de 2020. A PANE (Plataforma Antirracista Nas Eleições) do Instituto Marielle Franco entendeu a decisão do TSE como “uma vitória histórica do movimento negro. O TSE aprovou o financiamento de campanha e tempo de propaganda proporcionais para candidaturas negras, após muita pressão de organizações negras”.
O professor Douglas Belchior, que em 2018 foi candidato a deputado federal pelo PSOL-SP, em entrevistas para os Jornalistas Livres apontou que
“a decisão do TSE é uma vitória do movimento negro, uma vitória da luta histórica do movimento, de lideranças negras, que sempre reclamaram condições para conseguir emplacar mandatos de lideranças negros na política. E os partidos sempre foram o impedimento. É preciso lembrar e refletir sobre isso”
O ministro e presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, relator da matéria no tribunal afirmou em seu voto “hoje, afirmamos que estamos [TSE] do lado dos que combatem o racismo” e reconheceu que a medida veio com “atraso”.