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  • Wadih Damous: “A tarefa imediata é colocar Bolsonaro para fora do Palácio do Planalto”

    Wadih Damous: “A tarefa imediata é colocar Bolsonaro para fora do Palácio do Planalto”

    Por Bruno Falci e Nilce Costa para o Jornalistas Livres
    Wadih Damous e Álvaro Quintão, conferenciam sobre a complexa e grave situação política, social e sanitária do Brasil , quando o Brasil assinala o segundo país mais infetado da covid19 no mundo. Dentro deste contexto, a ação da Polícia Federal, que  deflagrou na última terça-feira a Operação Placebo.

    Também é comentado a situação das minorias, o desprezo neste momento para estas camadas.  Uma forte avaliação e formas de um novo governo través do PT, no intuito de retirar a extrema direita do poder,

    Wadih Damous, ex-deputado federal, advogado trabalhista, que foi presidente da OAB – Ordem os Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro, por dois mandatos. Damous é militante do Partido dos Trabalhadores desde a sua fundação, quando ainda fazia o curso de direito na  UERJ – Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

    Na presidência da OAB no Rio, uma das bandeiras de Damous foi o lançamento da Campanha pela Memória e pela Verdade, em prol da abertura dos arquivos da ditadura militar. Nesta trajetória, traçou um paralelo do combate à tortura durante o governo militar com o questionamento do instituto da delação premiada, consagrado pela Lava Jato, que virou uma dos fundamentos de sua atuação parlamentar. Teve procuração para atuar como advogado de defesa do ex-presidente Lula quando este se encontrava detido na carceragem de Curitiba.

    ex-deputado federal,  advogado trabalhista, que foi presidente da OAB – Ordem os Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro, por dois mandatos. Damous é militante do Partido dos Trabalhadores desde a sua fundação, quando ainda fazia o curso de direito na  UERJ – Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

    Na presidência da OAB no Rio, uma das bandeiras de Damous foi o lançamento da Campanha pela Memória e pela Verdade, em prol da abertura dos arquivos da ditadura militar. Nesta trajetória, traçou um paralelo do combate à tortura durante o governo militar com o questionamento do instituto da delação premiada, consagrado pela Lava Jato, que virou uma dos fundamentos de sua atuação parlamentar. Teve procuração para atuar como advogado de defesa do ex-presidente Lula quando este se encontrava detido na carceragem de Curitiba.

    Quanto a operação Placebo, Wadih Damous não confere qualquer credibilidade quanto ao governador Wilson Witzel, mas defende que a operação poderia ter sido elaborada de melhor forma.

    “Eu não sabia o que se passava, quando ouvia de casa, helicópteros a sobrevoar o local, ao verificar e deparei com a polícia federal fazia operação no palácio Guanabara, e nas propriedades particulares do governador Wilson Witzel do Rio de Janeiro e sua mulher.  Esta operação poderia ter sido feita com descrição, apesar da profunda ojeriza que sinto pelo governante e seu governo, mas eu prezo muito a ordem jurídica. É coisa grave, ela estaria repetindo Adriano Anselmo com Sérgio Cabral, usando o escritório de advocacia para celebrar contratos com fornecedores do Estado.”

    Quanto ao governo Bolsonaro e as decisões a serem tomadas, e a enfrentamento a pandemia, Wadih menciona que nada é feito e a política da pandemia irá prosseguir.

    “Bolsonaro é um aliado da pandemia, é negacionista, confirma que é uma gripezinha. É contra o isolamento social e participa em atos públicos com aglomeração de pessoa. Bolsonaro diz que ainda irá acontecer com muito mais gente”

    E acrescenta:

    Como os governadores estão na linha de frente no enfrentamento a pandemia e muitas vezes tem que contornar os obstáculos legais e administrativos na compra de equipamentos, para salvar vidas, estes vão ser perseguidos, investigados e sofrer tentativa de desmoralizados por parte de Bolsonaro e a PF.

    Quem votou em Bolsonaro sabia em quem votava. Crivela é o homem do Bolsonaro na cidade do Rio de Janeiro, já pensa em flexibilizar a quarentena e ele tem que ser contido nisso. O Brasil está num índice macabro. O Brasil hoje é um país amaldiçoado, não vamos poder entrar em outros países, seremos apontados como agentes da pandemia”.

    No que diz respeito a mudança urgente do governo atual:

    “Não há como nós aceitarmos Bolsonaro à frente do governo até 2022, o Brasil acaba junto. O Brasil não aguenta assistir passivamente esta estratégia de Bolsonaro, que é simplesmente exterminar pobre e sanear a Previdência Social com extermínio de pobre.

    Saídas como o impeachment, é custosa, Rodrigo Maia não tem prazo para aprovar isso, ele tem o poder de arquivar. O impeachment é um teatro político, embora tenha regras jurídicas, o que prevalece é a política. Teríamos que caçar a chapa Bolsonaro/Mourão”.

    Garante que a esquerda, tem que reconstruir sua identidade.

    A polarização na política brasileira, está se dando pela direita e extrema direita, a esquerda está fora, eu defendo que a esquerda tem que reconstruir sua identidade, construir uma agenda anticapitalista. Neste momento somos o epicentro da pandemia e do desemprego. Frente Ampla é algo mais “amplo”, acho que devemos de reunir esforços e que ela aconteça. Eu defendo uma Frente Ampla em defesa do Estado de direito, mas eleitoralmente, eu defendo uma frente de esquerda para enfrentar o fascismo nas próximas eleições. A tarefa imediata é colocar Bolsonaro para fora do Palácio do Planalto”.

    O que pensa o PT com a saída do Freixo:

    “A posição oficial do PT no Rio de Janeiro é manter a frente esquerda que eu acho que não acontecerá, que se dava ao nome do Marcelo Freixo, era  o candidato mais viável. O argumento correto não dava pra manter a candidatura por causa da fragmentação da esquerda , não conseguiu unir o PT com outros partidos, assim abandonando a candidatura. Nós não vamos apoiar candidato do PSOL e ponto. Em termos de representatividade na sociedade, me parece que a candidata Benedita preenche bem. Nós vamos continuar a defendendo a frente esquerda, os partidos tem que se sentar e ter maturidade e emergir um nome”.

    Álvaro Quintão, começou a militância política por volta dos 16 anos e sendo eleito para a diretoria do sindicato dos metalúrgicos do Rio de Janeiro com apenas 20 anos.

    Foi filiado ao PT, onde atuou ativamente na década de 80 contribuindo com a construção do PT e participou ativamente das campanhas que levaram Lula à presidência do Brasil.

    Posteriormente, fez faculdade de Direito, e passou a militar na advocacia, sendo eleito presidente do Sindicato dos Advogados do Rio de Janeiro e Conselheiro da Ordem dos Advogados no Rio de Janeiro.

    Atualmente, além da Presidência do Sindicato dos Advogados, exerce o Cargo de Secretário-Geral e Presidente da Comissão dos Direitos Humanos na OAB/RJ.

    Como advogado atua na área Trabalhista, assessora diversos sindicatos, entre estes, o Sindicato dos Trabalhadores da Aviação, visto neste momento de pandemia ser um dos mais afetado.

    Na qualidade de advogado vem participando de várias Negociações Coletivas com base nas normas que estão sendo criadas neste período de pandemia.

    Álvaro Quintão, refere que desde a Lava Jato, o Brasil perdeu toda sua legitimidade, tratando-se de um processo mais político do que jurídico, que acabou por dar a oportunidade do atual governo.

    “A situação que nos encontramos hoje, já não é nova, voltando a 2014/2015, quando a famigerada operação Lava Jato esqueceu de investigar e de julgar de acordo com a constituição e com as leis. Preferiu fazer daquele processo, um processo político, nós já avisávamos que correríamos riscos muito grande, estava abrindo naquele momento a caixa de pandora”.

    E ainda conclui que:

    “Eduardo Cunha que presidia a Câmara Federal, fazendo toda barbaridade para levar o Brasil onde chegou, encontrava esse ego naquela operação, naqueles julgamentos mais político do que jurídico que aconteciam em Curitiba, e isso vem acontecendo. Isto acabou contribuindo para eleição deste presidente, que me recuso a dizer o nome”.

    Como Presidente da Direção dos Direitos Humanos na OAB/RJ, afirma que as minorias são as mais prejudicadas; pobres, negros, mulheres e índios. Instituições preferem não se manifestar. O tempo é de ditadura e o Brasil se tornou o país do espetáculo, garante.

    “Todas chamadas minorias, o que estavam mais fragilizados sentiu na pele esse aumento da violência e da discriminação. O que a gente não vê, são certas instituições que preferem não se manifestar. São trinta e cinco pedidos de impeachment do atual presidente e nenhum destes pedidos, foram sequer analisados. O Brasil tem vivido nos últimos anos um país de espetáculo”.

    E ressalta: Vivemos mais tempos de ditadura do que de democracia.

    “O governo está mais preocupado é em colocar os pobres e negros nas ruas como os moradores de periferias, enquanto a elite econômica, continuam fazendo sua quarentena voluntária em casa. A política econômica na europa, os governos abrem mão do orçamento, o Brasil não tem intenção de investir”.

    Quando se refere a Marcelo Freixo:

    “Existe sim resistência de alguns partidos, um dos candidatos da esquerda que já tinha inclusive, o seu apoio pelo PT resolveu retirar sua candidatura, que foi o Marcelo Freixo, porque tem encontrado em outros partidos resistência nesta frente de esquerda que todos nós sonhamos. Tem que se tirar o chapéu ao PSOL, PT e PCdoB, que tem demonstrado a disposição para se buscar uma unidade de fato dos partidos de esquerda. A esquerda tem sim que buscar um candidato viável para as eleições presidenciais. Trabalhar pela união da esquerda, para construir uma base”.

    VEJA ABAIXO A ENTREVISTA COMPLETA

  • Guaranis em defesa da natureza em SP

    Guaranis em defesa da natureza em SP

    Os Guaranis do Jaraguá (SP) seguem em defesa da natureza e do território, com uma ampla rede de apoiadores.

    INFORMES de 06.fevereiro.2020

    Ontem, por volta das 16h30, a ocupação C.E.Y.TY Yary Ty (Floresta de Cedro) foi surpreendida pela Polícia Militar que veio executar uma ação de reintegração de posse emitido pela juíza, de primeiro grau, Maria Claudia Bedotti. Se apresentaram fortemente armados e determinados expulsar todos os Guarani do terreno, porém não obtiveram êxito na ação, ao chegarem ao local, deram de encontro com membros da FUNAI que visitavam a área e tomaram as devidas providência para evitar uma provável ação truculenta promovida pela Polícia Militar, pela Tenda e pela Juíza.

    Uma comitiva de advogados que acompanha o caso dos Guarani da T.I. Jaraguá, se uniu em força tarefa, entre CGY, CIMI, CTI, OAB, DPU e DPE, emitindo um Agravo de Instrumento a fim de invalidar o documento contra a comunidade. Enquanto a ação de reintegração de posse não cair, a rotina da ocupação segue em estado de alerta, pois a ação pode, ou não, ser executada a qualquer momento. A ocupação se mantém na resistência.

    Para o dia de hoje, o vereador Eduardo Suplicy agendou uma reunião no MPF, com todas as partes envolvidas, estavam presentes: a comitiva indígena, representantes da SVMA, diretores e advogado da Tenda, os vereadores Eduardo Suplicy, Juliana Cardoso, Ana Xocleyn, Soninha Francine e Gilberto Natalini, as advogadas do CIMI e do CTI, representante da FUNAI e o procurador federal Matheus Baraldi Magnani, quem comandou a sessão.

    As alegações e apontamentos apresentados pela diretora da Tenda, Daniela Ferrari, a todo momento caia em contradição, conforme menções abaixo.

    A começar por dizer que, até o momento, não havia oferecido nenhum tipo de acordo ou compensação a comunidade. Informação mentirosa, a comunidade tem, inclusive, gravação da diretora do SIC, em nome da Tenda, oferecendo migalhas para viabilizar a obra sem ter “problemas” com a comunidade, tais como, reforma da escola, patrocínio da equipe de futebol feminino, montar horta comunitária, reforma das casas que pegaram fogo, arrumar ruas no entorno e comprar tenda para venda de artesanatos, nomeando essa tentativa de extorsão de “responsabilidade social”.

    Justifica aos presentes a necessidade da construção do condomínio na região por apresentar, na região, um défict de moradias populares, que os são apartamentos serão do tipo HIS1 e acessível para pessoa que ganham até 03 salários mínimos, podendo financiar pelo programa Minha Casa Minha Vida. Informação duvidosa, o estudo do alvará de construção do condomínio apresenta 525 unidades do tipo HIS1, 267 unidades do tipo HIS2 e 88 tipo HMP.

    Quanto ao manejo, afirmou, que foi efetuado, mas no área desmatada, foram constatadas várias leituras contrárias, técnicos que visitaram o local detectaram colônias de abelhas (algumas delas em extinção) caídas com as árvores, passarinhos caídos do ninho e outros animais silvestres do bioma Mata Atlântica, ou seja, não houve manejo algum tal como não se tratar de área de árvores isoladas, visto a diversidade das espécies arbóreas que foram derrubadas.

    Mentiu também sobre a consulta a CETESB, a qual foi ao visitou o local do acampamento e questionada do motivo pela liberação da obra em tamanho crime ambiental, a mesma esclareceu que, em momento algum, não foi comunicada da execução da obra. Mentiu sobre o contexto da consulta a FUNAI, nas mesmas circunstâncias.

    Enfim, também se pronunciou quanto as intenções de continuar o ataque a Mãe Natureza, os animais e seus recursos, deixando claro que não tem, em absoluto, nenhuma intenção em cancelar o empreendimento, ou negociar a outorga do mesmo, alegando que o terreno está em área ZEIS-2 com licença para supressão de 528 árvores com reposição e plantio de acordo com processo emitido pela Prefeitura de São Paulo e SVMA. Esta é a maior das contradições, uma vez que independente do estabelecido pelo Plano Diretor local, a obra, em condições legais, só deveria entrar em andamento após cumprimento do componente indígena. A consulta e aprovação do desmatamento através da SVMA é indevida, inadequada e ilegal.

    A Tenda teria a obrigação de realizar um licenciamento ambiental supervisionado pelo IBAMA, e estabelecido pela comunidade indígena que está localizada há menos de 08km da construção, como descrito no decreto interministerial 060 de 2015. O órgão regularizador da obra, por lei, deve ser o IBAMA não o SVMA.

    Durante a reunião, a diretora também ofereceu 50% da área ZEPAN (área permanente de proteção ambiental), do terreno para ficar sob tutela da comunidade em condição de compensação pelo empreendimento que pretende construir. A proposta foi terminantemente desaprovada pela comunidade. Não há compensação para o extermínio da comunidade, promoção da violência e tendência de higienização da região através da especulação imobiliária que esta obra representa, qual a compensação de uma ou mais vidas? Qual compensação da comunidade viver acuada pelo cerco de torres de condomínio e perder toda condição de vive sob modo de vida e cultura de seu povo? Qual a compensação pela supressão de centenas de árvores nativas, ou não, e pela morte de diversos animais silvestres? Qual a compensação para o extermínio da natureza? Como mensurar tamanha fatalidade?

    A Tenda foi judicializada pelo MPF, para apresentar a devida autorização do manejo arbóreo executado. A Funai exigiu da Tenda apresentação da documentação do empreendimento.

    O MPF informou que irá acionar o IBAMA, cedendo um ofício a fim de desmunicipalizar o manejo arbóreo da obra e dar andamento ao componente indígena, e este então analisar se vai ou não dar encaminhamento a obra.

     

     

    Os Guaranis já estão replantando a mata

    A comunidade determinou que manterá a ocupação por tempo indeterminado, até o cumprimento das suas exigências que compreendem na criação de um parque ecológico e memorial cultura Guarani [este foi prometido pelo Prefeito Bruno Covas que se comprometeu em concretizar esse projeto a comunidade indígena do Jaraguá, para usufruto público e com gestão compartilhada, deixando intacta a área ainda não desmatada pela Tenda e recuperando a área que foi afetada, como a ação de plantio de 200 mudas de espécies da Mata Atlântica feito durante esses dias de ocupação.

    A luta dos Guaranis do Jaraguá vem de muito tempo [+ em]:

    Carta para o Prefeito Bruno Covas dos Guaranis do Jaraguá

     

    Uma conversa com Karai Popygua (David), liderança indígena Guarani

     

    Em ato simbólico, Guaranis encenam a “cura” dos colonizadores

     

     

     

  • As instituições estão resistindo ao fascismo

    As instituições estão resistindo ao fascismo

    ARTIGO

    RODRIGO PEREZ OLIVEIRA, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia

     

    Não é de hoje que as instituições brasileiras estão sendo testadas, pois é exatamente isso que significa uma crise institucional: um momento em que as instituições estabelecidas são constantemente desafiadas.Neste ensaio, quero analisar como as instituições democráticas estão reagindo aos desafios.

    O comportamento das instituições não é linear e pode ser dividido em dois momentos.

    1°) Do mensalão, em 2005, até o fim do governo de Michel Temer, em 2018.

    Nesse momento, as instituições foram permissivas, omissas, se deixando sequestrar pelo projeto político que vinha sendo sistematicamente rejeitado nas urnas.

    Inconformado com sucesso eleitoral do petismo, o establishment político brasileiro manipulou os ritos democráticos para confrontar o modelo de Estado redistributivo que começou a ser implementado em janeiro de 2003.

    É isso, leitor e leitora. A história recente do Brasil pode ser resumida dessa forma: a disputa pelo controle das riquezas produzidas pelo Estado. De um lado, o petismo com sua agenda redistributiva. Do outro lado, o financismo, com sua agenda neoliberal. Por um tempo, Lula conseguiu conciliar os dois projetos. Não é possível conciliar por muito tempo interesses tão opostos.

    A narrativa do combate à corrupção foi apenas nuvem de fumaça. O que interessava mesmo à coligação antipetista era desestabilizar o adversário por dentro das instituições. O primeiro movimento aconteceu em 2005, com a ação penal 470. O petismo sobreviveu. A coligação antipetista não recolheu as armas. Onze anos depois, Dilma seria golpeada, justamente por se negar a entregar o Estado ao controle dos financistas.

    Juízes e procuradores enriqueceram-se com palestras, se tornaram famosos, tiveram retratos estampados em capa de revista. Enquanto isso, a democracia ia adoecendo pouco a pouco. As democracias não morrem do dia pra noite. Leva tempo.

    OAB, Ministério Público, STF: os que juraram defender a democracia foram omissos. Todos fecharam os olhos para os crimes de Curitiba. Os operadores da Lava Jato não teriam chegado tão longe sem a leniência de seus superiores. Deltan Dallagnol jamais lideraria investigação clandestina contra ministro do STF se a própria suprema corte não tivesse sido conivente.

    A cumplicidade custou caro.

    2°) O governo de Jair Bolsonaro (Janeiro-agosto de 2019).

    A eleição de Bolsonaro foi a consequência inesperada do caos institucional. Tolos foram aqueles que acreditaram ser possível controlar o caos. Controlar o caos é uma contradição em termos.

    Todos os dias, Bolsonaro violenta as instituições democráticas.

    Sempre que defende abertamente o nepotismo, quando faz piada com a cabeça dos nordestinos e com o pinto dos japoneses, Bolsonaro está implodindo a liturgia que é fundamental para o exercício do cargo que ocupa. Quando, sem nenhum constrangimento, o presidente da República se comporta como um homem comum, a instituição Presidência da República é atacada.

    O presidente da República não pode se comportar como um homem comum pelo simples fato de que ele não é um homem comum. Não pode ser. Jamais!

    Ao defender abertamente a tortura, Bolsonaro viola tratados internacionais de defesa dos direitos humanos dos quais o Brasil é signatário. Quando persegue os órgãos de defesa do meio-ambiente, Bolsonaro quebra acordos internacionais que o Brasil, soberanamente, assumiu.

    Quando tenta governar por decretos e quando discrimina os Estados do Nordeste, Bolsonaro rejeita a legitimidade de senadores, deputados e governadores, todos democraticamente eleitos.

    Bolsonaro é o presidente da República que não tem o menor compromisso com a República. É uma ameaça ao convívio democrático. É a fenda autoritária que, durante 30 anos, a democracia decidiu tolerar. Talvez a democracia brasileira tenha superestimado sua própria força.

    As instituições entenderam o risco e reagiram. Se hoje o Brasil ainda não foi plenamente tomado pelo fascismo é porque as instituições estão resistindo, estão cumprindo seu papel.

    Os exemplos são muitos. Destaco apenas alguns: o Senado rejeitou o decreto de armas, o STF manteve a demarcação das terras indígenas sob o controle da FUNAI. A Câmara dos Deputados, na voz de Rodrigo Maia, defendeu a liberdade de imprensa ao se manifestar em favor de Glenn Greenwald. A OAB recomendou o afastamento de Sérgio Moro do Ministério da Justiça. O MP impediu que Bolsonaro nomeasse um negacionista para a comissão da verdade.

    Parte da esquerda acredita que as instituições estão rendidas ao fascismo e que, por isso, toda e qualquer atuação institucional seria inútil. Esses companheiros e companheiras olham para a realidade e enxergam uma sociedade civil mobilizada, à espera do chamado de sindicados e partidos políticos.

    O diagnóstico está equivocado: a sociedade civil ainda não está disposta a derrubar o fascismo nas ruas. Parte da sociedade civil apoia o fascismo. Outra parte observa com indiferença o avanço da marcha fascista, como se isso fosse problema menor quando comparado ao desemprego e à crise econômica.

    As instituições não estão indiferentes, não estão rendidas ao fascismo. Estão resistindo e, por enquanto, estão vencendo.

    O fascismo, que sempre é popular e mobilizador, coloca a democracia diante de uma contradição. Em tempos de fascismo, o povo é a principal ameaça à democracia.

    Somente através das instituições é possível que a democracia sobreviva aos ataques do povo, enfrentando o povo, mostrando que, sim, é proibido ser fascista. As instituições são a última esperança.

  • BOLSONARO COM DOSES DE PSICOPATIA

    BOLSONARO COM DOSES DE PSICOPATIA

    ARTIGO

    Alexandre Santos de Moraes, professor do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense

    Para que ninguém duvide de seu caráter, Jair Bolsonaro mantém a ofensiva e segue disseminando ódio. O alvo dessa vez foi Felipe Santa Cruz, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Seu pai, Fernando Santa Cruz, foi exterminado pelos militares durante a vigência do golpe militar de 1964. O presidente fez uma declaração em uma resposta aos posicionamentos da OAB diante do processo de Adélio Bispo, o sujeito com transtornos psiquiátricos que esfaqueou o então candidato na cidade de Juiz de Fora (MG) em setembro de 2018. A OAB nada mais fez do que defender que fosse assegurado o sigilo das conversas entre os advogados e o réu. Trata-se de uma prerrogativa constitucional que segue desagradando Bolsonaro, um político notabilizado pelo desapreço às leis que jurou defender.

    Esse foi o estopim para que o presidente da República atacasse Felipe Santa Cruz. No entanto, não foi uma crítica inocente, própria do jogo democrático, ou mesmo a defesa do governo diante de um admitido opositor. O teor do ataque foi absolutamente incondizente com o cargo que Bolsonaro ocupa, e ainda que sua verborragia desenfreada não seja uma novidade, diversos setores das esquerdas e mesmo das direitas reagiram duramente ao palavrório. Até mesmo o governador de São Paulo, João Dória (PSDB), que literalmente vestiu a camisa do atual presidente durante a campanha, decidiu fazer de conta que nunca se envolveu com o candidato que ele ajudou a eleger.

    Em carta, Lula considerou se tratar de um “caráter covarde”. O deputado Helder Salomão (PT-ES) caracterizou o discurso como “antidemocrático, desumano e sádico”. Felipe Santa Cruz sinalizou em nota a “crueldade” e “falta de empatia”. Penso que todos estão corretos, mas se acompanharmos com cuidado a declaração, considero que há pitadas nada desprezíveis de psicopatia, o que faz da permanência de Jair no mais alto cargo do Executivo algo cada vez mais insustentável. Vamos às falas.

    A primeira manifestação aconteceu em uma entrevista no dia 29 de julho. Para provocar Felipe Santa Cruz, e sem qualquer contexto que justificasse esse estratagema, Bolsonaro recordou a morte de Fernando Santa Cruz numa cínica postura de denunciante: “Se um dia o presidente da OAB quiser saber como seu pai desapareceu no período militar, eu conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade”. De início, Bolsonaro sugere conhecer uma informação sigilosa, como se tivesse gozado de acesso a privilegiado a um dado que seria desconhecido pelo público e que se dispunha a compartilhar com um dos maiores interessados no tema. O cinismo se disfarça de filantropia, como um assassino que se faz amigo para se aproximar da vítima e desferir o golpe fatal. Logo em seguida, na mesma entrevista, diz não se tratar de sua versão e alega: “A minha vivência me fez chegar a essas conclusões”.

    Há aí uma contradição deflagrada: se ele chegou, através das próprias vivências, a essas conclusões, trata-se obviamente de uma versão particular. Nas horas subsequentes à declaração, todos desconheciam o que Bolsonaro supostamente sabia a respeito do fato. Teve início a pressão. O que se sabe, que é público e documentado, é que Fernando Santa Cruz militava na Ação Popular Marxista-Leninista (APML) e foi capturado no Rio de Janeiro pelas Forças Armadas em 22 de fevereiro de 1974. Tinha 26 anos, era funcionário público, casado, pai e estudava Direito na Universidade Federal Fluminense (UFF). Essa informação consta no relatório secreto RPB 655, que se fez conhecido através da Comissão Nacional da Verdade, que também ouviu Cláudio Guerra, ex-delegado que declarou que Fernando Santa Cruz foi morto na prisão e que teve seu corpo incinerado na Usina Cambahyba, em Campos (RJ).

    Na época da prisão de Fernando Santa Cruz, Bolsonaro estava no início de sua carreira militar, pois foi aprovado para a Academia Militar das Agulhas Negras no final de 1973. Não era, portanto, nem mesmo aspirante a oficial. O atual presidente se formou apenas em 1977. Logo em seguida, integrou a Brigada de Infantaria Paraquedista e, em 1979, saiu do Rio de Janeiro para servir no Mato Grosso do Sul, onde permaneceu até 1981. Como é amplamente noticiado, sua carreira militar foi marcada por vários atropelos. Os superiores consideravam-no excessivamente ambicioso. O coronel Carlos Alfredo Pellegrino, como mostram documentos, além de destacar sua agressividade com os camaradas, o via como marcado pela falta de lógica, racionalidade e equilíbrio na apresentação de argumentos. Foi para a reserva aos 33 anos de idade.

    É preciso ter tudo isso em mente para não esquecer que Bolsonaro foi um pária durante o período em que serviu ao Exército. Para ter informações seguras sobre Fernando Santa Cruz, era necessário integrar os círculos restritos do DOI-CODI ou de qualquer outro serviço secreto. Mesmo que tenha tido acesso a pessoas envolvidas no sequestro do militante da APML, é improvável que essas informações circulassem em conversas cotidianas no interior das casernas. Também é necessário considerar que Bolsonaro, visto como um sujeito agressivo e irracional, não devia ser alguém que estimulava confidências de pessoas envolvidas em atos ilícitos que os militares se esforçavam para esconder. Logo que a declaração foi feita, considerei que Bolsonaro pudesse ter tido acesso a esses dados apenas recentemente, fornecidos por oficiais que participam do governo. Era improvável, mas não impossível.

    No dia seguinte, porém, a ignorância a respeito do desaparecimento de Fernando Santa Cruz se confirmou em uma gravação ao vivo que fez no Facebook. Pressionado, decidiu retomar o assunto, mas não sem outra pitada de psicopatia: decidiu fazê-lo durante um corte de cabelo, como se seu tempo fosse precioso demais para dedicar atenção exclusiva. Foi um símbolo de desprezo, de ausência absoluta de compaixão pelas vítimas da ditadura. Com um tom de voz despretensioso, resolveu revelar o suposto segredo que guardava. Inicia sua fala dizendo que Fernando Santa Cruz integrava a AP de Recife quando veio para o Rio de Janeiro. Nesse momento, lança uma pergunta retórica imediatamente respondida: “Onde obtive essas informações? Com quem conversei na época, ora bolas, tá!”.

    É preciso insistir: à época da prisão, Bolsonaro estava no primeiro ou no segundo mês de formação militar na Academia das Agulhas Negras, e não na “fronteira” onde só mais tarde veio a servir. Gaguejando, buscando alguma resposta plausível, Bolsonaro diz que houve um desacordo (não se sabe qual) e a AP do Rio de Janeiro teria decido “sumir” com o militante, e insiste: “Essa é a informação que tive na época”, para reforçar a ladainha de que é “muito fácil culpar os militares”.

    A gravação ao vivo tornou o discurso ainda pior, mas não apenas pelo esforço inútil de tentar desonerar os militares de responsabilidade, baboseira que não convence mais ninguém. Para saber de fonte fidedigna que Santa Cruz teria sido morto pelos próprios companheiros da AP, das duas, uma: ou ele conhecia intimamente a organização de esquerda ou teve acesso a quem participou do inquérito militar (supondo que ele tenha existido) que chegou a essa conclusão.

    Mesmo em seu mundo de fantasia, que contradiz as informações que constam nos documentos outrora sigilosos da Marinha e da Aeronáutica, a hipótese de que um segredo de caserna foi confiada a um recém-ingressante nas Forças Armadas é indigna até mesmo do mais grosseiro conto da carochinha. Ainda assim, como mau mentiroso, nota-se que Bolsonaro mudou o discurso sobre como tomou conhecimento: no dia 29, atribuiu às conclusões tiradas a partir de sua própria vivência; no dia 30, disse ter recebido informações à época. Mentiu uma, mentiu duas, mentiu três vezes. Mentiu compulsivamente.

    Bolsonaro não tem a menor ideia do que se passou com Fernando Santa Cruz. Disso não tenho provas, é claro, apenas convicções, mas tudo indica que foi uma peça retórica fabricada para difamar a esquerda e atacar o presidente da OAB. A ignorância a respeito dos fatos torna a declaração ainda mais grave, pois a reveste de pitadas generosas de psicopatia. Ela mostra que o presidente da República não possui qualquer limite quando o assunto é atacar desafetos. Mente criminosamente e não se constrange nem mesmo em tentar dissimular a própria mentira. Decide, de forma meditada ou não, produzir uma ficção a respeito da morte de um jovem estudante que gerou danos irreparáveis em uma família.

    Obviamente, não há aqui espaço para qualquer surpresa, e só os muito desavisados consideram essa atitude incompatível com seu histórico pessoal. No entanto, ela confirma o que parece circular nos corredores da Câmara dos Deputados: Bolsonaro não tem condições de ser presidente. Como bêbado que não pode dirigir, Jair não pode governar. Impeachment é pouco, é um caso de interdição.

  • OAB requer admissão no inquérito da Operação Spoofing e pede medida cautelar para impedir destruição de provas

    OAB requer admissão no inquérito da Operação Spoofing e pede medida cautelar para impedir destruição de provas

    Comunicado da OAB, nesta sexta-feira, após Sérgio Moro dizer a autoridades que os diálogos encontrados com os supostos hackers seriam destruídos.
    sexta-feira, 26 de julho de 2019 às 18h10

    O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil requereu hoje (26), ao juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª. Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Distrito Federal, sua admissão como assistente no inquérito da Operação Spoofing, instalado para apurar os ataques nas contas de Telegram de diversas autoridades. O objetivo, segundo a Ordem, é “postular a adoção de todas as medidas necessárias para a proteção da cadeia de custódia das informações e para garantia de amplo acesso dos advogados aos elementos e prova”.

    Na petição, a OAB também requer que “sejam expedidas ordens judiciais para que as autoridades policiais, o Exmo. Ministro da Justiça e os demais interessados nas investigações se abstenham da tomada de quaisquer medidas que possam levar ao comprometimento da integridade do material probatório coligido na Operação Spoofing.”

    Nas justificativas, a Ordem lembra que o Ministro da Justiça Sérgio Moro teria informado a autoridades também atingidas pela invasão que o material capturado pelo suposto grupo de hackers seria destruído, sob argumento de preservação da identidade das vítimas – fato que teria sido confirmado pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro João Otávio Noronha, como amplamente divulgado pela imprensa. E aponta a impropriedade de tal intromissão:

    “Qualquer intromissão do Ministro da Justiça é manifestamente imprópria diante da exclusiva competência do Poder Judiciário para decidir sobre o destino dos materiais coletados, mormente em procedimento investigativo que corre em segredo de justiça. É certo que, se o inquérito é mantido sob sigilo, não cabe ao Ministro da Justiça ter acesso aos dados, quanto menos interferir na sua utilização e destino.

    Por fim, a indicação do Ministro da Justiça de destruição dos elementos de prova também parece atentar contra a competência do Supremo Tribunal Federal, que pode eventualmente ser chamado a apreciar os fatos, uma vez que há possíveis autoridades atingidas pela invasão sujeitas a prerrogativa de foro, como no caso de ministro do Superior Tribunal de Justiça.

    Trata-se, portanto, de inaceitável intromissão de órgão do Poder Executivo na esfera de competência do Poder Judiciário, em direta afronta à administração da justiça e ao pleno exercício do direito de defesa. Não é demais lembrar que a preservação da autoridade do Poder Judiciário constitui exigência do postulado do Estado de Direito, que não sobrevive sem a garantia de independência e autonomia judicial no exercício de suas funções precípuas.”

  • 26 de JUNHO: Dia Internacional de Luta Contra a Tortura

    26 de JUNHO: Dia Internacional de Luta Contra a Tortura

    “A tortura é uma invenção maravilhosa e absolutamente segura para causar a perda de um inocente.”

    Jean de la Bruyere

     

    Este mês foi marcado por uma questão gravíssima, a questão da tortura e dos direitos humanos. O Governo Federal, através de um decreto da Presidência da República [1], descomissionou todos os peritos encarregados da avaliação das condições dos presídios e das torturas que lá ocorrem. O descomissionamento desses peritos nacionais equivale a uma ruptura com o Protocolo de Istambul [2], um protocolo da ONU, do qual o Brasil é signatário, que data de 2001.

     

    Pois bem, ao descomissionar, ao encerrar o mandato dos peritos nacionais, dos nove peritos nacionais, o Brasil se coloca em condições de países que estão totalmente à margem da lei internacional.

     

    As averiguações das condições dos presídios, das delegacias, dos manicômios, das instituições asilares, das casas transitórias e das fundações para menores, são preceitos fundamentais de um processo civilizatório. A dificuldade com que as audiências de custódia têm sido realizadas, principalmente com essa orientação do Governo do Estado de São Paulo, que alega não ter os recursos necessários para escolta, para que os presos possam fazer o seu primeiro depoimento na frente de um juiz, de forma presencial, alegando a desnecessidade desse procedimento básico, fazendo isso dentro do presídio, à distância, via internet, medida essa que está sendo adotada em todo o território nacional, põe em risco a Democracia [3].

     

    O projeto de lei, de 2014 [4], de minha autoria, criando o mecanismo de prevenção à tortura no Estado de São Paulo, com a nomeação dos peritos, foi vetado pelo Sr. Governador. O Dr. José Carlos Dias [5] escreveu um artigo fortíssimo na Folha de São Paulo [6], rejeitando o veto, dando parecer contra o veto do Sr. Governador nos seus primeiros dias de governo. Não bastasse tudo isso, a situação irregular e a superpopulação carcerária, a situação irregular dos presos, sem o devido processo, tumultua a vida nos presídios.

     

    [Por exemplo] a chacina de Manaus, com grande número de mortos, a rebelião no Ceará, com grande número de mortos, presídios estes controlados por forças radicais aliadas ao crime, com execuções, com “julgamentos”… A situação das mulheres é uma das coisas mais aviltantes, mais desumanas, principalmente a situação das mulheres estrangeiras, sem o domínio do [idioma] Português e sem qualquer formalização do processo, as chamadas “mulas”, principalmente no Estado de São Paulo, onde se acumulam senhoras, que não dominam nem o idioma europeu de origem de seus países, falam dialetos… Apesar de organizações como o ITCC [7], da Irmã Michael [8], que procura dar o mínimo de assistência jurídica e legalidade a essas pessoas encarceradas, em condições desumanas.

    A interpretação da lei, transformando pequenos usuários em traficantes, aumentou sobremaneira a população carcerária e essa mistura de jovens – com passagens bem tênues – com pessoas condenadas a penas muito elevadas, só faz dos presídios a pior escola do crime. Esta situação de barbárie não tem condições de perdurar.

    A ruptura com o Protocolo de Istambul, que é um documento que o Brasil é signatário desde 2001, coloca nosso país em situação comparável aos países mais atrasados do mundo. Esta hostilização permanente às Nações Unidas e suas deliberações e aos protocolos de fóruns internacionais, vai nos isolando no cenário mundial.

     

    É de dentro deste quadro, agradecendo a retomada do processo democrático pela OAB Nacional, pelas OABs Estaduais, por todas as suas subseções, em particular esta de Salto, a que me refiro agora, [que digo] que um dos eixos da OAB do Estado de São Paulo é exatamente a garantia e a inviolabilidade da audiência de custódia. É sobre isso que queria me manifestar e dizer que dia 26 é O dia internacional, mundial, do combate à tortura.

     

    A tortura é a forma mais abjeta de dominação entre os seres humanos. Está entre os pilares do Cristianismo. O Cristianismo adotou a cruz como símbolo de seu processo civilizatório entendendo que a cruz é o símbolo da tortura. A cruz está para o Cristianismo, assim como o pau-de-arara está para o povo brasileiro, seja na escravidão ou seja nos períodos atuais de ruptura de tais protocolos.

     


    NOTA DA COMISSÃO CDH(*):

    Prosseguindo em nosso projeto de evidenciar personalidades públicas em seu lugar de fala, a Comissão entrevistou Adriano Diogo, geólogo sanitarista uspiano, que teve trajetória reconhecida no país todo por sua militância pela democracia e direitos humanos, história essa que atingiu seu auge com a presidência, de 2012 a 2015, da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” (criada pela Resolução ALESP n. 879, de 10 de fevereiro de 2012).

    Na entrevista, foi concedido o tema livre, vinculado apenas aos mecanismos do Direito e pautando-se pela data estabelecida pela ONU, em resolução de 12 de dezembro de 1997, como dia internacional das Nações Unidas em apoio às vítimas da tortura e com vistas à erradicação total da tortura e à aplicação efetiva da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes, que entrou em vigor em 26 de junho de 1987.

    O tema é pertinente ao exercício da advocacia, tanto pelo viés constitucionalista quanto penalista, especialmente em face das inseguranças práticas na aplicação da Resolução nº 213/15 do CNJ (audiências de custódia) e Lei de Execuções Penais.

    Contudo, as opiniões pessoais emitidas pelo entrevistado não se confundem com as opiniões desta Comissão entrevistadora ou da própria Ordem.

     


    BIOGRAFIA:

    ADRIANO DIOGO é geólogo sanitarista e político. Iniciou sua militância pela democracia e pelos direitos humanos nos anos 1960, participando do movimento secundarista e das lutas do movimento estudantil contra o regime (Ocupação da Maria Antônia; Congresso da UNE em Ibiúna; Greve de Osasco em 1968). Em 1969, ingressou na USP, participando da resistência estudantil principalmente nos movimentos culturais, com o método do Teatro Jornal. Foi preso em 1973 e torturado no DOI-Codi de São Paulo, na mesma época em que foi morto sob tortura seu colega da Geologia Alexandre Vannucchi Leme. Em 1978 e 1979, militou na campanha pela Anistia. Participou da criação do Partido dos Trabalhadores e entre 1982 e 1984, atuou em na campanha pelas Diretas. Foi assessor parlamentar na Câmara dos Vereadores em São Paulo. Exerceu quatro mandatos de Vereador da cidade de São Paulo (1989-2003), ocupando-se especialmente das áreas do meio ambiente, da saúde pública (especialmente na luta antimanicomial), educação, moradia popular e das regiões periféricas. Foi eleito deputado estadual em 2002, licenciando-se da ALESP para exercer cargo de Secretário do Verde e do Meio-Ambiente na Prefeitura do Município de São Paulo (2003-2004). Exerceu dosi mandatos como Deputado Estadual (2007-2014). Foi membro da Comissão de Direitos Humanos da ALESP e presidiu, de 2012 a 2015, a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” (). Atualmente é Secretário dos Direitos Humanos do Partido dos Trabalhadores.

     


    (*) Entrevista concedida à Comissão de Direitos Humanos de Salto, Subseção da OAB São Paulo (SP).

    REFERÊNCIAS:

    [1] DECRETO Nº 9.831, DE 10 DE JUNHO DE 2019 – “Altera o Decreto nº 9.673, de 2 de janeiro de 2019, que aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, e o Decreto nº 8.154, de 16 de dezembro de 2013, que regulamenta o funcionamento do Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, a composição e o funcionamento do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, dispõe sobre o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura; e remaneja cargos em comissão”: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Decreto/D9831.htm
    [2] O Manual de Investigação e Documentação Efetiva sobre Tortura, Castigos e Tratamentos Cruéis, Desumanos e Degradantes, mais conhecido como o Protocolo de Istambul, é o primeiro conjunto de normas internacionais para documentar a tortura e suas consequências. Foi adotado pelo Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos em 2000. O Protocolo de Istambul foi criado por mais de 75 especialistas em direito, saúde e direitos humanos durante três anos de esforço coletivo e envolve mais de 40 organizações diferentes, incluindo o Conselho Internacional para a Reabilitação de Vítimas de Tortura. O extenso trabalho foi iniciado e coordenado pela Comissão de Direitos Humanos da Turquia (Fundação de Direitos Humanos da Turquia – HRFT) e pela organização Médicos pelos Direitos Humanos dos Estados Unidos (Médicos pelos Direitos Humanos – PHR EUA).
    Sua finalidade é servir como um guia internacional para a avaliação de pessoas que foram torturadas, a fim de investigar casos de possível tortura e relatar os resultados para as agências de justiça ou de investigação.
    Sua aplicação é prevista na Recomendação nº 49/14 e na Resolução nº 213/15, ambas do CNJ, e na Resolução nº 2.217/18 (Código de Ética Médica), do CFM, em conjunto com o Protocolo Brasileiro de Perícia Forense, de 2003.
    [3] “Moro quer ampliar uso de videoconferências em audiências de custódia”, artigo de Laís Lis, publicado no g1-Globo em 09/01/2019: https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/01/09/moro-quer-ampliar-uso-de-videoconferencias-em-audiencias-de-custodia-e-de-tornozeleiras.ghtml
    [4] PROJETO DE LEI 1257/14, da ALESP – “Institui o Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura e o Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura no Estado”: https://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=1223577
    [5] José Carlos Dias é advogado criminalista, ex-Secretário de Justiça do Estado de São Paulo (1983-1987), ex-Ministro da Justiça (1999-2000) e ex-coordenador da Comissão Nacional da Verdade (agosto a novembro de 2013). Durante a ditadura militar, tornou-se conhecido como defensor de presos políticos, atuando diretamente na Justiça Militar.
    [6] “Sem Desculpas, Governador”, artigo do Dr. José Carlos Dias, publicado na FSP em 14/02/2019: https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2019/02/sem-desculpas-governador.shtml
    [7] O Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) é uma organização de Direitos Humanos fundada em 1997, cuja visão é “erradicar a desigualdade de gênero, garantir direitos e combater o encarceramento”: http://ittc.org.br/nossa-historia/
    [8] Michael Mary Nolan, presidenta do ITCC, é advogada, coordenadora da Congregação das Irmãs de Santa Cruz, assessora das Pastorais Sociais e assessora jurídica do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e da Equipe de Articulação e Assessoria às Comunidades Negras (EAACONE). Em 2004 recebeu doutorado honorário de Saint Mary’s College, Notre Dame, Indiana por seu trabalho em direitos humanos.