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  • CLIMÃO: “Docente pela Liberdade” da UFMT censura debate

    CLIMÃO: “Docente pela Liberdade” da UFMT censura debate

    Uma docente da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), integrante do recém-nascido Docentes Pela Liberdade (DPL), causou um verdadeiro “climão” num debate sobre aquecimento global realizado na instituição na semana passada. Dois professores pesquisadores foram expulsos da palestra do climatologista e professor da Universidade de São Paulo (USP), Ricardo Felício, simplesmente porque demonstraram interesse em fazer perguntas ao final do evento. Os docentes expulsos destacaram que Felício faz parte de uma minoria científica chamada “negacionistas climáticos”. Notadamente financiados por grandes grupos econômicos, esses pesquisadores ganham muito dinheiro para contrapor a grande maioria de cientistas, que alerta para as transformações climáticas causadas pela exploração desenfreada do meio ambiente pelos seres humanos.

    “Fomos muito bem recebidos na entrada, falaram que não havia nenhuma restrição, podíamos entrar sem fazer a inscrição, sem assinar a lista. Então nós entramos e ficamos tranquilos, ouvindo a palestra, como em todo evento acadêmico que a gente vai. Em determinado momento, nós perguntamos para uma menina da organização se haveria espaço para perguntas, e ela respondeu que sim. Em questão de minutos veio essa professora, já com tom repreensivo, dizendo que não haveria espaço para perguntas, que seriam apenas três, destinadas a estudantes dos cursos de Zootecnia, Agronomia e Veterinária. Eu disse que era estudante do doutorado, mas ela se estressou, disse que não e perguntou se nós queríamos conversar com ela fora do evento”, contou um dos professores, egresso do doutorado em Ecologia e Conservação da Biodiversidade da UFMT.

    Um dos professores ignorou o ato repressivo e continuou assistindo a palestra, que, embora tenha sido anunciada como uma atividade da Semana de Agronomia da UFMT, constava também como parte da programação do Circuito Universitário promovido pela Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) entre os dias 14 e 31/10. Pelo sexto ano seguido, a associação realiza o evento em inúmeras instituições de ensino superior. Este ano, o circuito, denominado “Aquecimento Global: mito ou realidade?” foi realizado em Diamantino, Nova Xavantina, Cuiabá, Várzea Grande e Campo Novo do Parecis e, na próxima semana, deverá ser apresentado também a futuros profissionais em Sinop, Lucas do Rio Verde, Nova Mutum e Tangará da Serra.

    “Meu colega ficou no auditório, mas eu pensei um pouco e aceitei sair para conversar com a professora. Lá fora ela ficou ainda mais alterada, disse que estávamos tumultuando o evento. Eu respondi que nós estávamos numa universidade pública, e ela disse que a universidade é pública, mas nada é de graça, que ‘eles’ estavam pagando. Essa discussão durou entre cinco ou dez minutos. Mas como eu estava com meu filho, fiquei preocupado, peguei ele lá dentro e fui embora”, explicou o pesquisador censurado.

    O colega, no entanto, permaneceu no evento, mas o “climão” estava instalado. “Nós fomos rechaçados pela organizadora principal da palestra, que é professora da Agronomia. Ela disse ‘aqui não terá debate, vocês não farão polêmica. Apenas estudantes da Agronomia, Zootecnia e Veterinária poderão fazer perguntas’. Eu ignorei, mas ela saiu e foi conversar com o meu colega. Quando a exposição do Felício acabou eu fui tentar dialogar com a coordenação, mas fui barrado na sala da organização por estudantes da Agronomia, que disseram que a professora estava ocupada. Aí retornei ao espaço para assistir às perguntas feitas pelos estudantes. Nesse momento eu ouvi várias pessoas da organização falando para chamarem a segurança e apontando para mim. Foi um conhecido da Aprosoja que impediu que isso fosse feito, porque ele nós trabalhamos em outras atividades no Ministério Público”, afirmou o segundo professor censurado.

    Irresponsabilidade acadêmica

    “Ricardo Felício tem uma dialética boa, mas o currículo não é bom. Por exemplo, ele usa um mapa interessante desenvolvido por um Laboratório da NASA, mas pegando apenas uma parte, o espaço que mostra a variação da quantidade de carbono na atmosfera. Esquece de incluir – esquece, entre aspas – o final do gráfico, a parte dos últimos anos, em que há um aumento abrupto da temperatura. É o finalzinho, só os últimos anos, mas ele não usa esse finalzinho do gráfico. Ele utiliza meios argumentos, não expõe toda a opinião da comunidade científica que está disponível em milhares de publicações”, afirmou um dos professores.

    Para a comunidade acadêmica, a abordagem científica de Felício representa, antes de tudo, um risco. “Existem dados reais do Paleoclima [estudos e reconstituições do clima num determinado período da pré-história] que falam de temperatura mais altas do que as que enfrentamos hoje. Mas há várias contra argumentações. Não que a gente quisesse fazer todas elas na palestra, mas é muita irresponsabilidade dele vir aqui dizer que não precisa haver nenhuma preocupação por parte do setor produtivo, porque o clima vai esfriar. Nós filmamos o final da palestra. Ele diz ‘podem ficar tranquilos, vai esfriar’. Isso é uma irresponsabilidade acadêmica muito grande, porque não existe essa tranquilidade por parte da maioria da comunidade científica. Até porque, se a grande maioria que alerta para a questão climática estiver errada, não vai acontecer nada. Nós seremos, no máximo, mais eficientes na produção de alimentos, no uso de fontes energéticas. Mas e se ele estiver errado? Vai ser o caos! Isso é uma irresponsabilidade acadêmica, e esse é o ponto mais importante”, alertou o professor.

    Há várias contra argumentações da comunidade científica às teorias utilizadas pelos negacionistas climáticos, não só nas revistas especializadas, mas também em outros dispositivos da web.  O professor titular da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Alexandre Araújo Costa, por exemplo, doutor em Ciências Atmosféricas, fez uma série de vídeos no youtube respondendo ponto por ponto dos argumentos do Ricardo Felício. Clique aqui para assistir.

    Que liberdade querem os “Docentes pela Liberdade”?

    O conceito de liberdade é uma disputa política histórica. O fato é conhecido e discutido em diversos espaços, especialmente nas universidades, instituições que têm o objetivo de observar, antes de tudo, as relações sociais cotidianas. A questão é: “liberdade” não se materializa automaticamente quando alguém reivindica a palavra. Para que ela exista, de fato, é preciso diferenciar a aparência da essência, a teoria e a prática. E é preciso qualificar o que significa liberdade.

    Para os liberais, a liberdade sempre foi um problema, a partir do argumento de que muita liberdade pode provocar “instabilidades no sistema”. Por isso, a necessidade do controle, da censura, de limitar a liberdade principalmente de participação nos espaços políticos. Por isso o medo da educação, das universidades públicas, dos movimentos organizados de estudantes e trabalhadores que, ao contrário, priorizam os debates, a contraposição de ideias, os direitos sociais, o coletivo, o bem estar de todos e não apenas o individual.

    Os professores expulsos do evento sobre clima destacaram outras atitudes semelhantes de membros do DPL. “Um aluna residente do Hospital Veterinário está processando uma professora por agressão, saiu na imprensa. O nome não foi divulgado, mas todos sabem que a professora também é do DPL. Um outro professor conservador, que gosta de discutir crise moral e falência ética, é conhecido na universidade pelo perfil autoritário, chega a ser hipócrita. Ou seja, já são três docentes de um grupo minúsculo com esse perfil. Eu jamais iria a esse espaço fazer polêmica. Nós queríamos qualificar o debate, principalmente porque o público que estava lá será de grande importância como força intelectual-técnica da produção agrícola do Brasil nos próximos anos. Os questionamentos seriam mais dirigidos ao senso crítico do público. Que o Ricardo Felício trabalha para o grande capital nós já sabemos, mas nós achamos que é possível atrair jovens para um pensamento de sustentabilidade e preocupação com os limites ecossistêmicos em espaços como esses”, afirmou o segundo professor.

    O caso, que parece isolado, ressaltou uma discussão acerca do perfil dos conservadores de direita que integram o DPL. Os docentes pela liberdade defendem uma liberdade parcial, restrita. Uma liberdade de mercado, reservada a indivíduos que podem pagar ou comprar o que querem. Assim, questionamentos, pontos de vistas diferenciados, pensar o coletivo antes do individual são perspectivas que não cabem.

    Em julho deste ano alguns, quando o DPL foi lançado em Mato Grosso, alguns membros do grupo apareceram na foto oficial posicionando as mãos como se fossem armas. A apologia à violência gerou mais polêmica do que o anúncio da associação em si, pois os grupos liberais conservadores de direita mobilizam não só cursos e pesquisas com sua perspectiva ideológica, mas até grupos cristãos de orações dentro da universidade – que, em tese, é laica.

     

    Por: Assessoria de Imprensa da Adufmat-Ssind

     

    Matéria original em: https://www.adufmat.org.br/portal/index.php/comunicacao/noticias/item/4203-climao-docente-pela-liberdade-censura-debate-sobre-aquecimento-global-na-ufmt?fbclid=IwAR0DPigwsJyMo-tw_q6YtNSeGc_pP2mgZiPU7dl-dj7gPcoSGIhclOpTpxw

  • Mato Grosso quer aumentar desmatamento legal na Amazônia

    Mato Grosso quer aumentar desmatamento legal na Amazônia

    Não bastasse o número recorde de queimadas emitindo a fumaça que ajudou a encobrir São Paulo, o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (DEM), surfa na onda de ataques ao meio ambiente pelo governo federal e encaminha à Assembleia Legislativa do Estado (AL-MT) um substitutivo de Projeto de Lei Complementar (PLC) no qual pretende ampliar a área legal para desmatamento na Amazônia. O texto atual do PLC 48/2019, apresentado semana passada, é fruto de uma manobra política da base governista, visto que um projeto semelhante já havia sido barrado pela oposição há duas semanas.

    Mendes, que demonstra especial simpatia pelo presidente da República, pretende alterar a Política Florestal do Estado e assim beneficiar mais uma vez o agronegócio. A ideia é ampliar o limite de exploração de madeira de 12 mil m³ para 49,5 mil m³ por ano para pessoas físicas ou jurídicas, sem necessidade de reflorestamento. Além disso, pretende permitir que o pequizeiro, árvore de grande valor social e ambiental, possa ser legalmente derrubado em áreas do bioma amazônico.

    Atualmente, o pequizeiro é uma espécie protegida por lei estadual, em portaria expedida pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema -MT) em 2010. Com a aprovação do projeto, a espécie passa a ter sua proteção garantida dentro de Mato Grosso somente no bioma do Cerrado. Segundo ambientalistas, a presença do pequizeiro é importante para garantir a sobrevivência de muitas espécies vegetais e animais que são essenciais ao equilíbrio dos ecossistemas, já que as flores e frutos do pequizeiro se constituem em alimentos para abelhas, insetos, morcegos, pássaros e mamíferos.

    Pequizeiro (Foto: João de Melo / Empaer-MT)

    Entre as justificativas para a alteração da Política Florestal, segundo o documento enviado pelo Governo do Estado, é de que a atual legislação causa “inúmeros transtornos e prejuízos, tanto ao Estado, quanto ao setor empresarial”. A modificação é um pedido do Centro das Indústrias Produtoras e Exportadoras de Madeira do Estado de Mato Grosso (Cipem).

    AMAZÔNIA SOB RISCO

    As declarações insensatas do presidente da República e sua equipe se multiplicam rapidamente e evidenciam a ameaça sob a qual a Amazônia está submetida. Em o curto espaço de tempo, a atenção do chefe do Executivo votou-se fortemente à pauta (anti) ambientalista. Bolsonaro criticou dados que demonstram o avanço do desmatamento na Amazônia, exonerou o presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) graças à divulgação desses dados e confirmou a apresentação de um Projeto de Lei que pretende legalizar a atividade garimpeira em áreas indígenas. Já o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo), condenado por adulterações de mapas do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê para favorecer mineradora, afirmou esta semana, em entrevista à BBC Brasil, que “a Amazônia precisa de soluções capitalistas”.

    Segundo a Organização Não Governamental Imazon, em levantamento divulgado na última sexta-feira (16), houve entre agosto do ano passado e julho deste ano, um aumento de 16% na degradação da floresta amazônica. De acordo com o estudo, os estados que mais destacaram foram Amazonas, Pará e Mato Grosso. A estimativa que é cerca de 5.054 km² de floresta foram perdidos durante o período analisado.

    Os dados e as declarações bolsonaristas têm preocupado ambientalistas de todo mundo e chegaram a causar desconforto com membros da União Europeia (UE), que colocaram em xeque a confirmação do acordo de livre-comércio que está em vias de ser assinado com o Mercado Comum do Sul (Mercosul). Noruega e Alemanha anunciaram esta semana o bloqueio da verba repassada para o ‘Fundo Amazônia’, que em parte era destinado a instituições ambientais do Governo, como o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

  • Mudanças climáticas: a influência das ações do homem nesse processo no Brasil

    Mudanças climáticas: a influência das ações do homem nesse processo no Brasil

     

    Uma pesquisa recentemente divulgada pelo Greenpeace, em parceria com o Datafolha, afirma que os brasileiros, num geral, acreditam que as mudanças climáticas já afetam o país. No entanto, apesar da maioria responder que já ouviu falar sobre o assunto, a parcela que se declara pouco informada em relação às mudanças climáticas é maioria.

    Enquanto um total de 88% respondeu que já tinha ouvido falar sobre mudanças climáticas, apenas 28% se consideram bem informados.

    Para Alexandre Gross, gestor de projetos no Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV, esses 88% podem abranger pessoas com profundo conhecimento sobre o tema e outras que apenas “ouviram falar”. “As pessoas estão mais informadas sobre as mudanças climáticas muito por causa da crise hídrica e do setor elétrico. Nesse sentido, a grande mídia e algumas figuras públicas também estão pautando o assunto”, comenta.

    Foto: Mídia NINJA

    Entre os possíveis fatores responsáveis pela mudança climática, o desmatamento lidera como principal para 95% dos entrevistados. Em seguida, está a queima de petróleo (93%), atividades industriais (92%), queima de carvão mineral (90%) e tratamento de lixo doméstico (87%). Entre os últimos da lista, está o comportamento do sol (83%), as hidroelétricas também (80%), a agropecuária (77%) e por último o el niño (64%).

    O professor da FAAP e teórico ecossocialista, José Correia Leite, considera que a principal causa das mudanças climáticas no Brasil é a agropecuária.

    “O grande vilão [do ecossistema] não é a indústria, é a agropecuária. Ela é a atividade mais predatória desenvolvida no território brasileiro”, diz.

    Para Alexandre, em uma escala global, é a queima de combustíveis fósseis a grande responsável. No Brasil, por outro lado, historicamente foi o que é chamado de uso da terra, categorização que engloba o desmatamento. Em segundo lugar, a agropecuária que foi ultrapassada pelo setor de energia recentemente.

    “É interessante que as pessoas não tenham a percepção de que esse setor é altamente prejudicial. Mas, ao mesmo tempo, é um setor que pode inverter a jogada facilmente. Tem uma metáfora que aponta a agropecuária como o vilão, por contribuir com as mudanças climáticas, a mocinha também, porque sofre com elas. E, além disso, pode ser o herói pelo potencial de diminuir essa emissão”, conta.

    Para José, além de influenciar as mudanças climáticas, a atividade agropecuária contribui com o desmatamento, perda da biodiversidade e destruição do sistema hídrico. “Isso tem um impacto devastador sob os biomas”, completa o especialista.

    Foto: Greenpeace/Gilvan Barreto

    A pesquisa aponta que 66% dos entrevistados considera que o Brasil deveria assumir uma liderança no enfrentamento do problema das mudanças climáticas. O professor da FAAP diz que o país tem potencial para enfrentar o assunto. No entanto: “O Brasil poderia gerar energia elétrica, basicamente, pela solar e eólica. Além das hidroelétricas que já existem, sem construir mais. Me parece que não vai liderar esse enfrentamento, porque não há nenhuma sensibilidade por parte dos dirigentes dos partidos políticos e do setor empresarial nesse sentido”.

    Para ele, o financiamento de partidos políticos por empresas de agronegócio compromete políticas públicas de caráter ambiental. Ainda segundo José, é preciso uma alteração radical da estrutura de poder da política brasileira. “A Dilma faz do Pré-sal seu principal projeto estratégico para o país. Além disso, grande parte das bancadas dos outros partidos, e também o PT, estão vinculadas ao agronegócio. Como essas pessoas vão combater o desmatamento, se elas mesmas estimulam o desmatamento?”, questiona.

    Pesquisa realizada por Antônio Nobre, no final do ano passado, aponta que existe uma mudança no regime de chuvas da Amazônia. Com a devastação, a floresta joga menos umidade no ar, e isso pode estar vinculado com a seca no sudeste.

    “Se isso é verdade, as consequências são enormes, por que o sistema Cantareira pode jamais se recuperar”, alerta. José aponta que essas mudanças não tem a ver apenas com a temperatura do planeta e fatores naturais, e sim com ações do homem.

    Desse ponto de vista, a aprovação do novo código florestal (2012), que reduz a preservação das matas ciliares (vegetação ao redor dos rios) de 50 para 15 metros, contribui para o desmatamento. “A aprovação foi um sinal verde para destruir em uma escala jamais vista no sistema hídrico brasileiro. E isso foi aprovado pelo governo, ou seja, isso foi referendado pela presidente Dilma”, conclui o ecosocialista.

    O Estado do Acre viveu uma cheia histórica de seus rios, com uma elevação de mais de 18m do curso normal, deixando mais de 7 mil pessoas desabrigadas na capital. — Foto: Mídia NINJA

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