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  • EUA, BRICS e América Latina – Tudo conectado

    EUA, BRICS e América Latina – Tudo conectado

    Em artigo publicado recentemente no jornal Monitor Mercantil, o analista geopolítico Fábio Reis Vianna mostra como a crescente militarização e convulsão na América Latina faz parte dos planos de Washington para minar a influência de China e Rússia na região e controlar as velhas e novas fontes de petróleo, gás e outros produtos minerais. Vale a pena ler:

    Eleições argentinas, enquadramento da América do Sul e os Brics


    Por Fábio Reis Vianna

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    No último dia 29 de outubro, o Ciclo de Seminários de Análise da Conjuntura Mundial, organizado pelos professores Monica Bruckmann e Franklin Trein, recebeu no Salão Nobre do IFCS-UFRJ, no Rio de Janeiro, a ilustre presença do ex-vice-presidente do Banco de Desenvolvimento dos Brics, o professor Paulo Nogueira Batista Jr.

    Em meio ao peculiar momento de convulsões sociais que se espalham pelo mundo, discutiu-se a Nova Rota da Seda, grande projeto chinês de integração geoeconômica da Eurásia por vastas redes de estradas, trens de alta velocidade, gasodutos, cabos de fibra ótica e portos, e que beneficiará milhões de pessoas (incluindo a Europa Ocidental, e incidentalmente, o continente africano e a própria América Latina).

    Para isso, três instituições criadas na órbita deste projeto cumpririam papel fundamental: o Silk Road Fund, o AIIB (Banco de Investimento e Infraestrutura da Ásia) e o NBD (Banco de Desenvolvimento dos Brics).

     

    Para EUA, era preciso separar o Brasil de Rússia e China a qualquer custo

     

    Sendo o Estado brasileiro acionista e fundador do NBD, muitos projetos de financiamento oriundos desta instituição global já poderiam ter sido aprovados e seriam muito bem-vindos à cambaleante economia brasileira.

    Porém, não obstante nos últimos anos, especificamente de 2003 a junho de 2018, empresas chinesas terem investido quase US$ 54 bilhões em mais de 100 projetos, segundo dados do próprio governo brasileiro, a partir de 2017, os investimentos caíram vertiginosamente.

    Segundo estudo do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), os investimentos chineses no Brasil somaram US$ 8,8 bilhões em 2017 e não mais que US$ 3 bilhões em 2018. Uma queda de 66%. O aprofundamento do enquadramento brasileiro à órbita imperial norte-americana diz muito sobre isso.

    Com a institucionalização da Nova Estratégia de Defesa dos Estados Unidos, promulgada em 18 de dezembro de 2017, oficializou-se o que na prática já vinha ocorrendo desde meados de 2012, com a aceleração da disputa interestatal e a escalada da competição mundial: o reposicionamento norte-americano no xadrez geopolítico mundial de maneira cada vez mais agressiva e unilateral.

    Deixando de lado a retórica multilateralista promovida ao longo do século passado, os norte-americanos, diante do fortalecimento das potências “revisionistas” Rússia e China – questionadoras da centralidade americana no uso das regras e instituições criadas e geridas de maneira unilateral durante todo o século XX – agora procuram impor sua vontade, sem concessões, aos países do chamado Hemisfério Ocidental.

    Região ao qual os Estados Unidos se atribuem, por direito, o pleno exercício da soberania, por considerarem sua zona de influência direta, inadmitindo assim, qualquer contestação à sua supremacia, nem mesmo qualquer aliança estratégica de países que possa criar um polo alternativo de poder; muito menos no Cone Sul do continente.

    Sendo assim, a postura de total alinhamento do atual governo brasileiro aos interesses da administração Trump, em muito diz respeito a este enquadramento do Hemisfério Ocidental à estratégia de contenção do expansionismo dos atores eurasiáticos.

    Se o aprofundamento do projeto eurasiático e da parceria estratégica sino-russa – dentro da teoria do controle do heartlandde Mackinder – já seria inadmissível por si só, então a participação de um grande país do Hemisfério Ocidental como protagonista de uma instituição contestadora de antigas normas estabelecidas e reguladas pelo hegemon já seria demais: era preciso separar o Brasil de Rússia e China custe o que custar, mesmo que para isso o país tenha que arcar com o preço de ver suas instituições destruídas e envolvido no labirinto de um quase fechamento militar de regime.

    Os últimos meses têm sido de muita agitação em várias e diversas partes do mundo; em particular na América do Sul. Mesmo que por motivos não exatamente similares, principalmente nos casos específicos de Peru e Bolívia, os protestos populares ocorridos no Equador e no Chile teriam em comum as características de uma reação, quase natural, de autoproteção destas sociedades às políticas restritivas neoliberais.

    Como se fora uma velha ironia da história, bem no momento em que vivemos o esgarçamento da competição interestatal, surge uma correia de transmissão espalhando por vários países, tão distantes quanto díspares entre si, a fagulha dos protestos sociais.

    Curiosamente, essa potente e perigosa combinação entre insatisfação social e acirramento de conflitos entre países, em outras épocas da história acabaria por configurar-se naquele período de transição entre os ciclos finais e de reconfiguração do grande tabuleiro do sistema mundial.

    Diante disso, é importante ressaltar o risco de uma característica em comum que vem aos poucos se delineando em alguns países da América do Sul: a militarização.

    Com o acirramento dos conflitos globais, o enquadramento da América do Sul à estratégia norte-americana de contenção dos adversários eurasiáticos e diante das agitações populares à deterioração dos padrões de vida, surge a lamentável opção pela imposição da ordem nua e crua, trazendo de volta ao cenário politico desses países a presença dos militares como garantidores da estabilidade institucional.

    Caminha-se na região para um cenário em que governos eleitos, enfrentando a crescente agitação interna, passariam a depender dos militares para sobreviver. Os recentes acontecimentos no Peru, Equador e Chile não deixam mentir. Fora o fato de que o Brasil já vive sob a sombra de uma velada tutela militar às suas instituições.

    O ponto fora da curva desta história é a Argentina e a impressionante vitória eleitoral da oposição peronista (num momento em que o uso de ferramentas de desestabilização tem sido frequentes para interferir em resultados eleitorais, como no caso da propagação em massa de fake news via Whatsapp em favor de Jair Bolsonaro no Brasil).

    Contra todas as tendências, em uma região acossada pela interferência cada vez mais agressiva dos Estados Unidos – vide a atual tentativa de deslegitimar e desestabilizar a recente eleição de Evo Morales por meio da já manjada e forjada “Revolução Colorida”, que se aprofunda na Bolívia – a Argentina caminha para a retomada de um projeto de nação autônomo e soberano.

    Diante da bem-sucedida, por hora, destruição da aliança estratégica Brasil-Argentina, que vinha se fortalecendo desde a redemocratização das duas nações em meados dos anos 80, caberá àquele país o complexo desafio de buscar expandir sua inserção internacional sem o seu antigo parceiro de Mercosul.

    Algo interessante dito pelo professor Paulo Nogueira Batista Jr., no Ciclo de Seminários de Análise da Conjuntura Mundial, diz respeito à atual postura chinesa diante da agressividade e truculência da administração Trump: paradoxalmente, tal agressividade estaria contendo o ímpeto expansionista chinês dos últimos anos na América do Sul, o que, segundo o professor, poderia abrir ótimas oportunidades para os países da região barganharem acordos mais favoráveis aos chineses.

    Com o engessamento do Brasil e o seu alinhamento cego à Nova Estratégia de Defesa dos Estados Unidos, abre-se à Argentina a oportunidade não só de barganhar acordos comerciais favoráveis, mas ocupar o espaço deixado vago pelo Brasil no projeto de integração eurasiático.

    Como bem disse o professor Paulo Nogueira Batista Jr., os Brics e em especial o seu banco de desenvolvimento (NBD) estariam caminhando para um processo de ampliação de seus participantes.

    Na nova configuração geopolítica mundial, em que o acirramento da disputa global aumenta a necessidade das potências competidoras em garantir sua segurança energética, a América do Sul já é vista por muitos analistas como o novo centro de gravidade da produção mundial de petróleo, em substituição ao Oriente Médio.

    A se confirmar esta tendência, não cabe outra alternativa a países baleia como Brasil e Argentina do que retomarem o projeto estratégico sul-americano sob risco de terminarem seus dias fragmentados e engolidos por interesses e disputas de potências externas à região.

    Por hora, cabe a Argentina caminhar sozinha e por necessidade, ampliar os laços econômicos e geopolíticos com China e Rússia porque a tendência é o país tornar-se alvo das próximas campanhas de desestabilização, guerras de “quarta geração” e asfixia econômica desferidas sempre sorrateiramente pelo hegemon.

    Fábio Reis Vianna

    Escritor e analista geopolítico.

    Leia o artigo original em: https://monitordigital.com.br/eleicoes-argentinas-enquadramento-da-america-do-sul-e-os-brics

  • A PEDAGOGIA DO MEDO: escola militarizada no DF

    A PEDAGOGIA DO MEDO: escola militarizada no DF

     Por Dioclécio Luz

    Na primeira semana de agosto de 2019, duas escolas públicas do Distrito Federal (DF), decidiram em assembleia que não queriam se converter numa escola militarizada como pretendia o governo. Irritado com a decisão da comunidade escolar – pais, alunos, professores, servidores –  o governador Ibaneis Rocha deu a entender que iria implantar as EM na marra, e pretendia começar “justamente pelas escolas que rejeitaram o modelo”, disse à imprensa.

    A reação de Ibaneis simboliza o caráter dessa pretensa escola. O que se tem aqui é o autoritarismo tornado pedagogia, é o medo feito disciplina; a educação teve fim, a democracia foi substituída pelo autoritarismo. Isto é a escola militarizada
    Hoje o DF conta com nove escolas militarizadas e um total de 12.156 alunos e alunas matriculados. Tudo começou em janeiro de 2019, quando teve início o novo governo e seis escolas públicas foram convertidas ao novo modelo. Em agosto uma nova investida do governo capturou mais três escolas. Como se percebe, essas investidas ocorrem estrategicamente no início ou fim de semestre, quando não há atividade escolar ou elas serão paralisadas.

    Eis um projeto caracterizado por mentiras. Começa com o governo tentando mascarar o projeto militarista maquiando as escolas militarizadas como “gestão compartilhada” ou “escola cívico-militar”. Depois, tenta dar uma roupagem democrática: a Secretaria de Educação e a de Segurança Pública, responsáveis pela nova “escola”, promovem “assembleias” com a comunidade que seria soberana na decisão pela mudança. Foi quando duas escolas rejeitaram o projeto e o governador irritado disse que faria a mudança de qualquer jeito. Não espanta. Pais, alunos, representantes do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro-DF), relatam que essas “assembleias” se dão sob pressão: quem é contra é hostilizado pelos organizadores.

    A escola militarizada tem como alvo os jovens oriundos da periferia. O objetivo é controla-los. Afinal, se esses pobres decidem reivindicar seus direitos, o Estado vai ter problema em atendê-los. Portanto, na falta de um controle de natalidade mais severo para os pobres que insistem em nascer, a solução é controlar a natalidade das ideias e das reinvindicações.
    O projeto recebe o apoio do governo Bolsonaro que anunciou a expansão dessas escolas. No dia 5 de setembro deste ano ele assinou decreto com o objetivo de implantar o modelo militarizado em 216 escolas até 2023. Esse tipo de escola não fazia parte do plano de governo de Ibaneis. Mas, para agradar ao presidente, no primeiro mês de governo Ibaneis criou as escolas militarizadas do DF.


    Coisa de fascista


    A escola militarizada atua sobre os jovens da periferia para que se tornem servis e obedientes. Os militares trazem da caserna o conceito de pátria e cidadania: obediência, disciplina, submissão. Não existe rebelde numa escola assim. Não por acaso, escolas com esse formato foram implantadas pelo fascismo de Benito Mussolini, nos idos de 1922. 
    Na Alemanha, em 1933, Adolf Hitler criou a Juventude Hitlerista, responsável por mobilizar mais de 5 milhões de jovens para o seu projeto de escola cívico-militar. Como nas atuais escolas militarizadas, o ensino nas escolas nazistas valorizava o nacionalismo, a obediência e a disciplina; defende a família e as tradições.
    Adolf Hitler diante da sua criação.
    Benito Mussolini diante dos alunos
    O filósofo, ex-ministro da educação no governo Lula, e professor da USP, Renato Janine Ribeiro, em entrevista à Rádio CBN (27/02/2019) disse:
    “A escola deve incentivar o aluno a ser rebelde, a ter opinião, questionar o professor, refletir sobre a sociedade. Isso é bom para a escola e para o aluno. A escola com militares é exatamente o contrário: ela pretende educar para um tempo que não existe mais – quando o professor era autoridade inquestionável. Esse tempo se foi, não volta mais”.
    Pelo visto voltou. E não só no Distrito Federal.

    Conforme o site Uol hoje o número dessas escolas chega a 120, espalhadas por 17 estados do Brasil. A grande maioria está em Goiás, po
    r obra e graça do ex-governador Marconi Perillo. O governador estava preocupado com os “baderneiros”: professores que faziam greve e alunos que ocupavam as escolas. No dia 10 de outubro de 2018, ao prestar depoimento na PF, Perillo foi preso preventivamente na operação “Cash Delivery” da Polícia Federal, acusado de receber R$ 12 milhões em propina da construtora Norberto Odebrecht.


    Soldadinhos de chumbo


    Engana-se, porém quem acha que a escola adotada por Mussolini e Hitler fascina somente a direita. O Piauí e a Bahia, sob o comando do Partido dos Trabalhadores, embarcaram nessa também. No caso do Piauí, conforme a revista Época, o governador petista Wellington Dias chegou a defender a criação de “Pelotões mirins” e “Combatentes mirins” – jovens formados pela Secretaria de Segurança Pública nos preceitos cívico-militares, nos moldes da Juventude hitlerista.

    Soldadinhos de chumbo? Sim. A escola impõe um regimento de quartel sobre as crianças, seus “soldadinhos”. O regimento trata de disciplina, civismo (na visão militar), religião e moral. É a pedagogia do medo. Os militares criam delatores dentro da escola, os chamados “líderes de turma”, com a missão de dedurar aqueles que não se comportam como manda o regimento. Com os policiais eles fiscalizam se a farda está limpa e a camisa por dentro da calça, se não incluíram adereços proibidos, se o corte de cabelo não é o proibido, se usam batom, o que é proibido; são vetados os brincos; os jovens não podem falar na linguagem deles. Nessa pretensa escola os alunos não se cumprimentam com o tradicional “bom dia”, mas com a continência militar; na hora de conversar com a autoridade, mãos para trás. Nada de namoro, nada de beijos e abraços. Se o major-diretor promover uma homenagem a qualquer-um-poderoso é obrigação do aluno estar lá, formar fileiras, cantar o hino nacional, bater palmas para esse qualquer-um, que pode ser um pilantra ou gente de bem. Nessa falsa escola o aluno obedece e ponto final.

    O jovem de uma escola como essa não é mais dono do seu corpo. Não pode assumir a sua identidade de raça ou de gênero, não pode ter opinião – é punido quem criticar a escola e os seus comandantes. É punido quem não seguir as “tradições” ou o “comportamento adequado”. O quê por exemplo? Aquilo que dá na cabeça do comandante. O aluno pode ser punido se questionar a “aula de civismo” ou falar que houve uma ditadura nesse país.

    Aplicar a jovens e adolescentes civis um regimento destinado a militares, isto é, gente que treina para o combate, é desumano e humilhante. Ainda mais quando se sabe que esse mesmo regimento está matando os adultos, os policiais militares. Eles são as primeiras vítimas de um sistema policial repressor que não respeita a humanidade que existe em cada um, levando os policiais ao estresse, depressão e suicídio.

    O jornalista Solon Neto, do site Sputniknews (20/03/2019), relata que “hoje, no estado de São Paulo, morrem mais policiais devido a suicídio do que em confrontos nas ruas. Entre 2017 e 2018, foram 71 suicídios nas Polícias Civil e Militar paulistas, enquanto nove policiais morreram em confronto nas ruas”.

    Diz o jornal El País (03/03/2019) que em São Paulo, “entre janeiro de 2014 e junho de 2018 três PMs foram diagnosticados, por dia, com transtornos mentais. Entre janeiro e agosto de 2018, 2.500 policiais militares foram afastados por transtornos mentais, mais que o dobro dos afastados em todo o ano de 2014”.

    Os números estão dizendo que o treinamento da PM é ineficiente e está matando os policiais. É preciso uma intervenção civil sobre as forças militares.


    Bizarro


    Diz o Governo do Distrito Federal (GDF) que a escola com a PM lá dentro dá mais segurança e disciplina ao aluno. Aqui se percebe uma tentativa de burlar a lei maior. Afinal, se é função constitucional do Estado garantir a segurança de todos, por que somente dentro da escola? Porque, historicamente, o Estado garante a segurança nos bairros nobres e abandona as periferias. O Estado despreza sua obrigação constitucional.

    A escola militarizada não elimina a violência na região. Pais e mães da periferia est
    ão tão acostumados com a ausência e o desprezo do Estado, que aceitam a migalha oferecida. Fazem isso por amor aos filhos, porque sabem que a escola (não isto que a PM e o governo inventaram) é um lugar sagrado. Essa “escola” não resolve o problema da violência, mas “pelo menos”, vai permitir que os jovens estudem. Por isso aceitam as mentiras do governo.

    Aqui a mentira tem requintes de crueldade porque incide sobre o sonho de muitas famílias, a esperança de uma situação melhor para os filhos, para que eles tenham aquilo que os pais não puderam ter: educação e um futuro melhor.

    O GDF também mentiu ao dizer aos pais que essa escola é como o Colégio Militar. Não é. Os colégios militares recebem três vezes mais recursos que as escolas públicas civis. Por alguma razão especial eles têm essa regalia. Para escola pública os recursos são regrados.

    Com a escola sob o comando da PM, os jovens da periferia, serão diariamente punidos. O fato é que o antigo território sagrado da sociedade, a escola, já não é mais o espaço aonde os jovens constroem suas primeiras relações sociais sadias. A escola sumiu. Ela não cabe na academia. Não se sabe de nenhuma Faculdade de educação que defenda essa projeto.

    Oficialmente a escola militarizada é um Frankenstein. Essa criatura bizarra não existe na forma da lei. Não há nenhuma lei em vigor fazendo referência a escola militarizada. Não se fala em escola militarizada na Constituição Federal, Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Orgânica do Distrito Federal.
    O Plano Distrital de Educação (PDE), Lei nº 5.499/2015, estabelece prioridades e metas para o DF e é a principal referência para a elaboração de planos plurianuais nas diferentes esferas de gestão. O PDE instituiu “21 Metas para o desenvolvimento do ensino no Distrito Federal nos próximos 10 anos e 411 estratégias para o seu cumprimento”. Em nenhuma delas é citada a escola militarizada. O Conselho tutelar tampouco foi consultado.

    Considerando a dimensão do projeto imagina-se que o GDF tenha elaborado estudo aprofundado sobre a viabilidade desse tipo de escola. Fazendo uso da lei de acesso à informação, foi solicitado esse estudo à Secretaria de Educação (SED) e à de Segurança Pública (SSP). A SSP informou que não é sua obrigação produzir documento que não tem! Já a SED, em resposta, encaminhou um texto de quatro laudas mostrando de forma simplória o óbvio: que toda escola precisa de disciplina para funcionar bem. Não era um estudo sobre a implantação de escolas militarizadas. Não existe estudo.

    O fato é que a escola militarizada é ilegal. Ela fere pelo menos 17 dispositivos legais. Fere a Constituição Brasileira (CF), a Lei de Diretrizes e Bases da educação (LDB), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei de gestão democrática do DF, entre outros.

    O regimento disciplinar avança sobre o comportamento e o corpo da pessoa, indo além do território escolar. É punido quem “desrespeitar em público as convenções sociais” ou “namorar na escola ou usando o uniforme da escola”. Aqui se afronta o Art. 5 inciso II: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei”.
    O Art. 5º é cláusula pétrea da Constituição, mas é agredido assim mesmo. O texto diz que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas”. Mas ao vetar os cabelos longos dos meninos, o uso de brincos e tiaras pelas meninas, o Estado, mais exatamente a Polícia Militar, está invadindo na intimidade e privacidade dos jovens.
    No mesmo Art. 5º (inciso X) se diz que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. Será que é desumano e degradante exigir que a criança obedeça calada as ordens do sargento, faça ordem unida como se fosse um soldado, corte o cabelo como se fosse militar? Não é humilhante impedir a garota de usar brincos e manter os cabelos soltos; impedir de falar na linguagem da sua tribo?

    Também se violenta o Art. 206 da CF que trata da gestão democrática. Os dirigentes dessa escola, policiais, escolhem os professores; os alunos não opi
    nam; a comunidade escolar deve obediência aos policiais. A PM decide tudo. Não existe mais eleição para diretoria. Não existe democracia.

    A Polícia não tem competência legal (e tampouco profissional) para a função delegada pelo governo estadual ou distrital.  Ao contrário do que diz o discurso oficial, a Polícia não está na escola para garantir segurança, mas para impor uma pedagogia – ela ensina, impondo a moral dos quartéis. Trata-se de desvio de função, como define o Art. 144 da CF.
    Tudo faz crer que o projeto de escola militarizada não se sustenta do ponto de vista legal. Mas não é esta a visão do Ministério Público. Em nota oficial, datada de 13 de fevereiro de 2019, as promotoras Cátia Gisele Martins Vergara e Márcia Pereira da Rocha, da Promotoria de Justiça de Defesa da Educação (PROEDUC), do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), afirmam que a proposta atende aos requisitos legais.

    Com o aval do MP o governador Ibaneis pretende ir longe. Neste momento, em algum lugar de Brasília, uma escola deixa de ser escola para se tornar esse Frankenstein. O Sinpro-DF já se manifestou contra, mas alguns professores e diretores de escola fazem a defesa desse modelo. Alunos e alunas, os principais atingidos por este modelo, têm pouco espaço para opinar. Se antes desconhecem o objetivo dessa escola, depois que ela é implantada aprendem que não podem reclamar – o regimento pune quem critica a escola.
  • A escola virou campo de batalha: PM e diretor atacam estudantes

    A escola virou campo de batalha: PM e diretor atacam estudantes

    Por Cecília Bacha e Lucas Martins

    Na noite da última quinta-feira, 04/03, a escola Escola Estadual Frederico Barros Brotero, em Guarulhos viveu uma noite de terror. Nas imagens gravadas por estudantes no pátio interno da escola, é possível ver que um PM empurra uma adolescente primeiro com a mão e depois com a ponta da sua arma. O vídeo publicado primeiro pelos Jornalistas Livres viralizou na internet.

    Marcas no corpo da estudante que sofreu agressão de PM dentro da escola

    Tudo começou quando os alunos da escola resolveram marcar uma manifestação para protestar contra o diretor José Maria Stanzani.  Além da jovem ameaçada com a arma, outros dois menores de idade foram apreendidos durante o ato e passaram a noite de quinta-feira presos, acusados de ameaçarem o diretor. Eles foram liberados no final da tarde da sexta-feira, 5. Os Jornalistas Livres acompanharam o momento da soltura e a volta dos alunos a escola.

    Os alunos tinham convocado o ato para durar durante todo a quinta. Ao chegarem para o turno da noite o diretor já havia solicitado a presença da PM e carros da polícia estavam na porta da escola.

    O Boletim de Ocorrência registrado pela apreensão dos dois jovens confirma que a polícia tinha sido convocada “por solicitação do Diretor da Escola”, no BO o protesto é caracterizado como um “tumulto generalizado”. Na descrição da ação policial está registrado que “conforme afirmaram os Policiais, eles empregaram força moderada, por se tratarem de dde muitos adolescentes” e confirma que o próprio diretor “veio a apontar os ora adolescentes infratores”.

    “A gente entrou todo mundo na escola e estavam todos os alunos no pátio protestando, falando ‘abre portão, abre portão. fecha portão’, os gritos de guerra. todo mundo mostrando o celular. ainda são sete horas. O diretor passou pelo pátio, entrou na secretaria fazendo joinha, rindo. Saiu fez joinha e fechou o portão [externo]. Depois, quando ele mandou abrir o portão, desceram três policiais militares e a gente deu uma recuada. Aí eles pegaram um aluno e enquadraram. Aí a gente foi pra cima, falou ‘não, solta o menino’, foi quando aprenderam o menino. três policiais tiraram o menino pela força, menor de idade. Dá pra ver, muito nítido na imagem que o diretor pega aponta pro menino, cochicha com o policial e logo em seguida eles pegam ele. Aí a menina foi falar para o diretor ‘você não tem o direito de deixar isso acontecer, ele é menor’ foi quando o policial empurrou a menina” conta a estudante Sophia Rios, 17 anos.

    O estudante Raul protesta pela liberdade do colega preso
    Foto: Lucas Martins / Jornalistas Livres

    Segundo Sophia, a insatisfação dos alunos com o diretor começou no início deste ano letivo quando José Maria assumiu o cargo e implementou uma política de “tolerância zero” com o fechamento dos portões.

    “A gente sempre teve um regime de tolerância de dez minutos e sempre funcionou muito bem, porque os alunos vinham do trabalho, mas atrasavam cinco, dois minutos, coisa básica. E esse diretor acabou tirando esses dez minutos de tolerância. Ou você entrava às sete horas em ponto ou não entrava mais. E o que acontece? Muitas pessoas trabalham pra sustentar a casa, muitos de nós não têm essa condição de se dar ao luxo de trabalhar só por diversão. A gente tem que ter essa tolerância, não porque a gente quer ‘vagabundar ou fazer vadiagem. Não, a gente precisa porque a gente trabalha para manter a nossa casa, para ajudar nossos pais.”

    Os alunos contam que logo na primeira reunião de pais a nova diretriz foi passada. Nenhum atraso seria tolerado. Eles reclamam ainda que o sinal da escola está adiantado pelo menos três minutos, precipitando o fechamento da escola para os alunos do período noturno. Uma vez atrasados, independente do tempo que for, eles não podem entrar na escola no dia do atraso.

    Além da nova política de horários o diretor tornou constante a presença da polícia na entrada da escola. A estudante Karine, de 15 anos, conta que “isso começou muito frequente esse ano. O ano inteiro, todos os dias, são várias viaturas passando, rondas pela praça e pela escola.”

    A E.E Frederico Barros Brotero, que fica na região central da cidade, é uma escola modelo em Guarulhos. Muitos pais transferem os filhos de outras escolas para a Frederico buscando proporcionar um melhor ambiente escolar, como é o caso da Roseli, mãe da Juliana, que

    “devido a qualidade do Brotero eu trouxe ela pra cá. Por causa do ensino, professores. A referência aqui em Guarulhos que é a escola.Trouxe ela no ano passado. [Mas] devido ao ocorrido de ontem eu me senti completamente insegura agora. não pelo fato dos alunos terem feito esse motim, que eu falo, esse manifesto, essa manifestação. Sim pela insegurança dos alunos dentro da escola por causa da própria direção, da própria escola que deveria estar dando segurança para eles, dentro da escola chamar a polícia para dentro da escola.”

    A confiança no trabalho realizado pelos educadores da escola é recorrente entre pais e alunos da Frederico. É o caso também de Eliane de Gouveia, mãe do João Vitor, 17, um dos rapazes detidos durante o protesto. Ela diz que inicialmente concordou com a medida do diretor “que queria colocar ordem na escola”. Segundo ela, de seis anos para cá, quando seu filho entrou na escola, a escola vem perdendo qualidade. “O problema foi justamente essa falta de tolerância do diretor. Nenhuma mudança pode ser feita assim da noite para o dia”, explica.

    Estudantes reunidos em frente a escola Frederico Barros Brotero, um dia após violência policial Foto: Lucas Martins / Jornalistas Livres

    A manifestação a que Roseli se refere é a convocada pelos alunos para acontecer durante toda a quinta-feira passada e pressionar a diretoria a voltar atrás na decisão de retirar a tolerância de 10 minutos para os retardatários. Foi durante ela que aconteceram as cenas de barbaridade realizadas pela Polícia Militar do estado de São Paulo. Os alunos, que já tentavam dialogar com o diretor desde o começo do ano, chegaram ao limite na quarta-feira passada, 03/03.

    O aluno Raul Martins, 18 anos, explica “um dia antes do protesto [o protesto ocorreu na quinta, então na quarta-feira] eu tinha vindo para escola, não posso andar muito rápido porque eu acabei de ter uma lesão no tornozelo por conta do esporte que pratico, então eu cheguei na escola eram 18:58. Eu me deparei com viaturas na porta da escola e quando eu desci para tentar entrar na escola o portão estava fechado e o diretor falou assim para a gente ‘vocês me dão um minutinho só que eu vou organizar aqui dentro e vocês já entram’, só que nisso ele deu voz para os policiais [que estavam na frente da escola] nos abordarem. Várias vezes os policiais falaram ‘eu to deixando de fazer o meu trabalho, que é pegar bandido porque estou recebendo reclamação do diretor da escola desse bando de maconheiro vagabundo que nao quer entrar para a escola. Sendo que nisso eu tinha chego antes do horário do fechamento.”

    A abordagem foi presenciada por outros estudantes que de dentro da escola tentaram conversar com o diretor “no dia que aconteceu esse enquadro [quarta-feira, 03/03] os alunos que estavam lá dentro ficaram sabendo do enquadro e começaram a perguntar para as tias e para o diretor. O diretor não falou com nenhum aluno. Pais bateram na porta da escola e ele nao abriu para os pais. Ele saiu para fora e não deixou os pais entrarem.” contou Karine.

    Raul conta que a abordagem seguiu o padrão da PM “violência verbal e violência física” e que durante a revista, que ocorreu na entrada da escola, Raul afirma que um dos policiais “falou que iria deixar todos nós de cueca e iríamos embora de cueca. Só não aconteceu isso porque as tias intervieram, as inspetoras da escola” e completa “eu não gosto disso, de sair de casa pra entrar pra escola e acabar levando enquadro na porta da escola. Levar tapa na cara encostado no portão da escola.”

    Segundo o site G1 o governo de João Doria (PSDB) declarou em nota para o veículo que  o policial militar que empurrou a estudante com uma arma foi “foi afastado”.

    Os dois menores detidos dentro da escola passaram quase 24h na Vara da Infância e da Juventude em Guarulhos. Do lado de fora, dezenas de estudantes faziam vigília até o momento da soltura. O movimento era acompanhado por algumas mães. Após a liberação os alunos caminharam cerca de 20 minutos pelas ruas do Centro de Guarulho até a escola onde os dois alunos foram recebidos como heróis pelos colegas.

    Assista no vídeo a ação da policia dentro da escola e a comemoração pela liberdade dos estudantes, nesta última sexta-feira: 

     

     

     

     

     

  • Atos por Marielle Franco, assassinada há um ano, se espalham pelo Brasil

    Atos por Marielle Franco, assassinada há um ano, se espalham pelo Brasil

    Por Fabiana Oliveira*

     

    Hoje, 14 de março de 2019, o grito de quem se indigna com o machismo, o racismo, a desigualdade e a violência faz contraste com o silêncio do Estado, da Justiça e dos perpetradores dos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes, que completam um ano.

    No último dia 12, foi decretada a prisão do policial reformado Ronnie Lessa e do ex- policial militar Elcio Vieira de Queiroz, acusados de serem autores dos disparos contra o carro em que estavam a vereadora Marielle, o motorista Anderson e a jornalista Fernanda Chaves, única sobrevivente do atentado, na noite do dia 14 de março de 2018. “Quem mandou matar Marielle?”, entretanto, é uma pergunta que segue sem resposta.

    Em muitas cidades do país e em outras partes do mundo, a população já foi ou vai às ruas pedir justiça por Marielle e reafirmar o compromisso com suas lutas em defesa da população negra e LGBT, das mulheres, dos mais pobres, dos favelados e de quem sonha, luta e constrói, cotidianamente, uma sociedade mais justa.

    O legado que Marielle deixa é a luta contra este modelo de sociedade: violento, baseado em relações de discriminação e exploração, que é um projeto de morte. O Brasil é o país que mais mata defensores dos direitos humanos e socioambientais no mundo e também é considerado um dos que mais mata mulheres, ocupando a 5º posição no ranking mundial. Além disso, a cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado no país.

    A memória de Marielle Franco e outras lutadoras e outros lutadores do povo será semente e vai geminar, queiram ou não os seus algozes. Confira a agenda de atos**:

     

    14/03

     

    Rio de Janeiro

    Amanhecer por Marielle e Anderson – RJ, 6h

     

    Festival Justiça Por Marielle e Anderson ::. 14/03, 8h

     

    Zona Oeste por Marielle Franco, Praça do Ringue, Santa Cruz, 10h

     

    Celebração Marielle Semente, 13h

     

    Aula Magna: Eu Sou Porque Nós Somos, Praça Cinelândia, 14h

     

    Carolina, Abdias e Marielle: Vidas, Ancestralidade e Continuação, Centro de Artes da Maré, 15h

     

    Marcha contra o genocídio negro! SOMOS Marielle Franco!, Alerj, 17h

     

    Cabo Frio

    Pela memória e justiça de Marielle!, Praça Porto Rocha, 17h

     

    Campos

    Mesa: Um ano da morte de Marielle Franco – quem matou Marielle?, Instituto Federal Fluminense (IFF Campos), 18h30

     

    Brasília

    365 dias sem Marielle [DF], distribuição de placas Rua Marielle Franco, Praça Zumbi dos Palmares, 12h

     

    Lançamento do livro UPP: a redução da favela a três letras, Foyer do plenário do CLDF, 17H

     

    Sessão solene em Memória de Marielle Franco, Plenário do CLDF, 19h

     

    Campo Grande

    Por que mataram Marielle Franco?, Concha Acústica, 8h

     

    João Pessoa

    Festival Marielle Vive, Parque da Lagoa, 9h30

     

    Natal

    Marielle, presente! O legado dela está mais vivo do que nunca., Auditório do DECOM/UFRN, 13h

     

    14M – Por justiça e pela memória de Marielle Franco, Calçadão do Midway. 17h

     

    São Bernardo

    Ato Marielle Vive, Praça da Matriz, 14h

     

    Aracaju

    14M Aracaju – Marielle Vive!, Câmara dos Vereadores de Aracaju, 16h

     

    Sessão Solene em memória de Marielle Franco, Câmara Legislativa do Distrito Federal, 17h

     

    Fortaleza

    Amanhecer por Marielle, Praça da Justiça, 6h

     

    Ato Marielle Vive!, Praça da Gentilândia, 17h

     

    Marielle, presente! De três letras a uma só voz, Auditório Valnir Chagas FACED – UFC, 19h

     

    Belo Horizonte

    Semana Marielle Franco UFMG, UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais, 17h (de 11 a 15 de março)

     

    Marielle Vive! Um ano de Saudade e Lutas!, Praça Sete De Setembro, 17h30

     

    São Paulo

    Justiça para Marielle: vidas negras e periféricas importam! 14M, Av. Paulista praça Oswaldo Cruz, 17h

     

    Marielle Vive, Nós Também! Pelo direito à vida das mulheres!,  Estrada do M’Boi Mirim, 18h

     

    Bauru

    Justiça por Marielle! Quem matou e quem mandou matar?, em frente a Câmara Municipal, 17h

     

    Porto Alegre

    Março Feminista! Justiça para Marielle: 1 ano sem resposta, Esquina Democrática, 18h

     

    Pelotas

    Um Ano Sem Marielle Franco, Chafariz do Calçadão, 17h30

     

    Manaus

    Simpósio e Aula pública – Marielle virou semente – ato em memória de Marielle Franco, Casa das Artes, 15h

     

    * Fabiana Oliveira é jornalista e militante da Marcha Mundial das Mulheres (MMM)

    ** Com informações da Mídia Ninja

  • A militarização das escolas públicas no DF e o ataque generalizado da extrema direita ao pensamento crítico.

    A militarização das escolas públicas no DF e o ataque generalizado da extrema direita ao pensamento crítico.

    Uniformes militares, cabelos curtos para meninos, meninas de coque, hasteamento da bandeira e execução do hino nacional, aulas de educação moral e cívica sob a orientação de policiais e bombeiros responsáveis pelo comando disciplinar das escolas. Esse é o projeto piloto que está sendo implementado em quatro escolas públicas do DF desde as volta às aulas, no dia 11 de fevereiro.

    “Vocês vão aprender alguns aspectos da doutrina militar, a prestar continência, a marchar”, adiantou o major Edney Freire, responsável pela administração e disciplina do colégio Centro Educacional (CED) 7, em Ceilândia (que agora passará a se chamar Colégio da Polícia Militar de Ceilândia).

    Ao contrário do que vem sendo dito pela Secretaria de Estado de Educação  do DF (SEEDF), e divulgado amplamente pela mídia (Rede Globo), a Gestão Compartilhada (nome dado à militarização das escolas) não está sendo um processo democrático e, segundo relatos de professores e do Sindicato dos Professores (SINPRO), está em curso um golpe contra professores, estudantes e as comunidades escolares. As assembléias que votaram pela militarização (em 3 das 4 escolas a “comunidade escolar” votou “sim” para a militarização”, mas o SIMPRO alega que tais votações não foram legítimas.

    Segundo o regimento que trata dos critérios para a realização e convocação de assembleias extraordinárias,  qualquer convocação precisaria garantir no mínimo 15 dias de ampla divulgação. Somente por esse critério as assembleias já estariam completamente deslegitimadas. A ampla divulgação não foi realizada, as assembléias foram “convocadas” com cinco dias de antecedência e em período de férias escolares, quando muitas famílias, professores e alunos não se encontram na cidade.

    Alunos de escola pública no primeiro dia de aula no DF
    Policiais recebem alunos no primeiro dia de aula no DF

    A iniciativa golpista dos setores que apoiam a intervenção militar nas escolas do DF teria se dado diante da firme oposição do corpo de professores que compõem essas escolas. “Precisaram descumprir as normas do regimento de convocação das assembléias pois, diante de um debate amplo com a comunidade escolar, a falácia da Gestão Compartilhada cairia por terra, não só nas quatro escolas escolhidas inicialmente, mas também nas outras 187 escolas do DF, como prevê o governo bolsonarista de Ibaneis”, dizem os professores.

    Assembléia controlada pela PM

    O golpe das assembleias, nas férias escolares, teve seu primeiro capítulo no CED 308 do Recanto das Emas, quarta escola vítima da militarização. No dia 30/1, o diretor Márcio Jesus Faria, teria convocado uma “assembleia” apenas com uma parte da comunidade escolar, selecionada a dedo as pessoas favoráveis à militarização, e chamou a Rede Globo para cobrir a votação e pegar depoimentos. As pessoas favoráveis a militarização chegaram, no dia da voltação, carregando faixas de apoio à polícia militar, o que é, segundo relatos de professores, incomum. A Polícia Militar também foi chamada, para dar “segurança” para as pessoas que iriam votar. e para tentar inibir qualquer oposição à assembléia. Os professores do CED 308 contrários à militarização não foram convocados, tampouco o sindicato da categoria, o SINPRO.

     

    Ditadura militar no MEC

    Para levar a frente a militarização de escolas públicas, duas medidas foram essenciais: a criação da Secretaria Nacional pela Militarização das Escolas e a Militarização do Ministério do MEC (Ministério da Educação), por meio da nomeação de militares para a pasta. Veja a lista abaixo:

    • General Francisco Mamede de Brito Filho – chefe de gabinete do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).
    • Coronel Robson Santos da Silva – assessor especial do ministro da Educação.
    • Tenente-coronel Marcos Heleno Guerson de Oliveira Junior – diretor de política regulatória da Seres (Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior.
    • Coronel-aviador Ricardo Wagner Roquetti – Secretaria-executiva do MEC.
    • Miranda Freire de Melo – Oficial da reserva não remunerada da Marinha Eduardo  – Secretário-executivo adjunto.
    • Luiz Tadeu Vilela Blumm – Coronel da reserva remunerada dos bombeiros – Diretor de gestão de fundos e benefícios do FNDE, Coordenador do financiamento estudantil oferecido pelo Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica).
    • Coronel da reserva Sebastião Vitalino da Silva– Coordenação-geral de materiais didáticos da SEB (Secretaria de Educação Básica). (Expectativa)

    General Oswaldo de Jesus Ferreira – Presidência da Ebserh, responsável pelo gerenciamento dos hospitais universitários federais de todo o país.

    A intervenção militar nas escolas faz parte de uma estratégia maior – liderada pelo governo Bolsonaro -de ataque à educação pública, como já foi anunciado pelo governo federal, a ideia é acabar com a alfabetização escolar, implementar a educação à distância e privatizar universidades públicas.

    Deputado Distrital da REDE elaborou um Projeto de Decreto que tentará impedir a militarização das escolas do DF

    Para impedir a continuidade do projeto  que militariza 4 escolas do DF, o Deputado Distrital Leandro Grass (REDE-DF), elaborou um Projeto de Decreto que foi levado, na tarde desta terça-feira (12), à CCJ (Comissão de Constituição e justiça) e CESC (Comissão de Educação Saúde e Cultura) da CLDF (Câmara Legislativa do DF). O projeto de Grass foi recusado pela Câmara Legislativa. Alguns professores manifestaram indignação e foram retirados da Câmara. 

    E segue o ataque da extrema direita ao pensamento crítico!

    Saiba mais no site do SIMPRO-DF: www.sinprodf.org.br

  • Diante da escassez de votos, Macri apela à repressão militar

    Diante da escassez de votos, Macri apela à repressão militar

    Embora esteja legalmente proibido desde o retorno da democracia na Argentina, as Forças Armadas argentinas voltarão a atuar em “assuntos estratégicos” de segurança interior, por decisão do presidente Mauricio Macri, em resposta aos cada vez mais presentes conflitos sociais no país, e às pressões do governo de Donald Trump.

    Para isso, o presidente utiliza a mesma linguagem com a qual costuma adornar e encobrir suas verdadeiras intenções: “modernizar”, “olhar estratégico”, “os desafios do Século XXI”… usando sempre a referência da “democracia”, entendida como o poder de um governo para cercear os direitos dos cidadãos que são sujeito dos direitos que ele assegura que pretende defender.

    A decisão do mandatário encerra um consenso democrático alcançado em 1983, após a longa noite da ditadura civil-militar genocida instaurada em março de 1976, e apaga a barreira entre a segurança interior e a defesa nacional. “Se a sociedade não conseguir freá-lo, é uma decisão que mudará a Argentina para sempre. E arruinará até mesmo a vida dos próprios militares”, comentou o jornalista Martín Granosvsky, do Página/12.

    Macri fez o anúncio da medida no Quartel de Campo de Maio: disse que elas estão destinadas a combater “os desafios de segurança do Século XXI, o terrorismo e o narcotráfico. É importante que intervenham na proteção de assuntos de carácter estratégico. Será fundamental a custódia e proteção das Forças Armadas em objetivos estratégicos, e blindar a segurança de nossos ativos”

    Fez uma ênfase no “apoio logístico” à segurança interior, enfocado no olhar à proteção do Atlântico Sul e das fronteiras, falou do redesenho do conceito de defesa nacional e de uma proteção dos objetivos estratégicos cruciais dos recursos naturais do país. A escassez e a pobreza de argumentos que costuma utilizar são inversamente proporcionais à brutalidade dos seus anúncios.

    O decreto, elaborado com a assessoria de especialistas estadunidenses e israelenses – e repudiado por partidos políticos e movimentos sociais antes mesmo de ser publicado oficialmente –, contempla três artigos a serem postos em execução, dentro do chamado Plano de Reestruturação das Forças Armadas. Em seu anexo documental de 27 páginas, prevê três grandes capítulos que estabelecem os contornos que a profunda reforma militar deverá seguir, segundo detalhou o meio digital governista Infobae.

    O documento está assinado pelo ministro de Defesa, Oscar Aguad, que menciona “as ameaças cibernéticas sofisticadas que provêm de organizações militares e agências de inteligência de outros estados”. Se trata do mesmo ministro que ainda não foi capaz de responder sobre a desaparição, no Atlântico Sul, do submarino ARA San Juan, com 43 tripulantes, no dia 15 de novembro de 2017.

    Aguad afirmou aos jornalistas que “não há uma ameaça concreta, mas podemos tê-las a qualquer momento. Imaginem que a Rússia interveio no resultado eleitoral dos Estados Unidos, na campanha anterior, e isso tem a ver com um ciberataque”, considerando como fato algo que nunca se pode comprovar, e que causou uma crise diplomática, ao tratar de justificar a compra de “um aparato para ciberdefesa muito moderno”, e outros equipamentos israelenses.

    Além disso, o ministro fala de cooperação com outros países, e surpreende que, no anexo sobre a análise regional, haja referência à “crise que a Venezuela atravessa”, com a denúncia de que o governo de Nicolás Maduro “insiste em seus esforços por consolidar um regime autoritário que viola de maneira sistemática as liberdades fundamentais e os direitos políticos de seus opositores”.

    Repúdios e preocupação

    O anúncio coleciona expressões de repúdios entre os organismos de direitos humanos, os quais qualificaram a decisão presidencial como uma “ameaça” à democracia, e a vincularam com as medidas de ajuste que o Executivo está implementando. Para os organismos humanitários, a medida tem um objetivo claro: reagir ao cada vez mais presente conflito social com mais política opressiva, já que não há forma de solucionar o plano econômico de ajuste e fome sem repressão.

    “É uma decisão que nos faz retroagir à época da última ditadura, porque foi a última vez que as Forças Armadas interviram na segurança interior, portanto é uma notícia muito ruim, nos leva a pensar que o pior da história argentina pode voltar a estar presente”, definiu Carlos Pisoni, da agrupação Filhos (de desaparecidos durante a ditadura), que assegurou que “como familiar de desaparecidos, só imaginar que os militares poderão fazer missões como as que fizeram durante a ditadura dá escalafrios”.

    O bloco senatorial kirchnerista Frente para a Vitória (FpV) advertiu que esta medida é inconstitucional, e que é um decreto deve passar pelo Congresso Nacional primeiro. Em comunicado, o grupo sustentou que “desde 1983, a separação entre defesa nacional e segurança interior é uma política de Estado. Envolver as Forças Armadas em assuntos internos é ilegal”, explicando que o uso do Exército nas tarefas de segurança interior “exige a modificação de três leio piramidais da democracia argentina: defesa, segurança interior e inteligência”.

    “A experiência do mundo nos indica que termina sendo um remédio pior que a doença, como foi no México e na Colômbia”, opinou o ex-candidato presidencial do radicalismo, Ricardo Alfonsín. A Frente de Esquerda (FIT) afirmou que não tem dúvidas de que o governo pretende usar as Forças Armadas na repressão dos protestos sociais que se multiplicarão, no enfrentamento ao duro ajuste exigido pelo FMI. O deputado Gabriel Solano, representante da FIT em Buenos Aires, acredita que “se trata de um plano repressivo desenhado pelo Pentágono”.

    Vários analistas se referiram à triste experiência mexicana desde que, em 2006, o então presidente Felipe Calderón agregou os militares às operações de luta contra o narcotráfico – e, de quebra, também os utilizou para conter as crescentes manifestações sociais. Essa política terminou com um saldo de dezenas de milhares de mortes. Ademais, deve-se considerar que a questão do narcotráfico na Argentina é muito diferente em comparação ao que acontece no México, que tem uma enorme fronteira em comum com o maior consumidor de drogas do mundo – embora, no caso mexicano, o tema também tenha servido de argumento para acentuar a repressão.

    Alinhamento

    Uma “reforma do sistema de segurança nacional” quando não há uma hipótese de conflito real não é outra cosa senão uma nova decisão visando o alinhamento da Argentina com a política dos Estados Unidos em matéria de segurança internacional, incluindo um discurso que aponta aos mesmos inimigos: o terrorismo e o narcotráfico.

    Alimentar a ideia do inimigo interno é uma ação que tem múltiplos propósitos: justifica o apoio às Forças Armadas, permite desviar recursos com esse fim, ajuda a tirar os crescentes problemas internos do noticiário e, simultaneamente, faz um gesto ao governo estadunidense, um dos principais apoiadores internacionais do governo de direita da Argentina.

    “Em breve, poderemos observar que, com a justificativa de `modernizar´ a Argentina, o governo decidirá comprar mais armas da indústria militar internacional (em especial estadunidense e israelense) e, em consequência, `terá´ que capacitar suas Forças Armadas para o uso das mesmas. Não é difícil imaginar que os Estados Unidos, generosa e solidariamente, oferecerão os seus próprios especialistas para ensinar aos argentinos como usar essas armas. Mas não é só isso. Quem conhece mais sobre `narcotráfico´ e `terrorismo´ no mundo? Eles mesmos”, comenta o analista político Washington Uranga.

    Para todos esses propósitos, Macri – que continua perdendo credibilidade e intenção de voto, com respeito às eleições do ano que vem, quando tentará renovar seu mandato – que “dar mais valor à família militar”. Começou recompondo os salários do setor, com aumentos acima do corte que impôs aos demais empregados do Estado, num reconhecimento necessário para as novas tarefas repressivas que o modelo econômico, político e social do macrismo requer.

    Rubén Armendáriz é jornalista e cientista político uruguaio, analista do Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)

    www.estrategia.la

    Publicado no Brasil originariamente pela Carta Maior – https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Pelo-Mundo/Diante-da-escassez-de-votos-Macri-apela-a-repressao-militar/6/41052