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  • SOBRE O 30 DE MAIO

    SOBRE O 30 DE MAIO

     

    ARTIGO

    Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia

     

     

     

    Em 26 de maio, a base social orgânica do bolsonarismo se manifestou em defesa do governo. Quatro dias depois, as ruas voltaram a ser ocupadas, agora pela oposição. Do ponto de vista numérico, os atos de 30 de maio foram maiores do que os realizados no dia 26 de maio. Porém, foram menores que os de 15 de maio, quando aconteceu o maior protesto de rua contra Bolsonaro desde o “Ele não”, ainda no segundo turno das eleições.

    De forma alguma, o 30 de maio não foi inexpressivo, bem longe disso. Mas também não chegou a se aproximar da força do 15 de maio. É perfeitamente possível entender o que aconteceu, o que está acontecendo.

    Para isso, porém, é necessário ter a clareza de que as movimentações da sociedade civil não devem ser avaliadas apenas na base daquilo que costumo chamar de “matemática de rebanho”, quando nos limitamos a contar as cabeças das pessoas que efetivamente foram às ruas. Há muito mais aspectos envolvidos, especialmente em momentos de crise aguda, como esse em que vivemos. As ruas não são independentes dos alinhamentos palacianos, das idas e vindas da política institucional. Não existe “mobilização espontânea”, de nenhum dos lados.

    Sobre o 30 de maio, a primeira coisa que precisa ser dita é que sua inserção no calendário de mobilizações foi tardia. No princípio, havia dois atos agendados: 15 de maio e 14 de junho, que tinham como pauta central o protesto contra a Reforma da Previdência.

    Mas como o mês de maio começou sob os ataques do governo ao sistema de ensino federal, a programação foi mudando de perfil, passando a ter a “defesa da educação” como agenda prioritária, que demonstrou ser uma pauta mais agregadora do que a crítica à reforma da previdência. Tão agregadora que contou, inclusive, com o apoio da mídia corporativa, que ajudou a catapultar o 15 de maio, transformando-o num dos maiores atos de rua da história recente brasileira. A mídia corporativa, rompida com Jair Bolsonaro desde o início do ano, utilizou os atos em defesa da educação para tentar desestabilizar o presidente.

    Que fique claro: seria equivocado dizer que a mídia corporativa rompeu com a totalidade do governo. A ruptura é com o presidente, acusado de ser incapaz, inclusive, de aprovar as reformas estruturais tão desejadas pelo mercado, de quem a mídia corporativa é porta-voz.

    Ao mesmo tempo em que apresenta Bolsonaro como inepto e despreparado, a imprensa hegemônica louva Paulo Guedes, o Chicago-Boy que teria na manga todas as soluções para os problemas brasileiros. É como se Bolsonaro fosse o preço a ser pago para ter Guedes na pasta da Fazenda.

    Animados, então, com o sucesso do 15 de maio, a representação dos estudantes (UNE, Ubes e ANPG) convocou o 30 de maio, numa clara tentativa assumir protagonismo, de imprimir a digital do movimento estudantil na mobilização social que naquela altura parecia ter potencial para derrubar o governo. A memória do “Fora Collor” foi atualizada.

    Acuado e surpreendido pela força do 15 de maio, o governo respondeu, combinando a velha estratégia do “morde e assopra”.

    Mordendo, o governo estimulou os atos populares promovidos em 26 de maio. Num primeiro momento, o apoio foi explícito, com Bolsonaro querendo participar pessoalmente das manifestações. Algum assessor de bom senso o dissuadiu da ideia. Incitar a sociedade contra outras instituições da República poderia ser considerado crime de responsabilidade.

    O apoio passou a ser velado e o dia 26 de maio mostrou que Bolsonaro tem uma base social orgânica sólida. Trata-se, é claro, de uma base muito menor que os 57.7 milhões de eleitores. Político não tem voto. Político teve voto.

    Mas ainda assim, essa base social é relevante, engajada e está disposta a ir com o presidente até o fim. Bolsonaro não saiu derrotado do 26 de maio.

    A mídia hegemônica, por sua vez, se apropriou do 26 de maio, transformando as manifestações autoritárias da base social bolsonarista em apoio popular à reforma da previdência.

    Assoprando, o governo recuou, sinalizando para uma tentativa de pacificação institucional. Depois de atacar os estudantes, Bolsonaro moderou o discurso. A narrativa dos cortes que no início era exclusivamente ideológica (acusação de balbúrdia) foi reorientada e transformada em argumentos técnicos: o corte passou a ser “contingenciamento”, o que se explicaria pelo baixo crescimento econômico. O dinheiro seria devolvido caso a reforma da previdência seja aprovada.

    Em 22 de maio, o governo usou o orçamento de reserva para devolver R$ 1,58 bilhão para o Ministério da Educação, o que reduziu o tamanho do bloqueio de 7,43 bilhões para 5,85 bilhões.

    Bolsonaro convidou os presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado e do STF para um café da manhã, propondo um pacto de colaboração entre os poderes, o que é uma redundância, já que essa colaboração é a essência do constitucionalismo moderno. Se os presidentes dos poderes da República precisaram firmar um pacto é porque o sistema institucional não está funcionando.

    Na base do pacto está ela, a menina dos olhos, o objeto de desejo do mercado: a reforma da previdência. Bolsonaro prometeu deixar de agir como um insano e começar, finalmente, a governar com alguma responsabilidade institucional. Davi Alcolumbre e Rodrigo Maia se comprometeram a tramitar no prazo curto o projeto, interferindo o mínimo possível no texto original do governo. Dias Toffoli garantiu que o STF vai reconhecer a constitucionalidade da reforma, ainda que ele não conheça o texto definitivo. A principal autoridade do poder Judiciário reconheceu a constitucionalidade de um texto que ainda não existe. A crise é muito grave.

    A mídia corporativa recebeu o acordo com algum ceticismo. Bolsonaro não inspira confiança, mas mesmo assim os barões da comunicação decidiram tentar uma trégua. Nos últimos dias, o tom do noticiário político do Grupo Globo foi mais ameno. A cobertura do 30 de maio foi pálida, com algumas chamadas pontuais ao longo do dia. Algo bem diferente da cobertura entusiasmada que monopolizou a grade da emissora durante todo o dia 15 de maio.

    Fato é que muita coisa aconteceu em 15 dias. Nas crises, o tempo parece passar mais rápido.

    A tentativa de realinhamento entre os poderes, a trégua da mídia corporativa, indícios de que a paciência do mercado com Bolsonaro ainda não terminou, a tomada do protagonismo por parte dos estudantes.

    A realidade desmentiu a propaganda: 30 de maio não foi maior, mas mostrou que a oposição ao governo também conta com uma base social sólida e mobilizada.

    Para 14 de junho está agendada uma greve geral convocada, exclusivamente, para protestar contra a reforma da previdência. Saberemos se, por si só, essa pauta é capaz de mobilizar os trabalhadores brasileiros.

    Será um teste importante para o governo e para a oposição.

     

     

  • CRÔNICA DE 26 DE MAIO

    CRÔNICA DE 26 DE MAIO

    ARTIGO

    Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia, com ilustração de Bagge

     

     

    Domingo, 26 de maio, os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro foram às ruas em diversas cidades, dando continuidade ao ambiente de mobilização social que desde 2013 caracteriza a crise brasileira.

    Existe um conteúdo profundo neste 26 de maio que traduz o atual estágio da crise.

    Os apoiadores do presidente manifestaram um desejo de representação política que tem alma autoritária e inspiração fascista. Mobilizados por uma relação de afeto com o líder, os manifestantes desejam eliminar aquilo que consideram ser os obstáculos institucionais que inviabilizam a plena realização da “verdadeira representação política”.

    Na sensibilidade política dessas pessoas não há espaço para a oposição. Não há espaço sequer para a adesão parcial. Todos aqueles que não aderirem plenamente ao projeto de nação idealizado pelo líder são transformados em inimigos e como tais devem ser tratados. Na guerra, o inimigo deve ser abatido.

    Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional seriam os responsáveis pelas dificuldades enfrentadas por Bolsonaro nestes cinco meses de mandato. Juízes e parlamentares estariam atrapalhando o presidente em sua missão regeneradora. O que está em disputa aqui são os conceitos de democracia e representação política. Os apoiadores de Bolsonaro acreditam que ritos fundamentais para a democracia representativa moderna são, na verdade, potencializadores de corrupção e estão sendo usados para enfraquecer o presidente.

    Pouco importa a legitimidade constitucional dos ministros da Suprema Corte, cuja função é, exatamente, garantir que a legalidade não seja desrespeitada pelos políticos eleitos. Pouco importa a legitimidade eleitoral dos deputados e senadores.

    Para o apoiador orgânico de Jair Bolsonaro, o único representante legítimo é o próprio presidente e qualquer ação institucional que impeça a plena realização de suas ideias é vista como “velha política”, como conspiração dos corruptos.

    Mas como é comum nesse tipo de ocasião, a agenda das ruas é manipulada, o que cria diferenças consideráveis entre os reais propósitos dos manifestantes e o seu eco na mídia corporativa. Todos sabemos que a comunicação social brasileira é monopolizada por empresas que quase sempre representam os interesses do grande capital. Isso é especialmente verdadeiro no caso do grupo Globo, para quem a reforma da previdência é pauta prioritária, com ou sem Bolsonaro.

    Ao longo de todo o dia, a TV Globo se esforçou em esvaziar o conteúdo autoritário das manifestações para transformá-las num ato popular em defesa da reforma da previdência. A ginástica narrativa foi caricata, patética mesmo: imagens distanciadas da multidão, sem repórteres em campo entrevistando manifestantes. Pronto! Basta colocar uma legenda na tela e impor a pauta desejada às ruas. A comunicação social é um dos principais problemas brasileiros.

    O 26 de maio, portanto, traduziu com precisão o conflito que está instaurado na frente ampla que desestabilizou os governos petistas: de um lado, a direita liberal que queria destruir o PT para esvaziar a vocação assistencialista do Estado moderno brasileiro. Estão aqui representados os interesses do capital financeiro nacional e internacional, que precisa de um Estado enxuto, leve e preparado para atuar como avalista da especulação.

    Do outro lado, está a direita fascistoide que foi alimentada pelo colapso do sistema político. A direita fascistoide não quer privatizar, não quer Estado mínimo. A direita fascistoide quer mesmo é Estado total, é o controle do comportamento, das ideias e da cultura.

    A direita fascitoide acordou cedo, se vestiu de verde e amarelo e saiu de casa para defender o presidente. A direita liberal não ficou parada e tentou se apropriar da narrativa, na tentativa de convencer o Congresso Nacional de que a Reforma da Previdência tem apoio popular. A ver se cola.

    O 26 de maio serviu para conheceremos com mais clareza o tamanho da base social orgânica do bolsonarismo. Obviamente, não foi a totalidade dos 57.7 milhões de eleitores de Bolsonaro que se manifestou. Muito longe disso, muito longe mesmo. De todas as manifestações recentes, o 26 de maio foi a de menor expressão numérica, o que não quer dizer que tenha sido irrelevante do ponto de vista político.

    Seria um imperdoável erro de análise (e de estratégia) medir a relevância política da mobilização usando apenas a métrica da quantidade de pessoas que efetivamente foram às ruas.

    E se o decreto de armas já estivesse vigente? Se os apoiadores de Bolsonaro estivessem nas ruas carregando pistolas e fuzis?

    Bolsonaro terminou o dia 26 de maio com um sorriso de canto de boca formado no rosto. Não foi exatamente uma vitória, mas tá longe de ter sido uma derrota. Foi um diagnóstico, uma missão de reconhecimento do terreno.

    Agora, ele sabe perfeitamente que sua base orgânica não é suficiente para governar na democracia. Mas se estiver armada e organizada, será o bastante para sustentar, através da violência e do medo, uma tirania.

     

  • CRÔNICA DE 15 DE MAIO

    CRÔNICA DE 15 DE MAIO

    Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia

     

     

    Escrevo este texto sob os impactos dos movimentos que construíram a greve geral da educação, em 15 de maio. Ações foram organizadas nas principais cidades brasileiras. Participei do ato realizado na região central de Salvador e acompanhei com cuidado o que aconteceu nas outras cidades através de relatos de amigos e da imprensa.

    Novamente, há guerra entre narrativas. A oposição de esquerda diz que a greve geral da educação é o início do fim do governo de Bolsonaro. O outro lado diminui a importância do evento. O presidente Jair Bolsonaro disse que os que estavam nas ruas eram “idiotas úteis manipulados por uma minoria”.

    Como acontece quase sempre, a sobriedade analítica nos convida a tomar o caminho do meio, o que não significa neutralidade. Há uma distância enorme separando a sobriedade da falácia da neutralidade.

    O 15 de maio de 2019 diz muito sobre o atual estágio da crise brasileira. Antes, uma breve contextualização com informações que são óbvias para o leitor do presente. Não serão óbvias para o leitor do futuro. A disputa pela memória já começou. A obviedade sempre é uma questão de localização histórica.

    No início de maio, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, determinou corte de cerca de 30% do orçamento da educação federal. Em um primeiro momento, o argumento era de natureza ideológica: as universidades foram acusadas de serem ineficientes (quando todos os índices dizem o contrário) e de servirem como palco para “balbúrdias” (leia-se, manifestações políticas de oposição ao governo).

    Como não poderia deixar de ser, a comunidade acadêmica reagiu. As mídias digitais foram acionados e as diversas entidades que representam interesses de professores, alunos e funcionários das instituições de ensino federais convocaram a greve geral para o dia 15 de maio.

    As ruas estavam cheias, bastante cheias. Naturalmente, os organizadores apresentam números ambiciosos, talvez inflacionados. De todo modo, foi o principal ato de mobilização desde o “Ele não”, que aconteceu ainda durante as eleições. Pela primeira vez o governo de Bolsonaro foi confrontado nas ruas.

    Dentro das possibilidades e considerando a gravidade da conjuntura, os ventos parecem ser favoráveis aos que estiveram nas ruas. Nem todos os grupos que formam o governo apoiam o ataque de Weintraub ao sistema de ensino federal.

    É que desta vez não se trata da simples redução de recursos, algo que todo o governo, cedo ou tarde, acaba fazendo. Já sabemos bem que em momentos de cobertor curto na economia, a educação é o primeiro setor a ter os pés descobertos.

    O PSDB, com o odiado ministro Paulo Renato (talvez não mais tão odiado assim), impôs dificuldades orçamentárias às universidades federais durante grande parte da década de 1990. Até mesmo Dilma cortou recursos da educação. Alguém aqui não lembra do ajuste fiscal de Joaquim Levy?

    Agora é diferente, muito diferente. O ataque é ideológico, puramente ideológico.

    O ministro está agindo assim porque faz parte de um grupo que se lançou numa guerra cultural contra as universidades. Olavo de Carvalho é o mentor intelectual dessa guerra. Desde os anos 1990, Olavo de Carvalho afirma que as universidades públicas brasileiras estavam tomadas pelo “marxismo cultural”. Agora, o guru da Virgínia acredita que chegou o momento de combater a tal doutrinação marxista.

    Para dinâmica política da crise, pouco importa se esse “marxismo cultural” existe ou não. Importa mesmo o que as pessoas acreditam, suas convicções.

    O núcleo ideológico, contudo, é tão somente um entre os diversos grupos que hoje disputam o governo por dentro. A tendência olavista é hegemônica, sem dúvida, mas não é única, tampouco está voando em céu de brigadeiro. Há adversários internos que não estão apoiando a guerra cultural.

    Nos últimos dias, percebendo a falta da apoio dentro do próprio governo, o ministro Weintraub mudou o discurso e passou a justificar o corte orçamentário com argumentos de natureza técnica: como a crise econômica não arrefeceu, o orçamento definido pelo governo anterior não pode ser cumprido. Se a reforma da previdência for aprovada e a economia apresentar sinais de recuperação, segundo o ministro, a verba contingenciada será liberada.

    A mudança na narrativa é, sim, sinal de recuo, e sugere que o ministro está reconhecendo que a guerra cultural olavista não tem eco em todos os grupos que sustentam o governo.

    O Congresso Nacional demonstrou isso com clareza.

    No dia 14 de maio, na véspera da greve geral, mais de 300 deputados aprovavam a convocação de Weintraub para sessão especial destinada, exatamente, a explicar os cortes na educação. Foi um constrangimento ao ministro e ao governo. Apenas as bancadas do PSL e do Novo tentaram preservar Weintraub.

    PMDB, DEM, PSDB, que são aliados do governo em outras agendas, como, por exemplo, a Reforma da Previdência, não saíram em defesa do ministro da Educação. Se quisessem, poderiam ter evitado a convocação. Não fizeram. Não fizeram porque não quiseram. Tá aí um indício de que a guerra cultural olavista é projeto forte dentro do governo, mas sua força se explica mais pelas convicções ideológicas do presidente do que pela real correlação de forças em Brasília.

    Politicamente, a insistência nessa jornada neomarcartista não é uma boa estratégia para Bolsonaro, isso se ele quiser, de fato, governar. Nada sugere que o presidente irá amenizar o discurso.

    As ruas também não são nada homogêneas. É possível sentir uma tensão no ar, algo que envolve a figura do ex-presidente Lula.

    Parece que se formou o consenso de que a pauta “Lula livre” e o protagonismo do PT agiriam como forças desmobilizadoras. Ora ou outra, alguém gritava um “Lula Livre”, mas a agenda oficial do movimento esteve claramente delimitada: defesa da educação e protesto contra a reforma da previdência.

    Talvez seja mesmo mais prudente agir assim. De fato, Lula e o PT poderiam funcionar como fatores de desmobilização da sociedade civil organizada. O problema é que existe também uma sociedade civil desorganizada formada por uma massa de trabalhadores ultraprecarizados e famintos. Pra essa gente, “aposentadoria”, “desenvolvimento científico” e “inovação tecnológica” não dizem muita coisa. Essas pessoas já não aposentam, pois morrem antes. Essas pessoas não estudam na universidade. São semiletradas.

    Essa é a base social do lulismo.

    Foram essas pessoas que lotaram Monteiro, no interior da Paraíba, em março de 2017, quando Lula inaugurou a obra de transposição do Rio São Francisco. Se tirar Lula da agenda significa não desmobilizar a sociedade civil organizada, significa também não mobilizar a sociedade civil desorganizada. É uma escolha difícil.

    Por enquanto, não dá pra saber o impacto político direto deste 15 de maio. Foi apenas o primeiro ato de um calendário de mobilizações que têm o objetivo de construir a greve geral dos trabalhadores, que está agendada para o dia 14 de junho.

    Mas foi bom participar, muito bom. Serviu, no mínimo, para melhorar o estado de espírito.

     

  • Democracia dá mais um passo rumo à vitória em Belo Horizonte

    Democracia dá mais um passo rumo à vitória em Belo Horizonte

    Em apoio à candidatura de Fernando Haddad e Manuela D’Ávila, que disputam a presidência pelo Partido dos Trabalhadores, milhares de pessoas saíram às ruas por todo o país, e houveram até manifestações internacionais.

    Confira as fotos:

    Foto: Agatha Azevedo | Jornalistas Livres
    Foto: Agatha Azevedo | Jornalistas Livres
    Foto: Agatha Azevedo | Jornalistas Livres
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    Foto: Agatha Azevedo | Jornalistas Livres
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    Foto: Agatha Azevedo | Jornalistas Livres
  • Último grito de alerta: o amor antes do fascismo

    Último grito de alerta: o amor antes do fascismo

    FOTOS: TAMIRES DUTRA

    Se me perguntarem o que é a minha pátria, direi:
    Não sei. De fato, não sei
    Como, por que e quando a minha pátria
    Mas sei que a minha pátria é a luz, o sal e a água
    Que elaboram e liquefazem a minha mágoa
    Em longas lágrimas amargas.

    (Vinícius de Moraes)

    “Aproveite, esta pode ser a sua última manifestação de rua antes do fascismo”. Enquanto eu mantinha as mãos e o olhar concentrados na transmissão de um ao vivo para os Jornalistas Livres, um companheiro sussurrou essa profecia nos meus ouvidos. Com o tom grave dos que compreendem a política pela intuição, ele se foi antes que eu pudesse reconhecê-lo. Num misto de dor e alegria cívica, a festa democrática no espaço histórico de lutas do Largo da Catedral parecia cumprir essa profecia. No pesar de uma tragédia iminente e a esperança fortalecida pelo reencontro nas ruas, o povo celebrou o amor pela Mátria e respirou a liberdade como se fosse pela última vez. As cenas se alternavam entre a confiança na virada, a quase catarse, e a melancolia de quem adivinha a sobrevivência rara da democracia. De um lado, um sorriso de conforto do abraço amigo, do outro, as lágrimas, até o pranto sacudido, de quem teme a despedida do amor.

    No sábado foi o culto ecumênico da infinita diversidade humana, o axé em roda gigante, o cordão colorido de mãos dadas no largo da matriz, recebendo as bênçãos do canto sagrado dos escravos negros. Ondas de paz, de alegria e de esperança vibraram nas praças brasileiras em cada canto do país. No domingo, o peito afrontado de dor, compungido de ofensas, barbarizado pelas ameaças do homem, pela covardia dos que têm o dever de defendê-la. Pelas redes sociais, a Mátria assistiu a reencarnação do ódio mobilizar à distância uma multidão de adoradores da violência na avenida Paulista, em São Paulo, ou na avenida Beira-mar, em Florianópolis.

    Não há dor maior do que a dor pela Pátria. A aflição de ver a vida da Mátria escorrer pelos dedos. É como dormir em pesadelo. É como carregar no peito uma pesada ampulheta de areia, a gritar que o tempo se esvai…  Um imperativo com a ordem de consciência: o que mais você pode fazer pra salvar o seu amigo, o seu parente, o seu vizinho, a sua mátria? É como caminhar com um despertador gritando por dentro: acorda teu povo, antes que seja tarde, acorda, acorda! O que fazer para remover a parede de vidro para que ele ouça os gritos dos irmãos e irmãs que ainda ecoam no calabouço, para que ele ouça o clamor da história, o chamado de amor da democracia? 

    Pedra rio vento casa
    Pranto dia canto alento
    Espaço raiz e água
    Ó minha pátria e meu centro
    Me dói a lua me soluça o mar

    (Sophia de Mello Andresen)

    * * *

    Um mar de gente fez as ruas de Florianópolis a sua praia neste sábado de sol de 26°: 10, 15 mil pessoas no momento de ápice. “Só conhece a derrota aqueles que não lutam, aqueles que desistem”. Fortalecendo a confiança na virada, sem tirar a gravidade histórica do momento, o presidente do Partido dos Trabalhadores, Décio Lima, repetiu as palavras do líder uruguaio Francisco Mujica para acolher a multidão que crescia ao redor do Largo da Catedral e da Praça XV sob o sol do meio-dia. O ato Mulheres Com Haddad Pela Democracia, organizado pelos coletivos feministas com o apoio de vários outros movimentos sociais, formou na Praça uma grande roda da diversidade, com negros, grupos LGBTI, artistas populares, indígenas, mulheres, crianças, idosos, trabalhadores e estudantes de mãos dadas, dando um axé para salvar o país da forte ameaça de retrocesso aos piores tempos do autoritarismo com um candidato de discurso neonazista.

    A presença massiva da juventude estudantil marcou a manifestação, que levantou a bandeira da Ditadura Nunca Mais, da educação pública, dos direitos humanos e trabalhistas, da proteção às riquezas nacionais e ambientais, do verdadeiro patriotismo, enfim. Os jovens empunharam com fervor a defesa da Amazônia e do petróleo. Foi um movimento de quantidade, mas sobretudo de qualidade de vibração.Nas ruas, ninguém esqueceu a denúncia de fraude e lavagem eleitoral pelo caixa 2 da campanha de Bolsonaro: a farsa dos algorítimos pelo Caixa 2 patrocinado por empresários catarinenses envolvidos em inúmeras contravenções, como o bilionário Luciano Hang, dono da Havan, foi escancarada nos cartazes, faixas, refrões. Nove cidades de Santa Catarina realizaram atos contra a ameaça neonazista do candidato que usa Fake News nas redes sociais para disseminar o ódio, a mentira e roubar a democracia e as riquezas nacionais: Florianópolis, Balneário Camboriú, Blumenau, Joinville, Jaraguá do Sul, Itajaí, Criciúma, Araranguá e Caçador.

     

    A concentração iniciou às 10 horas, com apresentação de esquetes teatrais, bandas musicais, e ritmos africanos, discursos emocionados se alternando no palco em frente a Praça XV e animando o grito do Ele Não. Já eram 15 horas quando o último grito pela democracia culminou com uma marcha gigantesca, alegre, pacífica e colorida pelas avenidas Paulo Fontes, Hercílio Luz, Mauro Ramos e Praça Tancredo Neves. O som dos tambores de maracatu e dos grupos de cultura popular ecoou pela cidade, fazendo redobrar o ânimo pela virada. Mas o coração de cada militante da democracia alimentava a certeza de que diante da derrota ou da vitória, não poderão mais deixar as ruas. Elas, e não as galerias virtuais, serão o espaço de reconstrução da vida política brasileira nos próximos anos.

     

  • Estado de Exceção avança com condenação de 23 manifestantes no Rio

    Estado de Exceção avança com condenação de 23 manifestantes no Rio

    Por Vinicius Souza e Maria Eugênia Sá, da www.mediaquatro.com, para os Jornalistas Livres

    O juiz federal Flavio Itabaiana condenou em primeira instância a penas entre 5 e 7 anos de regime fechado, 23 pessoas que participaram de manifestações entre 2013 e 2014. Entre eles não está nenhum apoiador do regime militar, ninguém que fez apologia a torturadores, nenhum político que votou pelo impeachment contra a corrupção ou flagrado combinando propinas e assassinato de parentes.

    Manifestantes pedem a volta da ditadura na reedição da Marcha com Deus e a Família. 15/03/2014. Foto: www.mediaquatro.com

    Mas há estudantes, professores, profissionais liberais, pessoas que tiveram a vida destruída por uma imagem de “black bloc” construída pela imprensa e até uma advogada que adotou um jovem durante esse processo. Há também dois jovens que estouraram um rojão numa manifestação matando um jornalista, mas que respondem a esse crime em outro processo e obviamente foram colocados nesse processo para qualificar todos como “quadrilha armada”, quando de fato nem se conheciam.

    Black Blocs pixam fachada da Rede Globo em São Paulo. Junho de 2013. foto: www.mediaquatro.com

    Entre junho de 2013 (veja aqui uma cronologia das principais manifestações daquele mês) e o agosto de 2014, milhões de jovens e nem tanto foram às ruas lutar, primeiro, por transportes dignos e, depois, por mais direitos, melhor educação, saúde, segurança pública, etc. As reivindicações iniciais eram TODAS de esquerda. 

    Até o dia 13 de junho de 2013, a pauta única das manifestações era a diminuição das tarifas do transporte público e, invariavelmente, reprimidas com força excessiva pela PM. Avenida Paulista 13/06/2013. Foto: www.mediaquatro.com

    Mas a direita, hábil e com apoio monumental da mídia hegemônica, transformou as manifestações em uma luta contra uma corrupção vaga que seria responsabilidade exclusiva da esquerda e especialmente do PT. Não faltaram declarações de que bastava tirar o PT do poder e voltaríamos ao paraíso da moralidade.

    Em 17 de junho de 2013, a maior manifestação em décadas, mudou a pauta das reivindicações. Foto www.mediaquatro.com
    A falta de senso de ridículo e pautas de direita como a redução nos impostos (o que inviabiliza as políticas públicas de educação e saúde, por exemplo) ganham as ruas. 17/06/2013. Foto: www.mediaquatro.com

    Muitos petistas e aliados, por sua vez, passaram a ver nas manifestações uma luta contra o governo e não foram poucos os que apoiaram a repressão que, já em 2014 mas principalmente a partir de 2015, iria recair exatamente sobre as manifestações de corte à esquerda, enquanto as “sem partido”, as que exaltavam a ditadura militar etc passavam a ter selfies com a polícia ao invés de cassetetes e gás lacrimogêneo.

    Manifestação pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Av. Paulista 13/04/2015

    Com a efetivação do golpe em 2016, a direita sumiu das ruas e a esquerda foi massacrada em atos como os contrários à PEC do Teto dos Gastos (veja aqui e aqui ).


    Dezenas de feridos pela PM tiveram de ser carregados pelos manifestantes para longe das bombas de gás e cassetetes. Brasília, dezembro 2016. Foto: www.mediaquatro.com
    Poucos resistiram até o fim, quando o mesmo número de deputados que derrubaram a Presidenta eleita aprovaram a PEC do Teto dos Gastos . Brasília, dezembro 2016. Foto: www.mediaquatro.com

    Se ainda se faz necessária a autocrítica da esquerda sobre o governo de uma ex-guerrilheira que aprovou uma lei antiterrorismo num país sem terrorismo dentro de uma política de conciliação que nasce na campanha de Lula em 2002, também é fundamental repudiar a destruição do Estado de Direito. Aceitar a sentença surreal do juiz Itabaiana (disponível aqui ) é aceitar o Estado de Exceção que permitiu a prisão até hoje de Rafael Braga por portar desinfetante. E também a prisão de Lula por “ato de ofício indeterminado”. Aceitar essa condenação é permitir que QUALQUER UM DE NÓS seja o próximo preso político do Brasil.

    Para alguns dos condenados, aliás, o pronunciamento da sentença nesse momento é um recado das forças conservadoras para que não se faça novas manifestações políticas às vésperas das eleições como, por exemplo, pela libertação do ex-presidente Lula e sua possibilidade de concorrer a um novo mandato. Por isso, 12 dos 23 condenados por Itabaiana divulgaram hoje uma Nota de Repúdio e Chamamento à Luta contra quem pretende criminalizar as manifestações populares e reinstalar a censura no país e encher novamente as prisões de presos políticos.

    #EstadoDeExceção

    #EuApoioOs23

    #NãoÀsPrisõesPolíticas

     

    Liberdade para Lula. Liberdade para Rafael. Liberdade para os 23!

    NOTAS DOS ATIVISTAS CONDENADOS POR CONTA DAS MANIFESTAÇÕES DE 2013/2014