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  • Direita ❤ PM

    Direita ❤ PM

     

    Na semana da chacina que matou 18 em Osasco, PMs são homenageados como heróis na Paulista

    A manifestação realizada ontem (16/8) na avenida Paulista e convocada por organizações que fazem oposição ao governo Dilma foi, segundo o Datafolha, menor do que a realizada em 15 de março. 120 mil ante as 210 mil de cinco meses atrás. Mas não deveu nada na acidez neofascista que ajudou a estimular. A exaltação ao trabalho da Polícia Militar, por exemplo, foi mais uma vez reafirmada.

    Foto: Ennio Brauns

    Do carro som, movimentos como “Vem Pra Rua”, “Endireita Brasil” e “Movimento Brasil Livre” repetiam a euforia de sempre. De hora em hora, agradeciam a PM e em seguida destilavam seus ódios. “Só quem tem medo de polícia é bandido”, afirmavam.

    Foto: Eder Tesio

    Por volta das 15h, o secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, Alexandre de Moraes, surgiu em frente ao MASP, escoltado por policiais da Tropa de Choque, e deu margem para que a histeria se espalhasse entre os presentes. O secretário dirigiu-se até o “Guardião”, modelo paulista do caveirão do Bope do Rio de Janeiro, estacionado na rua Peixoto Gomide ao lado do Parque Trianon, cumprimentou os soldados que lá estavam e inaugurou a série de fotos com PMs na condição de modelos.

    Um dos que tirou vários “selfies” na frente do “Guardião” foi o empresário Luis Fernando Saad, 48 anos, e morador do bairro Cidade Jardim. “A polícia tem um lado muito bom e outro nem tanto, que é causado pela falta de investimentos.”

    Acompanhado da esposa, o engenheiro Luis Carlos Gomes, 72 anos, residente de Moema, foi fotografado ao lado dos policiais que estavam de prontidão ao lado do veículo fabricado em Israel. “Avalio o trabalho da PM como muito bom.”

    Chacina

    Nem mesmo a chacina ocorrida na última quinta-feira (13/8) em Osasco e Barueri, que vitimou 18 pessoas, constrangeu os presentes, apesar de os principais suspeitos serem policiais integrantes de grupos de extermínio. “Essa situação [chacina] foi pontual”, diminui Patricia Herreira, 39, turismóloga que mora no bairro Pacaembu.

    Durante o ato do dia 17 de agosto na Av Paulista, integrantes da rede de Jornalistas Livres realizaram uma performance contra a violência da chacina recente — Foto: Mídia NINJA

    Morador da Bela Vista, o analista de sistemas André Schaumburg, 40 anos, foi além. “Isso deve ter revanchismo de bandido no meio. As pessoas não respeitam mais a polícia. O Brasil virou um país sem lei.”

    Sábado (15/8), as vítimas da chacina foram enterradas. No velório, familiares mostraram indignação. Segundo eles, seus parentes que foram assassinados não tinham ligação com o tráfico organizado. Mas mesmo que tivessem antecedentes criminais, não é assim que se combate a criminalidade.

    Violência policial!

    Em relatório divulgado em janeiro deste ano, a organização internacional Human Rights Watch confronta a opinião de Patricia. Segundo o estudo, a violência policial em São Paulo cresceu, em 2014, 93% com relação ao ano anterior.

    Essa realidade não é particularidade dos paulistas. A ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública apurou 2.220 mortes vítimas de operações policiais em 2013.

    No livro “Rota 66 — A História da Polícia que mata”, o jornalista Caco Barcelos levanta inúmeras ocorrências de mortes nas periferias da cidade de São Paulo protagonizada pela PM.

    Desmilitarização da polícia

    A mesma avenida Paulista que domingo (16/8) serviu de cenário para declarações desse porte, foi palco, em 13 de junho de 2013, de violentas repressões policiais contra os manifestantes que repudiavam o aumento da tarifa do transporte público, no metrô e nos ônibus. Dali em diante, as manifestações cresceriam vertiginosamente, receberiam o status das maiores já realizadas no Brasil e ganhariam o país todo.

    Foto: Mídia NINJA

    Além do tamanho, as chamadas “Jornadas de Junho” reposicionariam alguns temas debatidos pela sociedade. Um dos principais foi a desmilitarização da polícia, que parte do diagnóstico de que o modus operandi da PM precisa ser alterado.

    A pauta também entrou como recomendação do relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Entre as 29 recomendações que apontam indicativos para aprofundar a democracia no país, a CNV contempla a desmilitarização da polícia como um dos fundamentais.

    Luis Fernando Saad, que diz ser “um primo distante” dos dirigentes da Band, ignora essas questões. “Discordo. Sou a favor de duas polícias. A PM, assim como a educação militar, é necessária”, afirmou.

    O ex-PM e servidor do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) Nelson Augusto Leite, 40 anos, residente do bairro Santa Cecília, assistiu às filhas fotografarem-se com policiais e emendou: “O papel da polícia é reprimir. Quem educa é a escola”, resumiu.

    Guardião

    O cenário das fotos com policiais militares na rua Peixoto Gomide, do lado oposto ao MASP, é a demonstração de que algumas pautas destacadas a partir de junho 2013, como a desmilitarização da polícia, recuaram desde lá.

    Entregue à Tropa de Choque da PM paulista no dia 1 de julho, o “Guardião” é um veículo com a mesma finalidade dos “caveirões” do BOPE no Rio de Janeiro. Tem, no entanto, capacidade para receber o dobro da sua versão carioca: 24 homens. Uma tropa inteira.

    Foto: Felipe Iszlaji

    Fabricado pela empresa israelense Plasan Security Solutions, outras cinco unidades foram entregues pelo governador Geraldo Alckmin. Cada uma custou R$ 3,675 milhões e tem blindagem de nível 4, capaz de segurar tiros de fuzil e explosivos. Mede 1,8 metros de altura, possibilita atirar de dentro para fora, possui torre com visão de 360 graus e dispara jatos d´água, tinta e gás lacrimogêneo. Objetivo: contenção de motins.

    Após a semana em que foi aprovado o texto-base do projeto de Lei 2016/15, que trata do antiterrorismo e inclui manifestações populares como um de seus objetos, já se pode imaginar como o “Guardião” vai ser utilizado. Sua primeira exibição pública, no domingo, só serviu de ilustração.

    Foto: Roberton Setton

     

  • Revoltada e paulista com muito orgulho

     

    Por volta de meio-dia de domingo (16/8), na esquina da avenida Paulista com a rua Peixoto Gomide, Tânia parecia incomodada com a adesão abaixo da esperada, no protesto contra Dilma e o PT. “Não vai dar, assim não vai ter impeachment”, reclamava.

    Foi quando perguntamos a ela: qual a saída, então?

    Vejam a resposta de Tânia, aposentada, que se define como “uma revoltada” e “paulista, com muito orgulho”…

     

  • Com Aécio, cerca de 10 mil pessoas rejeitam vitória de Dilma

    Com Aécio, cerca de 10 mil pessoas rejeitam vitória de Dilma

    Em BH, haviam pedidos de impeachment, desabafos contra a corrupção e saudações ao regime militar

    O grito que mais ecoou neste domingo foi: Fora PT!
    O Lula, considerado pelos manifestantes o principal “chefe da quadrilha”, teve o nome muito pronunciado.

    Tinha de tudo. As pessoas, em sua maioria vestidas de verde e amarelo, empunhavam cartazes contra a corrupção, contra Dilma e Lula, e principalmente contra uma suposta fraude nas eleições de 2014. Com várias menções à Jesus Cristo, ouvia-se “eu digo, se a voz do povo é a voz de Deus, deus quer: caia fora, Dilma”…

    Como é típico nessas manifestações, havia também os que pediam pela Intervenção Militar. Com camisa do Exército, um grupo ia andando em meio aos manifestantes entregando um panfleto “informativo”. Segundo eles, não há possibilidade de um impeachment da presidente, e que por isso, é preciso uma intervenção constitucional militar para tirar todos do poder, fazendo uma “faxina”. De acordo com a PM, 10 mil pessoas estavam no protesto. Já os movimentos, como a Aliança dos Movimentos Democráticos, estimaram a presença de pelo menos 20 mil.

    O ato começou tímido na Praça da Liberdade, região centro-sul da capital mineira, às 10 horas. Mas por volta do meio dia, o local ficou cheio. Bem na hora que o senador e ex presidenciável, Aécio Neves, se pronunciava, de forma rápida, no palanque do MBL: “Como cidadão brasileiro, vim participar desse movimento extraordinário. Estou indignado com a corrupção, com a mentira, com a incompetência desse governo, que vem fazendo tão mal aos brasileiros”.

    O Hino Nacional foi tocado em muitos momentos nos quatro trio elétricos estacionados ao redor da praça, assim como várias músicas contra Dilma, Lula e PT.

    A sensação que se tinha, ao conversar com os manifestantes, é que eles acreditam que o único problema da corrupção no Brasil é o Partido dos Trabalhadores. Um cartaz tímido contra Eduardo Cunha, e outras opiniões menos radicais contra pedidos de intervenção militar, ecoavam no mesmo ato.

    Líderes de movimentos, como o Movimento Brasil Livre e o Vem pra rua, se revezavam ao microfone. A certa altura, pensou-se que um deles chamaria a população para lotar as casas legislativas, mas ele completou com “lotar as caixas de e-mail dos deputados”.

    À uma da tarde, o movimento saiu da Praça da Liberdade em direção à Praça da Savassi. Nem todos que estavam na concentração caminharam. Por volta de duas horas, o movimento perdeu força e os manifestantes se dispersaram.

    Foto: Jornalistas Livres
  • Golpistas levam menos gente para manifestações: Lula vira alvo nas ruas e na tela da Globo – exported from Medium

    Golpistas levam menos gente para manifestações: Lula vira alvo nas ruas e na tela da Globo – exported from Medium

     

    Repete-se a tática de março: manifestações, mesmo esvaziadas, Brasil afora servem como “esquenta” para o ato em São Paulo na parte da tarde. Mas nem os takes fechados são capazes de disfarçar que os protestos são pífios

    As primeiras cenas, ainda de manhã, provocam desânimo entre âncoras e repórteres da Globo. No intervalo do programa esportivo, perto de 10 horas da manhã, entra o link de Brasilia: “são 500 pessoas na Esplanada dos Ministérios…”, diz o repórter. A imagem mostra um imenso vazio. Claro que logo começa um incrível atropelo de números: 2 mil, 5 mil, logo 25 mil pessoas. E segue a imagem do vazio.

    De repente, na transmissão de Brasília, o áudio da Globo falha, a câmera treme, e do estúdio o apresentador tenta salvar a situação: chama agora imagens de Belém (PA), e ali parece haver mais gente. A Globo trabalha com takes fechados durante toda a manhã. Repete-se a tática de março: manifestações, mesmo esvaziadas, Brasil afora servem como “esquenta” para o ato em São Paulo na parte da tarde.

    Em Salvador, o take mais aberto derruba a estratégia da Globo: pouca gente na rua

    Mas nem os takes fechados são capazes de disfarçar que em Belo Horizonte, Maceió, Salvador e no Recife os protestos são pífios. No Rio, há mais gente na praia do que no asfalto de Copacabana — onde se repete o discurso de ódio e os apelos por intervenção militar.

    Logo fica claro que a decisão da Globo de poupar Dilma e o governo, para evitar o desarranjo da economia, não significa recuo nos ataques a Lula e ao PT.

    No Recife, o cinegrafista da Globo passeia pela manifestação, e encontra cartazes pedindo a prisão de Lula. O enquadramento muda rápido para um plano mais geral (o profissional deve ter achado que aquilo estava demais). Mas a câmera logo volta aos cartazes, agora em take bem fechado: Lula atrás das grades.

    A impressão foi de que alguém deu a instrução, pelo “ponto”: foca no barbudo.

    Logo depois, Alex Escobar (narrador esportivo medíocre) tenta “narrar” a manifestação de Belém. Ele lê para o telespectador uma faixa agressiva contra Lula e Dilma. E conclui: “um claro protesto contra a corrupção.”

    Não, caro Alex: o protesto não é contra a corrupção. Mas contra o PT. Se fosse contra a corrupção, Aécio não teria se sentido tão à vontade para desfilar no também esvaziado ato de BH. E Cunha não teria sido poupado. Aliás, uma faixa aberta em BH chegava a afirmar (em lapso freudiano): “somos milhões de Cunhas”. Aí, tudo ficou mais claro.

    Cunha poupado. E todo ódio centrado em outro personagem: Lula, Lula, Lula. Esse era o nome. Era isso que importava.

    Se esse dia de manifestações mais fracas por todo o país teve um toque diferente foi o fato de Lula ter sido transformado em alvo central. Tanto nas ruas quanto nos comentários de quem estava no estúdio.

    Outro exemplo: a equipe da Globo mostra manifestação de apoio ao ex-presidente, em frente ao Instituto Lula em São Paulo. Manifestantes gritam: “mexeu com Lula, mexeu comigo”. Cristiana Lobo, no estúdio, comenta: “é… mas a sociedade vai querer mexer sim com o Lula.”

    Hum… Qual sociedade, Cristiana? Ela procura falar em nome da sociedade. Mas fala mesmo em nome dos patrões.

    Nada, na Globo, se faz sem a decisão tomada nas reuniões do “comitê” (que reúne João Roberto Marinho e os dirigentes dos principais veículos da família: jornais, TV, rádio, internet). Cristiana Lobo se traiu no ar: a decisão é levar Lula para o canto do ringue. E depois, se possível, para a cadeia. Com ou sem provas. A decisão já está tomada. Isso está claro.

    Este blogueiro passou no fim da tarde pela manifestação petista em frente ao Instituto Lula, e ouviu exatamente essa análise de duas pessoas próximas ao ex-presidente: “a Globo não vai aliviar para o Lula, vai partir pra cima. Temos informações claras sobre isso.”

    – Guerra de Imagens–

    Um boneco de Lula, com roupa de presidiário e marcado com o número 13, foi o principal “fato” do dia na guerra de imagens. A figura apareceu no esvaziado protesto de Brasília. E deve povoar as capas de jornais nesta segunda-feira.

    O Lula “presidiário” cumpre a clara tarefa de dar fôlego à narrativa de que a prisão do ex-presidente é algo desejável e “natural”.

    As manifestações do dia 16 tiveram mais uma vez cartazes absurdos, com pedido de golpe e intervenção militar. Em quase todo o país, o número de participantes foi muito inferior ao que se viu em março. Em São Paulo, também, menos gente foi às ruas; mas a queda não foi tão grande. E de toda forma mais de 100 mil pessoas estiveram na Paulista — segundo o “DataFolha”.

    Este blogueiro passou por lá, conversou com muita gente, e pode dizer que a maioria absoluta era formada por anti-petistas raivosos. Gente que sempre detestou Lula e o PT, e agora se sente mais à vontade pra manifestar esse ódio. O povão que votou em Dilma, e está ressabiado com o governo, este não foi pra rua — de novo.

    – Aécio derrotado –

    Mãos ao alto: Aécio saudado em BH, pelos manifestantes do protesto “apartidário”

    As manifestações terminam também com um claro derrotado: Aécio Neves. Ele precisava de um “estouro da boiada” nas ruas, para pressionar Globo e grandes empresários a centrar fogo em Dilma, e “bombar” de novo o impeachment. Com menos gente na rua do que em março, o delírio golpista de Aécio fica inviabilizado.

    Parece ganhar força no PSDB a ala mais moderada, que aposta em manter Dilma cambaleando no governo, ao mesmo tempo em que se sangra a figura pública de Lula — ara evitar sustos em 2018.

    Ninguém deve se enganar: o tom da cobertura na Globo mostra que Lula agora é o alvo central.

    As condições para uma eventual prisão do ex-presidente não estão dadas. Juridicamente, não há nada concreto contra ele. Mas o jogo começou.

    – A narrativa midiática –

    A essa altura, o que se procura é construir uma narrativa midiática que permita — ainda que com indícios absolutamente frágeis — submeter Lula a um constrangimento absoluto, sob a condução do juiz Sergio Moro na Lava-Jato.

    Ninguém deve ter dúvidas: Moro vai tentar. Ninguém deve ter dúvidas: a operação já começou. E ninguém deve ter dúvidas: a operação de caça a Lula conta com apoio decidido dos principais meios de comunicação do país, especialmente a Globo.

    Dilma ganhou tempo pra respirar (sobre isso, clique aqui para ler o texto de Renato Rovai). E Lula ganhou a certeza de que é o alvo da operação jurídico-midiática que tenta, já em 2015, antecipar o resultado e liquidar a fatura da eleição de 2018.

     

  • Em Curitiba, gritos e selfies

    Em Curitiba, gritos e selfies

     

    Foto: Isabella Lanave/ R.U.A Foto Coletivo

    “Junta aqui na frente que precisamos tirar uma foto histórica”, disse um dos locutores no microfone. Ele queria que as três bandeiras — a do Brasil, do Paraná e a Viva Lava Jato — estivessem juntas em frente ao prédio histórico da Universidade Federal do Paraná, a primeira do Brasil. Dito e feito. A foto diz muito sobre o protesto deste domingo ensolarado em Curitiba.

    Cinquenta mil pessoas foram às ruas, segundo o Coronel Rocha, da Polícia Militar do Paraná.

    Um pouco mais tarde, os organizadores da caminhada falaram em 60 mil pessoas. A maioria portando verde, amarelo, um celular e o grito na garganta.

    Foto: Isabella Lanave/R.U.A Foto Coletivo

    Na concentração, pouco antes das 14h, na Praça Santos Andrade, 20 mil pessoas escutaram os locutores. Olavo de Carvalho foi saudado aos gritos e com uma música-paródia. A Polícia Federal foi elevada ao patamar dos justiceiros. A Polícia Militar foi aplaudida. “Nesse protesto não há e nem haverá confusão por que as pessoas são do bem”, disse um dos locutores. Eles são homens, em sua maioria brancos, enérgicos e que usam camisetas com dizeres conservadores ou de indignação, como o tradicional Fora Dilma. Em três caminhões, discursaram sobre Sérgio Moro (amado), Gilmar Mendes (adorado) e Dias Tóffoli (odiado). Sobre o Foro de São Paulo (“uma invenção comunista do Lula e do Fidel Castro”). Apresentaram uma versão do ex-presidente preso. Diferente dos bonecos do Lula das outras capitais, em Curitiba ele foi um homem com uma camiseta listrada em preto e branco e uma máscara. “Vocês querem o Lula preso, vamos prender ele hoje!”. Rolaram piadas com José Dirceu e diversas críticas à imprensa (em especial a Rede Globo e os contratados Marieta Severo e Jô Soares). Gustavo Fruet, prefeito da capital, também teve seu nome apontado em críticas: “está enchendo a prefeitura de Curitiba de petistas, estamos de olho”. Em suma, gritaram contra tudo e todos. Muitos com apitos que eram vendidos a 2 cada. “Posso fazer 3 por 5”, me disse um vendedor. Muitos deles portavam camisetas com as cores do protesto. Brasileiro se adapta em qualquer ambiente para melhorar o negócio. E das 12h às 17h, durante a movimentação bruta por algumas quadras da capital, foram muitas selfies. “Precisamos fazer essas fotos correrem o mundo”, disseram. Talvez isso explique algumas frases como No Comunism e Stay Alert For What Is Coming.

    Foto: Isabella Lanave/R.U.A Foto Coletivo

    Os locutores e os protestantes falam mais ou menos a mesma língua. Gritam Fora Dilma, Fora PT e Fora Lula sem parar. Pulam, vaiam, aplaudem, cantam o hino nacional. Estão descontentes de maneira geral e não se importam em contestar tudo. Falam da crise política, econômica e social. Nessa última, julgam haver um componente comunista, tanto na educação básica como na aproximação do Governo Federal a governos como Venezuela e Cuba. Eles gritam “nossa arma é a Constituição Federal” e pedem impeachment pra ontem. Alguns são mais comedidos e falam de descontentamento de uma maneira geral. Uma tristeza acumulada pelos erros gravíssimos da administração federal. Alguns pedem intervenção militar e o Sul É Meu País. Mas esses só querem 30 segundos de fama e usam o protesto como vitrine. Nada que tumultuasse a atuação dos 800 policiais que participaram da operação, segundo o Major Breunig, da PM do Paraná.

    Stefan Czaplinski, 54 anos, estudante de Ciência Política, portava um cartaz “Não votei em Dilma, a culpa não foi minha” e pedia novas eleições. “A eleição é como se fosse um contrato. Eu votei em determinado candidato e tenho que ficar de olho. É como se fosse um produto. Se desse defeito, eu iria reclamar. Com o governo federal deveria ser a mesma coisa. Deveríamos fazer uma eleição pra já e mudar o panorama. Esse novo governante ficaria condicionado à vontade da população e não faria mais besteira. Se fizesse iria cair também”.

    Foto: Isabella Lanave/R.U.A Foto Coletivo

    Helmuth Fast, 65 anos, aposentado, foi protestar contra a ideologia comunista. “O que mais me incomoda é a ideologia passada por eles (o PT) em tudo. A ideologia se infiltrou, nos escraviza, imbeciliza e é perversa em todos os sentidos. Abaixo o comunismo”. Mais cedo conversei com José Ferreira, empregado da construção civil. Ele não foi ao protesto, mas estava na praça nos momentos que antecederam a caminhada. Ele votou em Aécio Neves no primeiro turno e em Dilma Rousseff no segundo, acreditando que ela “mudaria alguma coisa”. “Pagamos muitos impostos e eles roubam muito da gente. Apoio o protesto. A gente é enganado”. Ele saiu pouco antes dos gritos começarem e não tirou foto. Tampouco deve ter chegado em casa feliz com o momento do país. São maneiras de protestar. Em silêncio ou com os amigos.

    Outra estrela do movimento deste domingo foi uma ação do Ministério Público Federal por meio de assinaturas. Os protestantes foram conclamados a assinar e apoiar dez medidas contra a corrupção, sem qualquer vinculação política-partidária. Pela legislação, as assinaturas para os projetos de lei de iniciativa popular devem ser encaminhadas fisicamente, não por meio digital. Entre as medidas estão a criminalização do enriquecimento ilícito de agentes públicos, reforma no sistema de prescrição penal, ajustes nas nulidades das penas, eficiência dos recursos no processo penal, entre outros. O projeto está disponível em http://www.combateacorrupcao.mpf.mp.br/10-medidas.

    Foto: Juliana Vilela Araujo

    Enquanto isso um carro de som repetia: “Nosso dever é defender o país, que se apresenta doente. Com uma doença gravíssima. O problema é o Lula. O vírus que assola o nosso país. Essa presidente quer transformar o país em um local de miséria, ignorância. Controlar a massa ignorante é muito mais fácil. Isso nós não podemos deixar. Vamos fazer com que o nosso país retome o rumo novamente. Esse governo está colocando nosso país num abismo. Não podemos deixar. O nosso dever é tirar esses tiranos, esses ditadores do poder. Os verdadeiros trabalhadores do Brasil estão sendo desviados pra fora da pátria para que sejam empregados em outros países. Em detrimento, nós temos dificuldade. Os trabalhadores estão sendo enganados. Governo da mentira, da corrupção, da falta total de credibilidade. São incapazes de fazer o bem e desviam o dinheiro para outros países”.

    “E é isso que vocês precisam explicar para os porteiros dos prédios, empregados, funcionários de condomínio, faxineiras, operários. Que um milhão de pessoas ajudaram a pagar o metrô de Caracas, na Venezuela, e isso não podemos permitir”. Essa frase foi repetida algumas vezes. Junto com Fora Dilma, Fora PT, Salve Sergio Moro e o apoio de uma massa com ideias conservadoras bem firmes. O protesto foi uma clara e legítima manifestação de insatisfação geral. Pesada por palavras de muito ódio. Mas essa parte o José Ferreira não ouviu. Ele até brincou que tem o mesmo nome do José Dirceu, mas que é honesto. Seu protesto não precisou de uma explosão de raiva. Essa explosão saiu das ruas de 25 estados e do Distrito Federal. E é um recado por mudança. Cada qual com a sua.

    Foto: Isabella Lanave/R.U.A Foto Coletivo

     

  • ‘O PT no poder surpreendeu e decepcionou, condenou corruptos e se corrompeu, acertou e errou’

    ‘O PT no poder surpreendeu e decepcionou, condenou corruptos e se corrompeu, acertou e errou’

     

    Desde pelo menos o início da década de oitenta, milhões no Brasil sonhavam com a democracia que já acenava no horizonte de um governo civil-militar que dava seus últimos suspiros.

    A luta de muitos cujas vidas foram devassadas, atormentadas e destruídas enquanto lutavam contra o golpe de 64 e, depois, pela conquista da democracia no Brasil, foram e são testemunho dessa transição lenta e inconclusa que germinou esperanças, provocou canções, espetáculos de teatro, obras de arte, deu guarida à indignação de trabalhadores, incitou , intelectuais e acadêmicos a saírem de suas cadeiras e gabinetes, instruiu políticos a defenderem uma pauta republicana e amadureceu estudantes.

    Uma nova ética foi inaugurada no Brasil, que muitos ainda chamam de princípios da esquerda. Nessa pauta se incluem principalmente o combate sem tréguas às iniquidades que fundam a nação brasileira e, mais tarde, a luta pelo alinhamento entre o estado democrático de direito e os direitos humanos no país.

    Iludidos ou não, muitos que engrossaram tais fileiras plantavam no Partido dos Trabalhadores as melhores esperanças e talvez –secretamente — a revolução tão aguardada, que ocorreria por vias institucionais e eleições livres e justas.

    Ato Periferia com Dilma nas eleições de 2014 em São Paulo — Foto: Mídia NINJA

    Mais de 12 anos depois das primeiras eleições presidenciais, o Partido dos Trabalhadores chegaria ao poder, e essa foi uma conquista de parte da sociedade brasileira e dos muitos que lutavam e lutam por um Brasil republicano.

    O PT no poder surpreendeu e decepcionou, foi corajoso e covarde, foi republicano e autoritário, condenou corruptos e se corrompeu, acertou e errou.

    A despeito do que pesa mais na balança nesse momento e destacado pelas análises sérias desse período — que hoje são a minoria sobre esses últimos quase 13 anos — o PT foi e é um partido que hoje se encontra no poder há mais de 12 anos, e que desde 2002 vem sendo reconduzido ao Planalto, sucessivamente, pelo cidadão que compareceu às urnas a cada nova eleição. Dessa trajetória, o que podemos afirmar é que o PT soube esperar.

    Soube aguardar a democracia, soube aguardar as eleições. Soube perder para Collor de Melo em 1989, para Fernando Henrique em 1994 e 1998 e se preparou para as eleições nos anos vindouros e venceu. O PT — com todos os seus erros e problemas que são muitos — ,e cortando na própria carne, é o governo que mais apurou (e permitiu apurar) irregularidades, mazelas e corrupções de toda espécie, incluindo as de pessoas importantes do empresariado, da classe política e de seu próprio partido e governo. Jamais se viu tantas figuras ilustres das elites financeiras e políticas no banco dos réus, investigadas e sob suspeita.

    Como efeito e decorrência disso, os poderes judiciário e legislativo autônomos permitem uma das oposições mais críticas e francamente opositoras ao governo da história do país e tais lideranças dos poderes instituídos trabalham, para o bem e para o mal,segundo o regimento atual das câmaras legislativas.

    Os atuais líderes da câmara e do senado foram, também eles, duas vezes eleitos, primeiro pelos cidadãos brasileiros e, depois, para assumirem as respectivas presidências da câmara e do senado, pelos seus pares, igualmente eleitos pelo voto popular e, enquanto cumprirem o regimento e o decoro, será difícil acusá-los de irregularidades do ponto de vista do exercício de suas funções.

    Entretanto, nesse embate e nessa crise política que se aprofunda, mas que historicamente sempre existiu no país, há uma verdade inconteste que precisa ser repetida, alertada, denunciada: há hoje no Brasil um golpe de Estado a caminho. Um golpe que inclui e é efeito das oligárquicas concessões de rádio e TV — que o governo foi incapaz de apurar e redistribuir de forma mais representativa e equânime — e das negociações políticas e fraturas ideológicas às quais o Partido dos Trabalhadores muito rapidamente cedeu, estabelecendo ligações partidárias com o principal objetivo de se preservar no poder.

    Às tendências hegemônicas do PT parece nunca ter ocorrido que a fidelidade às suas bases é o que o levou e o levaria ao poder novamente, quantas vezes fosse possível e necessário, desde que o partido tivesse o que dizer e a quem convencer, e desde que tivesse quem se dispusesse a fazer isso (seus militantes e simpatizantes) em nome das bandeiras que historicamente carregava.

    O PT envergonhou o que no Brasil denominamos de princípios fundamentais e inegociáveis das esquerdas, aqueles que orientam na luta contra a assimetria de poder político e econômico no Brasil — e hoje, quem diria, o PT tem receio das manifestações de rua; seja por ser hostilizado por elas, seja por temer o risco de ver seu apoio muito reduzido e alquebrado.

    Militantes são expulsos de manifestação por portarem bandeiras partidárias na Avenida Paulista. A tentativa de entrada dos partidos tradicionais de esquerda nos protestos ficou conhecida como “Onda Vermelha” — Foto: Mídia NINJA

    O partido então enfrenta a sua mais importante crise, desde sua fundação, e deve enfrentá-la com dignidade.

    Mas o que o PT, seus eleitores do passado e do presente, e todos os partido se cidadãos que se auto denominam democráticos ou republicanos não podem aceitar é o golpismo,que pretende a alternância de poder à força e sem sustentação e que quer arrancar do poder executivo um partido que chegou a ele respeitando todos os preceitos da democracia representativa, persuadindo eleitores, e não por efeito de conflitos armados ou de pressões por renúncia ou impeachment sem circunstância e fundamento.

    Impeachment e renúncia não podem ser nem pleiteados e nem reivindicados a não ser implodindo a jovem democracia brasileira que mal chega aos seu 30 anos.

    Para as ruas devem ir agora e depois não apenas os petistas e os apoiadores do PT, hoje em menor número do que no passado, mas todos aqueles que lutaram para que partidos nascidos na democracia chegassem ao poder; porque democracia significa também a maturidade de aceitar a derrota e se preparar para novos pleitos.

    Sem isso os regimes não passam de pseudo democracias, simulacros de falso republicanismo. E é evidente que diante do golpismo que se articula e organiza, o país necessitará da mesma energia e as mesmas virtudes que o reconduziram à democracia em 1985.

    Uma enérgica e contundente reação “nas escolas, nas ruas, campos e construções” contra o golpismo branco,que desmerece as últimas eleições e quer atropelar o tempo institucional que regula o voto, será urgente e necessária.

    Sem o respeito às decisões colhidas de eleições democraticamente instituídas e geridas,a pátria estará não apenas dividida, mas inteiramente afogada no ideário: se não ganho, não vale. E daí por diante a situação será imprevisível.

    Milhares de manifestantes foram às ruas por todo o Brasil, no dia 15 de março de 2015, para pedir impeachment da presidente Dilma. Com gritos, cartazes e carros de som, o mar verde amarelo foi marcado por ódio incitado com pedidos de volta a ditadura militar e com retaliação para quem passasse nos locais – Foto: Alice Vergueiro

    Se o golpe se deflagra, a autorização para que resultados colhidos das urnas sejam desmerecidos e não reconhecidos no futuro terá sido dado.

    Quem disse que o impeachment ou a renúncia da atual presidente encerraria a crise política?

    Quem disse que outros milhões de brasileiros que no passado votaram em Lula e Dilma aceitarão passivos Aécios, Cunhas e quem mais vier, se empurrados goela abaixo, deslegitimando o voto conquistado historicamente com sangue, suor e lágrimas por grande parte da população brasileira?

    Como disse Renato Meirelles, presidente do Data Popular, em entrevista ao “El País”, a insatisfação com o governo não quer dizer desejo de que a presidente saia. Pode, inclusive, também expressar o desejo de que melhore. Para que, ao final do mandato, ela venha a fazer jus aos votos confiados a ela.

    Creio que para aqueles que levaram os membros do poder executivo e do legislativo ao poder pelas urnas e pelo voto a notícia deve ser emitida clara e limpidamente e sem hesitação: Não vai ter golpe!

    Respeitem o voto conquistado e que ainda rege nossa claudicante democracia.

    Mas se o golpe vier, isso não resultará num fim pacificador, ao contrário, convocará o início de reações e conflitos que podem vir a ser incontroláveis e cujo desfecho será imprevisível. Se o respeito ao voto do cidadão for desfeito, a cada um não restará muito mais do que agir por conta própria, num país onde as posições de consenso e as instituições são, constantemente, ridicularizadas e lançadas à lata do lixo.

    Caberá sempre ao eleitor decidir e reavaliar seu voto na próxima vez em que estiver diante das urnas. O sequestro do voto é um atentado grave à cidadania e aos cidadãos, num país em que o futuro da democracia ainda é totalmente incerto e nebuloso.

    Apertar o botão verde nas próximas eleições será o efeito de um sistema eleitoral que se moderniza e se consolida, e que se tornou tão propalado mundo afora, ou não será muito diferente de um vídeo game inútil e risível em que é sempre possível recomeçar o jogo do início diante da derrota.

    Paulo Endo é psicanalista, professor da Pós Graduação em Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades e do Instituto de Psicologia, ambos da USP, membro da Cátedra UNESCO de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância da USP.