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  • Elisa LUCINDA: Aos filhos da Liberdade

    Elisa LUCINDA: Aos filhos da Liberdade

    Estação Primeira de Mangueira: Filhos da Liberdade
    Estação Primeira de Mangueira: Filhos da Liberdade

    Quando soube do novo enredo da Mangueira, gostei de cara. Nutriu minha esperança. É muito poderosa a força narrativa da Sapucaí. A festa tem impressão espetacular, grifando bem a etimologia da espetaculosa palavra. O carnavalesco Leandro Vieira sabe certamente da força educacional política de uma escola e não vem medindo esforços para mirar no esclarecimento do povo brasileiro sobre as questões que dominam seu cotidiano e em usar a arte popular do rei momo pedagogicamente. Pelo que entendo do que li do enredo, Jesus Cristo volta ao mundo, o encontra extremamente intolerante, e o que é pior, em seu nome. Isso o desagrada. É realmente perigosa, escandalosa e abismal a diferença da vida e do pensamento entre Jesus Cristo e o que se tornou a igreja católica e as neopentecostais.

    Chocante.

    Ele não era intolerante nem preconceituoso. Sabemos que Cristo não era branco nem pregava riqueza! Ao contrário, vivia entre pobres, hippies e putas, e não estava em seus planos ver um fiel aos seus princípios um dia dizer: “Agora encontrei Jesus e já tenho dois carros”. Tanto que, desde que chegou ao Vaticano , o valente papa Francisco atua seriamente na desconstrução de toda pompa de tal império da fé e de tudo mais que afasta a igreja dos verdadeiros fundamentos cristãos. Não é tarefa fácil. Tudo está muito torto.

    E o mundo está confuso. O Brasil numa maré de azar sem tamanho. Avançam as forças conservadoras numa miscelânea de ignorância radical e pregação de ideologias que não se assumem como ideologias, mentiras vestidas de verdades, e tudo isso leva nossa comunicação à beira do caos. Que confusão é essa?

    Mata-se indígena em nome do desenvolvimento, nudez é crime mesmo sendo o nosso figurino original, condena-se a sexualidade como se fosse pecado, enquanto as igrejas cometem há séculos a desfaçatez de terem templos espalhados pelo nosso país com categorias separatistas e nomeados como igrejas dos escravos ou dos pretos e ninguém repara? Destroem terreiros, atacam babalorixás e ialorixás, e tudo em nome da fé, do bem, da família. Fé em quem? Bem de quem? E de que família? Nessa febre insana que inclui moralistas, terra-planistas em pleno século XXI, temos um presidente desmatador do Brasil que imita o presidente americano que ama armas e guerras e de cuja performance o mundo tem vergonha, e ainda uma ministra da Secretaria especial da mulher que é contra o feminismo, que faz do seu gabinete uma sucursal de sua igreja, e que, agora, inventou de propor a não-vida sexual entre adolescentes e jovens.

    Socorro, “… o mundo está ao contrário e ninguém reparou?” Realmente Jesus vai ter muito com que se espantar com “isso daí”. E o enredo vai fazer muita gente refletir a partir da Sapucaí.

    Estamos todos atordoados. A cada porrada, uma ação judicial, a cada inconstitucionalidade uma reação imediata dos direitos humanos, uma busca desesperada da sociedade que ainda pode usar a Constituição como um escudo contra as barbaridades que estão levando nosso país ao seu pior lugar de evolução diante de todos os avanços que havíamos conseguido nas últimas décadas. Uma merda geral. As milícias no poder, o Ministro da justiça afundado na falta de ética, comprometendo a imagem geral dos juízes, e um governo despreparado para compreender a complexidade do Brasil de agora, que ainda tem coragem de afirmar, esquizofrenicamente, que a economia vai bem, quando nenhuma economia pode ir bem chafurdada na desigualdade, nas injustiças sociais, na violação dos Direitos Humanos no extermínio das populações indígena e negra. É como dizer: “A economia daquela casa vai muito bem, só estão todos desempregados, não têm como se sustentar, as crianças da casa não tem boa alimentação, educação e saúde pública de qualidade, o pai é preto e pobre, por isso pode ser assassinado a qualquer momento, um dos filhos é gay, lésbica ou trans e por isso pode ser assassinado a qualquer momento, a mãe sofre violência doméstica, por isso pode ser assassinada a qualquer momento. Mas a economia daquela casa vai muito bem”. Não sou economista mas sei que se trata de uma ciência que se relaciona com outros fatores definidores. Nossa economia vai mal, meus senhores. Milhões de desempregados circulam desesperados na espiral da falta de perspectivas. Se eu fosse nossa querida e competente Flavia Oliveira, teria mais argumentos aqui. Mas o pouco que sei diz que isso não está certo, que vamos mal sim.

    Porém, brilha uma luz no fim do túnel:

    O que insanos conservadores não perceberam é que não adianta uma determinação para que jovens não façam amor, agora uma ordem. Quem vai obedecer? É tarde demais. Ninguém vai querer parar de transar e quem ainda nunca, não vai querer mudar a regra do jogo logo na sua vez. Nos 35 anos que nos separam do fim da ditadura, desenvolvemos uma profunda revolução amorosa começada mundialmente em 1968, encabeçada por jovens exigindo a liberdade de sua sexualidade, na base do “faça amor, não faça guerra”. Desde então nossos jovens estão transando em casa, na casa dos seus namorados e namoradas, e os pais sabem, orientam, ensinam prevenções sem hipocrisia e com responsabilidade. Esta é a luz: a nova gente.

    Sou de uma geração que nasceu na ditadura e viu, e participou da luta pela restituição da liberdade e da democracia. Uma dura luta contra a censura e pela liberdade de expressão. Vi meu pai queimando livros no meio da noite no fundo do quintal. Temia ser descoberto como homem de pensamento livre, como amante da liberdade e igualdade para todos. Eu sou filha de quem lutou pela liberdade. Herdeira desta bandeira. Ter vivido essa história fez com que nós também lutássemos para que nossos filhos tivessem garantida a liberdade que um dia nos faltou .Vinte anos de ditadura fizeram muito mal ao país, creiam-me! Gênios, intelectuais, estudantes, artistas, professores, pensadores, pesquisadores, jornalistas, pessoas cujo único crime foi lutar pela liberdade, foram torturados e mortos. A ditadura insistia em ser chamada de revolução quando na verdade foi um duro golpe militar. Nesse tempo todos nos tornamos guardiões dessa liberdade e lutamos diuturnamente para preservá-la. Imagine o que farão então os que nunca viveram sem ela? Quem nasceu com esse grito –gozo da liberdade de expressão– solto não vai querer saber de outro rumo pra esta prosa e não vai se entregar assim .

    Greta Thumberg, esta menina ativista sueca que está puxando a orelha dos adultos pela bagunça climática no mundo, não é um caso isolado. Os jovens estão estudando sustentabilidade em todos os sentidos. Estão atentos à contemporaneidade, à diversidade de gênero e enquanto negros e indígenas estão se tornando antropólogos, sociólogos, filósofos, e estão de olho nas contradições do país que caminha trôpego sobre profunda desigualdade. Sabem que dessa injustiça não poderá brotar a paz.

    São os filhos da liberdade e não a entregarão com facilidade, nem imaginam o mundo onde não possam circular livres e expressarem sua opinião quando quiserem, à hora que quiserem e sobre o que quiserem. Não conhecem outro regime. Não estava nos seus planos. Os filhos da liberdade nasceram com o DNA de sua preservação. Seus pais lutaram pelas minorias e acharam maneiras alternativas para lhes prometer um mundo melhor. Lutaram por suas crenças, ervas e opiniões. Não será uma luta fácil, mas confio na força de quem nasceu numa casa onde a repressão deu lugar à uma educação sincera, verdadeira, informal e respeitosa.

    Claro que também há os “jovens de direita” (ó triste encontro de duas palavras tão antônimas), mas ainda assim eu acredito que, como diz o poeta Manoel de Barros, “A liberdade é como água, caça jeito”, acha um modo de escoar. Não vão nos levar tudo na mão grande, haverá luta. Há luta! E os filhos da liberdade não vão negociá-la nem medir esforços para honrá-la. O carnavalesco da Mangueira é um filho desta grandiosa prole. Na esteira destas batalhas para assegurar nossos direitos veio o direito ao nosso pensamento livre, o direito à homoafetividade e à transexualidade sem condenação, veio o anticoncepcional que fez com que pudéssemos decidir e programar gestações, veio a mulher no mercado no trabalho, veio o homem se reconfigurando e se despoluindo de seu machismo tóxico.

    Nosso grande quilombo misto somado aos que vieram depois de nós não é nada pequeno. Ou seja, estamos todos, os da tribo imensa da liberdade, dispostos a não perdê-la de modo algum. Confiemos nos frutos da liberdade e aí veremos que os filhos dela jamais fogem à luta.

    Elisa Lucinda, verão de 2020

     

     

     

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  • Portela e Mangueira debocham de Damares no subúrbio do Rio

    Portela e Mangueira debocham de Damares no subúrbio do Rio

    A zoação, o bom humor e a crítica são ingredientes inseparáveis do carnaval do Rio de Janeiro, o maior do mundo. Mais uma prova disso se viu na última sexta-feira (18) à noite, em Madureira, no subúrbio do Rio.

    As maiores campeãs e mais populares escolas de samba do Rio, Mangueira e Portela, fizeram uma festa em parceria para criticar a recente fala da ministra Damares Alves, da pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos. Damares disse recentemente que estamos “numa nova era no Brasil: menino veste azul e menina veste rosa”.

    A bobagem explícita gerou reações indignadas pelo Brasil, o país que mais mata a população trans em todo o mundo. Só em 2018, foram, pelo menos. 163 mortes violentas de travestis e transexuais.

    “Ridícula”, disse Damião Walsh sobre Damares enquanto ele sambava, vestido de rosa, com sua mãe Zuleika, vestida de azul. Milhares de homens de rosa e mulheres de azul não pagaram para entrar na quadra da Portela. Zuleika, religiosa assim como Damares, ainda disse uma frase que tem muito a ensinar à ministra. “meu filho é gay porque Deus quis assim e tá tudo bem”.

    O assessor de imprensa da Portela disse desconhecer de quem foi a ideia da promoção, mas o fato é que a escola abraçou a ideia. O terceiro mestre-sala da agremiação Emanuel Lima, se apresentou de rosa, dispensando, por uma noite apenas, o tradicionalíssimo azul da Portela. “Aquilo que ela falou foi um absurdo”, disse Emanuel, que parabenizou a iniciativa das duas escolas.

    O povão é claro, também adorou. Pessoas economizaram dinheiro e ainda zoaram da agressão da ministra. “A brincadeira é uma forma de resistência. Esses fascistas que agora estão no poder não vão poder parar o Brasil. O negro continuará vivo, o samba continuará vivo, o carnaval continuará vivo. E continuará vivo assim: com homem e mulher vestindo a cor da roupa que quiser”, disse Mônica Silva, outra que deu de ombros para Damares e deixou em casa o vestidinho rosa de bela, recatada e do lar.

    Imagens: Caetano Manenti Rithyele Dantas

     

  • A SOLIDARIEDADE E O MENINO DA MANGUEIRA

    A SOLIDARIEDADE E O MENINO DA MANGUEIRA

    Todos já devem saber que a Feijoada e a apresentação do samba na quadra da Mangueira foram canceladas.

    Apesar da triste notícia, a diretoria da Mangueira resolveu distribuir para a comunidade do Morro toda a feijoada que foi preparada pra a festa que aconteceria hoje em sua quadra, na apresentação da cantora Alcione e segmentos da escola. O motivo foi um forte tiroteio que ocorreu no Morro.

    Me chamou atenção o Depoimento do Romário Souza, presidente da torcida organizada da Mangueira.

    Não teve feijoada, mais sobrou emoção.

    Assim relatou o Romário responsável pela torcida organizada da Estação Primeira de Mangueira:

    Como não teve feijoada a Escola liberou a feijoada pra comunidade comer, estava eu na fila e tinha muitas crianças, e uma no meio de muitas me chamou atenção… Um menino aparentemente de 8 anos de idade fez a pergunta: “Tio, feijoada é bom?” Prontamente respondi que sim e perguntei se ele nunca tinha comido e ele disse que não, e vendo aquela fila olhei e me perguntei quantos também não têm essa oportunidade de comer uma feijoada. Não, não teve feijoada. Foi um prejuízo enorme pra escola, mas, pra inúmeras pessoas, foi a comida que salvou o seu dia.

    Essa é a IMAGEM que uma ESCOLA DE SAMBA deve ter. Muito provável que em outros lugares essa comida fosse toda para o lixo. Ela teve custos e ninguém gosta de perder. Mas ganha que sabe ser solidário. Decerto, a COMUNIDADE DA MANGUEIRA retribuirá muito mais do que ela já faz.

    “As pessoas que se preocupam com o bem estar do próximo mostram que a solidariedade enriquece suas almas e as faz mensageiras da alegria.”

    SALVE A ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA ??

     

    Leia a nota oficial da Mangueira, sobre o cancelamento da feijoada e do ensaio da escola:

    “A diretoria da Estação Primeira de Mangueira vem informar ao público frequentador do Palácio do Samba, que devido à falta de segurança na região, que no dia de hoje fechou o Jardim Zoológico da Quinta da Boa Vista e vias de acesso, causando grande transtorno à população, optamos por cancelar o Ensaio Show deste sábado, 13 de janeiro, que aconteceria a partir das 22h no Palácio do Samba.
    Confirmamos a realização do Ensaio de Rua, amanhã, domingo, 19h na Av. Estação Primeira de Mangueira, ao lado do metrô Maracanã e o Ensaio Show no próximo sábado, dia 20 de janeiro, dia de São Sebastião padroeiro da cidade maravilhosa do Rio de Janeiro. Que Ele possa nos abençoar com paz e segurança!
    Gratos pela compreensão de todas e de todos. Saudações mangueirenses.”