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  • Chega de injustiça, retrocessos, violência!

    Chega de injustiça, retrocessos, violência!

    Ontem dia 09 aconteceu uma Audiência Pública de extrema relevância para os moradores de ocupações, movimentos sociais e instituições comprometidas com a Defesa de Direitos e Justiça em nosso país, organizada pelo CONDEPE (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, Plataforma DHESCA (Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais) e Defensoria Pública.
    Compuseram a mesa representantes do CONDEPE (Graça, vice Presidenta), Defensoria Publica do Estado de São Paulo (Alan, Núcleo de Direito Humanos e Davi, Urbanismo), Plataforma DHESCA (Denise Carreira coordenadora executiva, Sauler e Lúcia Moraes relatores nacionais), Ministério Público Federal (Denisan), Assembléia Legislativa deputada Beth Sayão da Comissão de Direitos Humanos).
    Todos vieram denunciar as violações de direitos humanos com as prisões de lideranças presas e tentativas de criminalizar os movimentos de moradia e se comprometer com estratégias de luta para enfrentar esta situação. A justiça não pode reproduzir a discriminação, repressão, criminalização e injustiças a que as lideranças dos movimentos de moradia estão sujeitas, fruto da pressão de interesses do capital e da especulação imobiliária. O direito à moradia, previsto na Constituição de 1988, vai além do direito privado a uma casa, condição de vida, de construção da identidade e da dignidade humana. Pressupõe o direito à infra-estrutura de bens e serviços que garantem condições dignas de vida humana, direito esse que deveria ser garantido pelo poder público.
    Segundos dados de Raquel Rolnik, da FAU/USP, o número de prédios abandonados e vazios no centro de São Paulo, seria suficiente para abrigar toda a população que precisa de moradia. A ocupação de prédios vazios pelos movimentos de moradia fruto de muita lua e de resistência, significou uma afronta à especulação imobiliária e ao poder público voltado para as classes dominantes.
    Desde o incêndio em maio de 2018, do edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paissandu, Centro de São Paulo, ocupado pelo movimento de moradia, que abrigava cerca de 400 moradores, as perseguições ao movimento de moradia se intensificaram. Acusados injustamente de extorsões, lideranças foram presas por cobrarem taxa de condomínio dos moradores. Diante desta situação por solicitação dos movimentos de moradia, a Missão Emergencial da Comissão DHESCA, Comissão Arns de Direitos Humanos, Defensoria Pública e movimentos sociais colheram depoimentos através de visitas às lideranças presas e a ocupações dentre elas a Ocupação São João e a Ocupação José Bonifácio, e depoimentos de participantes dos diversos movimentos, que comporão um relatório que será encaminhado a várias instâncias e consistirá em instrumento para novas estratégias de luta.
    Defensores públicos e procuradores ressaltaram que a luta do dia a dia travada pelos moradores de ocupações e pelos movimentos de moradia, na defesa dos direitos e contra a perversidade da justiça com os movimentos sociais é que nos anima a firmar nosso compromisso com a justiça e defesa de direitos sociais.
    As ocupações realizadas por pessoas desprovidas de condições para prover moradia por conta própria se organizam através do movimento, calcados em valores de solidariedade e partilha de responsabilidade. Desempregados ou trabalhadores com baixos salários, não tem como pagar aluguel e diante da omissão do Estado através de políticas públicas são compelidos a buscar esta solução. As ocupações através dos movimentos de moradia, ao mesmo tempo em que atendem a uma necessidade individual, tem um caráter coletivo. Os mutirões, as formas de organização, as normas de ocupação e de convivência, os espaços comuns, as melhorias implantadas no local, fazem parte de um processo de decisão coletiva permeada por valores de solidariedade e compromisso mútuo entre os moradores. Morar nas ocupações implica em regras e em contribuições financeiras como em qualquer condomínio, para arcar com as despesas da infra-estrutura do edifício ocupado.
    Ao mesmo tempo em que soluciona a questão da moradia, provoca mudança significativa na qualidade de vida dos moradores que passam a usufruir dos benefícios da infra–estrutura urbana do centro da cidade (educação, saúde, transporte, proximidade de empregos, cultura, mobilidade urbana, comércio próximo…). Por sua vez, segundo depoimentos de moradores do entorno e do comércio local, a utilização de prédios antes vazios, abandonados e insalubres, incrustados no coração da cidade, tem provocado requalificação da região e dinamização do comércio. “A gente se juntou e mostrou pra vizinhança que a nossa vida a gente transforma através da luta o prédio cinza pro colorido, da pulga prá vida humana e também mudamos todo o nosso quadrilátero usando o comércio, a farmácia que a gora fica aberta 24hs, a gente aquece a economia local e estamos sendo criminalizados por isso?”.
    A utilização de prédios vazios com capacidade ociosa, fundada na função social da propriedade, deveria fazer parte dos investimentos prioritários do município na busca de solução do déficit habitacional para a população de baixa renda, garantindo o direito constitucional à moradia digna. A ocupação de propriedades ociosas pelo poder público, poderia se dar também em parcerias com os movimentos de moradia, no enfrentamento deste grave problema que tem aumentado dia a dia na cidade de São Paulo.

    Movimentos Aguerridos, Indignados, a luta continua!

    Ponto alto do evento foram os depoimentos de moradores da ocupação e de participantes do movimento de moradia, Central dos Movimentos Populares-CMP, UNMM – União Nacional Movimentos de Moradia, Movimento População de Rua, Frente de Luta por Moradia-FLM, Movimento de Moradia e Luta Por Justiça – MMLJ, moradores de ocupações (Mauá, Morro dos Macacos – Diadema, Marielle Vive – Valinhos e outros), Movimento Direitos Humanos do Centro, Ambulantes, Associação dos Recicladores do Parque do Gato, representante de Conselho Tutelar, Advogado de Direitos Humanos de Campinas, Coletivo Flores pela Democracia e outros vieram denunciar indignados à Defensoria Pública e organizadores da Missão Emergencial a discriminação e violência a que as lideranças, presos políticos, e movimentos estão sujeitos e exigir do poder público providências quanto ás arbitrariedades praticadas. “que esta denúncia tenha o objetivo de acabar com esta desigualdade que estamos vivendo”. Onde está o direito de defesa?
    Viemos denunciar: – A criminalização dos movimentos sociais e os desmontes do programa habitacional por parte dos poderes públicos federal, estadual e municipal; – A redução de investimentos em moradias populares e infra-estrutura urbana e políticas sociais; – A desativação de Conselhos (Conselho da Cidade e demais Conselhos participativos); – A PEC do Senado enviada pelo senador Flávio Bolsonaro que se aprovada irá derrubar a função social da propriedade; Exigir por parte do poder público federal, estadual e municipal, propostas de solução e de enfrentamento dos problemas de moradia, direito constitucional e responsabilidade do Estado; Denunciar a mídia hegemônica cuja visão de mundo e de sociedade é unilateral e conivente com a visão de sociedade das classes dominantes, em detrimento das classes populares, desqualificando os movimentos populares, comprometidos com a classe trabalhadora.
    Carregados de emoção, moradores expressaram a rudeza das condições de vida que os levaram a esta situação “a gente ocupa por necessidade”, “quem ocupa não tem culpa”, a melhoria que alcançaram com as conquistas que permitiram além da casa para morar, o acesso a educação para seus filhos, poder usufruir dos benefícios da cidade, crescer com as lutas coletivas e com a solidariedade mútua praticada. “Se eu não tenho onde morar, como é que eu posso ter a cidadania garantida? se até o João de barro pode ter a sua casa, porque eu não tenho esse direito garantido pela Constituição?”, “direito não tem fila, direito é direito”, “hoje não sou mais morador de rua, tenho endereço”.
    Além disso, queremos propor à ONU missão emergencial para verificar o acúmulo dos movimentos sociais através do processo das ocupações, que é uma atuação coletiva e forma de transformação dos prédios vagos em moradias “o prédio estava desocupado, cheio de lixo, baratas e ratos, hoje moram muitas famílias e a gente pode ter o nosso canto”, traz uma outra visão de sociedade e de compromisso público e coletivo e “que esta denúncia tenha um objetivo: acabar com essa desigualdade que estamos vivendo, não dá mais”.

    Encaminhamentos: A luta continua!

    Os movimentos afirmam em alto e bom som que não desistirão da luta e que não se curvarão às injustiças e arbitrariedades a que estão sendo submetidos, “enquanto houver prédio desocupado e gente sem moradia, a luta continua, e é por isso que estamos sendo criminalizados”.
    Fala contundente de uma das lideranças a seguir, aponta o processo, os caminhos, os desafios e a garra dos participantes das ocupações e dos movimentos.

    Todos esses depoimentos e denúncias comporão um relatório que será encaminhado às Comissões de Direitos Humanos dos legislativos municipal, estadual e federal, bem como ao Ministério Público Estadual e Federal. O documento também será encaminhado a organismos internacionais como a Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Organização das Nações Unidas (ONU), como parte das estratégias de luta.

    E hoje podemos comemorar uma vitória nesta luta (https://jornalistaslivres.org/justica-de-sao-paulo-concede-liberdade-a-carmen-silva/)

  • Flores pela Democracia no Senado em Defesa da Previdência com Proteção Social

    Flores pela Democracia no Senado em Defesa da Previdência com Proteção Social

    Em 10 de setembro o Coletivo Flores pela Democracia, juntamente com pessoas da CNBB/Sul, Grito dos Excluídos, Pastorais e Frente em Defesa da Seguridade Social, com seu gesto de delicadeza, realizaram uma ação de diálogo e de sensibilização com os Senadores, em Brasília, em Defesa do Sistema de Proteção Social.

    Iniciando com o poema:

    “Hoje,

    Só hoje

    Vamos fazer Diferente

     

    Essas Flores apontam

    Um outro Caminho,

     

    Vejam nascer

    Essas flores de nossas mãos

    Flores pela Democracia

     

    Flores que hoje falam

    Da Defesa da Proteção Social”

     

     Através das flores/panfletos, com os dizeres:

    “Votem e Vetem esta Reforma da Previdência. Honrem o voto do povo brasileiro”;

    “Os Devedores é que devem pagar a divida da Previdência e  não o povo”;

    “Vote contra esta Reforma, ela só irá aprofundar a desigualdade social”;

    “Pense no povo trabalhador, esta Reforma criará mais desemprego”,

    ocuparam os corredores que levavam ao Plenário, sensibilizando para refletirem sobre as conseqüências econômicas e sociais negativas que essa Reforma trará para o país.

    • milhões de trabalhadores que ganham até 2 salários mínimos serão penalizados;

    • segmentos mais fragilizados da população como deficientes e idosos, serão afetados em suas necessidades básicas;

    • esta Reforma irá desmontar o Sistema de Proteção Social, previsto na Constituição de 1988;

    • tira do bolso de velhinhos, aposentados, 3 trilhões do consumo;

    • desonera o Estado e as empresas das responsabilidades com a aposentadoria e o trabalhador passa a ser o único contribuinte responsável por sua capitalização, através da rede bancária…

    A ação realizada teve grande aceitação pelo público que circulou pelo “Túnel do Tempo”: senadores, assessores parlamentares, deputados que participavam de comissões mistas, funcionários e servidores da Casa, visitantes.

     

    “A presença de vocês aqui no Senado, representou para nós esperança! Lutamos aqui direto pelos direitos e contra os desmontes das políticas públicas e da soberania nacional. Encontrar vocês aqui com esta ação nos faz sentir que não estamos sós” (Max, relações Institucionais da Liderança do PT);

    “O Coletivo Flores pela Democracia ocupou hoje o Senado Federal para sensibilizar a casa quanto a votação da Previdência. Foi muito emocionante revê-los, nós que lutamos juntos nas esquinas de São Paulo”  (Deputado Alexandre Padilha);

    Um senador no entanto disse que a Democracia já era… Senador, pense melhor nas consequências de sua posição. Ditadura não!

    Espera-se que esta abordagem com flores tenha atingido corações e mentes, alertando os senadores para o compromisso de sua responsabilidade pública: lutar pelos interesses de soberania do país e do povo que o elegeu.

    No dia seguinte o Coletivo atuou também na Câmara dos Deputados, tendo sido muito bem visto pelos parlamentares, assessores e visitantes.

    “Acabo de chegar e recebo dessas mulheres guerreiras, rosas vermelhas pela democracia. Isso em momentos tão difíceis. Este é o caminho, lutar pela democracia, pelos direitos, pela soberania, pelo Brasil. O Brasil é um país democrático, não pertence a nenhuma família mas ao povo brasileiro. Não tem presente sem democracia, não tem presente sem preservar os direitos sociais previstos na Constituição  de 1988” (Deputado José Guimarães).

    “Mulheres guerreiras que estão na luta por direitos, por justiça e em defesa da seguridade social e pela liberdade de organização e de expressão. Lindo gesto” (Deputada Maria do Rosário).

     

    Com mensagem de luta e de esperança o grupo realizou uma ação na defesa dos direitos sociais, da Justiça e hoje, pela Defesa do Sistema de Proteção Social. Esta Reforma da Previdência Não!

    Vida Digna para Todos!

    O Congresso há de honrar o compromisso social com o povo que o elegeu?

  • Marcha das Margaridas: O que tem a nos ensinar?

    Marcha das Margaridas: O que tem a nos ensinar?

    A solidariedade para que o Coletivo Flores pela Democracia estivesse em Brasília, começou antes. Com o por do sol de Brasília no dia 12 de agosto, seis representantes chegaram de São Paulo, à casa de Maria e Samuel. Acolhidas com calor especial e muito amor, fizeram flores, brincaram, cozinharam. Dividiram desejos, risos, sonhos, lágrimas… Ouviram música e cantaram. Marcharam com as Margaridas. Vibraram com tantos e tantos sentimentos…

    Com a Marcha, a oportunidade de encontrar o nosso verdadeiro Brasil! Um misto de emoções indescritíveis! Cada Margarida, um histórico de vida, um motivo para participar desse grande evento. Não dimensionaram esforços para seu deslocamento, ainda que fosse de um dos quatro pontos mais longínquos do nosso país.

    Emoção à flor da pele. Passos firmes, determinados, vidas marcadas pela força e sabedoria da lida da terra. Brotaram Margaridas dos profundos rincões do Brasil. Muito fizeram para lá estarem presentes. De longe, com muitas horas de viagem, altivez e dignidade foram representar suas comunidades.

    “Saímos de Mocajuba,  Pará, no baixo Tocantins no domingo meio dia, viajando 2ª dia e noite e chegando na 3ª por volta das 8 hs da manhã. Viemos numa delegação de 26 pessoas, fizemos um trabalho de base sobre o que é a marcha, a mobilização e as vozes das mulheres ocupando espaços de ousadia… O simples  fato das pessoas saírem de suas casa, da zona de conforto, enfrentar esses dias de viagem, ir prá rua é uma forma de ousadia, se rebelando contra o sistema. Larga sua família, seu trabalho e vem se mantendo, acreditando que a mobilização é um processo importante. A própria viagem é um aprendizado político. A marcha é tão bonita, a Marcha das Margaridas começa desde o processo de mobilização, a solidariedade, reunião da comunidade, torneios, futebol de mulheres, quermesses para fundos. Esta mulher que veio está representando a sua comunidade. A solidariedade na viagem, é dessa forma que a gente tem que crescer, as mulheres cada vez mais solidárias, a solidariedade na vida, a partir das mulheres.(Joyce Dandara, 25 anos)

    Viemos de ônibus, do Maranhão 70 ônibus, 3 dias de viagem. Sou solteira, brasileira, naturalizada maranhense. Sou do Município de Matinha,quebradeira de côco babaçu. Nossos objetivos da Marcha das Margaridas é para que a gente tenha nossos pamerás livres, nossos cocos, nossos campos cercados. Outra coisa: Lula Livre. Se tem ladrão, bota os outros na cadeia, não puxa debaixo do tapete. Estamos nessa luta há muito tempo” (Maria Valdelina).

    Sou de José Boiteau, Sta. Catarina, faço faculdade em Blumenau, odontologia. Fiquei espantada com a multidão de gente, um aprendizado que dá mais força pra gente estar na luta estudantil, demarcação de terras indígenas. Muita emoção ainda mais neste tempo que estamos vivendo , dá vergonha. Tem poucos jovens formados,  pouco tempo de cotas raciais, todos que se formaram, voltaram para a aldeia, somos muito apegados, faz parte da cultura nossa”  (Djadjá, da etnia Xokleng)

     

    A presença no Planalto Central

    80.000 Margaridas acamparam e marcharam… Com a sua garra, bandeiras, faixas, cantos e gritos, mostraram sua força, deixaram seu recado e estiveram presentes no Planalto Central do país.

    O dia a dia rude da lida no campo não ceifou suas energias. Em suas expressões, alegria de participar, solidariedade e garra.  Nas suas reivindicações luta por terra e trabalho, direitos, vida digna no campo, afirmação de identidades, uma agricultura sem veneno, preservação da natureza, soberania. A vivência com a natureza, as lições de garra no domar o trato da terra, a sabedoria do plantio, cultivo e colheita dos alimentos, as tornaram mais humanas, mais solidárias e com mais disponibilidade para a luta?

    Sou de Bom Conselho, PE, trabalhadora rural, participo do sindicato, vim prá Marcha por luta por melhorias. Lá as pessoas passam dificuldades sofrem mesmo de verdade, falta emprego. O agricultor sofre muito, a comunidade tem a terra mas não tem como trabalhar, quando aparece, pagam muito pouco ...” (Cleide, 41 anos)

    “Meu objetivo hoje é brigar para que nossos direitos sejam alcançados, Bolsonaro cai fora e Lula Livre. Essa é minha intenção. Tô aqui lutando pelos meus netos, meus filhos e pelas gerações futuras. Sou professora aposentada, me formei depois de 56 anos… A maior parte da juventude está alienada, não teve uma educação política. Pode ver que ele ta acabando com a Universidade, com a educação, com tudo. Enquanto Lula criou várias universidades, ele está destruindo e isso é lamentável. Nós que já temos uma caminhada, temos que lutar prá que isso não aconteça”  (Anadina , 72 anos, presidente da Associação dos Pequenos Produtores Rurais , Vila Bonita, Itacarambi, prá lá de Montes Claros, Norte de MG)

    O problema é que no campo não se oferece políticas públicas então o jovem tá saindo para estudar e muitas vezes esse jovem não volta prá comunidade e isso vai dificultando a vida no campo, pra se fazer uma sucessão. A ideia é que o jovem possa ficar no campo com condições dignas, compreendendo a importância rural para que ele possa assumir a terra, continuar produzindo, se percebendo como classe trabalhadora de agricultores familiares(Joyce Dandara, 25 anos).

    Moro em Palhoça, Sta. Catarina. Sou assistente social e faço parte do movimento de economia solidária. Trabalho com mulheres no artesanato. Nesta conjuntura  política é muito importante a gente se empoderar e retomar o espaço por direitos.Levo de volta muita experiência, muito conhecimento, muitas amizades, parece que todo mundo se conhece” (Inês, 57anos)

    Sou de Bom Sossego, PE. Estou aqui para que meus filhos, meus netos, mais etnias, tenham como viver melhor. Não temos saúde, escolas, garantia de nossas terras. Acho importante como homem, estar na Marcha, sinto um grande amor pelas mulheres e por Margarida Alves. Uma grande admiração pela mulher que foi lutadora, batalhadora. Por todas as mulheres batalhadoras que vivem na luta do dia a dia, não importa o trabalho que tenham, são guerreiras. De volta levo uma mala cheia de alívio no peito por ver tantas mulheres lutando como Margarida Alves” (José Roberto, 50 anos, indígena)

    Venho da Amazônia brasileira. Meu povo, minha etnia vem da Amazônia, dentro do Acre. Meu povo sofreu muito, vive na Amazônia há 5 mil anos. Prá vir prá cá foram muitas horas de viagem. Viemos de van, a gente se organizou…  Sou artesã e assim como todas as mulheres do mundo, somos muitas coisas: sou professora, sou costureira, sou ativista do movimento indígena, ambiental, do movimento de liberação da maconha como uso medicinal e recreativo para que nosso país pare com essa pouca vergonha, pare de prender nossos filhos, nossos jovens por causa de um cigarro natural enquanto liberam cigarro cheio de química…Para nós indígenas a saúde está precária, um monte de desvios, muita falta de atenção pras comunidades indígenas do Brasil inteiro. A minha pauta também é da educação.Nós indígenas pertencemos a 6 troncos. Somos mais de 365 povos e não é possível que o governo brasileiro queira enfiar goela abaixo a mesma educação que oferece a todos os brasileiros, sem respeitar cada região brasileira, cada povo. Paulo Freire  em 1964 foi expulso de nosso país, se seu método tivesse sido implantado, nosso país seria outra coisa. Nas aldeias existe um preconceito que nos ensinaram nesses anos todos de dominação colonial que éramos inferiores, incapazes. O que fizeram com a gente, com os povos da América Latina foi uma atrocidade, restou muito pouco. Digo sempre aos meus alunos que nós somos o que restou do paraíso.  Paulo Freire vive em cada região mamadi da Amazônia. Enquanto eu viver o método dele vai ser aplicado na minha aldeia e por onde eu passar no mundo” (Quichirá, aquela que nasceu para guiar, 43 anos).

    Sou de uma aldeia no município de José Boiteau, representante das mulheres que cultivam ervas medicinais, um chá da Índia. Eu e minha mãe estamos desenvolvendo um projeto com as mulheres que estavam entrando em depressão e com os estudantes. Mobilizamos os estudantes para que tenham um lugar para buscar informação sobre nossa cultura indígena que não é só o falar, mas o artesanato, a comida, os costumes, ervas medicinais, as palestras e as vivências que tínhamos e que hoje estamos um pouco distanciados. Projeto faz lembrar como éramos antes da pacificação, nossas crianças brincavam juntas, a gente comia no mesmo prato e isso é muito importante de lembrar. Na Marcha é muito importante ver nós mulheres brigando pelos direitos. Eu sou uma que não  paro e isso eu vou levar para as nossas mulheres. Com é importante a luta política hoje e nós temos que nos levantar” (Antõnia Batlé, 36 anos, etnia Xhokleng)

     

    Margaridas: Encontros de Sujeitos por outro país

    Na Marcha das Margaridas num agosto seco do cerrado brasileiro, vários encontros se deram. Encontros de seres humanos, de pessoas, de sujeitos fortes e, ao mesmo tempo, delicados. Encontros de corpos que estão juntos na luta por outro país. Encontros de olhares de identidade da luta coletiva. Encontros que simbolizam uma chama que não se apaga porque há vida latente… ainda. E sempre.

    Daquelas mulheres simples do campo, de todos os cantos do país, a garra por justiça e direitos, solidariedade e preocupação com a preservação da natureza.

    “A Marcha é tão bonita, começa desde o processo de mobilização. A solidariedade, reunião da comunidade, torneios, futebol de mulheres, quermesses para fundos. Esta mulher que veio está representando a sua comunidade. A solidariedade na viagem das companheiras que ajudam as companheiras. Eu trouxe meu filho e todo mundo ajudou. A solidariedade, é dessa foram que a gente tem que crescer, as mulheres cada vez mais solidárias, a solidariedade na vida, a partir das mulheres” (Joyce Dandara, 25 anos).

    “Tudo o que estão fazendo agora na minha casa no Acre, a fumaça, vai ter repercussão no Sul, no Sudeste, no Nordeste. A única coisa que vai salvar o planeta é a solidariedade. Nós indígenas estamos resistindo. Cada gesto nosso vai refletir no outro. Minha ação no planeta, onde eu estiver,  vai refletir no outro. Temos que ter essa consciência. Quando liberam os agrotóxicos, estamos envenenando nossa própria casa. É como minha mãe dizia, é uma cobra que morde o próprio rabo. O que estão fazendo (o governo, o povinho lá de fora, os banqueiros), não nos interessa, eles vão nos levar à morte. Deixe nós nações indígenas e o povo brasileiro a nos guiar. Esse povo dos grandes lá, só ta pensando em dinheiro. Gostaria que meus descendentes recebessem a casa e o rio que eu recebi. Eu pude nadar no rio da Amazônia . junto com os peixes e agora não tá podendo mais. Eu pude respirar um ar limpo. O que vale realmente a pena na vida é a família, é ser feliz, é estar no ambiente que a natureza esteja bem. Não podemos comprar o sol, a água. Eles vão entender que a  água não é mercadoria, a Bolívia entendeu e graças aos índios eles recuperaram aquilo que eles tem. O que fizerem com os povos da América Latina foi uma atrocidade, restou muito pouco. digo sempre aos meus alunos que nós somos o q restou do paraíso”

    “Como disse Krenáh, nós estamos em guerra  e prá nós não temos trégua. Vocês também estão em guerra, é um tipo de guerra sem bomba, mas é . Vamos mostrar prá esse povo que eles podem até querer fazer mas a gente vai ter reação” (Quichirá, 43 anos)

     

    Juntas Somos Muitas!

     

     

    Não consigo retirar a pulseira  do meu braço.

    Margaridas, Margaridas!Quantas somos?

    Ainda não consigo retirar a pulseira do meu braço.

    Serei eu uma Margarida?

    Quantas somos?

    Ainda não consegui retirar a pulseira do meu braço …

    Conseguirei confeccionar tantas margaridas pra quantas somos?

    A pulseira…  Nossos braços.

     

    Nossa força que carrega nossas Flores.

    Flores que tem perfume de Brasil

    Do nosso Brasil soberano, livre!

     

  • Com participação negada por criminosos, Lucas continua preso

    Com participação negada por criminosos, Lucas continua preso

    Há mais de 1 ano, quatro maiores e um menor de idade estão presos acusados de praticarem um roubo de veículo próximo a Av. Gen. Edgar Facó, zona norte de São Paulo.

    Um dos maiores e o menor assumiram a crime e os outros três alegaram inocência. O reconhecimento da vítima foi a prova que condenou os três homens: Lucas Leandro Vieira Yoyo, Luan e Ricardo, mesmo quando os outros dois admitiram não conhecerem e não nunca tendo visto nenhum deles antes.

    A mãe de Lucas, 22, busca provar sua inocência e trazê-lo de volta para casa: “ele é super tranquilo, carinhoso e trabalhador”. Lucas está preso condenado a 22 anos de prisão. Com um filho de quatro anos, sob os cuidados da avó, ele espera o resultado do julgamento em segunda instância.

    O caso

    No dia 01 de  agosto de 2018, um empresário chegava em sua casa, por volta das 21h30, na R. Santa Romana quando foi abordado por “cinco indivíduos que chegaram a pé, um deles armado com uma pistola. A vítima foi obrigada a tirar o carro da garagem e depois a passar para o banco do passageiro dianteiro.  No boletim de ocorrência constam as versões da vítima, do menor, de Lucas e de mais seis policiais que fizeram as prisões.

    O carro seguiu e a vítima entregou um cartão, a senha e um celular para os criminosos.

    Na Av Elísio Teixeira Leite o carro passou a ser seguido por uma viatura até que, na Rua Mica Branca, um dos criminosos que dirigia pulou do carro em movimento e o veículo caiu num córrego.

    O carro foi recuperado junto com o celular e o cartão.

    Naquela noite cinco pessoas foram presas e na 72° Delegacia de Polícia (DP), da Vila Penteado, a vítima reconheceu todos os indivíduos.

    Contradições

    Até o momento em que o carro caiu no córrego, os depoimentos da vítima, dos policiais e dos detidos  batem. Depois, como se o crime não bastasse, outras versões conflitantes aparecem no caso.

    Depoimento do primeiro policial a chegar no córrego
    Depoimento da vítima

    Lucas foi preso, chegando em sua casa, na rua R. Expedito Ribeiro de Souza. Ele vestia calça jeans e blusa azul, as peças estavam limpas, longe do aspecto de quem parecia ter caído num córrego.

    Via rádio, policiais receberam ordem para iniciar uma busca por um homem com calça jeans e blusa com capuz: “em patrulhamento pela região localizaram na Rua Expedito Ribeiro de Souza um indivíduo que estava correndo e trajando o mesmo tipo das vestes mencionadas anteriormente”, é o que diz o texto do boletim de ocorrência.

    Policiais encontram Lucas correndo  e questionam o  porquê da pressa? O jovem responde que estava indo para casa.

    Lucas

    A mãe de Lucas, Simone Fernandes Vieira narra uma outra versão sobre o fato e segue reunindo provas para tentar provar a inocência do filho.

    Ela conta que o filho saiu de casa por volta das 21h para encontrar uma amiga na frente da Escola Municipal Mario Lago, na Rua Dourada. Simone diz que o percurso dura em média quinze minutos a pé.

    O tempo da caminhada de Lucas bate com a minutagem de um vídeo captado da câmera de um prédio próximo a escola. Na imagem uma pessoa trajando roupas da mesma cor que Lucas usava naquele dia que ele usava aparece. Lucas teria ficado uma hora na frente da escola e voltado para casa por volta das 22h.

    A mãe tem as mensagens trocadas com a amiga, nas quais é possível confirmar o horário e local onde iriam se encontrar. A última mensagem foi envidada por volta das 20:40, quando Lucas saiu, sem o celular.

    O advogado Edson Júlio da Silva apresentou o vídeo para a juíza Cynthia Maria Sabino Bezzera Camurri, mas o o pedido foi indeferido, em razão da baixa resolução da imagem, o que na interpretação da magistrada dificulta a identificação de Lucas.

    Lucas foi abordado por volta das 22h30, já na rua de casa.

    Simone viu o filho ser algemado e ser levado na viatura. A mãe foi informada pelos policiais que o filho seria levado até a cena do crime, ou seja, o córrego. Chegando no córrego, Simone foi orientada a seguir para o para o 33° DP, mas depois soube que Lucas havia sido encaminhado para o 72 DP.

    Um mês depois, Simone encontrou Lucas preso, ele reafirmou sua inocência. Lucas estava indignado. Esse foi o fim de noite que o jovem pensou em ter algum dia em sua vida?

    Lucas é pai e quer ser cirurgião ortopedista. É um sonho que ainda pode se realizar, tanto que na audiência, quando teve a oportunidade de estar diante da juíza ele diz: ‘o que eu queria era um Coren [Conselho Regional de Enfermagem] e não de um processo”. Antes de ser preso ele estava terminado um curso de enfermagem e trabalhava em uma oficina de motos.

  • Acusados de roubo de celular, jovens são presos em seu local de trabalho

    Acusados de roubo de celular, jovens são presos em seu local de trabalho

    Aqui estamos diante de mais um enredo repetido de prisão injusta, e nem mesmo a liberdade provisória foi concedida. Essa é a realidade de duas famílias que lutam para provar a inocência de seus filhos. Marcos e Pedro são os novos presos que protagonizam mais uma história cotidiana de gente que sofre com as injustiças do Sistema de “Justiça” Brasileiro. Ambos são motoboys  e foram detidos dentro da pizzaria em que trabalham, no Jardim São Jorge, Zona Oeste de São Paulo, em 23 de julho.

    A acusação: roubo de 1 celular. O fato: o aparelho foi recuperado na pizzaria em que Marcos Mykael Silva dos Santos, 20 anos, e Pedro Justino de Amorim Jr, 32 anos, também detido, trabalham. Marcos achou o celular enquanto voltava de uma entrega e deixou com chefe para que o proprietário buscasse. A policia é quem buscou o celular. E levou os dois presos.

    Para a mãe não existiria motivo para que Marcos roubasse: “ele tem o que ele quer, é independente, tem moto e celular: tudo pago com seu próprio trabalho O celular estava em péssimas condições, então me diga, para que Marcos iria querer um celular todo quebrado? Ainda por cima,  mantendo o chip no aparelho. A primeira coisa que quem rouba é tirar o chip e desativar o rastreador”.

    O julgamento do caso será em Outubro.

    O caso

    Segundo informações do inquérito policial, Marcos e Pedro foram presos por volta das 23h40, em flagrante, em 23/07 enquanto estavam na Pizzaria, da Rua Doutor Erício Alvares de Azevedo Gonzaga.

    Segunda a família de Marcos, o jovem havia passado a noite realizando entregas. Às 21h encontrou um celular na esquina da Av. Joaquim de Santana x  R. Gen. Asdrúbal Da Cunha. Em seguida chegou na pizzaria onde mostrou o aparelho para o chefe e seguiu fazendo entregas guardou o celular consigo. Horas depois a Polícia localizou o celular (pelo rastreador), daí então a razão de terem ido à pizzaria efetuar as prisões.

    O dono da pizzaria acompanhou os dois, após a prisão e confirmou o relato no boletim de ocorrência“estava em seu local de trabalho, momento em que o entregador de pizza Marcos, ao retornar de uma entrega lhe mostrou um aparelho celular e informou que encontrou referido aparelho caído na rua e que o referido aparelho estava bloqueado, que na sequência a polícia compareceu ao local e deteve dois funcionários”.

    Segundo o depoimento da vítima no BO o crime aconteceu as 20h, quando “estava no banco do passageiro do veículo conduzido por sua genitora, momento em que uma motocicleta de cor roxa, ocupada por dois indivíduos se aproximou e tais pessoas anunciaram o assalto, que os dois indivíduos, tanto o piloto, quanto o garupa portavam armas. Exigiram os pertences pessoais, aparelho celular e a chave do veículo e que após o assalto os roubadores se evadiram. Que através do rastreador do celular conseguiu identificar onde o aparelho estava” e “informou ao delegado de polícia as características físicas dos roubadores, tais como compleição corporal, cor de pele e detalhes como barba, bigode e cavanhaque, bem como características das vestimentas. Que informou ainda que os assaltantes estavam com os capacetes apenas na parte de cima da cabeça, ou seja, os capacetes não cobriam a face” e por final, “apontou com absoluta certeza as pessoas de Marcos Mycael Silva dos Santos e Pedro Justino de amorim Junior como sendo os roubadores”.

    Os métodos policiais

    Ainda conforme informações do Boletim de Ocorrência foi per meio do rastreador do celular que a polícia chegou até a pizzaria. Lá a policial Alessandra Fernandes da Silva que fez as prisões contou que “localizaram os indivíduos Marcos e Pedro na pizzaria e questionou de quem era uma motocicleta, na cor roxa, que estava estacionada do lado de fora do estabelecimento? Pedro disse que era sua e questionado sobre o referido roubo disse que não sabia de nada” e com eles “nenhuma arma de fogo foi localizada”. De lá foram levados para a 89° Delegacia de Polícia (DP), sem resistência, mesmo tendo negado qualquer envolvimento com o crime em questão.

    As mentiras da polícia   

    A mãe de Marcos foi avisada sobre a prisão e seguiu para a delegacia.

    Ao chegar no 89° DP, do Jardim Taboão,  soube que “quem forneceu os detalhes da ocorrência para o texto do  boletim foi a policial militar,  Alessandra Fernandes da Silva” que “ficou aguardando a chegada da vítima. Alessandra conversou com a vítima, descreveu Marcos e Pedro dizendo – “vai lá e fala que foram eles. Já estão aqui. O celular estava nas mãos deles,   então foi eles”.

    As busca por justiça

    Logo após as prisões, uma intensa mobilização tirou o sono das famílias: a  busca diária por formas de provar que Marcos e Pedro são inocentes não tem intervalo, por isso as famílias acessaram a Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio – que atua em apoio às famílias e vítimas de violência policial. A Rede já tinha atuado em um caso similar, no mesmo bairro, no começo do ano.

    Ao mesmo tempo que procuravam a Rede as famílias recorreram aos tribunais para pedir a liberdade e apresentar a versão de Marcos e Pedro.  Na última sexta, 16, as famílias e a Rede realizaram um ato pelas ruas da região contando sobre o caso e denunciando o risco que comunidades periféricas estão sujeitas diante da violência do Estado.

    O ato faz parte é uma das ações rotineiras da Rede. Além de procurar conscientizar as pessoas sobre seus direitos, o apoio em denunciar violações é a principal linha de atuação adotada.

    Por todo trajeto, que durou cerca de uma hora, o caso ecoou pelas ruas.

    Uma mãe fala de seu filho

    A mãe de Marcos tem procurado reunir provas que indicam a inocência de seu filho: além de levar o dono da pizzaria para testemunhar a favor, as imagens das câmeras da região também são alvo da pedido judicial. Ela conta que a moto de Pedro, apontada como a utilizada para cometer o crime, não é roxa,  é azul. Com base no GPS da motocicleta, ela apresentou ainda, o itinerário que Marcos fez durante a noite, enquanto realizava entregas. O aparelho indica que ele passou a noite toda realizando entregas e que na hora do roubo, como indicado no boletim estava na Pizzaria.

    Comandas de pedidos de pizza entregues por Pedro e Marcos mostram que eles estavam na pizzaria aguardando para realizarem pedidos diferentes durante o horário do roubo. Outra inconsistência apresentada pela mãe é o local do roubo ser o mesmo do endereço da pizzaria.

    Marcos tinha planos para o futuro, pensava em abrir seu próprio negócio: abrir uma tabacaria. A mãe segue nessa luta. A mãe é uma mulher desesperada para ver o fim de uma tragédia que nunca imaginou que poderia viver, especialmente, envolvendo o filho.

  • As instituições estão resistindo ao fascismo

    As instituições estão resistindo ao fascismo

    ARTIGO

    RODRIGO PEREZ OLIVEIRA, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia

     

    Não é de hoje que as instituições brasileiras estão sendo testadas, pois é exatamente isso que significa uma crise institucional: um momento em que as instituições estabelecidas são constantemente desafiadas.Neste ensaio, quero analisar como as instituições democráticas estão reagindo aos desafios.

    O comportamento das instituições não é linear e pode ser dividido em dois momentos.

    1°) Do mensalão, em 2005, até o fim do governo de Michel Temer, em 2018.

    Nesse momento, as instituições foram permissivas, omissas, se deixando sequestrar pelo projeto político que vinha sendo sistematicamente rejeitado nas urnas.

    Inconformado com sucesso eleitoral do petismo, o establishment político brasileiro manipulou os ritos democráticos para confrontar o modelo de Estado redistributivo que começou a ser implementado em janeiro de 2003.

    É isso, leitor e leitora. A história recente do Brasil pode ser resumida dessa forma: a disputa pelo controle das riquezas produzidas pelo Estado. De um lado, o petismo com sua agenda redistributiva. Do outro lado, o financismo, com sua agenda neoliberal. Por um tempo, Lula conseguiu conciliar os dois projetos. Não é possível conciliar por muito tempo interesses tão opostos.

    A narrativa do combate à corrupção foi apenas nuvem de fumaça. O que interessava mesmo à coligação antipetista era desestabilizar o adversário por dentro das instituições. O primeiro movimento aconteceu em 2005, com a ação penal 470. O petismo sobreviveu. A coligação antipetista não recolheu as armas. Onze anos depois, Dilma seria golpeada, justamente por se negar a entregar o Estado ao controle dos financistas.

    Juízes e procuradores enriqueceram-se com palestras, se tornaram famosos, tiveram retratos estampados em capa de revista. Enquanto isso, a democracia ia adoecendo pouco a pouco. As democracias não morrem do dia pra noite. Leva tempo.

    OAB, Ministério Público, STF: os que juraram defender a democracia foram omissos. Todos fecharam os olhos para os crimes de Curitiba. Os operadores da Lava Jato não teriam chegado tão longe sem a leniência de seus superiores. Deltan Dallagnol jamais lideraria investigação clandestina contra ministro do STF se a própria suprema corte não tivesse sido conivente.

    A cumplicidade custou caro.

    2°) O governo de Jair Bolsonaro (Janeiro-agosto de 2019).

    A eleição de Bolsonaro foi a consequência inesperada do caos institucional. Tolos foram aqueles que acreditaram ser possível controlar o caos. Controlar o caos é uma contradição em termos.

    Todos os dias, Bolsonaro violenta as instituições democráticas.

    Sempre que defende abertamente o nepotismo, quando faz piada com a cabeça dos nordestinos e com o pinto dos japoneses, Bolsonaro está implodindo a liturgia que é fundamental para o exercício do cargo que ocupa. Quando, sem nenhum constrangimento, o presidente da República se comporta como um homem comum, a instituição Presidência da República é atacada.

    O presidente da República não pode se comportar como um homem comum pelo simples fato de que ele não é um homem comum. Não pode ser. Jamais!

    Ao defender abertamente a tortura, Bolsonaro viola tratados internacionais de defesa dos direitos humanos dos quais o Brasil é signatário. Quando persegue os órgãos de defesa do meio-ambiente, Bolsonaro quebra acordos internacionais que o Brasil, soberanamente, assumiu.

    Quando tenta governar por decretos e quando discrimina os Estados do Nordeste, Bolsonaro rejeita a legitimidade de senadores, deputados e governadores, todos democraticamente eleitos.

    Bolsonaro é o presidente da República que não tem o menor compromisso com a República. É uma ameaça ao convívio democrático. É a fenda autoritária que, durante 30 anos, a democracia decidiu tolerar. Talvez a democracia brasileira tenha superestimado sua própria força.

    As instituições entenderam o risco e reagiram. Se hoje o Brasil ainda não foi plenamente tomado pelo fascismo é porque as instituições estão resistindo, estão cumprindo seu papel.

    Os exemplos são muitos. Destaco apenas alguns: o Senado rejeitou o decreto de armas, o STF manteve a demarcação das terras indígenas sob o controle da FUNAI. A Câmara dos Deputados, na voz de Rodrigo Maia, defendeu a liberdade de imprensa ao se manifestar em favor de Glenn Greenwald. A OAB recomendou o afastamento de Sérgio Moro do Ministério da Justiça. O MP impediu que Bolsonaro nomeasse um negacionista para a comissão da verdade.

    Parte da esquerda acredita que as instituições estão rendidas ao fascismo e que, por isso, toda e qualquer atuação institucional seria inútil. Esses companheiros e companheiras olham para a realidade e enxergam uma sociedade civil mobilizada, à espera do chamado de sindicados e partidos políticos.

    O diagnóstico está equivocado: a sociedade civil ainda não está disposta a derrubar o fascismo nas ruas. Parte da sociedade civil apoia o fascismo. Outra parte observa com indiferença o avanço da marcha fascista, como se isso fosse problema menor quando comparado ao desemprego e à crise econômica.

    As instituições não estão indiferentes, não estão rendidas ao fascismo. Estão resistindo e, por enquanto, estão vencendo.

    O fascismo, que sempre é popular e mobilizador, coloca a democracia diante de uma contradição. Em tempos de fascismo, o povo é a principal ameaça à democracia.

    Somente através das instituições é possível que a democracia sobreviva aos ataques do povo, enfrentando o povo, mostrando que, sim, é proibido ser fascista. As instituições são a última esperança.