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Tag: inflação

  • Governo quer tirar do salário mínimo para dar aos bancos

    Governo quer tirar do salário mínimo para dar aos bancos

    A equipe econômica se queixa do engessamento das despesas públicas e distribuiu estudo em que fala que 2/3 dos gastos primários são corrigidos por algum tipo de indexador. Ao se aproximar do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), autor da Proposta de Emenda à Constituição 438/2018, o objetivo não é apenas o de abocanhar verbas destinadas ao setor social ou reduzir os vencimentos dos servidores públicos. O alvo é o salário mínimo.

    Com a discrição que convém a temas impopulares, o assunto é tratado ao final de uma matéria publicada pelo Estadão. Lá, é atribuída a “técnicos do Congresso” a ideia de excluir da Constituição a obrigação de o governo reajustar o valor do salário mínimo pela inflação. Se não conseguir achatar o mínimo, ao menos a equipe econômica pretende desvincular o reajuste das aposentadorias superiores ao piso.

    O objetivo é dar mais flexibilidade ao Orçamento? Nem a Velhinha de Taubaté, viva fosse, engoliria essa. A meta está explícita na PEC 438: “Utilização de saldos positivos de recursos vinculados, verificados após o encerramento do exercício financeiro, para pagamento do serviço da dívida pública.” (Recursos vinculados são os que a Constituição atribui exclusivamente à Saúde, Educação e Seguridade Social entre outros)

    O texto da PEC do deputado Pedro Paulo espanca a Constituição de várias formas para garantir privilégios aos rentistas do sistema financeiro. A Proposta insere o esquema da “Securitização de Créditos Públicos” no art. 115, II, e, item 2 de seu texto, acrescentando ainda, no § 3º do mesmo artigo, que a cessão onerosa dos créditos não configuraria dívida, “o que é mentira, conforme manifestação de diversos órgãos de controle e também fartamente comprovado durante os trabalhos da CPI da PBH Ativos S/A em Belo Horizonte”, denuncia a Auditoria Cidadã da Dívida.

    A mesma entidade mostra que, ao contrário do que diz o autor, a PEC 438/2018 relaxa a Regra de Ouro (Art. 167, III), a qual impede a contratação de nova dívida pública para pagar despesas correntes (despesas com a manutenção do Estado, serviços públicos prestados à população e juros da dívida pública).

    Essa regra já vem sendo burlada em relação ao pagamento dos juros da dívida pública, que têm sido, em grande parte, contabilizados como se fosse amortização, exatamente para fugir a essa regra, como denunciado pela Auditoria Cidadã da Dívida desde a CPI da Dívida Pública realizada na Câmara dos Deputados em 2009/2010.

    Artigo original em https://monitordigital.com.br/guedes-mira-acabar-reajuste-do-minimo-pela-inflacao

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  • Chame o ladrão

    Chame o ladrão

    Tomando um café na manhã de quatro do quatro. Despretensiosamente olhando pela janela. Encosta um furgão cinza na frente da minha casa. Coração e mente disparam. Meu corpo revive tempos escuros, tempos da completa ausência de liberdade para pensar ou agir ou falar. A música de Chico Buarque quebra a linha de raciocínio.

     

    Acorda, amor
    Eu tive um pesadelo agora
    Sonhei que tinha gente lá fora
    Batendo no portão, que aflição
    Era a dura, numa muito escura viatura
    Minha nossa santa criatura
    Chame, chame, chame lá
    Chame, chame o ladrão, chame o ladrão

     

    Lembrei-me dos livros que foram queimados ou enterrados pelo medo de serem vistos como subversivos e se tornarem motivos para as pessoas serem presas. Quem definia o que era subversão ou não eram os militares, sem discussão. E o 477? Foi um decreto-lei de 1969 que determinava o seguinte:

    Art. 1º Comete infração disciplinar o professor, aluno, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino público ou particular que:

    I – Alicie ou incite à deflagração de movimento que tenha por finalidade a paralisação de atividade escolar ou participe nesse movimento;
    II – Atente contra pessoas ou bens tanto em prédio ou instalações, de qualquer natureza, dentro de estabelecimentos de ensino, como fora dêle;
    III – Pratique atos destinados à organização de movimentos subversivos, passeatas, desfiles ou comícios não autorizados, ou dêle participe;
    IV – Conduza ou realize, confeccione, imprima, tenha em depósito, distribua material subversivo de qualquer natureza;
    V – Seqüestre ou mantenha em cárcere privado diretor, membro de corpo docente, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino, agente de autoridade ou aluno;
    VI – Use dependência ou recinto escolar para fins de subversão ou para praticar ato contrário à moral ou à ordem pública.

    Acorda, amor
    Não é mais pesadelo nada
    Tem gente já no vão de escada
    Fazendo confusão, que aflição
    São os homens
    E eu aqui parado de pijama
    Eu não gosto de passar vexame
    Chame, chame, chame
    Chame o ladrão, chame o ladrão

    Chico, ao imaginar a quem poderia recorrer caso fosse preso, só encontrou uma saída para sua canção: chamar o ladrão! Posto que não havia ninguém a quem recorrer, mesmo que não se tivesse praticado qualquer ato que representasse risco ao regime. Você podia ser levado a qualquer momento, sem qualquer explicação e sem qualquer satisfação posterior à sua família.

    Se eu demorar uns meses
    Convém, às vezes, você sofrer
    Mas depois de um ano eu não vindo
    Ponha a roupa de domingo
    E pode me esquecer

    Quem ia não sabia se voltava. Por isso Chico, na música, pede que a mulher o esqueça depois de um ano. O período, talvez, mais violento aconteceu quando o país comemorava a vitória na Copa do Mundo do México em 1970. Sem que a maioria se desse conta, o verde-amarelo daqueles que exaltavam o tri se misturava com o vermelho do sangue que corria nos porões do regime.

    Acorda, amor
    Que o bicho é brabo e não sossega
    Se você corre, o bicho pega
    Se fica não sei não
    Atenção!

    As políticas econômicas prejudicavam os trabalhadores com alto desemprego e violento arrocho salarial. Qualquer manifestação contrária, no entanto, era violentamente reprimida. Num certo momento, as políticas adotadas para o país começaram a resultados que causavam prejuízos a todos, também à elite econômica: ausência de crescimento, alto desemprego, inflação altíssima, uma dívida impagável com bancos estrangeiros. E mesmo os partidários da extrema direita não podiam se manifestar. Os jornais que apoiaram o golpe tentaram mudar de lado e foram censurados. Havia censores nas redações. Censores nas editoras, nas gravadoras. A maior parte da população não sabia o que ocorria.

    Não demora
    Dia desses chega a sua hora
    Não discuta à toa, não reclame
    Clame, chame lá, chame, chame
    Chame o ladrão, chame o ladrão, chame o ladrão
    (Não esqueça a escova, o sabonete e o violão)

    O tuíte do Comandante do Exército Brasileiro, general Eduardo Villas Bôas, trouxe à vida fantasmas que julgávamos definitivamente extintos. O carro na porta da minha casa, hoje dia quatro do quatro, era um furgão cinza onde se lia em preto sobre fundo amarelo: ESCOLAR!

  • Um ano do golpe. E a economia?

    Um ano do golpe. E a economia?

    Quando o canal de TV e o jornal apoiam o governo, a notícia econômica ruim é dada acrescentando-se ao final: “mais há sinais de que vai melhorar”. Quando a notícia é boa, mas a mídia é oposição ao governo, acrescem: “mas pode piorar”. Você, provavelmente, tem ouvido que nossa economia está mal das pernas, mas que vai melhorar.

    Mostramos, aqui os dados mais recentes, divulgados pelo IBGE, relativos ao desemprego, à produção industrial, ao comércio varejista, ao setor de serviços e à inflação. Encerramos com um breve comentário sobre o caminho que ora trilhamos.

    Vamos ver se há motivos para comemorar.

    1 O desemprego chegou a 14,2 milhões de pessoas e bateu o recorde da série histórica

    “Essa foi a maior taxa de desocupação da série histórica”, afirma o comunicado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD – que mostrou que, no trimestre janeiro, fevereiro e março de 2017, o desemprego chegou a 13,7% da força total de trabalho do Brasil, estimada em pouco mais de 103 milhões de pessoas.

    A população desocupada chegou a 14,2 milhões no primeiro trimestre de 2017 (jan-fev-mar) e bateu o recorde da série histórica. No trimestre anterior (out-nov-dez de 2016), o contingente de desempregados era de 12,4 milhões de pessoas. Mais de 1,8 milhão de pessoas passaram à condição de desempregados, um crescimento percentual de 14,9%.

    No mesmo trimestre de 2016 (jan-fev-mar), a pesquisa apresentava 10,9% de desemprego, ou seja, 11,1 milhão de desempregados. Houve, do primeiro trimestre de 2016 para o primeiro trimestre de 2017, um acréscimo de 3,1 milhões de pessoas, o que representa um crescimento percentual de 27,8% no contingente desempregado.

    É possível reparar no quadro acima que o desemprego atual é mais do que o dobro do verificado durante quase todo o ano de 2014 e só cresceu nos últimos meses.

    “O número de empregados com carteira de trabalho assinada (33,4 milhões de pessoas) recuou em ambos os períodos de comparação: frente ao trimestre outubro / dezembro de 2016 (-1,8% ou menos 599 mil pessoas) e ao trimestre janeiro / março de 2016 (-3,5% ou menos 1,2 milhão de pessoas). Este foi o menor contingente de trabalhadores com carteira assinada já observado na série histórica da pesquisa”, nas palavras do IBGE.

    2 Produção industrial cai 3,8% nos últimos 12 meses

    Os índices da produção industrial costumam apresentar surpresas de um mês para outro, no entanto quando olhamos comparações anuais temos melhor ideia da tendência que está em curso. O quadro abaixo nos mostra que, em 12 meses terminados em março de 2017, houve queda na produção em todas as quatro categorias: bens de capital (-2,3%), bens intermediários (-4,2%), bens de consumo duráveis (-5,5%) e bens de consumo semiduráveis e não duráveis (-5,5%).

    Na comparação de março de 2017 com fevereiro também foi observado recuo de 1,8% da atividade industrial. Dos 24 ramos da indústria pesquisados, 15 tiveram desempenho negativo. “Entre os setores, as principais influências negativas foram registradas por veículos automotores, reboques e carrocerias (-7,5%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (-23,8%) e coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-3,3%)”, aponta o IBGE.

    3 Comércio varejista ampliado cai 7,1% em 12 meses

    A tabela abaixo nos mostra os dados do varejo e do varejo ampliado, que engloba veículos e material de construção. O altíssimo número de desempregados nos explica fielmente os dados do comércio: quando a renda cai, a família tenta manter a alimentação e medicamentos, abrindo mão dos outros itens de consumo. Isso explica que as menores quedas, em 12 meses terminados em março de 2017, são relativas às vendas de hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (-3,2%) e às vendas de artigos farmacêuticos (-3,4%).

    As compras descartadas e adiadas se agrupam, principalmente, em i) livros, jornais, revistas e papelaria (-13,2%); ii) equipamento e material para escritório, informática e comunicação (-10,8%) e iii) veículos, motos, partes e peças (-12,8%).

    4 Setor de serviços cai 5,0% em 12 meses

    O setor que mais emprega trabalhadores no Brasil, o setor de serviços, teve queda de 5,0% nos 12 meses encerrados em março de 2017. O ciclo vicioso atual fica evidente através desse setor: milhões de desempregados consomem menos, as empresas aumentam as demissões pela queda no volume de serviços, o que vem agregar mais trabalhadores ao contingente desempregado.

    A maior queda se verificou nos serviços de transporte (-7,2%), seguida pelo setor de serviços profissionais, administrativos e complementares (-6,1%).

    Sobre o mais recente dado publicado, o IBGE informa: “em março, o setor de serviços apresentou queda de 2,3% no volume de serviços prestados frente ao mês anterior (série com ajuste sazonal), após ter registrado crescimento de 0,4% em fevereiro (revisado) e 0,0% em janeiro (revisado). Essa é a maior queda da série iniciada em 2012”.

    5 Inflação tem a menor taxa acumulada em 12 meses desde 2007

    A inflação, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA – ficou em 4,07% no período de 12 meses terminado em abril de 2017. Segundo o IBGE, constituiu-se “na menor taxa em 12 meses desde julho de 2007, quando se situou em 3,74%”.

    A tabela abaixo nos mostra que, em abril, os preços do item alimentação foram os que mais subiram (0,15%) e os preços do item habitação foram aqueles que mais caíram (+0,17%), especialmente por conta da queda do preço da energia elétrica (6,39%).

    6 Considerações finais

    Houve um tempo em que o combate à inflação não era a principal meta das áreas de política econômica do governo, Banco Central, Ministérios da Fazenda e do Planejamento. O emprego e o crescimento eram mais importantes. Houve, é claro, exageros e “irresponsabilidades” fiscais.

    Mas, ao sairmos do oitenta, dos governos militares, em direção ao oito, dos governos pós Plano Real, perdemos a noção de que o que realmente importa na economia é o bem-estar que é possível proporcionar ao conjunto da população.

    Achar que, para crescer e voltar a dar emprego aos brasileiros, é preciso deixar mais de 14 milhões de trabalhadores desempregados, com a política de austeridade atual, é de uma miopia criminosa. A estabilidade política com um governo legítimo é o caminho para voltarmos aos trilhos, o único caminho.

    Notas

    1 PNAD – comunicado do IBGE em 28/04/2017 em:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3420&busca=1&t=pnad-continua-taxa-desocupacao-vai-13-7-trimestre-encerrado-marco-2017

    2 Produção Industrial – Comunicado do IBGE em 03/05/2017 em:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3422&busca=1&t=producao-industrial-cai-1-8-marco

    3 Vendas no varejo – comunicado do IBGE em 1/05/2017 em:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3429&busca=1&t=vendas-varejo-caem-1-9-entre-fevereiro-marco

    4 Serviços – comunicado do IBGE em 12/05/2017 em:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3430&busca=1&t=marco-setor-servicos-cai-2-3-relacao-fevereiro

    5 Inflação – comunicado do IBGE em 10/05/2017 em:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=3427

  • A inflação de janeiro foi baixa. Vamos comemorar?

    A inflação de janeiro foi baixa. Vamos comemorar?

    Há um mês “celebramos” a queda da taxa de juros. A chamada taxa Selic caiu de 13,75% ao ano para 13%. Um corte ousadíssimo, dado o conservadorismo dessa diretoria do Banco Central. Naquele momento, dissemos que o corte não era um bom sinal, mas mostra de uma economia em forte desaquecimento.

    Agora, somos informados, pelo IBGE, que a inflação de janeiro, medida pelo IPCA, ficou em 0,38%. Muito abaixo do que esperavam os sábios do mercado financeiro. O gráfico mostra a queda da inflação calculada em períodos de 12 meses. Devemos comemorar?

    Perdão, sem querer ser um estraga prazeres, pediria que olhássemos o quadro completo: Como anda o desemprego? Como andam as vendas no varejo e o setor de serviços? Como andam os indicadores de pobreza?

    Temos 12 milhões e 300 mil desempregados no país, é o que nos informou o IBGE. No gráfico abaixo é possível notar a aceleração do desemprego após 2014. Durante o ano passado 3,3 milhões de pessoas passaram a fazer parte desse enorme grupo de desempregados. Essas pessoas, certamente, não vão comemorar a inflação baixa de janeiro. Elas devem, sim, estar se perguntando se a inflação caiu por conta do emprego que elas perderam. Elas tem razão de questionar, uma vez que, de fato, as políticas que pretendem baixar a inflação atingem em cheio o emprego. Ou você acha que juros altos e cortes de investimentos e gastos do governo beneficiam o emprego?

    Será que encontraremos boas novas no comércio ou no setor de serviços? A pesquisa do IBGE nos mostra que as vendas do Comércio Varejista Ampliado caíram 8,7% em 2016. As vendas de veículos caíram 14% e as de material de construção caíram 10,7%. As vendas do comércio sem veículos e material de construção caiu 6,2% em 2016, Como mostra o gráfico abaixo.

    O setor de serviços engloba transportes, comunicação, alojamento e turismo, entre outros. A queda nesse setor foi de 5% em 2016. O destaque de queda (10,4 %) foi no transporte terrestre. Aqui, é importante ressaltar, está o transporte de cargas, como matérias-primas e produtos acabados para a indústria. Menos transporte para a indústria implica menor produção industrial. As dificuldades da indústria também se refletem nos preços: não dá para aumentar preços, se nem vender direito a indústria está conseguindo. Comemorar inflação baixa, às custas de queda na produção industrial, é absolutamente descabido.

    Aqui é fácil perceber que aqueles que continuam empregados estão receosos de trocar de carro ou construir/reformar suas casas. Um governo que, no meio de uma brutal recessão, só fala em cortes de investimentos e gastos consegue dar confiança para que os trabalhadores consumam, especialmente, bens duráveis como automóveis?

    E a questão da pobreza? Bem, nessa semana fomos surpreendidos por um estudo do Banco Mundial que afirma que, somente nesse ano de 2017, a recessão deve derrubar 3,6 milhões de brasileiros para baixo da linha da pobreza. Cerca de 1 milhão desses “novos pobres” passarão a depender do benefício do Bolsa Família, que já ajuda 14 milhões de pessoas, sublinha o estudo. O pior é que, quando imaginamos que esse quadro é passageiro, nos lembramos que o orçamento do governo está “encarcerado” até 2036.

    Mal comparando, podemos imaginar nosso carro num atoleiro, com lama por todos os lados. De repente, o alegre motorista exclama: “Senhores, nosso limpador de para-brisas está funcionando perfeitamente. Estamos no caminho certo. Isso não é maravilhoso?”

    Comemorar a inflação baixa de janeiro é a mesma coisa. A economia brasileira está num atoleiro. Há dois anos que afundamos na lama. As políticas econômicas adotadas ajudam a afundar mais e mais. O desemprego, a queda de um enorme contingente de pessoas abaixo da linha da pobreza, a queda das vendas no varejo, a queda nos serviços e a enorme queda no PIB devem ser esquecidos. Celebremos a “vitória” diante do monstro inflacionário e bom Carnaval para todos nós!

    Notas

    1 Para ver o relatório do IBGE sobre o desemprego: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3367&busca=1&t=pnad-continua-taxa-desocupacao-foi-12-0-quarto-trimestre-2016-media-ano

    2 Para ver o relatório do IBGE sobre a queda das vendas no varejo:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3375&busca=1&t=dezembro-2016-vendas-varejo-recuam-2-1-fecham-ano-6

    3 Para ver o relatório do IBGE sobre a queda nas atividades do setor de serviço:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3376&busca=1&t=dezembro-setor-servicos-cresce-0-6-fecha-ano-5

    4 Para ver a matéria sobre o estudo do Banco Mundial:

    http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2017-02/banco-mundial-crise-pode-levar-36-milhoes-de-brasileiros-de-volta-pobreza

    Para ver o relatório sobre a inflação de janeiro de 2017:

    http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3372&busca=1&t=ipca-fica-0-38-janeiro

  • Deu ruim: queda brusca na taxa de juros não é bom sinal!

    Deu ruim: queda brusca na taxa de juros não é bom sinal!

    (Os parágrafos em itálico e negrito são do comunicado do Banco Central)

    Há muito tempo, o Banco Central (BC) não corta 0,75% em uma só reunião. E hoje cortou a taxa básica da economia brasileira, a Selic, de 13,75% para 13% ao ano. Para os neoliberais, hoje na direção do BC, ser conservador é manter a taxa muito alta. Desse modo, decidir por esse corte, indo contra seu habitual “conservadorismo”, tem somente uma interpretação: Deu ruim! Os sinais da economia brasileira são horrorosos!

    A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:

    O conjunto dos indicadores sugere atividade econômica aquém do esperado. A evidência disponível sinaliza que a retomada da atividade econômica deve ser ainda mais demorada e gradual que a antecipada previamente;

    Atividade aquém do esperado quer dizer continuamos em recessão brava com queda na produção e no emprego. A volta ao crescimento e melhora no emprego não estão no horizonte.

    No âmbito externo, o cenário ainda é bastante incerto. Entretanto, até o momento, os efeitos do fim do interregno benigno têm sido limitados;

    Afirmar que o cenário externo é incerto é procurar transferir parte da culpa para a economia mundial. Os opositores de Dilma, agora no poder, adotam a explicação da influência externa que negaram existir ao longo de 2015. O desmonte em curso da nossa economia, entretanto, tem muito, muito mais relação com o sitiamento do governo Dilma, a crise política gerada pelo golpe e o garrote imposto pelas políticas econômica e monetária de Temer, Meirelles e Goldfajn.

    A inflação recente continuou mais favorável que o esperado. Há evidências de que o processo de desinflação mais difundida tenha atingido também componentes mais sensíveis à política monetária e ao ciclo econômico;

    Carregamos demais na dose é o significado da afirmação que a desinflação está mais difundida. Em português claro, o que os membros do Comitê de Política Monetária do BC estão dizendo é: estávamos, e ainda estamos, em uma enorme recessão e mantivemos a taxa de juros mais alta, muito mais alta, do que devíamos por mais tempo, muito mais tempo, do que devíamos. Assim a inflação está perdendo força mais rapidamente do que eles esperavam.

    A inflação acumulada no ano passado alcançou 6,3%, bem abaixo do esperado há poucos meses e dentro do intervalo de tolerância da meta para a inflação estabelecido para 2016;

    As expectativas de inflação apuradas pela pesquisa Focus recuaram para em torno de 4,8% para 2017, e mantiveram-se ancoradas ao redor de 4,5% para 2018 e horizontes mais distantes;

    Como subir preços quando o quadro recessivo e o desemprego só se agravam? É óbvio que a inflação ia cair, ainda mais com cortes de investimentos públicos e com as altíssimas taxas de juros mantidas pelo Banco Central. Só o Governo e o Copom estão surpresos.

    As projeções condicionais do Copom também recuaram em relação às divulgadas no Relatório de Inflação passado, que foram baseadas no conjunto de informações disponíveis até 9 de dezembro de 2016. Dentre outros fatores, os recuos nas projeções foram influenciados por dados de inflação e atividade econômica divulgados desde então. As projeções no cenário de referência encontram-se em torno de 4,0% e 3,4% para 2017 e 2018, respectivamente. Já no cenário de mercado, situam-se em torno de 4,4% e 4,5% para 2017 e 2018, respectivamente; e

    Em outras palavras, a inflação e o crescimento previstos estão muito mais baixos do que eles esperavam anteriormente.

    Os passos no processo de encaminhamento e aprovação das reformas fiscais têm sido positivos até o momento.

    Os passos nas reformas fiscais têm sido “positivos” para quem imagina que o melhor par o Brasil é a devastação. Cortes de gastos sociais, cortes de direitos, inflação em queda com brusca desaceleração da economia só faz feliz uma classe social: a dos endinheirados.

    O Comitê ressalta os seguintes riscos para o cenário básico para a inflação:

    Por um lado, (i) o alto grau de incerteza no cenário externo pode dificultar o processo de desinflação; (ii) o processo de desinflação de alguns componentes do IPCA mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária requer atenção contínua; (iii) o processo de aprovação e implementação das reformas e ajustes necessários na economia é longo e envolve incertezas;

    O que querem dizer é que: a vaca foi pro brejo, mas, mesmo assim, estaremos vigilantes para ter certeza de que ela não se desvie do brejo. Esse é o resumo desse parágrafo do Copom.

    Por outro lado, (iv) a atividade econômica mais fraca e o elevado nível de ociosidade na economia podem produzir desinflação mais rápida que a refletida nas projeções do Copom; (v) a inflação tem se mostrado mais favorável, o que pode sinalizar menor persistência no processo inflacionário; e (vi) o processo de aprovação e implementação das reformas e ajustes necessários na economia pode ocorrer de forma mais célere que o antecipado.

    Existe o risco da inflação cair mais do que estamos esperando hoje. A razão é a elevada ociosidade na economia, ou seja, há muitas máquinas e recursos produtivos parados e desemprego. Em outras palavras, sangramos o paciente até ele quase desfalecer, por isso a inflação pode ser menor do que estávamos mirando.

    Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, pela redução da taxa básica de juros para 13,00% a.a., sem viés. O Comitê entende que a convergência da inflação para a meta de 4,5% no horizonte relevante para a condução da política monetária, que inclui os anos-calendário de 2017 e, com peso gradualmente crescente, de 2018, é compatível com intensificação da flexibilização monetária em curso.

    Todos os membros do Comitê votaram pela queda da taxa de 13,72 para 13%. Isso significa menos o mais monetaristas perceberam que o aperto passou muito dos limites.

    O Copom avaliou a alternativa de reduzir a taxa básica de juros para 13,25% e sinalizar uma intensidade maior de queda para a próxima reunião. Entretanto, diante do ambiente com expectativas de inflação ancoradas, o Comitê entende que o atual cenário, com um processo de desinflação mais disseminado e atividade econômica aquém do esperado, já torna apropriada a antecipação do ciclo de distensão da política monetária, permitindo o estabelecimento do novo ritmo de flexibilização. A extensão do ciclo e possíveis revisões no ritmo de flexibilização continuarão dependendo das projeções e expectativas de inflação e da evolução dos fatores de risco mencionados acima.

    Esse penúltimo parágrafo afirma que eles estarão de olho: se a economia cismar de cresce eles voltam com as pauladas.

    Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Ilan Goldfajn (Presidente), Anthero de Moraes Meirelles, Carlos Viana de Carvalho, Isaac Sidney Menezes Ferreira, Luiz Edson Feltrim, Otávio Ribeiro Damaso, Reinaldo Le Grazie, Sidnei Corrêa Marques e Tiago Couto Berriel.

    Eis os nomes daqueles que, junto com Henrique Meirelles e Temer, estão tornando mais distantes o emprego e crescimento econômico

    Brasília, 11 de janeiro de 2017.

    Banco Central do Brasil

  • Por que a inflação foi 10,67% em 2015

    Por que a inflação foi 10,67% em 2015

    Parece que virou moda comunicar-se por carta em Brasília. Você viu a carta que Alexandre Tombini, presidente do Banco Central (BC), mandou para Nelson Barbosa, ministro da fazenda?

    caro ministro

    caro ministrotexto-01caro ministro   caro ministrocaro ministro

    Bem, mas nesse caso não é bem assim.

    É que o regime de “metas para a Inflação”, implantado no Brasil em 1999, estabelece que a missão do BC é executar políticas para cumprir a meta estabelecida, especialmente administrando as taxas de juros no país. E nesse ato, o presidente do BC fica também responsável por explicar as razões do descumprimento, a cada vez que a meta não é atingida.

    A meta atual para a inflação anual é de 4,5% com tolerância de mais ou menos dois pontos percentuais. O que é o mesmo que dizer que o alvo, que o BC deve mirar, é uma faixa entre 2,5% e 6,5% de inflação, medida pelo IPCA, ao ano. Quando a inflação fica dentro dessa faixa, o presidente do BC não precisa fazer nada. Como a inflação ficou em 10,67% em 2015, ele teve de explicar, em carta aberta, ao ministro da Fazenda as razões do estouro. O que faz com que essa carta seja menos “Temerária”, digamos.

    Causas do descumprimento da meta

    O texto de Tombini começa pelas causas do descumprimento da meta:

    texto_02

    Oops, calma Tombini, você está indo muito depressa. O que são preços administrados? E preços livres? O que é processo de realinhamento de preços? O que é realinhar preços domésticos com os internacionais?

    Bem, preços administrados são aqueles que o governo federal tem o poder de regular (telefonia, derivados de petróleo, eletricidade e planos de saúde) ou aqueles que os governos estaduais ou municipais regulam (água, IPVA e transporte público). Os preços livres são todos os outros incluídos no cálculo do IPCA, ou seja, aqueles outros preços que não têm ingerências dos governos. Os preços administrados têm um peso próximo de 1/4 do IPCA e os livres de 3/4 do índice. Veja na Tabela 1, que está na carta de Tombini, como vêm variando preços livres e administrados desde 2014. Repare bem no que aconteceu com os preços administrados no 1o trimestre de 2015.

    grafiso_taxa de variacao

    Veja que, em 2014, os preços livres ganharam a corrida, 6,72% de aumento no ano, contra 5,32% dos administrados. No entanto, conforme se nota os administrados aceleraram rapidamente no início de 2015 e se mantiveram subindo com velocidade durante todo o ano. Até que no final de 2015 se percebeu que os preços administrados subiram 18,07%.

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    Como é possível que os preços administrados tenham subido mais de 18% se a inflação de 2015 foi abaixo de 11%?  Bem, a razão é que os administrados representam perto de 25% dos preços e os livres, que representam os outros 75%, subiram bem menos, 8,51%.

    Um resumo do que aconteceu com a inflação em 2015 é que o governo tomou a decisão de recompor, de realinhar os preços que administra. Esses preços vinham aumentando menos do que os preços livres. O governo reajustou fortemente, por exemplo, a eletricidade e os derivados de petróleo. Salientemos que eletricidade e derivados de petróleo entram no custo de quase tudo o que é produzido. O que quer dizer que os aumentos na eletricidade e nos combustíveis provocaram mais aumentos nos preços livres.

    Além dessa ação deliberada do governo, houve a subida do dólar, era a isso que Tombini se referia quando falou do realinhamento dos preços domésticos em relação aos preços internacionais. Nós sabemos que a cotação do dólar influencia inúmeros preços aqui no Brasil. Um caminho para essa influência são os produtos importados e os componentes importados de produtos feitos aqui. Um carro importado sobe de preço diretamente com a subida do dólar, mas o carro nacional que tem componentes importados também sobe de preço, já que o custo de produzir o carro aumenta.

    Mesmo no caso de produtos que exportamos existe influência da alta do dólar. Digamos que você produza açúcar no Brasil e vende aqui mesmo por RS 50 a saca de 50 quilos. Digamos que o preço equivalente no exterior seja US$ 20. Se o dólar sai de R$ 2,50 e vai para R$ 4,00, você tem a chance de vender no exterior a R$ 80 a saca, que é o resultado dos 20 dólares vezes os 4 reais por dólar. Minha pergunta é: você continuará a vender o açúcar aqui no Brasil por R$ 50? O resultado é que o preço daqui sobe para se alinhar com o preço internacional, mesmo que nada tenha mudado na produção de açúcar aqui dentro do país. Depois do preço do açúcar ter caído um pouco em 2014, o preço no varejo em 2015, de fato, subiu mais de 30%.

    Repare então no que fez o dólar em 2014 e 2105. Esse Gráfico 3 também faz parte da carta de Tombini. A taxa de câmbio começou o ano a R$ 2,70 por dólar, subiu até R$ 3,26 no final de março, voltou um pouco e fechou o ano em R$ 3,90. Esse aumento de mais de 40% na cotação do dólar pressionou a inflação de 2015. Seu efeito sobre a inflação foi bem menor do que os reajustes nos preços administrados, mas foi relevante.

    grafico_dolar

    Nesse último dia 20 o Comitê de Política Monetária do Banco Central resolveu manter a taxa de juros em 14,25%. Será que os componentes do Comitê estão antevendo uma inflação mais comportada? Vamos acompanhar.

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     Ilustrações por Joana Brasileiro

    Nota: a íntegra da carta está em http://www.bcb.gov.br/htms/relinf/carta2016.pdf