Jornalistas Livres

Tag: Glória

  • Moradores do Glória, em Uberlândia, comemoram mais uma vitória

    Moradores do Glória, em Uberlândia, comemoram mais uma vitória

    Texto: Diego Leão e Vinicius Souza. Fotos: Giovana Coelho e www.mediaquatro.com (Vinicius Souza e Maria Eugênia Sá)

     

    As cerca de 15 mil pessoas que ocupam parte da antiga Fazenda do Glória, atual Bairro Elisson Prieto, em Uberlândia, podem em breve ter motivo para comemorar o final de uma longa novela. A Advocacia Geral do Estado finalmente manifestou interesse pela área em agosto. Agora, com o aval da Justiça, os movimentos por moradia lutam junto à Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais para que a COHAB assuma os trabalhos de regularização fundiária e de infraestrutura do terreno. A urbanização havia sido prometida pela antiga administração da cidade, do Partido dos Trabalhadores – PT, mas com a vitória em novembro do atual prefeito, Odelmo Leão, do Partido Progressista – PP, o compromisso foi esquecido. É uma esperança para o fim das agressões constantes à comunidade, como o ataque da Tropa de Choque da PM em março último (ver aqui).

    Um dos problemas no loca são as ruas de terra cuja poeira na época da seca afeta a saúde dos moradores. Foto: www.mediaquatro.com

    Organizada inicialmente pelo Movimento dos Sem Teto do Brasil – MSTB no início de 2012 com famílias provenientes de outra ocupação despejada na cidade e atualmente em parceria com o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto – MTST, a luta pelo Glória tem envolvido uma série de negociações referentes ao terreno, que oficialmente pertence à Universidade Federal de Uberlândia – UFU, nos âmbitos universitário, municipal, estadual e federal. O relato de algumas das reviravoltas no caso pode ser lido aqui, uma das diversas matérias produzidas sobre a área especialmente para os Jornalistas Livres desde maio de 2016. Até o início do ano, as ameaças da Polícia Militar e da Justiça mantinham o sonho em suspense (veja as possíveis consequências da desocupação violenta aqui).

    A rodovia BR 050 divide a antiga Fazenda do Glória entre o campus da UFU e a parte ocupada pelos movimentos de moradia. Foto www.mediaquatro.com

    Em março, o Conselho Universitário da UFU aprovou a doação da área, que não faz parte dos seus planos de expansão, para o poder público conforme havia se comprometido o reitor Valder Steffen Jr (ver em https://youtu.be/Q3uAd9TaKJo) em fevereiro. Por decisão da 2ª Vara Federal, foi determinado que a Prefeitura de Uberlândia e o Estado de Minas Gerais se manifestassem sobre a vontade de assumir os 64 hectares, ocupados há cinco anos. Como o governo de Odelmo Leão não se posicionou sobre o caso, o estado de Minas Gerais decidiu assumir o processo de regularização que beneficia as milhares de famílias.

    As casas são simples, mas a urbanização deve resolver problemas como saneamento básico e energia. Foto www.mediaquatro.com

    Famílias estão otimistas com a regularização

    Desse modo, desde o final de agosto a associação de moradores vem fazendo um recadastramento social de todos os habitantes da área. “Vamos juntar informações como renda, profissões, presença de gestantes e quantidade de crianças. Tudo de forma bem detalhada para que consigamos um acordo com o Ministério Público para consolidar a regularização fundiária a ser feita pela COHAB”, afirma Igino Marcos, advogado da Comissão Pastoral da Terra. As histórias de alguns desses moradores, inclusive de Dona Maria, que completou 100 anos mês passado, podem sem vistas em um pequeno documentário produzido em julho de 2016 (https://youtu.be/y-k7pPuR7xQ).

    A expectativa agora é de que até janeiro o governo estadual já entregue os títulos de legitimação fundiária às famílias. A proposta é que os moradores, praticamente todos vivendo em casas de alvenaria em ruas bem divididas, paguem parcelas mensais a partir de 100 reais, de acordo com a renda familiar, em 300 vezes. De acordo com o advogado, há ainda a proposta de buscar uma linha de financiamento de reforma das moradias junto ao Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais – BDMG.

    Apesar das ruas de terra, moradores já construíram suas casas em alvenaria e vários têm carro para ir até o centro da cidade. Foto: www.mediaquatro.com

    “Queremos que além de uma vitória da luta dos trabalhadores, também seja uma vitória para a cidade. Queremos deixar um bairro bem bonito, do jeito que Uberlândia merece e as famílias merecem”, conclui Marcos. Em vídeo de dezembro passado, junto a líderes e moradores de outras ocupações na primeira assembleia conjunta da cidade (veja aqui ), ele explica as estratégias da luta sem violência para conquistar o teto.

    O chamado “Triângulo do Glória” limitado abaixo por um campus da UFU e à esquerda pela antiga ocupação e hoje bairro São Jorge. Foto: www.mediaquatro.com

    Procurada pela nossa reportagem, a Prefeitura de Uberlândia não se manifestou até o fechamento desta matéria.

     

  • PM: “ É quase certeza que a reintegração ocorrerá”

    PM: “ É quase certeza que a reintegração ocorrerá”

    Boa parte dos moradores da ocupação são crianças. Foto: www.mediaquatro.com

    A reintegração de posse do Glória, área pertencente à Universidade Federal de Uberlândia onde vivem 2.350 famílias há cinco anos, se torna cada vez mais próxima aos olhos da Polícia Militar. Porém, mesmo com o planejamento pronto e a verba necessária depositada à PM, a intervenção ainda não ocorreu. O Major Julio Cesar Cerizze Cerazo de Oliveira, assessor de Comunicação Organizacional da 9ª RPM (9ª Região de Polícia Militar), explicou o motivo desta ação ainda não ter acontecido em entrevista exclusiva ao blog Glória em Foco.

    “O processo de reintegração de posse não é simplesmente o uso de força policial para reaver o terreno ocupado. Ele envolve uma série de negociações que inclui reuniões com o Ministério Público, órgãos de defesa dos direitos humanos e dos sem teto, a Pastoral da Terra, a Promotoria e os próprios moradores”. Segundo o Major, o avanço do processo depende das negociações e prazos estabelecidos nesses encontros.

    Ele ainda afirma que a área do campus Glória da UFU não é um assentamento. “Tecnicamente, por enquanto é uma invasão. Vira assentamento depois que o governo compra a área e a distribui em forma de lotes”. Apesar disso, o dicionário Aurélio apresenta outra descrição: “Ato ou efeito de fixar-se, de estabelecer residência em determinado lugar”.

    O chamado “Triângulo do Glória” limitado abaixo por um campus da UFU, à esquerda pela antiga ocupação e hoje bairro São Jorge e ao fundo os bairros centrais de Uberlândia. Foto: www.mediaquatro.com

    Oliveira declara também que a parte mais complexa desta ação já foi realizada. “Realmente houve o depósito dos R$ 7,4 milhões para custear a operação, e isso era o mais difícil de ocorrer. Então eu quero acreditar que a ordem judicial será cumprida, pois já são dois anos de negociação e ninguém conseguiu entrar num consenso. Tenho quase certeza que a reintegração vai acontecer”. Como fins da verba citada, ele cita a munição, o transporte, a alimentação e o combustível, além de hospedagem para as possíveis tropas vindas de fora da cidade.

    “O planejamento para a operação já está pronto desde 2014. Por isso, o valor depositado pela UFU pode não ser suficiente para custeá-la. Houve aumento do número de pessoas no local, então precisaremos aumentar a quantidade de policiais, de viaturas, de armamento para fazer frente ao tamanho que hoje está a invasão do Glória ”, declara Oliveira.

    Para o Major, há também perigo de fatalidades no caso de um confronto com os moradores do local. “Quem vai determinar o tipo de abordagem que vai ocorrer são as pessoas que moram lá. A Polícia Militar estará preparada para o que for necessário. De acordo com a reação que ocorrer por parte dos moradores, vamos responder à altura”. Ele também afirma que, no planejamento, a polícia já faz uma previsão do pior dos cenários, com 40 mortes (10 soldados e 30 civis). Por este motivo, existe um plano de uso de ambulâncias e de transporte aéreo para feridos graves. Além disso, é feito um contato prévio nos hospitais próximos.

    Praticamente todas as mais de 2.350 casas da ocupação são de alvenaria e os moradores continuam construindo mais. Foto: www.mediaquatro.com

    Quanto aos bens da população, Oliveira afirma que, por ser uma área federal, provavelmente a UFU colocará à disposição mão de obra, equipamentos e um local para manter os pertences dos moradores, no entanto não há qualquer manifestação da reitoria nesse sentido. “No caso de uma área particular, o proprietário é quem geralmente banca estes custos. Como é uma área federal, quem deve acolher estas pessoas deve ser a própria universidade”. Ainda assim, em documento expedido no dia 13 de fevereiro deste ano, a procuradoria de Uberlândia afirmou que a universidade não tem competência para realizar um plano de desocupação considerando o número atual de habitantes do terreno.

    Quando perguntado sobre a possível substituição da área pela Fazenda do Capim Branco, localizada na zona rural de Uberlândia, o oficial foi incisivo. “Não existe troca de área pública. O governo não pode doar esta área porque não pertence a ele, é público. É como achar que o prefeito pode dar uma praça para alguém. A UFU é pública, por isso não se pode ficar trocando ou cedendo espaço para outros. Se fosse uma área particular, seria diferente”. É importante lembrar que, apesar da afirmação acima, houve uma série de negociações para a troca do terreno com a UFU, mesmo havendo certo prejuízo. Enquanto a área do Glória é avaliada em cerca de R$ 65 milhões, a do Capim Branco tem valor de 58 milhões de reais.

    Foto: www.mediaquatro.com

     

  • Glória a um passo da solução. Ou não

    Glória a um passo da solução. Ou não

    As mais de 15 mil pessoas de 2.350 famílias que moram no bairro Élisson Prieto, zona sul de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, têm vivido numa montanha russa nos últimos meses. Enquanto o assentamento, mais conhecido por Glória, completa cinco anos com praticamente todas as casas de alvenaria, as ruas definidas, o espaço para uma praça central separado, o Ministério Público Federal pressiona cada vez mais pela desocupação. Nessa quinta, diante de uma nova ameaça de despejo iminente, para o qual a Polícia Militar de Minas Gerais estima um custo de R$ 7.5 milhões além da morte de 40 pessoas (10 policiais e 30 moradores https://wp.me/p7pbzg-5Uk), mais de 2.000 assentados foram cobrar diretamente de Valder Steffen Jr, novo reitor da Universidade Federal de Uberlândia, dona da área, um posicionamento claro.

    Valder Steffen Jr, reitor da UFU, e Minéia do Glória

    Depois do MP bloquear no ano passado os bens dos dois últimos reitores da UFU em R$ 7.5 milhões exigindo o pagamento dos custos para a reintegração de posse, em dezembro o dinheiro é liberado pelo Governo Federal (https://www.youtube.com/watch?v=CE2CBOXjxUs). Em janeiro, o MP intima a reitoria, que havia acabado de tomar posse, a desenhar um plano de desocupação em 10 dias. Vencido o prazo, os procuradores federais da defensoria da própria UFU informam o juiz do caso, no último dia 13 de fevereiro, que a universidade não possui a expertise para tanto e “nesse caso não há outro plano senão contar com a imprescindível atuação do Poder Judiciário e com o necessário auxílio das Polícias Militar e Federal, além do acompanhamento de outros atores sociais como o Corpo de Bombeiros, Ministério Público, Conselho Tutelar e Secretarias Municipais de Saúde e Ação Social […] durante o desenvolvimento dos trabalhos de desocupação”. No mesmo despacho, requerem dos réus (os assentados) “que exponham, de sua parte, qual o plano para por fim à desobediência e cumprir a ordem de desocupação, sem darem ensejo ao uso da força e exporem a risco inocentes”.

    O saguão da reitoria ficou pequeno para os manifestantes. No meio da sala, uma maquete do futuro Campus Glória, da UFU. O triângulo branco que aparece vazio é onde moram 2.350 famílias

    A escalada das ameaças é evidente. Acordos alinhavados nos últimos anos com os governos municipal, estadual e federal, com oferecimento de outras áreas em troca do terreno, definido pela prefeitura antes mesmo da disputa como Zona Especial de Interesse Social (ZEIS), nunca utilizado pela UFU e separado por uma rodovia do restante do Campus Glória, são simplesmente ignorados. Nenhum argumento de ordem humanitária, social ou mesmo financeira é levado em conta. Afinal, além das dezenas de mortos e centenas de feridos previstos pela PM, como acomodar da noite pro dia 3% da população do segundo município mais populoso de Minas? Ainda mais se tratando de milhares de crianças, cerca de 2.000 idosos e 600 pessoas com deficiência. E que sentido tem deitar por terra mais de 2.300 construções num valor estimado de pelo menos R$ 160 milhões?

    Sem medo, mas com justo receio sobre como será o futuro numa ocupação que luta há cinco anos pra ser regularizada

    Diante de tudo isso, os moradores marcharam bastante tensos para a reitoria. Nas conversas entreouvidas, o sentimento era muito semelhante: “não vou sair da minha casa, nem que o trator passe por cima”, “só saio morta”, “construí lá meu sonho e minha vida”. De tempos em tempos, um grito de guerra: “Aqui está, o povo sem medo, sem medo de lutar”, “Eeee, o Glória voltou, o Glória voltou”, “Lutar, resistir e depois morar aqui”. As lideranças andam entre os moradores. Minéia do Glória, Marcos do MTST, Frei Rodrigo da Comissão Pastoral da Terra e Dr. Igino Marcos, advogado, tentam manter o ânimo em alta. Sobem e descem os três andares do prédio. Buscam representantes para conversar.

    O reitor recebe convidados numa sala envidraçada do terceiro andar. Depois do pedido, concorda em descer e conversar diretamente com os assentados, algo inédito. E mais, traz boas notícias. Segundo ele, o governo deu “um presente de natal” ao promulgar em 23 de dezembro passado a Medida Provisória 759 (http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/127879), que facilita a regularização de ocupações urbanas consolidadas, como é o caso do Glória. Ele pediu um “voto de confiança” na nova gestão da universidade e afirmou que levará na próxima reunião do Conselho Universitário, já em março, uma proposta para encerrar o processo atual de despejo e iniciar um novo com vistas a uma “solução pacífica”. Resta agora esperar pra ver se, diferente de outras ocasiões, não se trata de mais uma “conversinha” enquanto os procuradores da UFU tomam decisões contrárias ao assumido pelo reitor e se o MP vai aceitar as resoluções do Consun.

    Vista aérea da ocupação do Glória. Mais de 15 mil pessoas morando num bairro organizado e consolidado maior que muita cidade no Brasil