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  • Temer e aliados no fundo do poço

    Temer e aliados no fundo do poço

    Texto de Paulo Endo, Psicanalistas pela Democracia

    Temer, seu governo e seus aliados chegaram ao fundo do poço. Começa agora o espetáculo dantesco daquele que chegou ao poder sem qualquer legitimidade, apoiado por forças que não desejam o bem do país e nem de seus cidadãos e que fora apoiado e insuflado por grupos neofascistas que, cada vez mais inúteis e perdidos, observam todos os dias a desgraça em que meteram o país. Já saíram às ruas para pedir o FORA TEMER, juntamente com a Globo, o Estadão e todos os que contribuíram para essa mixórdia nacional.

    A Globo percebendo sua credibilidade cair em queda livre em suas tentativas desesperadas de apoiar um governo que tem 2% de aprovação, decide dar carta branca para o fim da era Temer sob pena de ser ridicularizada pelos seus próprios telespectadores.

    No conjunto, sabíamos da irresponsabilidade desse que é o grupo pró-impeachment, pró-golpe e, desde cedo, sabíamos que sua estratégia seria propagar violência e ruína. Suas bravatas desmancham todos os dias uma a uma, mas eles não cedem. Cegos como cães raivosos perderam a capacidade de ver, ouvir e argumentar e, mesmo agora, não esquecem que a cada frase devem ofender e denegrir o PT com mais duas, verdadeira obsessão dos monotemáticos articuladores do desastre-Brasil e que, agora que seu líder mergulha em queda livre querem sair por cima.

    Podemos tentar imaginar os próximos passos do ex-presidente, como bem disse o sábio William Bonner no Jornal Nacional de anteontem.

    Desesperado, mas obcecado pelo poder, Temer já repetiu inúmeras vezes que “não vai cair” e em seu depoimento oficial afirma que não renunciará. Ele, agora mesmo, deve estar procurando adesões no baixo clero, tentando comprar com benesses, vantagens e ilícitos a todo e qualquer parlamentar, juiz, procurador, ministro e líder partidário. Abusará, como nunca do dinheiro público, arrecadado com impostos. A casa já caiu então por que não se lambuzar de vez?

    Sem rumo, oferecerá tudo o que não lhe pertence e continuará negociando para permanecer ‘um pouquinho mais, só até passarem as reformas’. Está aturdido pelo Palácio do Planalto, vive plenamente as vantagens de ocupar um lugar que jamais lhe pertencerá.

    Incauto, ficará nervoso com os subalternos e exigirá pressa na tramitação das reformas que, a essa altura, viraram pó. Contará com parlamentares suicidas e, para isso, oferecerá inúmeros ilícitos.

    Covarde, colocará polícia e exército nas ruas de Brasília para impedir aproximações de milhares de manifestantes que não admitem mais um dia sequer de sua presença no planalto, mantido à base de regalias sustentadas com o dinheiro dos impostos pagos pelos brasileiros.

    Inútil, tentará negociar com os grupos econômicos aos quais havia prometido mundos e fundos e cujos resultados não pôde entregar completamente. Fará promessas inexequíveis.

    Dissimulado, dirá a nação que nada do que ela ouve e vê é verdade e continuará dizendo aos milhões brasileiros que aceitem o transe hipnótico que inventa um trabalhador feliz e sem direitos; um aposentado tranquilo e sem renda; milhões de brasileiros livres e sem democracia; um país orgulhoso e submisso.

    Sem futuro, lembrará que um dia foi um grande constitucionalista e professor e, ao lado de Cunha, quiçá compartilhando a mesma cela, e em tom submisso e amedrontado, cobrará seu comparsa pelos reais que permitiram que a vida de Cunha preso e de sua mulher, em liberdade, continuassem com os mesmos luxos e benefícios que tinham ao longo da vida corrupta e impune que sempre tiveram.

    Em prantos procurará o colo de Marcela, mas que a essa altura, talvez, já estará ocupada com os prantos do pequeno e envergonhado Michelzinho.

    Lamentamos que a democracia representativa tenha o legado mais escandaloso que só hoje demonstra seu tamanho e consequências. Na complexidade em que as coisas avançam e na ruptura do processo, que impõe o fazer e respeitar leis, o Brasil precisa urgentemente das eleições diretas, como único mecanismo democrático que ainda sobrevive à apologia da destruição.

    A sociedade precisa de novos líderes capazes de repactuar um projeto nacional e um horizonte livre para o exercício de subjetividades dos que viveram a liberdade e não renunciarão a ela, mas é preciso restituir legitimidade a essas lideranças. Hoje só o voto direto apresenta essas condições mínimas. Longe e fora dele só é possível prever destroços.

    A expectativa de que um golpe funcionaria ignorou as instituições e forças democráticas que se consolidaram, durante o pouco tempo em que uma democracia vigorou no país. São elas, e apenas elas, que terão legitimidade para projetar um novo país que se elaborará como signo de uma democracia nova, consertada, mais robusta.

    O país não foi destruído, não chegamos ainda a terra arrasada. Sentimos isso a cada manifestação, a cada ato, a cada tentativa de construção e reinvenção do país, a cada ativista repleto de esperança que após perderem a visão, terem o crânio esfacelado e o sangue limpo de suas vestes e faces permanecem vivos, lutando e orgulhosos de terem resistido ante a promessa do caos.

    Os movimentos sociais, a mídia livre, os poucos intelectuais que estiveram ativos e vigilantes, os democratas resistentes em cada uma das instituições brasileiras e os inúmeros movimentos de estudantes e trabalhadores saberão dar curso ao Brasil saído de um golpe.

    Um grande pacto terá de advir.

    Temos esperança de que a esquerda também amadureceu, saberá se entender e compartilhar o essencial abandonando os narcisismos que sempre a impedem de se articularem no longo prazo.

    Tudo o que vemos não é mais tenebroso apenas por que vemos. Isso sempre esteve presente no Brasil drenando a energia e os recursos nacionais e inscrevendo em cada um de nós um escafandro identitário contraditório.

    Somos o país do futuro ou do atraso? Somos exóticos ou risíveis? Originais ou cópias baratas? Cordiais ou submissos? Indignados ou indolentes? Americanos ou americanizados?

    O diagnóstico está feito, o mapa está à nossa frente. Daqui para diante não poderemos alegar a escuridão para justificar a perda de rumos e uma nova e alvissareira cartografia haverá de ser feita pelos que, nem por um minuto, deixaram de acreditar na nossa democracia e no desejo imenso que tantos tem de que o Brasil, um dia, floresça como merece, sempre mereceu.

    Temer ganha tempo. Ao não renunciar e sair do poleiro com o mínimo de dignidade, mantém o foro privilegiado e terá tempo de fazer um sucessor por vias indiretas. Nesse aspecto continua um comparsa do projeto Rede Globo.

    O principal não é sua permanência ou queda, mas a concretização do projeto de atraso do Brasil ainda não inteiramente concluído. Recomendamos ao leitor a publicação do site Alerta Social intitulada 365 direitos perdidos, que faz um apanhado do ataque frontal à população brasileira mais vulnerável e pobre empreendida sem tréguas, ao longo do último ano, pelas forças que compõem o projeto que o atual governo representa. (http://alertasocial.com.br/?p=3602).

    Para estancar a sangria a queda de Temer é um primeiro passo, mas ele não é decisivo. Pode ser o começo do fim, mas estancar a retomada de eleições livres e justas, com chances reais para um candidato que defenda uma pauta à esquerda, é o que visa a todo custo o projeto Temer, que persistirá mesmo após sua derrocada.

    As últimas notícias animaram as mobilizações e indicaram que o projeto das elites nacionais corre perigo, que as esquerdas também se beneficiam de erros da direita e podem surfar enquanto os promotores do projeto desastre batem cabeça. De súbito tudo adquire um sentido novo, colorido e vistoso e a agenda das ruas se intensifica. O projeto Globo passa à execução do plano B. À nossa frente Rodrigo Maia e Carmen Lúcia. A próxima tarefa é deixá-los para trás arrastados pelo vórtice das Diretas Já.

    Mas Temer ainda não desistiu de ser o menino prodígio do golpe. Acredita em sua tarefa e na antessala onde, como presidente da República, conversa amigavelmente com empresários que narram como se obstrui a justiça influenciando juízes e plantando procuradores. Diante deles o presidente só tem a dizer: É complicado.

    Temer, role para o lado, a caravana precisa passar!

    Diretas imediatamente agora, para reiniciarmos a caminhada para o país que queremos e aprofundar a nossa ferida, mas querida democracia. Aquela que sobrevive e pulsa no coração de milhões de brasileiros!

  • Golpe dentro do Golpe

    Golpe dentro do Golpe

    O Brasil amanhece com a notícia de que a Polícia Federal realiza mandados de busca e apreensão em mais de 40 endereços pelo país, especialmente em Brasília e no Rio de Janeiro. Dentre os alvos da operação, o Senador Aécio Neves. Envolvido, junto com o Presidente Michel Temer em uma denúncia publicada pelo Jornal O Globo, o Senador foi visto ao final da sessão de ontem a noite saindo discretamente, logo depois de ter sido fotografado lendo as notícias que já corriam pela internet.

    De fato, o furo do jornalista Lauro Jardim parece ter implodido a república brasileira nas últimas horas.

    Depois do impeachment de Dilma Rousseff, a revelação de que delatores da JBS (que representa a Friboi), GRAVARAM o presidente Michel Temer em negociações de propina para comprar o silêncio de Eduardo Cunha, parece ter conseguido o feito de unificar o país dividido de um ano atrás. Até líderes de movimentos como o MBL – um dos principais mobilizadores para a derrubada de Dilma – ocuparam as redes esta noite para pedir a renúncia de Michel Temer.

    A Globo (aberta) anunciou em seu plantão, pouco antes do Jornal Nacional ir ao ar, que o colunista havia publicado as revelações “ainda sem os áudios, mas com confirmação dos investigadores da Lava Jato”. No referido material, diálogos gravados pelos delatores supostamente comprovam que Temer sabia do esquema de pagamento de “mesadas” à Eduardo Cunha, preso e condenado, para que este “não falasse o que sabe”. Além disso, outros trechos indicam que o Senador Aécio Neves também estaria envolvido, tendo pedido $ 2 milhões aos empresários da JBS e ainda, aparentemente, sugerido o assassinato de um dos envolvidos “antes que ele delatasse” o esquema.

    Em meio a esse cenário, uma das coisas que chamou a atenção da opinião pública foi o claro “desembarque” da Globo do governo que a própria emissora ajudou a colocar no poder. Mas alguns fatores podem estar por trás desta atitude, como o interesse numa transição de governo capitaneada pela Ministra Carmem Lúcia do STF e a posterior convocação de eleições indiretas, ou seja, decidida pelo Congresso, que podem levar ao poder algum aliado do mercado financeiro.

    É bom lembrar que completado um ano de governo Temer, a economia ainda apresenta números negativos e o empresariado ( especialmente aqueles representados pela FIESP), vêm demonstrando insatisfação em relação ao tímido resultado apresentado. E dentro da linha sucessória, tanto Rodrigo Maia, presidente da Câmara, quanto Eunício Oliveira do Senado, estariam teoricamente impedidos de assumirem um “mandato tampão”, por serem investigados pela Operação Lava Jato. Um desdobramento em consequência da ação que destituiu Renan Calheiros da presidência do Senado pelo mesmo motivo.

    Essa linha de raciocínio explicaria o jantar do qual a Ministra participou há alguns dias, com FHC, empresários e até um membro da Família Marinho. Carmem Lúcia pode representar ainda uma possibilidade de suspensão do calendário de 2018, com o argumento de “estabilizar o país” e concluir a Operação Lava Jato. No entanto, isso também poderia ser visto como uma tentativa de impedir a eleição do ex-presidente Lula, que vem aparecendo em primeiro lugar nas intenções de voto em todos os cenários e por institutos de pesquisa diferentes.

    Figuras como o Senador Ronaldo Caiado pedindo abertamente a renúncia de Michel Temer também indicam que a aliança formada para derrubar a presidenta Dilma Rousseff, começou a se diluir assim que as revelações começaram a circular.

    O Planalto soltou uma nota, cerca de uma hora depois que as notícias foram divulgadas, em que afirma que o presidente Michel Temer “não participou de nenhuma conversa” com aquele teor. Também o Senador Aécio Neves nega qualquer participação na negociação. Ambos disseram por meio desses comunicados que “confiam nas investigações e aguardam que o judiciário se pronuncie”.

    Pouco antes de uma multidão tomar as ruas em frente ao Palácio do Planalto em Brasília, também na Avenida Paulista e em várias outras cidades, os Ministros do STF fizeram algo bastante incomum para os jornalistas acostumados a cobrir a Côrte. Foi solicitado que a imprensa se retirasse e em seguida, fecharam as portas do Supremo. Ali, acredita-se que o Ministro Edson Fachin tenha se reunido com seus pares, não só para avaliar o tamanho da crise, mas também pelo fato de que agora ele está sendo pressionado a revelar rapidamente o conteúdo das conversas citadas.

    O Ministro Edson Fachin assumiu a relatoria da Operação Lava Jato depois que o avião que levava o Ministro Teori Zavatscki caiu e onde morreram todos os ocupantes, um acidente que ainda está sob investigação. Por sinal, o filho do Ministro, Francisco Zavatscki, chegou a publicar em seu perfil nas redes sociais uma espécie de “desabafo” em que pergunta “se o PMDB teria coragem de matar o pai dele”. Com a repercussão, o post foi apagado, mas já havia se espalhado pela internet. Francisco menciona ainda o Ministro Teori, dizendo que pouco antes de morrer, o pai estava “preocupado com o PMDB”, que segundo ele “tentava parar a Operação Lava Jato”.

    Também chamou atenção da opinião pública nos minutos seguintes em que a cúpula do Governo Temer começava rapidamente a ruir com a notícia, o fato de que há poucos dias foi revelado que o Juiz Sérgio Moro, que conduz de Curitiba a 1ª instância da Operação Lava Jato, disse em despacho que negava um pedido da defesa de Eduardo Cunha porque este havia tentado “chantagear Michel Temer”. Fica a pergunta no ar: se Moro sabia da tentativa do PMDB de parar a Operação, porque tentou censurar o que Eduardo Cunha tinha a dizer? Será que foi esse o motivo que levou os irmãos da JBS à procurarem a PGR e não Sérgio Moro, para fechar o acordo de delação premiada?

    Não se sabe ao certo muitas respostas e nem o que vai acontecer nas próximas horas, mas uma coisa é certa: o grito ouvido nas ruas nesta quarta-feira e a reação na internet foi unificada: #RenunciaTemer e #DiretasJá. E é a primeira vez, desde o impeachment de Fernando Collor na década de 90, que aparentemente todo o país se uniu em torno de uma ideia em comum. Não é pouca coisa.

  • NÃO FOI GAFE. FOI DESRESPEITO

    NÃO FOI GAFE. FOI DESRESPEITO

    A Globo classificou como “gafe” o termo usado pelo prefeito eleito de São Paulo, João Dória Jr, para se referir aos deficientes. Não se trata de gafe. Trata-se de completo desconhecimento sobre o tema, total despreparo acerca das demandas dessa população e enorme desrespeito aos direitos humanos.

    O uso do termo “defeituosa” – completamente equivocado – revela muito sobre o próximo gestor da capital paulista: nunca se debruçou sobre as questões relativas aos direitos das pessoas com deficiência; não entende nada sobre políticas de inclusão social; não tem qualquer sensibilidade com a situação, a não ser puro marketing.

    No Brasil existem 45,6 milhões de pessoas com deficiência, de acordo com o IBGE, o que representa 23,92% da população. Ao longo do tempo, o conceito de deficiência foi se aprimorando, conforme ganhava contornos e políticas inclusivas.

    Não é mera nomenclatura. O termo carrega significados. Primeiro falava-se em “inválidos”, depois em “incapacitados” e entre 1960 e 1980, usava-se o termo “defeituosos”, ao qual se remeteu Dória.

    Depois vieram os conceitos “pessoas portadoras de deficiência”, “pessoas com necessidades especiais”, até se chegar ao uso atual “pessoas com deficiência”. E em 2010, o uso correto do conceito se tornou lei por meio da portaria 2.344, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

    Usar uma palavra equivocada, como proferiu o futuro prefeito, “pode ser responsável pela resistência contra a mudança de paradigmas (…), por exemplo, na mudança que vai da integração para a inclusão em todos os sistemas sociais comuns”, escreveu Romeu Kazumi Sassaki, especialista em inclusão.

    Não é pouca coisa.

    Ainda mais para alguém que pretende ser prefeito da capital de São Paulo.

    Em tempo: em 2000 a instituição AACD teve também que se adequar aos novos tempos, a pedido dos próprios pacientes. E trocou sua nomenclatura por Associação de Assistência à Criança Deficiente.

    Meme: http://www.globo.comdoria
    Texto: Maria Carolina Trevisan, Jornalistas Livres

  • A palavra que mata

    A palavra que mata

    O cerco a Getúlio

    Meu tio Marcos adorava Getúlio Vargas. Aos dezoito anos de idade, recém chegado ao Rio, saído de uma cidadezinha de Minas, viu seu salário mínimo dobrar. Talvez não prestasse atenção à criação das leis do trabalho, da Petrobrás e do BNDES, nem tampouco aos interesses, locais e mais ao norte, que tais atos contrariavam, mas sentiu no bolso uma folga desconhecida na sua vida mista de estudante e trabalhador.

    Estou certo, no entanto, que meu tio e muitos outros perceberam que a perseguição a Getúlio fora executada pelo bloco capitaneado pela imprensa que não dera tréguas até sua morte, como conta Jânio de Freitas:

    Desde 6 de agosto, dia seguinte ao atentado [a Lacerda e em que morreu um major], o país passou a viver em torno da exaltação concentrada na República do Galeão, e em crescendo permanente sob a agitação furiosa feita por Lacerda.

    Logo acusado do crime por Lacerda, Getúlio ficou indefeso, objeto de um ódio coletivo que se propagava sem limites: monolíticos, a imprensa, a incipiente TV e o rádio, mais do que se aliarem à irracionalidade, foram seus porta-vozes sem considerar as previsíveis consequências para o Estado de Direito.

    Após o anúncio do suicídio de Getúlio:

    A redação de “O Globo” foi atacada, carros do jornal foram destruídos, o “Jornal do Commercio” teve sua oficina invadida, vários dos 17 jornais foram alvos da massa. Lojas, portarias, ônibus, bondes, automóveis, carros da polícia em fuga, a Câmara dos Deputados e o Senado, as cercanias dos guarnecidos ministérios do Exército e da Marinha, tudo devia pagar pelo abandono em que Getúlio fora deixado por todos, e pela própria massa.

    No dia 23, o Brasil estava endoidecido de ódio a Getúlio. No dia 24, enlouquecido de paixão e saudade.

    O golpe de 1964

    Ainda me lembro de, aos 10 anos de idade, de mãos dadas com minha mãe e meu pai, “marchar com a Família, com Deus, pela Liberdade”, em torno da igreja da matriz de São José dos Campos. A Marcha era um dos preparativos para o golpe que se avizinhava. Não sei dizer se meus pais se sabiam manipulados pela imprensa, contudo, certamente não compactuavam com o ideário conservador de direita que tomaria corpo na sequência.

    E novamente, lá estava a imprensa, como narra Emir Sader:

    A verdade é esta: no momento mais importante da história brasileira recente, a imprensa ficou do lado da ditadura e contra a democracia.

    O golpe militar de 1964 foi mais um produto da crise de desestabilização política que os EUA, aliado a forças locais, promoveram na América Latina. Ele se inscreve na lista dos golpes da Guatemala (1954), do Brasil contra o Getulio (1954), da Argentina contra o Peron (1955), entre tantos outros.

    Eles foram sempre arquitetados como se fossem levantamentos civis espontâneos contra governos “despóticos, “cripto comunistas”, isolados por movimentos democráticos de resistência na defesa das liberdades ameaçadas. Depois soubemos que são táticas arquitetadas pelas teorias de contra insurgência, que seriam aperfeiçoadas e aplicadas em outros países da própria região, como no Uruguai, no Chile, na Argentina.

    É uma engrenagem indispensável a ação da mídia, para campanhas insidiosas contra os governos, levantando falsas acusações, mentindo, forjando circunstâncias e disseminando um clima de terror, de pânico, entre a população.

    Que a democracia estaria em perigo, que as liberdades estão acabando, que a liberdade de expressão esta sendo mortalmente atacada, que a liberdade de culto pode acabar, que a educação estaria sendo alvo de campanhas comunistas de formação da juventude, etc. etc.

    A imprensa foi um instrumento ideológico na preparação do golpe e da instalação das ditaduras militares. No Brasil, convocava as Marchas com a Família, com Deus, pela Liberdade, distorcia as políticas do governo, pregava abertamente o golpe militar nos seus editorais, apelava ao fantasma do “comunismo”, servindo os ideias da Doutrina de Segurança Nacional na guerra fria.

    E fazia tudo – como se conhece hoje pelo acesso que se tem aos jornais daquela época – como se a democracia estivesse em perigo e o golpe militar, que instaurou o regime ditatorial mais selvagem que o país conheceu, fosse a reinstauração da democracia. Em nome dos riscos que correria a democracia, atuaram abertamente para que a democracia brasileira fosse destruída.

    Sem a imprensa, não teria sido possível a criação do clima de desestabilização, indispensável à intervenção dos militares, como para impor a ordem em uma situação que a imprensa propagava que fosse de falta de controle institucional, de uma situação supostamente pré-revolucionária.

    A imprensa foi a porta voz dos projetos de ruptura da democracia e de apelo aos militares para que intervissem. Ela saudou o golpe como a salvação da democracia, se pronunciou abertamente a favor da instauração da ditadura e apoiou a repressão como se fizesse parte desse esquema de salvação. Sem a imprensa, não teria sido criado o clima de desestabilização que tornou realidade o golpe e a ditadura militar.

    São crimes contra a democracia, que mancharam irreversivelmente os órgãos de imprensa que deles participaram. No momento mais importante da historia brasileira recente, a imprensa ficou do lado da ditadura e contra a democracia.

    Diretas Já

    Aniversário de São Paulo de 1984 e lá ia eu de camisa amarela pela rua, lembrando da canção de Chico Buarque pelas diretas: “quando vi todo mundo na rua de blusa amarela, eu achei que era ela puxando o cordão”. Usávamos um peça de roupa amarela, não era a camisa da CBF. Embora ainda pairasse no ar certo medo de repressão pelo regime militar, formamos uma massa de mais de 300 mil pessoas na Praça da Sé. A Rede Globo, em seu jornal noturno disse que as pessoas estavam comemorando o aniversário de São Paulo. Ali surgiu o slogan: “o povo não é bobo, abaixo a rede Globo”.

    Como narra Najla Passos:

    “Quando a multidão ocupou a Praça da Sé, a Globo optou por maquiar o ato e alterar suas finalidades. No telejornal mais visto do país, o apresentador Sérgio Chapelin fez a seguinte chamada: “A cidade comemorou seus 430 anos com mais de 500 solenidades. A maior foi um comício na Praça da Sé””.

    Conclui ela:

    “a hostilidade com que os manifestantes tratavam a emissora só fazia aumentar. Foi nesta época que os protestos de rua passaram a bradar o slogan ouvido até hoje: “O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo”. Foi nesta época também que os repórteres da Globo passaram a ser achincalhados nas ruas”.

    O debate entre Lula e Collor

    Depois de longos e cinzentos anos vivíamos uma esperança rejuvenescedora com um candidato à presidência identificado com as lutas do povo brasileiro: Lula passara ao segundo turno da eleição presidencial de 1989. A última eleição direta havia sido em 1960. Ele e Collor desbancaram Ulisses, Covas, Brizola, Maluf, entre outros. A campanha foi recheada de golpes baixos contra o candidato petista, como a declaração do presidente da Fiesp de que milhares de empresários deixariam o país se Lula vencesse, como o caso Miriam Cordeiro, ex-namorada de Lula com quem tivera uma filha, como a aparição de um dos sequestradores de Abílio Diniz com a camiseta do PT e como a pretensa medição de apartamentos de classe média para “verificar quantas famílias poderiam ocupá-los” já que o comunismo era iminente.

    Não obstante o jogo sujo, Lula crescia e Collor caia nas pesquisas. Havia aparente empate técnico às vésperas da votação do segundo turno, quando ocorreu o debate na Globo. A edição feita para a matéria do Jornal Nacional realçou todas as falas positivas de Collor e todas as falas negativas de Lula.

    Como conta o jornalista Ronald Carvalho, em artigo de Juca Kfouri:

    “Eu mesmo tratei de refazer a edição, porque sabia que era uma missão delicada e não quis expor ninguém. Pensei assim: vou editar como se fosse um jogo de futebol. Se foi 5 a 1, e foi 5 a 1 para o Collor, mostrarei os cinco gols dele e o gol do Lula”.

    Naquele dia, de acordo com o escritor Antonio Mello, o Jornal Nacional terminou com as seguintes falas de Cid Moreira:

    “E quem venceu o debate? O Instituto Vox Populi fez esta pergunta a 490 telespectadores em 114 municípios. 22% dos entrevistados acharam que o debate foi ótimo; 39,5% o consideraram bom; o debate foi regular na opinião de 28% dos telespectadores; e 7,7% disseram que o encontro ficou entre ruim e péssimo.

    Veja agora a avaliação do desempenho dos candidatos:

    – Melhor desempenho: Collor: 44,5%,Lula: 32%

    – Ideias mais claras: Collor: 45%, Lula: 34,1%

    – O mais preparado para governar: Collor: 48%, Lula: 30%

    – Melhores planos de governo: Collor: 45,9%, Lula: 33%

    – Quem atacou mais o adversário?: Collor: 33%, Lula: 30,8%”

    E de Alexandre Garcia (no estúdio):

    “O debate dos candidatos teve um alto índice de audiência e o público superou o do debate anterior. Ao transmitir o encontro dos presidenciáveis, a televisão cumpriu mais uma vez o seu papel na democracia.”

    Criminologia midiática

    O professor Eugenio Raúl Zaffaroni, em A palavra dos mortos: conferências de criminologia cautelar, nos conduz para além da criminologia acadêmica. Nos alerta para a a existência e efetividade da criminologia midiática. As duas criminologias conformam as opiniões da média das pessoas e potencializam ao extremo nossa surdez em ouvir a palavra dos mortos.

    A criminologia não se reduz a, simplesmente, uma ciência tratada ao nível acadêmico. É preciso atentar para a construção da realidade feita pelos meios de comunicação de massa: a criminalidade midiática, criada pela palavra, “a despeito de estar carregada de preconceitos, falsidades e inexatidões”. A criminalidade midiática., que se opõem a criminalidade acadêmica, forma a atitude da média da pessoas, que se tornam posições politicas que, por sua vez, se transformam em leis.

    Às duas criminalidades, acadêmica e midiática, deve-se confrontar a palavra dos mortos: o crime a partir da perspectiva das vítimas da violência mais grave.

    “Não se trata apenas, porém, de confrontar, mas também de averiguar se os cadáveres são tais porque as palavras contribuíram para condicionar [ou para não evitar] as condutas que os converteram em cadáveres, posto que é assim que as palavras matam, é assim que a linguagem mortífera opera, ou seja, legitimando, mostrando ou ocultando, descobrindo ou encobrindo”, afirma Zaffaroni.

    Se a palavra mata, se a linguagem mortífera, disseminada pelos meios de comunicação, chega ao limite extremo de legitimar assassinatos, milhares de assassinatos, milhões de assassinatos, do que será, a palavra produzida nos meios de comunicação social, capaz em outras violências de discriminação, de opressão, de submissão?

    Notas

    1 Um dia, um país. Jânio de Freitas (Folha de São Paulo – 24/ago/2014).

    http://www1.folha.uol.com.br/colunas/janiodefreitas/2014/08/1505060-um-dia-um-pais.shtml

    2 A imprensa brasileira e o golpe de 1964. Emir Sader (Carta Maior – 10/jan/2014).

    http://www.cartamaior.com.br/?/Blog/Blog-do-Emir/A-imprensa-brasileira-e-o-golpe-de-1964/2/29985

    3 Os 30 anos do comício que a Globo transformou em festa. Najla Passos (Carta Maior – 24/jan/2014).

    http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Os-30-anos-do-comicio-que-a-Globo-transformou-em-festa-/4/30084

    4 A verdade sobre o debate de 1989. Juca Kfouri (Observatório da Imprensa – 21/ago/2002).

    http://observatoriodaimprensa.com.br/artigos/mt210820021.htm

    5 O papel da televisão. Antonio de Mello (Blog do Mello – 05/out/2007) expõe a íntegra da edição do debate Lula-Collor em 1989, no Jornal Nacional.

    http://blogdomello.blogspot.com.br/2007/10/o-papel-da-televiso-ntegra-da-edio-do.html

    6 A palavra dos mortos: conferências de criminologia cautelar. Eugenio Raúl Zaffaroni, Saraiva, 2012

  • O golpe de Moro, o assédio moral e o terror político

    O golpe de Moro, o assédio moral e o terror político

    Em tempo de procuradores que homenageiam o filósofo nazista Martin Heidegger (Aletheia), que confundem Engels com Hegel, é bom lembrar da metafísica. A metafísica é uma forma de pensamento que vê por baixo dos fatos. Usa o olhar de raio X não só para ver o que não existe, mas para atormentar aqueles a quem vitima. Acaba enxergando tão fundo que encontra tudo que quer enxergar. É a lógica do perverso Olegário, o marido que transforma o ciúme em obsessão, retratado por Nelson Rodrigues em A mulher sem pecado:

    OLEGÁRIO (sardônico) – Me desafia! Diz “minha vida não tem mistérios”! E eu
    ando atrás de você o tempo todo? Sei lá pra quem você olha na rua? Estou dentro de você para saber o que você sente, o que você sonha?

    Agora mesmo, neste minuto, você pode estar-se lembrando de um amigo, de um conhecido ou desconhecido. Até de um transeunte. Pode estar desejando uma aventura na vida. A vida da mulher honesta é tão vazia! E eu sei disso! Sei!

    LÍDIA (nervosa e revoltada) – Você está louco, Olegário, doido! Então, até isso!

    É óbvio que essa tirania, do assédio moral e do sadismo, é uma forma de terrorismo. Terrorismo psicológico, que é a pior forma de perversidade nas relações sociais. Agora, o que está ai na aliança da mídia com a MPF, é o terrorismo judicial aplicado contra a vontade de uma parte significativa da opinião pública. É um sadismo covarde que pretende multiplicar sobre uma sociedade exasperada pela crise econômica e política, cenas de demência sanguinária como essa:

    Uma grande parcela do eleitorado e grupos sociais inteiros sentem-se ultrajados pela perseguição aberta à figura de Lula e à democracia. Esse olhar metafísico e maniqueísta, por isso perverso como o de qualquer seita que se julga portadora de uma missão sagrada, crê firmemente que o mal não pode escapar da sua visão. Para a fé inquisitorial só existe o Bem contra o Mal, o que justifica qualquer tortura para levar alguém a confessar. Se numa situação aparentemente não há mal nenhum, é porque o ‘criminoso’ escondeu bem escondido o seu crime. O crime sempre há. Se não aparece crime nenhum, é porque se está praticando um outro: o crime de esconder o crime.

    Sempre há o crime. Ele é necessário porque, sem ele, o que seria dos carrascos? E essa linha de raciocínio, bastante excêntrica para o bom senso, parece que tem orientado as investigações da Lava Jato. Já no próprio dia 04, quando Lula foi conduzido à força, os responsáveis pela investigação, falavam em vazamentos que teriam levado à destruição de provas.

    “O vazamento pode ter sido a origem do que nós comprovamos hoje ter sido a destruição de provas e ocultamento de documentos. Nesse momento, vamos apurar todos os vazamentos e identificar os responsáveis”. O fato de não ter encontrado as provas que procurava, resultou em “prejuízo à investigação da Polícia Federal”.

    Assim, criavam uma proteção para eles mesmos. Não poderiam ser acusados de mera incompetência, de apontarem crime onde ele não existia, porque, por trás dos fatos, opera uma força diabólica que, fazendo o vazamento e prejudicando a operação, esconde o crime.

    Com isso nunca podem ser acusados de cometer erros. Se não são encontradas as provas contra o suspeito, é simplesmente porque ele é mais ardiloso do que se imaginava e, portanto, é mais criminoso do que se supunha: não satisfeito de praticar seus delitos, ainda, de quebra, furta as provas. Não importa se ninguém morreu, as provas do assassinato serão encontradas.

    Sim, Lula tem poucos bens, seu patrimônio é praticamente o mesmo de quando entrou em seu primeiro mandato. Ora, dirão os metafísicos de plantão, é justamente isso que prova o seu crime. Se ele não exibe o patrimônio que desviou é porque pratica a “ocultação de patrimônio”. Mas, se quisermos argumentar com esses delírios e dizer, por exemplo, que até agora não provaram que o dinheiro de Lula não é limpo, vamos ouvir algo no mesmo estilo: “se o dinheiro dele aparenta ser limpo, é porque foi lavado”. É para descobrir essas coisas, que temos a Lava Jato.

    Não se percebe outro objetivo de Moro que não seja o de contaminar o país com esse sadismo e de criar as condições para que a perversidade social se alastre em um confronto generalizado. Assim, já muitas vezes se falou que os métodos da KGB e da Gestapo eram metafísicos. Stálin gostava de brincar dizendo que a NKVD, se preciso, faria uma criança de cinco anos confessar que era o autor de Guerra e paz.

    O suporte para o sadismo é o aparelho de espionagem (de escutas), de delação (premiada ou não), de gestação do medo e da insegurança, que garantem que tudo está sendo visto. Que conhece o avesso das coisas. Como o tarado da anedota que em suas alucinações dizia que estava todo mundo nu. E que quando alguém o desmentia mostrando que todo mundo estava vestido, replicava: “mas por baixo da roupa, por baixo da roupa está todo mundo nu”.

     

    Assim, vamos ler o diálogo de Lula e Dilma, cuja divulgação soa como grotesco revide pela nomeação de Lula para o ministério:

    Conversa com Dilma
    Dilma: Alô
    Lula: Alô
    Dilma: Lula, deixa eu te falar uma coisa.
    Lula: Fala, querida. Ahn
    Dilma: Seguinte, eu tô mandando o ‘Bessias’ junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!
    Lula:  Uhum. Tá bom, tá bom.
    Dilma: Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.
    Lula: Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando.
    Dilma: Tá?!
    Lula: Tá bom.
    Dilma: Tchau.
    Lula: Tchau, querida.

    Não espanta que, para esconder a própria falta de substância dessa “revelação” ─ já devidamente caracterizada pelo governo ontem à noite ─, o próprio juiz Sérgio Moro corra para dizer que “pelo teor dos diálogos degravados, constata-se que o ex-Presidente já sabia ou pelo menos desconfiava de que estaria sendo interceptado pela Polícia Federal, comprometendo a espontaneidade e a credibilidade de diversos dos diálogos”.

    Aqui se insinua a mesma fantasia metafísica: toda vez que nada se encontra, é porque há muito escondido. Toda vez que o culpado não é pego, é porque ele é mais culpado ainda. Toda vez que o crime não se verifica, é porque é um crime ainda mais insidioso.

    Caso o golpe de Moro, com a criminosa divulgação dessas gravações, em sincronia com manifestações de FHC numa “palestra” para uma “empresa de seguros” (de que banco?), fracasse, certamente ele terá muito que explicar à justiça. Suas ações não são do tipo etéreas, não são meras hipóteses, mas atos que estão empurrando o país para uma possível catástrofe. E isso não há como esconder.

     Ilustração via Vitor Teixeira

  • Malhação tentou construir mundo imaginário sobre as Escolas em Luta

    Malhação tentou construir mundo imaginário sobre as Escolas em Luta

    Nesta segunda (29), dia de ser #FelizSemGlobo, hashtag que ficou nos Trend Topics do Twitter e que deu nome ao protesto realizado hoje, por esta e outras redes sociais contra o império da família Marinho, a Rede Globo exibiu um episódio da série ‘Malhação’ que ‘tentou’ mostrar estudantes ocupando uma escola fictícia chamada Dom Fernão, nome coincidentemente parecido com o nome da E. E. Fernão Dias, uma das primeiras escolas estaduais de SP que iniciaram a luta contra a reorganização escolar imposta pelo tucano Alckmin.

    O esforço foi na direção de querer encenar o que muitos estudantes sentiram durante todos os dias da ocupação da vida real: o temor da violência policial. Indo na contramão da realidade, a versão romântica das Escolas em Luta composta pela Globo ficou piegas mas nada surpreendente para os moldes do PIG.

    Para contextualizar o roteiro da série: lá na ocupação da Dom Fernão não houve abuso policial. No roteiro do universo adolescente da série, a “luta” , em segundo plano, era sim por uma possível reorganização imposta pelo governador, mas o grande objetivo da turma era impedir a demolição do prédio e evitar assim, a instalação de um parque no local.
    Tá confuso pra você? Pra nós também ficou. E pasmem, não acabou por aí. Professores da escola discutiam o suposto projeto real de Geraldo Alckmin. Diziam acreditar que a ação de separar alunos por ciclo seria boa e tinham como única objeção o pouco tempo entre a proposta e sua execução.

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    As reconstruções simbólicas ficam escondidas, em pequenos trechos, quase imperceptíveis.
    Mas as peças se encaixam de uma maneira cruel. Tudo isso por que, as semelhanças com a realidade em figuras de linguagem, cenários e a pauta ornaram um cenário que para os mais distraídos, ou para aqueles que não possuem minimamente qualquer contato com formação política passa com nota 10 pelo entendimento da realidade das verdadeiras Escolas em Luta. Quem acompanhou a luta da vida real não se engana.

    Fatos e cenas

    1. Cena: Logo no começo do episódio,um pequeno atrito entre estudantes. Discussão sobre um deles não pertencer ao Dom Fernão e sim um “playboyzinho de uma escola particular”. Fato: no início das ocupações, a própria Rede Globo sustentou esse tipo de argumento em suas reportagens para deslegitimar o movimento

    2. Cena: a presença policial no episódio não é nada ostensiva. Deu para contar: no máximo 10 policiais, todos sem arma de fogo. Fato: na E.E. Fernão Dias, os estudantes sofriam diariamente com um forte contingente na porta da escola. Policiais armados até os dentes, alguns deles, inclusive com armas de grande porte: submetralhadoras e afins.malhacao-dom-fernao-1

    3. Cena: Em todo o tempo, dada a possibilidade de conflito, há temor por uma ação repressiva da Tropa de Choque, mas não se questiona o real papel da policial ali presente, a justificativa é simples e leve: “estão apenas cumprindo ordens”.  Fato: Nas escolas em Luta, o clima diário era repleto de temor com abuso policial, intimidações e, até mesmo, invasões sem a devida “ordem a ser cumprida”.

    5. Cena: Os ‘policiais do Choque’ não usam identificação,no entanto, isso não foi encarado como algo que deveria ter sido questionado.

    6. Cena: O oficial de justiça entrega para a ‘Tropa de Choque’ a ordem de suspensão da construção do um parque no local. A licitação para a construção da praça teria ocorrido de maneira irregular. Eliminada a possibilidade de demolição da escola e, a ordem de desocupação, os estudantes comemoram vitória. E a reorganização continua.

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    O fato nada surpreendente, é que a Globo tentou desvincular o movimento das Escolas em Luta da vida real, de seu objetivo principal, mudando o foco para a questão da corrupção entre licitações e construtoras, assunto totalmente ligado a Lava Jato.

    Faltou dizer que o governador da novela é um homem honesto, que nunca desviou dinheiro do Metrô ou da Merenda, e que na verdade a culpa é da Dilma. E por falar em merenda, vamos aguardar a encenação do episódio da máfia das merendas na Malhação, pois, certamente, essa hora vai chegar.

    Fim

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