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  • Salvador receberá pesquisadores de todo o continente para Simpósio sobre vigilância, gênero e raça

    Salvador receberá pesquisadores de todo o continente para Simpósio sobre vigilância, gênero e raça

    Entre os dias 26 e 28 de junho, Salvador vai receber pesquisadores de todo o continente para discutir controle, monitoramento, dados pessoais, tecnologia, assimetrias de poder, gênero, raça e uma série de outros temas que articulam debates sobre vigilância, tecnologia e sociedade. As discussões fazem parte da programação do VI Simpósio Internacional LAVITS, que acontece na Universidade Federal da Bahia (UFBA).

    O objetivo do evento é promover uma agenda propositiva e crítica sobre os temas, estimulando um espaço interdisciplinar de reflexões. Para isso, os três dias de Simpósio abrigam intervenções artísticas, oficinas, sessões livres e trabalhos individuais. Entre os pesquisadores internacionais que virão ao evento, estão David Lyon, que é professor de sociologia na Universidade de Queens, no Canadá, e dirige o Centro de Estudos de Vigilância (SSC) da instituição, que é referência para a área, e Simone Browne, que é pesquisadora e educadora da Universidade do Texas, em Austin, nos Estados Unidos, e estuda a negritude como alvo das práticas de monitoramento. Browne é autora do livro Dark Matters: On the Surveillance of Blackness, no qual insere os estudos afro-americanos no centro dos estudos de vigilância.

    Lançado em 2015, o livro investiga as raízes das atuais práticas de vigilância nos Estados Unidos, relacionadas, segundo Browne, à escravidão e à era Jim Crow, cujas leis de segregação racial vigoraram no sul daquele país até 1965. A autora demonstra como as tecnologias e práticas de vigilância contemporâneas têm influência da longa história de formação racial e dos métodos de policiamento da vida negra na escravidão, como, por exemplo, as marcas permanentes nos corpos, os avisos de escravos fugitivos e as leis de lanterna. A obra recebeu o Lora Romero First Book Prize (2015) da American Studies Association, o Donald McGannon Award (2015) de Social and Ethical Relevance in Communications Technology Research e o Best Book Prize (2016) da Surveillance Studies Network.

    Em suas pesquisas, Browne expõe uma lacuna de um olhar centrado nas questões raciais dentro dos estudos sobre vigilância. A VI edição do Simpósio Internacional LAVITS tem, justamente, o desejo de impulsionar os debates sobre a intersecção entre vigilância, gênero e raça. Para a Rede, apesar da evidência desta imbricação, o campo ainda não lhe dedicou a devida atenção.

    Ainda que a crescente presença de processos de vigilância nos espaços urbanos, informacionais e sociais seja um fenômeno global, suas inscrições locais comportam singularidades que merecem ser pesquisadas e debatidas. Na América Latina e no Brasil em particular, as tecnologias e práticas de vigilância e controle são historicamente atreladas a estruturas coloniais, estatais e econômicas de produção de desigualdades, segregação ou mesmo extermínio de populações específicas, especialmente, indígena e negra. Ao mesmo tempo, são historicamente conhecidas as diversas formas de controle e vigilância sobre o corpo e a vida das mulheres.

    A Rede LAVITS

    A Rede Latino-Americana de Estudos sobre Vigilância, Tecnologia e Sociedade (LAVITS) foi fundada em 2009, contando com membros de ao menos 14 instituições de quatro países latino-americanos (Brasil, Argentina, México e Chile) e um país europeu (Bélgica). Com histórico de realização de simpósios internacionais em diferentes países latino-americanos (como México, Argentina, Chile e Brasil), a LAVITS retorna ao Brasil em 2019, para a cidade de Salvador (Bahia), apropriadamente situada para as discussões sobre assimetrias e (in)visibilidades.

     

    SERVIÇO

    O QUE: VI Simpósio Internacional LAVITS – Assimetrias e (In)visibilidades: Vigilância, Gênero e Raça

    QUANDO: 26, 27 e 28 de junho de 2019

    ONDE: Universidade Federal da Bahia (UFBA)

    OUTRAS INFORMAÇÕES: Mais informações sobre o evento estão disponíveis no site oficial do evento – www.lavits.ihac.ufba.br/

    CONTATO: lavits2019@ufba.br

    lavits.org@riseup.net

  • O casamento real e os impasses das esquerdas

    O casamento real e os impasses das esquerdas

    Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na UFBA, com charge de Leo

     

    Hoje venho falar do evento do ano: o casamento real do príncipe Harry com a atriz norte-americana Megan Markle.

    Não analiso os trajes de gala dos convivas, nem estou interessado nos quitutes.

    Confesso, com alguma vergonha, que fiquei curioso e liguei a TV para ver a tal festa. É que toda a gente tava comentando. O buffet não me encheu os olhos. Gosto mesmo é de coxinha de frango e bolinha de queijo. Lembro que em algum momento da década de 1990, lá em Anchieta, o “cento” do salgado era 10 reais. Coisa boa, de qualidade, bem melhor do que aqueles biricuticos insossos e pálidos que foram servidos no Palácio de Kesington. A galera deve ter voltado pra casa com fome. Não vejo sentido em ir pra festa e voltar pra casa com fome.

    Enfim, o que quero dizer é que meu interesse está menos no casamento em si do que nos esforços discursivos de sua legitimação. Aqui, neste ensaio, tomo o casamento real como pretexto para discutir aquele que me parece ser o grande impasse das esquerdas contemporâneas.

    Mas como assim? O que a festa da realeza tem a ver com as esquerdas contemporâneas?

    No século XXI, nesses tempos tão confusos, de fronteiras tão porosas, até a realeza é capaz de se apropriar de algumas agendas das esquerdas contemporâneas. Se algumas agendas das esquerdas estão sendo apropriadas pela realeza, símbolo máximo do atraso, é porque precisamos discutir com cuidado a natureza dessas agendas. É isso que tento fazer aqui.

    “Feminista, negra, divorciada, mulher independente que rompendo com os protocolos da realeza britânica não jurou obediência ao marido”.

    Foi mais ou menos com essas palavras que o departamento de marketing da realeza britânica (deve ter um departamento de marketing na realeza britânica) chamou a atenção do público para o casamento real. Não dá pra negar que a estratégia deu certo, pois aqui, nesse nosso lado do Atlântico, em um país arrasado por uma grave crise civilizatória, houve quem festejasse a “representatividade”, considerando-a uma vitória de movimentos sociais e coletivos identitários.

    De forma alguma, quero desqualificar a importância das agendas políticas pautadas nas ideias de gênero e de raça. Quero apenas chamar atenção para o fato de que quando não estão associadas ao corte material que acompanha o velho e bom conceito de “classe social” essas pautas se tornam dóceis, algo conservadoras, a ponto de serem mobilizadas pela realeza, até mesmo pela realeza.

    Sem a premissa da classe social, as agendas de gênero e raça funcionam como uma espécie de calça jeans ideológica, que combina com quase todo tipo de camisa, que serve a quase todo tipo de regime de poder.

    Parece que em algum momento da segunda metade do século XX as esquerdas internacionais abandonaram, deliberadamente, o norte que as conduzia desde o final século XVIII, quando, no calor da Revolução Francesa, nasceu a “esquerda política”. Esse norte era dado pela convicção de que na modernidade burguesa a principal experiência de opressão é dada pela vulnerabilidade material, pela pobreza.

    Ou em outras palavras: durante quase 200 anos, na percepção das esquerdas internacionais, para reivindicar o estatuto de oprimido carecia, antes de tudo, de ser pobre.

    Essa convicção mudou, como já disse antes, na segunda metade do século XX, com os ecos de maio de 1968. Na verdade, as mudanças já estavam acontecendo desde meados da década de 1950, como resultado daquilo que já na época ficou conhecido como “processo de desestalinização”, marcado pelas denúncias dos crimes contra a humanidade cometidos pelo governo de Josef Stalin (1878-1953).

    Com essa crise simbólica do socialismo real, instaurou-se um clima de desilusão e crítica entre a militância, que passou a tentar explorar outras possibilidades de luta. A rejeição ao autoritarismo da burocracia comunista se desdobrou nas críticas ao conceito marxista de classe social, considerado insuficiente para a compreensão das demandas específicas dos sujeitos oprimidos.

    O “trabalhador”, categoria universal definida pelo lugar o ocupado pelos sujeitos no processo produtivo, deu lugar a formas mais particularizadas de experimentação da opressão.

     “Trabalhador”, então, deixou de ser a substância fundamental na agenda das esquerdas internacionais para se tornar um substantivo que precisa de complemento.

    Qual trabalhador é mais oprimido? Qual é o gênero? A cor da sua pele?

    Já na época, esse clima de renovação foi interpretado em duas perspectivas distintas e rivais entre si.

    De um lado, estavam as lideranças mais velhas, que consideravam essas novas agendas como forças de desagregação e que, por isso, prestavam um desserviço ao projeto revolucionário.

    Do outro lado, estavam as lideranças mais jovens, cuja formação política havia se dado sob a desestalinização. Essas novas lideranças estavam menos preocupadas com a utopia revolucinária do que com a emancipação das subjetividades que elas consideravam silenciadas pela ortodoxia marxista.

    Essas novas lideranças não entendiam a “Classe Social” como uma meta-categoria universal, mas, sim, resultado de experiências concretas que envolviam não apenas o aspecto material da existência, mas também condições subjetivas, como gênero e raça.

    Falar sobre a classe deixou de ser um exercício teórico e especializado para dar lugar à auto-manifestação, o que conferiu legitimidade analítica ao testemunho dos oprimidos. Temos aqui o embrião daquelas que me parecem ser as duas principais características das esquerdas contemporâneas: o anti-intelectualismo e o culto à noção de “lugar de fala”.

    Na época, essas novas agendas tiveram conteúdo libertário profundo, na medida em que passaram a reivindicar não apenas a emancipação do trabalho, mas também a liberdade dos corpos, corpos de mulheres, de pretos e pretas e LGBTs.

    Nesse cenário, raça e gênero cumpriam a função de adjetivo e especificavam a contundência da exploração. Trabalhadora era mais explorada que trabalhador. Trabalhador preto era mais oprimido que trabalhador branco. Trabalhador LGBT sofria mais que trabalhador heteronormativo.

    Mesmo com toda a adjetivação, o substantivo era o mesmo, a experiência básica da exploração era dada pelo pertencimento ao mundo do trabalho, pela vulnerabilidade material, pela pobreza.

     Porém, algo aconteceu nos últimos 40 anos que parece ter emancipado a raça e o gênero, que hoje figuram como independentes da classe social.

    Hoje, “ser mulher”, “ser preto ou preta” e “ser LGBT” se tornaram a substância elementar da exploração, o que coloca as esquerdas internacionais diante de um impasse.

    O impasse pode ser resumido na seguinte questão:

    Como as esquerdas se diferenciam, no nível das práticas políticas, das forças mais dinâmicas e progressistas do capital?

    Mas como assim “forças dinâmicas e progressistas do capital”?

    Para entender o argumento, é necessário diferenciar com cuidado os diversos regimes estruturais de opressão que constituem a vida contemporânea. Vejo, pelo menos, dois regimes distintos, que se combinam, mas que estão em claro processo de diferenciação:

    • Chamo aqui de “regime do atraso” as práticas de opressão ligadas ao patriarcado e fundadas no princípio da desigualdade natural entre as pessoas. Aqui estão o machismo, o racismo e a homofobia. Aqui está o bolsonarismo.

    Nesse regime de opressão, mulheres, pessoas pretas e LGBTS serão sempre inferiores, mesmo que sejam ricos.

    Se uma atriz preta rica é barrada numa loja de grife, se um empresário preto rico é mal atendido no restaurante é porque esse regime do atraso ainda não foi plenamente superado. A força dessas práticas de opressão de tipo antigo é especialmente grande em um país como o Brasil. Porém, não me parece que no concerto geral do capitalismo internacional essas práticas sejam as mais poderosas e influentes. Acredito mesmo que elas estejam em processo de superação.

    É claro que esse processo de superação tem ritmos distintos que variam de país para país. Na Alemanha, na França ou no Chile esse ritmo parece estar mais adiantado. No Brasil, mais atrasado. Entretanto, nas duas margens do Atlântico está em marcha o derretimento do patriarcado, um derretimento que vem sendo pautado pelo próprio capital.

    Até que ponto a superação do patriarcado pelo capital deve ser objeto de comemoração é um debate muito difícil de ser feito, muito difícil mesmo.

    Mas que capital que mostra tanto empenho na superação do patriarcado?

    • Chamo de “capitalismo clean” as novas práticas de opressão que negam o princípio da desigualdade natural entre as pessoas. No Brasil, a grade de programação da Globo News traduz, com precisão, o projeto dessa “nova direita”, uma direita leve que rejeita o bolsonarismo com veemência.

    O bolsonarismo tensiona o sistema, tensiona com mulheres, com pretos e pretas, com LGBTs. O capitalismo clean, leve, quer restringir as tensões ao mínimo possível, apenas ao que não é possível negociar.

    Para essa nova direita, que tanto esforço faz para se diferenciar do bolsonarismo, o que importa é a igualdade natural, a igualdade como ponto de partida. A igualdade como horizonte, como ponto de chegada, é o ideal da utopia comunista, é algo indesejável para o capitalismo leve.

    Para essa nova direita, as pessoas são naturalmente iguais, sendo as desigualdades sociais interpretadas como o resultado do empenho, do trabalho e do mérito. Logo, cartão de crédito de preto rico, de mulher rica e de LGBT rico vale tanto quanto o cartão de crédito de branco rico.

    O capitalismo clean quer acolher o preto rico que sofre racismo, a mulher rica vítima de machismo, o LGBT rico que é alvo da homofobia. O capitalismo clean é elástico o bastante para se apropriar das agendas de gênero e raça, desde que elas sejam independentes de qualquer projeto de igualdade social.

    Se forem independentes de um projeto amplo de igualdade social que mire na distribuição riqueza, as agendas do gênero e da raça são dóceis e perfeitamente compatíveis com os interesses das forças mais dinâmicas e poderosas do capital.

    No capitalismo clean até a realeza britânica tenta levar a vida na leveza e laureia mulher preta rica com título de nobreza.

    Pra radicalizar na crítica ao capital, é necessário começar a luta pelo recorte da classe social.

    É necessário começar na classe, mas não pode acabar na classe, pois aí o risco seria não enxergar algo que é tão óbvio como a existência do sol: pior que ser pobre, é ser pobre preto e preta, é ser pobre LGBT.

    Óbvio, óbvio mesmo é que o capitalismo clean é sedutor, pois permite que, você, leitor e leitora, seja quem quiser ser. Só não seja pobre, pois aí você está “lenhad@”, como se costuma dizer aqui na Bahia.

     

     

     

  • Bancada fundamentalista quer banir debate de gênero no PME

    Retornou esta semana, no Rio de Janeiro, o debate e a votação do Plano Municipal de Educação, que são documentos, com força de lei, garantidores de metas para a consolidação do direito à educação de qualidade no período de dez anos.

    Neste plano devem estar contidos os objetivos que o sistema de ensino da prefeitura quer atingir, como oferta de vagas nas escolas, quantidade de alunos por classe, grade de disciplinas e os temas a serem tratados para o aperfeiçoamento da formação continuada.

    Há alguns anos, porém, os temas relativos a estrutura geral que o governo municipal oferece para população têm sido deixados de lado ou ignorados por parlamentares ligados a chamada bancada fundamentalista da Câmara e por seus aliados, como são os deputados das bancadas da bala, do tráfico e das milícias, que tem priorizado o que consideram “combate à ideologia de gênero”, e que na prática é a oposição política ferrenha a todas as discussões relativas aos direitos das minorias nas salas de aula.

    O conluio funciona com vereadores ligados às igrejas recebendo o apoio de colegas investigados por corrupção e que foram eleitos com a maioria dos votos concentrados em áreas de domínio do tráfico ou de milícias em troca dos seus apoios em outras matérias. Eles se ajudam mutuamente, e assim garantem maioria folgada em todas as votação.

    Foi assim, por exemplo, que barraram a convocação do barão da máfia dos transportes Jacob Barata para prestar esclarecimentos à CPI instalada logo após a decretação da sua prisão. O acordão utilizado para livrar o investigado por desvios monumentais na gestão de Sérgio Cabral funciona com as mesmas lideranças para tentar barrar qualquer discussão sobre gênero nas escolas do Rio.

    Um dos expoentes desse conluio é o vereador Alexandre Isqueiro, considerado braço direito do milionário pastor Silas Malafaia, indiciado pela Polícia Federal pelo crime de lavagem de dinheiro no âmbito da Operação Lava-Jato, e que tem sido um dos mais ferrenhos porta-vozes do chamado movimento de perseguição às discussões de gênero. Isqueiro é tão radical nessa linha que tem trabalhado nos bastidores para retirar dos textos a serem votados até o termo “gênero alimentício”.

    Entre os apoiadores, o destaque é para vitaminada bancada do PSOL, que saiu das urnas em 2016 como a maior da oposição ao governo Crivella, e conta com 6 parlamentares. O time atuará pela primeira vez sem Marielle Franco, assassinada brutalmente há 13 dias, mas o seu discurso que estava pronto foi lido pelo líder da bancada do partido, o professor Tarcísio Motta.

    Fato é que, se nada de novo acontecer nos próximos dias, o mais provável é que vença outra vez o conluio da direita, impedindo a definição tão aguardada de um plano estratégico para lidar, por exemplo, com a evasão escolar acima da média de alunos LGBT, especialmente da população trans, e com questões como gravidez precoce das alunas. A esperança vem das galerias, onde estarão para pressionar em loco os vereadores, profissionais da educação e representantes dos movimentos de mulheres e LGBT’s.

    Rodrigo Veloso – Bacharel em Relações Internacionais

     

  • Viva a organização dos Sem-Terra LGBTs!

    Viva a organização dos Sem-Terra LGBTs!

    Acontece hoje (11), durante o 28º Encontro Estadual do MST na Bahia , a 1º Roda de Conversa com os LGBTs Sem Terra com a participação de cerca de 50 gays, lésbicas, bissexuais, travestis, mulheres transexuais e homens trans militantes de todo o país. O tema do encontro é “Reforma agrária e relações de gênero: desafios para a construção de um projeto popular” que tem como objetivo levantar questões relacionadas a identidade de gênero, lutar contra a homotransfobia e promover o uso do nome social .  A travesti Scarlet de Rui Barbosa (BA), declarou que existe muita homotransfobia em seu estado onde a cada 36 horas uma pessoas lgbt é morta: “As travestis são as que mais morrem, porque ficam mais expostas.”

    De acordo com a página do MST, há 10 anos está sendo construído dentro do movimento um setorial de luta contra a homotransfobia e em defesa dos direitos das pessoas LGBTs, com seminários, grupos de estudos, encontros e manifestações. Entre os dias 7 e 9 de agosto, aconteceu, na Escola Nacional Florestan Fernandes em Guararema, São Paulo, o primeiro encontro LGBT do MST a nível nacional, dentro do seminário “MST e a Diversidade Sexual” com a participação de 40 pessoas de vários estados do país. Na Bahia foram realizados durante dois anos consecutivos várias manifestações e panfletagens contra a LGBTfobia nas marchas estaduais do MST.

    Tiago Hungria, do coletivo de gênero do MST, disse que é preciso agregar tod@s @s trabalhador@s sem terra, independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero, e que a inserção e o protagonismo de pessoas LGBTs só fortalece o movimento que luta por uma sociedade mais justa.

    “Para isso é necessário pautar a participação, o protagonismo e construir de maneira auto-organizada espaços em que as opressões possam ser colocadas em xeque, para serem superadas”, destaca Hungria.

    Dessa forma, o MST inaugura um momento histórico em sua trajetória, mostrando que a esquerda vai aos poucos se libertando da antiga postura ortodoxa que até meados dos anos 80 defendia a idéia de que pessoas LGBTs eram portadoras de “desvios burgueses”, além de quererem minar –com a sua militância– a luta maior, que é a luta de classes. Esse foi um grande equívoco que finalmente está sendo esclarecido. Se o MST luta contra a opressão e exploração do Estado capitalista moderno, deve incluir em sua bandeira a causa LGBT, na defesa de pessoas que não só são discriminadas, mas assassinadas cotidianamente pelo simples fato de não comungar com os modelos propostos pela cultura cisheteronormativa burguesa.

    Com informações da página do MST.     

  • Haddad perde a chance de se tornar mito na comunidade LGBT

    Haddad perde a chance de se tornar mito na comunidade LGBT

    Haddad perdeu a oportunidade de se tornar o prefeito mais preocupado com a vulnerabilidade da comunidade LGBT, ao sancionar sem vetos, no último dia 17 o Plano Municipal de Educação de São Paulo, que excluiu, por 42 votos a favor e 2 contra, das grades escolares o debate democrático sobre questões de gênero e orientação sexual.

    Em discurso, o prefeito afirmou que o 1° Plano Municipal de São Paulo “é certamente o mais avançado do país”.

    De concreto, será aumentado o orçamento da educação dos atuais 31% para 33%; haverá a diminuição de 15% a 20% de alunos por classe. E pretende-se zerar a fila de crianças à espera de vaga numa creche.

    Sem dúvida nenhuma, Fernando Haddad até o momento é o prefeito que mais realizou políticas públicas para a comunidade LGBT, em especial para Travestis, mulheres transexuais e homens trans:

    1. Inaugurou no dia 10 de outubro de 2014 o Centro de Acolhida Zacki Narchi para atendimento da população em situação de rua LGBT. A unidade recebe a população à noite, com alimentação, banho, dormitório e café da manhã, e ainda inclui um serviço de vans que recolhe os usuários pelo centro de São Paulo.
    2. No dia 31 de outubro de 2014, Haddad priorizou gays em situação de violência, travestis moradores em albergues e índios na fila para serem beneficiados com unidades do Programa ‘Minha Casa Minha Vida’ construídas no município de São Paulo.
    3. Em 27 de março de 2015, o prefeito inaugurou o Centro de Cidadania LGBT que oferece auxílio psicológico e jurídico para a comunidade com o objetivo de auxiliar quem sofreu algum tipo de violência ou está em situação de vulnerabilidade social.
    4. Em 29 de junho foi inaugurada a Unidade Móvel vinculada ao Centro de Cidadania que fica no Arouche de quinta a domingo das 18 às 23hs para atender vítimas de homotransfobia.
    5. No dia 27 deste agosto foi inaugurado um cursinho popular voltado exclusivamente para travestis e transexuais, com aulas ministradas pelo coletivo TRANSformação direcionadas para o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).
    6. Mas o seu mais valoroso projeto é sem dúvida nenhuma o Transcidadania, lançado em 29 de janeiro desse ano, no dia Nacional da Visibilidade Trans. O programa, que disponibiliza uma bolsa de R$ 840 para 100 pessoas travestis e transexuais voltarem a estudar, vai completar 9 meses com apenas 10% de evasão escolar. Devido ao sucesso, mais 50 vagas deverão ser disponibilizadas, o que é bem pouco diante de uma população estimada em torno de 4.000 pessoas Ts, a maior parte em situação de rua vivendo da prostituição e de subempregos. Tod@s @s bolsistas do Transcidadania foram expuls@s de casa e 61,3% não concluíram o ensino fundamental. A metade vive em albergues e prédios invadidos e 63% são negras e pardas entre 31 e 40 anos.

    Mas Haddad e o PT perderam a oportunidade de constituir para São Paulo, a maior cidade da América do Sul e a quarta do mundo, o mais avançado e inclusivo Plano Municipal de Educação do Brasil. A filósofa feminista Judith Butler, que esteve recentemente no Brasil, cravou com sabedoria: “Não existe justiça social com discriminação de gênero.”

    O Transcidadania é um projeto extraordinário mas é só um redutor de danos, resgatando pessoas travestis e transexuais em situação de rua, que chegaram a essa situação de vulnerabilidade e exclusão social porque não tiveram a oportunidade de permanecer numa escola onde todas as formas de discriminação e violência de gênero são reproduzidas e repetidas cotidianamente. Pessoas LGBTs, em especial travestis, mulheres transexuais e homens trans, dificilmente conseguem permanecer em ambientes escolares homotransfóbicos, quando não são expuls@s de casa no começo da adolescência. E o Transcidadania só está tratando dos efeitos dessa situação de violência e discriminação que começa nos ambientes escolares brasileiros.

    Para atacar a origem da homotransfobia nas escolas, seria necessário que Haddad tivesse tido a coragem do gesto grandioso do veto a um Plano Municipal de Educação que foi sufocado e mutilado pelo moralismo inquisitorial dos setores ultra conservadores da igreja católica. Teria coroado sua trajetória de atenção à comunidade LGBT com a coerência que um grande político deve ter para marcar seu nome de forma indelével na História.

    Deveria ter feito isso, mesmo que seu veto fosse depois derrubado pelos políticos covardes que preferem ceder a pressões fundamentalistas do que representar todos os segmentos da população. A inserção de informações sobre identidade de gênero e orientação sexual é fundamental para a criação de dispositivos contra a homotransfobia, e propiciaria um ambiente mais respeitoso e acolhedor para pessoas que não estão enquadradas nos modelos tradicionais hegemônicos de homem e mulher cisgêneros.

    Sobre a histeria católica que conseguiu pressionar os vereadores de todos os municípios brasileiros para que fossem retiradas referências à identidade de Gênero e orientação sexual, a socióloga e professora da UFRGN Berenice Bento declarou: “Eu acho que não é a questão do gênero, acho que é uma questão muito específica relacionada com as pessoas travestis e transexuais, esse ódio, porque quem pauta a identidade de gênero na educação são as pessoas trans. Os conservadores percebem que além do “problema” da homossexualidade, talvez haja outro pior que é discutir a idéia de que “não se nasce homem, não se nasce mulher…torna-se”(citação de Simone de Beauvoir no livro ‘O segundo sexo’). Para Berenice essa vitória dos católicos não representa muita coisa porque a articulação política da comunidade de travestis, mulheres transexuais e homens trans, apesar de todas as limitações, avançou muito a ponto de hoje existirem muitas pesssoas Ts dentro da academia como professores.

    “Não está mais nos planos municipais, estaduais e nacionais…e aí? Você vai parar de fazer o seu ativismo? Eu não vou parar de escrever meus artigos, de entrar em salas de aula, fazer mostra de filmes, de fazer minhas pesquisas. Aparentemente é uma vitória deles mas as conquistas não têm retrocesso, pelo menos eu aposto que não! Vamos continuar a transformar nossa vulnerabilidade em ação política.” Berenice Bento