Jornalistas Livres

Tag: Especulação Imobilíara

  • Com a Cyrella, a mais atrevida tacada de Doria, por Luis Nassif

    Com a Cyrella, a mais atrevida tacada de Doria, por Luis Nassif

    Do: GGN – Luis Nassif OnLine

    João Doria Jr é um bem sucedido homem de negócios. Por tal, não se entenda o empreendedor convencional, ou o gestor. Toda a carreira empresarial de Doria foi feita no campo dos patrocínios, permutas e lobbies, colocando empresários em contato com autoridades através dos múltiplos fóruns da LIDE. A missão da LIDE é montar eventos que permitam a empresários e autoridades estreitar relacionamentos.

    As autoridades vão porque querem um público de empresários e CEOS. E estes vão porque querem contato direto com as autoridades. Simples assim. 

    Terreno do Parque Augusta. Foto divulgação – Prefeitura de São Paulo

    Em cima dessa fórmula, Doria montou inúmeros filhotes da LIDE, tanto setoriais – LIDE do agronegócios, da exportação etc – quanto regional, com filiais inclusive na América Latina.

    Agora, está completando a inovação tornando a Prefeitura uma filial da LIDE. E aí entra em um terreno pantanoso, principalmente se os Ministérios Públicos fizerem a ligação entre os eventos da LIDE e as ações de Doria na prefeitura.

    É como se ele acenasse para os membros da LIDE: o coroamento do investimento de vocês é que, a partir de agora, não será mais necessário investir em relacionamento: vocês serão as autoridades.

    É o que aconteceu com essa nomeação escandalosa de Claudio Carvalho de Lima, vice-presidente executivo da Cyrella para a Secretaria das Subprefeituras.

    A Prefeitura é a agência reguladora do setor de construções e incorporações de edifícios de São Paulo. Tudo passa pela Prefeitura, do início ao fim da obra, o relacionamento com a Prefeitura é essencial para uma grande incorporadora, do alvará ao HABITE-SE, da mão de trânsito à permissão de estacionamento e Zona Azul, do ISS na construção, zona de alta arbitragem à altura de prédio.

    Cabe à Prefeitura defender a lógica do zoneamento, para impedir abusos e distorções.

    Calçada em frete ao Parque Augusta. Foto: Vinicius Souza e Maria Eugênia Sá – www.mediaquatro.com

    A Cyrella é a maior empresa do setor.  E as subprefeituras são a principal moeda de troca com vereadores. Agora entrega-se essa moeda de troca a um executivo da Cyrella, que tem enormes interesses que dependem da Câmara Municipal, a começar pelo caso do Parque Augusta. Mesmos os piores prefeitos que passaram pela cidade não ousaram uma esbórnia tão ampla, assim, entre interesses públicos e privados.

    É uma audácia sem desconfiômetro, típico da ambição sem limites de Doria, para suas investidas políticos-financeiras.

    Através da Câmara, e usando as Subprefeituras como moeda de troca, será possível alterar zoneamentos fixados pelo Plano Diretor, permitindo às incorporadoras a jogada óbvia: comprar terrenos em Zona 1, vedadas a construção de edifícios e, em seguida, alterar as condições da região.

    Matéria original em: https://jornalggn.com.br/noticia/com-a-cyrella-a-mais-atrevida-tacada-de-doria-por-luis-nassif

     

    Nota dos Jornalistas Livres: O Plano Diretor de uma cidade é um documento que estabelece os princípios, diretrizes e objetivos que nortearão todas as decisões de políticas de desenvolvimento urbanas. É nele que são definidas as ações e permissões que levam, por exemplo, a um maior convívio ou exclusão sociais. Onde haverá praças e onde se construirão os shoppings. Vias expressas, ciclovia e corredores de ônibus. Teoricamente, o Plano Diretor para São Paulo até 2029 visava se contrapor à especulação imobiliária desenfreada, como exposto pelo vereador Nabil Bonduki (PT) em entrevista ao Candeia Jornalismo (https://candeiablog.wordpress.com/) e publicada no Outras Palavras em outubro de 2014 (https://outraspalavras.net/blog/2014/10/16/nabil-bonduki-um-plano-diretor-contra-a-especulacao-imobiliaria/).

    Em maio de 2015, os Jornalistas Livres acompanhamos uma aula pública sobre parques e direito à cidade com o professor Antônio Carlos Sarti, da EACH-USP Leste, e a exibição/debate do documentário Sem Pena, de Eugênio Puppo (http://www.sempena.com.br/) , dentro das atividades da #ViradaPenal ( Veja em https://medium.com/@jornalistaslivres/controlar-vigiar-e-punir-no-parque-augusta-6c42aa1f1bd2).

    Parque Augusta – Foto: Vinicius Souza e Maria Eugênia Sá – www.mediaquatro.com

    Vale lembrar que o prefeito João Doria assinou em agosto desse ano um acordo para a cessão de um terreno da Prefeitura próximo à Marginal Pinheiros em troca do “direito” de destinar a área do Parque Augusta, de propriedade formal das incorporadoras Cyrela e Setin, ao uso social. Como aponta reportagem do NexoJornal: “Doria é amigo de Elie Horn, dono da incorporadora Cyrela, que doou R$ 100 mil à campanha vitoriosa do prefeito. Em junho, um dos executivos da empresa se desligou da companhia e passou a capitanear a recém-criada Secretaria de Investimento Social” (veja em: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/08/04/Doria-anuncia-acordo-pelo-Parque-Augusta.-O-que-SP-cede-e-o-que-ganha). Os valores nominais de ambos os terrenos ainda não foram divulgados.

  • As áreas rurais e o Plano Diretor de Campinas – Episódio 2

    As áreas rurais e o Plano Diretor de Campinas – Episódio 2

    Neste momento, acompanhamos a elaboração do Plano Diretor de Campinas, que vai guiar o desenvolvimento da cidade pelos próximos 10 anos! Tanto a sociedade civil e quanto o Ministério Público questionam a falta de transparência e participação dos cidadãos no processo. Uma das propostas do Governo é a criação da Macrozona de Expansão com Crescimento Ordenado, que permite a ampliação indiscriminada do perímetro urbano, ou seja, o fim das nossas áreas rurais!

    Para mostrar que Campinas possui produção agrícola importante (apesar do abandono das áreas rurais), os Jornalistas Livres e o Fórum Cidadão pelo Desenvolvimento Rural de Campinas estão produzindo vídeos que trazem um pouco da realidade vivida por esses agricultores. No segundo vídeo da série, apresentamos Seu Cabral e sua esposa, do bairro Carlos Gomes/ Monte Belo, que são produtores rurais há 40 anos. Em seu depoimento, Seu Cabral critica a falta de assistência da prefeitura, as péssimas condições das estradas, a falta de verba para a disponibilização de agrônomos, entre outros.

    Para proteger as áreas rurais, o Fórum pelo Desenvolvimento Rural elaborou a Carta Aberta e Propostas para as áreas rurais da cidade. Segue o link para acessá-las e contribuir com o abaixo assinado.

    Para saber mais, acompanhe a página da Cidade Orgânica

  • Geddel e o Calerogate: a vista à vista

    Geddel e o Calerogate: a vista à vista

    Por Ernesto Marques, especial para os Jornalistas Livres.

    A marca da influência dos irmãos Vieira Lima sobre Salvador começou a se configurar no final do primeiro mandato de João Henrique Carneiro (2005-2008), quando Geddel abduziu o tíbio e populista prefeito, anexando-o ao seu PMDB. Já no segundo turno de 2008, o hoje homem forte de Temer consorciou-se com ACM Neto para reeleger João e assim partilharem o poder. A logomarca do primeiro governo, influenciado pelo PT, trazia figuras humanas estilizadas com as mãos levantadas, como se votassem numa assembleia, e o slogan “Prefeitura de participação popular”. A identidade visual do segundo governo JH traz o nome da cidade sobreposto a uma sequência de barras verticais coloridas, como se fossem arranha-céus e, abaixo, a tradução do fetiche pretensamente futurista: “Prefeitura de um novo tempo”.

    Identidade visual da prefeitura de Salvador na segunda gestão de João Henrique
    Identidade visual da prefeitura de Salvador na segunda gestão de João Henrique antecipa o projeto de lotar a cidade de arranhacéus.

    Ironicamente, a promessa do “novo tempo” ficou limitada ao fetiche dos espigões que fizeram a alegria do baronato da especulação imobiliária e tanto fascinavam João Henrique. À mudança estética correspondeu uma transformação ética, incorporando as cores do PMDB e o estilo dos Vieira Lima. O que aconteceu em seu segundo mandato, pelo menos em sentido figurado, pode ser definido como esbulho, considerando a apropriação violenta da cidade por uns poucos. Com outro estilo e a velha autoproclamada eficiência do “carlismo”, o prefeito ACM Neto deu continuidade ao processo, mas antes mandou seu antecessor e cabo eleitoral às favas, excluindo-o da partilha do butim.
    Como na Bahia de Octávio Mangabeira todo absurdo tem um precedente, o ACM original, quando prefeito biônico “eleito” pelos generais, operou o milagre da transmutação das terras públicas em propriedade privada. A pretexto de financiar a modernização da primeira capital do Brasil, ACM fez os vereadores aprovarem uma reforma urbana que transferiu terras do Município para empreiteiras. Naquela altura, o pai de Geddel, Afrísio Vieira Lima, era procurador da Prefeitura e, anos mais tarde, viria a se tornar um dos mais dedicados vassalos de ACM quando este foi “eleito” governador duas vezes pelos generais.

    A sucessão de gerações no patronato político baiano mudou personagens e atualizou procedimentos, mas o método sobreviveu ao tempo. A crise instalada com a demissão ruidosa do ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero, gerou um escândalo de grandes proporções pela suposta prática de advocacia administrativa, crime que teria sido praticado pelo ministro Geddel a ser investigado pela Comissão de Ética da Presidência da República. Mas o Brasil precisa saber que o espigão de 30 andares e 106 metros de altura, motivo das pressões sobre Calero, é apenas a ponta do iceberg do alvo da cobiça gentrificadora da especulação imobiliária sobre o trecho mais deslumbrante da orla de Salvador.

    A obra embargada do La Vue, no início da Ladeira da Barra, está a poucos metros do marco de fundação da cidade por Thomé de Souza, assentado na praia do Porto. A ladeira leva à Cidade Alta, pouco mais de 70 metros acima do nível do mar, começando pelo Corredor da Vitória, uma das áreas mais nobres da capital baiana. Mas contemplar a vista (la vue) da Baía de Todos os Santos, naquele trecho, é privilégio para poucos, porque o Corredor da Vitória, antes ocupado apenas por mansões, há décadas foi sendo tomado por prédios altos e quase colados uns aos outros. O deus mercado passou por cima de leis e órgãos de fiscalização, suprimiu vegetação nativa, ergueu piers particulares e teleféricos para os seus escolhidos descerem de bondinho de seus apartamentos-mansões até suas lanchas. Com o Corredor da Vitória já saturado, a especulação cresceu os olhos para os quilômetros seguintes da falha geológica que faz de Salvador uma cidade singular, única do lado de cá do Atlântico onde o sol se põe no mar, nas águas calmas e mornas da Baía de Todos os Santos.


    “As pessoas também gostam da discricionariedade do Iphan para servir a um ou outro interesse”, disse a então presidenta do Iphan, Jurema Machado, em um evento na Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia. O contexto da declaração: Jurema tinha ao seu lado o então superintendente do Iphan na Bahia, Carlos Amorim, a presidenta do Instituto dos Arquitetos, Solange Araújo, o presidente da OAB-BA e antecessor de Amorim no comando regional do Iphan, Luiz Viana Queiroz, o secretário de Urbanismo de Salvador, Silvio Pinheiro, entre outros. Diante dela, algumas centenas de arquitetos, estudantes, ativistas de movimentos sociais e moradores do Centro Antigo.

    Além do tema geral, aquele encontro tinha em comum com a polêmica de agora, pelo menos três personagens: o secretário Silvio Pinheiro, Carlos Amorim e o então coordenador técnico do Iphan-Ba e atual superintendente, Bruno Tavares. A interação entre os três e mais outras figuras importantes daria um bom livro-reportagem, por não caberem num artigo. Pela primeira vez debatiam abertamente as licenças assinadas por Tavares e convalidadas por Amorim para demolição de 31 imóveis no Centro Antigo – dois dos quais, tombados. Ao colocarem os casarões abaixo da forma como o fizeram, levaram o Conselho Regional de Arquitetura e Urbanismo a promover aquele evento.
    Pairando acima de governos e querelas partidárias, o patrão de Carlos Amorim é o mercado imobiliário, associado a setores da área pública capturados pelo que o economista Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES, chama de “sagrada aliança”. Cabe a CEOs desses consórcios de grandes interesses, como Geddel, colocar operadores leais em postos-chave, como a superintendência do Iphan. Lealdade a ser provada através de atos oficiais, ironicamente baixados em nome do interesse público. Nas explicações sobre o “Calerogate”, por exemplo, Geddel expõe sua preocupação com os empregos não gerados pela paralisação da obra do La Vue. Para justificar as demolições, Amorim e Tavares argumentam em defesa da vida dos pretos e pobres que neles moravam e/ou trabalhavam e por isso estariam sob risco iminente.

    Para arrancar a fórceps as licenças do La Vue, do Cloc Marina Residence (entre o bairro 2 de Julho e a Avenida Contorno), assim como para demolir imóveis entre o Cloc e o Elevador Lacerda, os leais à sagrada aliança operaram em alta. Ao assumir a superintendência regional do Iphan, Amorim extinguiu o conselho consultivo criado por Luiz Viana, do qual participavam arquitetos, urbanistas e representantes de entidades da sociedade. Mais recentemente, extinguiu o Escritório Técnico de Licenciamento e Fiscalização (Etelf) com base num parecer assinado pelo engenheiro Bruno Tavares. Sem meias palavras, o documento desqualifica arquitetos e técnicos do Etelf.
    Com a deposição da presidenta Dilma e a ascenção de Temer e Geddel, Bruno Tavares vira superintendente do Iphan e Carlos Amorim é presenteado com a invenção de uma tal Secretaria do Patrimônio, junto com a recriação do Ministério da Cultura. A grita geral de profissionais e entidades da área, denunciando a nova estrutura como manobra para esvaziar uma instituição de 80 anos, repercutiu internacionalmente e o governo recuou.
    São da lavra de Tavares as licenças para os dois mega-empreendimentos, assim como as demolições nas históricas ladeiras da Preguiça, da Conceição e da Montanha. A coincidência entre todos esses imóveis é “la vue” para a Baía de Todos os Santos. Todos os alvarás passam pela mesa de Silvio Pinheiro, secretário municipal de Urbanismo e um dos rapazes de ouro do prefeito ACM Neto.

    Geddel, ACM Neto e Aécio Neves em campanha em 2014. Foto: Igo Estrela/ Coligação Muda Brasil
    Geddel, ACM Neto e Aécio Neves em campanha em 2014. Foto: Igo Estrela/ Coligação Muda Brasil

    É alvissareiro ver um CEO da sagrada aliança na berlinda, ainda mais quando a denúncia parte de um golpista, como ele. Mas é preciso que peixes menores comecem a pagar pelos pecados que cometem contra o interesse público, quando estão investidos em funções de comando em governos. Têm menos poder, mas, sem a participação deles, reduz-se a margem do poder discricionário do Iphan, ora destruidor, ora salvador. Não existe corrupto na área pública sem o seu correspondente corruptor. E esse “mercado” paga à vista.

    Ernesto Marques é jornalistas e vice-presidente da Associação Bahiana de Imprensa.