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  • ARTIGO: O discurso meritocrático derrotado com o adiamento do Enem

    ARTIGO: O discurso meritocrático derrotado com o adiamento do Enem

    Artigo de Mariana dos Reis, Doutora em educação, professora do Instituto Benjamin Constant, feminista negra e socialista

    Desde o dia 4 de maio, o Ministério da Educação veiculou a propaganda do Enem em rede nacional. Através de um vídeo de 1 minuto, o MEC ( Ministério da Educação) informou que o Enem 2020 não seria adiado mesmo diante da situação da pandemia. A data de inscrição foi anunciada para o do dia 11 até o dia 22 de maio e realização das provas no final do ano.
    O conteúdo do vídeo gerou descontentamento dos pais de vestibulandos e indignação de grande parte do alunado apto a prestar o exame. A naturalização da desigualdade educacional emitida no conteúdo da propaganda propiciou a criação de paródias e memes que viralizaram através do bordão “ Você que lute!”. O reforço da ideia da meritocracia na propaganda contou com a participação de jovens incentivando os vestibulandos a estudarem para o exame, visibilizando um ambiente privilegiado de estudo amplo, com equipamentos e acesso a internet.
    A palavra Mérito vem do latim meritum e designa: “ter mérito ser digno de recompensa, elogio, prêmio, estima, apreço”. Embora a ideia do mérito ou esforço individual no Vestibular ainda perdure no imaginário social , pesquisas no campo da educação apontam a falácia desta perspectiva. Estes estudos ( Saviani, Leher, Cunha) sinalizam descontinuidades de políticas públicas em educação , não assegurando a qualidade do ensino público ou propiciando condições acadêmicas do alunado da escola pública ao disputar a vaga com alunos .

    Verificamos nas universidades brasileiras um perfil predominantemente elitizado de estudantes ainda que as cotas raciais e sociais tenham conseguido equalizar a situação da disputa das vagas no Vestibular.

    Em meio a essa defesa escancarada da propaganda do Enem à meritocracia da educação, entidades estudantis, classistas e docentes se mobilizaram pela rede social em prol da campanha de adiamento do exame através da hashtag “AdiaEnem”. O clamor popular ecoou com tamanha força que ganhou adesão até mesmo de parlamentares da ultra direita.

    No dia 19 de maio, ocorreu a sessão de votação no Senado referente ao projeto de lei que adia a aplicação do Enem 2020 que propicia o acesso ao educação superior, tendo como justificativa a pandemia do Coronavírus. O projeto foi aprovado por 75 votos contra 1. O único senador a se opor foi Flavio Bolsonaro( Republicanos-RJ), filho do presidente da republica Jair Bolsonaro.No dia seguinte( 20 de maio), o INEP( Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) que organiza a divulgação e efetivação do exame em território nacional decidiu adiar o Enem devido às dificuldades trazidas pelo novo Coronavírus.

    Diante da extrema rejeição da realização do exame sob as condições, analisaremos os principais discursos meritocráticos propagados por essa propaganda do Enem, considerando a construção hegemônica do principio da meritocracia ao longo da trajetória da educação brasileira.

    “E SE UMA GERAÇÃO DE PROFISSIONAIS FOSSE PERDIDA?”

    É perverso responsabilizarmos uma geração de estudantes pelo futuro de um país que historicamente negou o acesso a educação de qualidade a maior parte da população há pelo menos 300 anos. A lógica da “ geração de profissionais perdida” responde às demandas de um modelo funcionalista de educação que formula seu conjunto de políticas educacionais voltado para o atendimento ao capital financeiro e mercantilização do ensino. A irracionalidade em considerar que este é um momento delicado para a maioria das famílias brasileiras se acentua na tentativa de responder ao funcionamento da economia capitalista. Soma-se ao cenário devastador da pandemia, a legitimação das políticas de Necropolítica nas favelas e periferias do Brasil. Somente nesta semana na cidade do Rio de Janeiro, segundo o coletivo de favelas “ Fala Akari” , 5 jovens foram executados na favela de Acari, 1 jovem na Cidade de Deus e outro jovem no Morro do Salgueiro em São Gonçalo. Neste sentido, as ações do próprio Estado muitas vezes vem a aniquilar essas mesmas gerações que possuem o sonho de ingressar numa universidade.

    “ A VIDA NÃO PODE PARAR. PRECISA IR A LUTA , SE REIVENTAR, SE SUPERAR”

    O Brasil hoje se encontra na quarta posição mundial em relação ao número de óbitos e pessoas contraídas pela COVID 19. Esse dado são ainda mais alarmantes ao considerarmos a ausência de direitos sociais das classes D e E. Fatores como a falta de acesso a condições sanitárias, materiais de higienização e paralisação das atividades profissionais que garantiam o sustento financeiro deste grupo contribuem para um surto de casos de pandemia nesta população. O número de óbitos hoje registrado em áreas periféricas e de favelas preocupa pesquisadores da área da saúde e especialistas da OMS. Desta forma, é importante lembrar que as condições socio econômicas dos estudantes de escola pública hoje no Brasil apresentam uma ausência de direitos que não lhes possibilitam “ superar” as lacunas existentes na sua formação educacional.

    Termos como “ se reiventar” se transformaram em palavras de ordem nos manuais de auto ajuda que asseguram garantia de sucesso profissional ou acadêmico na contemporaneidade. Esta ideia do próprio individuo ser agente da sua mudança, através de novas ferramentas e diferentes meios de aprendizagens detém a simpatia de muitas pessoas, sobretudo diante da popularização da função “ coach” no mercado. A crença de que o sucesso acadêmico depende da vontade individual centraliza comportamentos baseados em fatores internos ( aptidões, personalidade, esforço). Esta linha raciocínio por sua vez, invisibiliza as causas externas(lacunas acadêmicas, poucas oportunidades, interferências sociais) que exacerbam as desigualdades educacionais existentes atualmente no Brasil.

    A justificativa do projeto neoliberal da educação calcado na defesa de as oportunidade sãs iguais para todos se sustenta diante da democratização do acesso ao ensino básico a cerca de 98% da população brasileira. Defende-se assim, a premissa de que todos tem acesso a educação, desconsiderando os contextos culturais e socioeconômicos que determinam sucesso/ fracasso do estudante brasileiro.

    “ESTUDE DE QUALQUER LUGAR, DE DIFERENTES FORMAS, PELOS LIVROS, PELA INTERNET, COM AJUDA DO PROFESSOR”

    É importante nos atermos as condições de habitação de grande parte de estudantes da classe popular são moradias apertadas ou com grande concentração de pessoas, impossibilitando assim, a garantia de um espaço arejado ou silencioso para a rotina diária de estudos. Em período de isolamento, o número de horas que as pessoas concentram-se numa casa aumenta, propiciando tensões cotidianas provocadas por esta convivência. Deste modo, tais circunstancias abalam a saúde mental do estudante que se sente esgotado no seu local de moradia além da pressão emocional diária pela intensa carga de estudos.

    A solução encontrada por grande parte das instituições escolares brasileiras na época da pandemia foi substituir a educação presencial pelo ensino remoto (aulas on line à distancia). Porém, a maioria dos estudantes do Ensino Médio brasileiro estão matriculados na rede pública de ensino( 87, 5% concentrados na esfera federal, estadual e municipal) e neste momento encontram-se sem a regularidade das aulas cotidianas.

    Algumas redes estaduais de ensino como a do Rio de Janeiro aderiram a educação remota no período da pandemia, desconsiderando o percentual alto de estudantes em situação de vulnerabilidade social, sem conexão com a internet.

    Em pesquisa mais recente do IBGE em 2017, aponta -se que cerca de 70% da população acessa a internet, no entanto, 17, 7 milhoes de domicílio brasileiros declararam não ter acesso a internet pelo fato de considerarem um serviço muito caro. Tal justificativa do alto custo da internet fatalmente relaciona-se com o perfil sócio econômico das famílias dos estudantes da rede pública chefiadas em sua maioria por trabalhadores informais que vivenciam hoje tamanha estabilidade econômica.

    Além disso, neste processo de pandemia, os professores vem denunciando as condições de precarização e excesso de cobranças com relação às suas atribuições anteriores. É importante ressaltar que a categoria do magistério é composta majoritariamente por mulheres que acumulam trabalho doméstico com os cuidados de crianças ou parentes idosos da família. Portanto, não é nada razoável exigir que os professores ajudem os vestibulandos sistematicamente em aulas a distância perante um conteúdo tão extenso e complexo como do Enem.
    Em suma, reconhecemos a forte pressão da sociedade civil e dos coletivos estudantis e movimentos sociais em todo país frente ao adiamento do Enem 2020. Para além da questão da realização do Enem, temos que repensar um novo modelo de educação brasileira para juventude brasileira. O projeto de escola atual corrobora com uma lógica meritocrática e desigual de acesso a aprendizagem . Sendo assim, seria necessária a democratização de um ensino realmente igualitário a todos e a garantia do acesso livre às universidades pública aos estudantes brasileiros .

    Mariana dos Reis, Doutora em educação, professora do Instituto Benjamin Constant, feminista negra e socialista

  • Crianças em isolamento social é tema do Vida em Quarentena

    Crianças em isolamento social é tema do Vida em Quarentena

    Como as crianças estão vivendo a quarentena? E como é o cotidiano de uma mãe de quíntuplos? Com essas questões o quinto episódio do Vida em Quarentena aborda a educação, o cotidiano, a rotina e o consumo de mídia pelo público infantil no período de isolamento social. Essa é uma produção do Projeto de Extensão em Rádio e Podcast, Comunicast, da Universidade Federal de Mato Grosso realizada em casa por estudantes.

    Uma das fontes do episódio é a Anieli Kurpel que descobriu a gravidez natural de quíntuplos no ano passado. Hoje ela tem uma rotina movimentada com um filho de seis anos e os cinco recém-nascidos na cidade de Chopinzinho, no sudoeste do Paraná. Também é possível conhecer o Grupo de Pesquisa em Infância da Universidade Federal de Mato Grosso (Gpin) que debate como as crianças estão recebendo informações neste período.

    O episódio debate, ainda, a educação e o consumo de mídia pelas crianças com a professora do Programa de Pós Graduação em Comunicação e Poder da UFMT, Pâmela Craveiro. O podcast também está no Spotify, Deezer, Anchor, Mixcloud, Breaker, RadioPublic e Youtube. Agora, também é possível ouvir na aba de podcasts da página oficial sobre a Covid-19 da UFMT no endereço https://ufmt.br/covid.

    Vida em Quarentena

    Este é um podcast feito de dentro de casa, na quarentena. A divulgação de informações que atendam ao serviço público de combate ao Coronavírus é fundamental no período de quarentena, principalmente na região Centro-Oeste em que Mato Grosso se encontra dentro de um vazio noticioso. Segundo o Atlas da Notícia do Instituto Pró-Jornalismo, os vazios são ausências de veículos de informação de abrangência local ou regional. Por outro lado, dos 13.732 veículos mapeados em todo o Brasil, o rádio é mais presente, correspondendo 35,5% do total. Solidariedade, empatia, cuidados e precaução! Ouça agora em:

    Spotify: https://open.spotify.com/show/6yxyK5YK5fZIlsx4kjepwY?si=Kht5DydxR6mCRWm7L7dt-Q

    Deezer: https://www.deezer.com/br/show/993622?utm_source=deezer&utm_content=show-993622&utm_term=2206201488_1585425023&utm_medium=web



    Google Podcasts: https://podcasts.google.com/?feed=aHR0cHM6Ly9hbmNob3IuZm0vcy8xOTNmZDI0OC9wb2RjYXN0L3Jzcw

    Radiotube: https://www.radiotube.org.br/meuperfil-7636

    Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCbqsmP6Ng3FLO2YpbT0zB6Q

    Mixcloud – https://www.mixcloud.com/comunicastufmt/

    Anchor: https://anchor.fm/vidaemquarentena

    Breaker: https://www.breaker.audio/vida-em-quarentena

    RadioPublic: https://radiopublic.com/vida-em-quarentena-Wo0B9x

    Overcast: https://overcast.fm/itunes1505490353/vida-em-quarentena

    E veja também:

    UFMT lança chamada pública de captação de recursos para enfrentamento à Covid-19

    A Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), por meio da Pró-reitoria de Cultura, Extensão e Vivência (Procev), lançou o edital 06/2020, referente a uma chamada pública para a doação de recursos, materiais/produtos, bens e/ou serviços para ações de extensão de enfrentamento ao Covid-19. A iniciativa conta com o apoio da Secretaria de Infraestrutura (Sinfra) da Universidade e da Fundação Uniselva.

    O Projeto de Extensão em Rádio e Podcast – Comunicast também está na lista de projetos que atuam no enfrentamento à Covid-19. A lista de materiais que podem ser doados para a produção de informações voltadas a emissoras radiofônicas e podcasts está no link: https://www1.ufmt.br/codex/arquivos/3f99faa0d346e9c81f5d99b59b87586f.pdf.

     

     

  • Lei que garante a alimentação escolar na pandemia é sancionada

    Lei que garante a alimentação escolar na pandemia é sancionada

     

    Por Tatiana Scalco – Ciranda.net

    O presidente Bolsonaro demorou uma semana para sancionar a Lei nº 13.987 que autoriza a distribuição da merenda escolar pela rede pública de educação básica em tempos de pandemia do coronavírus (Covid-19).

    O texto que altera a lei da alimentação escolar (Lei nº 11.947/2009) foi publicado na última terça-feira (7/4) e assegura o direito à alimentação dos alunos durante o período de suspensão das aulas.

    “Estávamos aguardando ansiosamente a sanção. Demorou para sair, mas ela é bem-vinda no momento, (na medida em) que contribui para a garantia do direito humano à alimentação”, fala Vanessa Schottz, professora UFRJ Macaé, membro do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.

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    Imagem: Abrasco

    Um “fato incomensurável”, diz Naidson Baptista – coordenador Nacional da Articulação do Semiárido (ASA), sobre a importância da lei que transforma, em caráter emergencial, “a alimentação escolar em cesta básica para as famílias”. Ele observa que muitas crianças frequentam a escola motivadas pelo acesso à alimentação e “têm na alimentação escolar, praticamente, a principal alimentação do dia”.

    A professora Schottz enfatiza a amplitude e capilaridade do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que atende cerca de 39 milhões de alunos, em todos os municípios do país (Inep,2019), e é o segundo principal acesso aos alimentos entre os beneficiários do Programa Bolsa Família.

    A alteração da lei decorre de grande mobilização social sobre o governo e o Congresso, explicam ativistas da segurança alimentar.

    “É uma vitória diante da imensa batalha de garantir alimentação saudável a uma parcela fundamental da população”, diz Leila Santana do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA). Ela inclui entre os beneficiários também ” camponeses/as, empreendimentos da economia solidária, povos originários e povos/comunidades tradicionais que produzem alimentos (que integram merendas escolares) e deles obtém renda para sua sobrevivência”, diz Leila.

    A alteração da legislação “responde aos anseios do conjunto da sociedade civil e ajuda a normatizar a atuação dos gestores públicos nesse período de pandemia”, explica André Luzzi, André Luzzi, integrante do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional de São Paulo (Comusan-SP)

    A Defensoria Pública da União (DPU-SP) expediu recomendação ao Estado da São Paulo e todos os seus municípios, bem como ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para que o orçamento próprio destinado ao PNAE seja aplicado integralmente, as escolas organizem as entregas de cestas básicas e as ações ocorram em “estreito diálogo e parceria com os conselhos de Alimentação Escolar (CAEs) e Segurança Alimentar (Conseas), entre outros.

    SEI_DPU – 3567630 – Ofício

    Desafios de implementação

    O momento da pandemia requer cuidados, como observa Lozzi. É preciso assegurar a distribuição dos alimentos nos diferentes ciclos de ensino, mas evitar que se formem grandes filas ou aglomerações. Serão necessárias estratégias de fornecimento às famílias. que podem ser por meio de cestas básicas ou feiras de natura. E atenção aos produtos perecíveis nas escolas pólo ou de maior vulnerabilidade e dificuldade de acesso da população aos equipamentos públicos de segurança alimentar.

    (merendeiras entregando comida aos alunos )

    Imagem: Arquivo/FNDE

    A logística de distribuição dentro do território, articulada em conjunto com cooperativas, associações e demais organizações da sociedade civil para garantir sua operacionalização é fundamental, comenta Leila Santana.

    As ações devem ocorrer de forma coordenada e intersetorial nos munícipios e estados. “Estamos apostando em que se criem comitês de solidariedade nos municípios e que esses comitês sejam acionados pelo poder público no sentido de ajudar a criar a logística e estratégia da entrega desses produtos”, explica Baptista.

    A implantação de comitês emergenciais, em níveis estadual e municipal é a recomendação do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar para a viabilizar a distribuição e monitoramento das ações. O documento intitulado “Garantir o direito à alimentação e combater a fome em tempos de coronavírus: a vida e a dignidade humana em primeiro lugar!” foi assinado por mais de 140 organizações da sociedade civil e publicado em 24 de março.pastedGraphic.png

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    Imagem: Ribs

    A composição dos comitês, como explica Naidson Baptista, deve contemplar “pessoas que têm acesso às comunidades e se inter-relacionam com as associações e grupos, que chegam na ponta, nas comunidades, na família. E, portanto, têm mais possibilidade de fazer chegar com rapidez e eficiência essa alimentação às pessoas.”

    Abastecimento e Agricultura Familiar

    “É da agricultura familiar que vem cerca 70% da alimentação que chega à mesa dos brasileiros. Isso, se transferido para a alimentação escolar, vai fazer que boa parte dessa alimentação possa ser adquirida na agricultura familiar. Sendo adquirida na agricultura familiar, nós teremos a manutenção da lei que já garante 30% das compras da alimentação escolar no município na agricultura familiar”, fala Naidson Batptista da ASA.

    Imagem:Ascom/SDR-BA

    A alteração de lei do PNAE não mexeu nas suas diretrizes, que continuam valendo: alimentos regionais, desenvolvimento local por meio da promoção da agricultura familiar, entre outros. Para a professora Vanessa Schottz, é fundamental que as prefeituras e estados apoiem a agricultura familiar para que esses alimentos sejam entregues.

    “O principal desafio é garantir que os entes estatais cumpram a lei, ou seja, comprem no mínimo 30% dos gêneros alimentícios destinados a alimentação escolar diretamente dos agricultores familiares ou das organizações representativas com DAP Jurídica”, comenta Leila Santana. Ela destaca que não há teto para aquisição de produtos oriundos da agricultura familiar, apenas o mínimo. “Estados e municípios podem adquirir até 100% dos produtos diretamente dos agricultores familiares, dinamizando a economia local e distribuindo renda” – sugere ela.

    A representante da Agendha, Valda Aroucha, destaca que “a questão do PNAE não é simplesmente colocar alimentação na escola.” O contexto a ser considerado inclui a priorização das comunidades tradicionais e os povos originários na compra, as particularidades das escolas quilombolas, indígenas, a inserção de produtos não só regionais na alimentação escolar. “Nem todo lugar planta tomate, nem todo local planta batata”- diz Valda. Organizar essa logística “é uma questão muito complexa, mas necessária e urgente” – fala.

    Diversos estados e municípios tem se movimentado para implementar ações. A Bahia discutirá esta semana o uso do cartão PNAE. Valda explica que a Secretaria de Educação adotou a mesma metodologia do PNAE SP, com ajustes.

    A Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro publicou decreto (nº 47357) no dia 8 de abril dispondo sobre fornecimento de Cartão Cesta Básica aos alunos da rede pública municipal inscritos nos Programas Bolsa Família ou Cartão Família Carioca, Os alunos que não estão nos programas de garantia de renda não foram contemplados.

    Tramitação em Regime de Urgência.

    O Projeto de Lei da Alimentação Escolar em tempos de coronavírus (PL nº 786/2020) tramitou em regime de urgência. Ele foi aprovado dia 25/3 pela Câmara dos Deputados e dia 30/03 pelo Senado. Seu texto estabelece a distribuição dos alimentos da merenda escolar às famílias dos estudantes que tiveram suspensas as aulas na rede pública devido à pandemia do coronavírus (Covid-19). O autor do PL foi o deputado federal Hildo Rocha (MDB-MA).

    A sanção do Presidente Bolsonaro e sua publicação no Diário Oficial da União demorou uma semana. A lei nº 13.987lei nº 13.987 foi publicada no dia 7 de abril de 2020, pela imprensa nacional.

    A Lei nº 13.987/2020

    O texto autoriza, em caráter excepcional, a distribuição de gêneros alimentícios adquiridos com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) aos pais ou responsáveis dos estudantes das escolas públicas de educação básica. Será válida durante o período de suspensão das aulas em razão de situação de emergência ou calamidade pública.

    A lei prevê que “durante o período de suspensão das aulas (….) a distribuição imediata aos pais ou responsáveis (….) dos gêneros alimentícios adquiridos com recursos financeiros da Lei” do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

    Ou seja, durante a pandemia do Coronavírus o dinheiro da alimentação escolar (PNAE) deverá continuar a ser repassado pela União aos estados e municípios para compra da merenda escolar. pastedGraphic.png

    imagem: FNDE
    O PNAE

    A Lei nº 11.947/2009 trata da alimentação escolar. Dentre suas diretrizes trouxe o emprego da alimentação saudável, adequada e universalizada aos alunos da rede pública de educação básica e criou o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

    Valores previstos PNAE

    O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) garante acesso à alimentação de quase 39 milhões de estudantes da rede pública de educação básica (Inep 2019). Seu papel é estratégico, seja relacionado à segurança alimentar dos alunos, como potencializador das redes de agricultura familiar. pastedGraphic.png
    Os valores de repasse de recursos PNAE são definidos por dia letivo de cada aluno e de acordo com a etapa e modalidade de ensino. Atualmente são os seguintes:

    Creches: R$ 1,07pastedGraphic.png
    Pré-escola: R$ 0,53pastedGraphic.png
    Escolas indígenas e quilombolas: R$ 0,64pastedGraphic.png
    Ensino fundamental e médio: R$ 0,36pastedGraphic.png
    Educação de jovens e adultos: R$ 0,32pastedGraphic.png
    Ensino integral: R$ 1,07pastedGraphic.png
    Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral: R$ 2,00pastedGraphic.png
    Alunos que frequentam o Atendimento Educacional Especializado no contraturno: R$ 0,53

    30% do valor repassado pelo PNAE deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar. Isso estimula o desenvolvimento econômico e sustentável das comunidades.

    A reportagem prosseguirá acompanhando a situação da alimentação escolar em tempos de coronavírus.

     

  • “Ensino à Distância não é uma solução para o país” em tempos de pandemia

    “Ensino à Distância não é uma solução para o país” em tempos de pandemia

    Mais uma vez o Governo Federal edita uma Medida Provisória mal redigida e sem consultar os especialistas no assunto. Agora é a MP 934, de 1º de abril, que estabelece normas especiais para a educação básica e ensino superior no enfrentamento à pandemia de coronavírus. Com a paralisação das escolas e a necessidade de um isolamento social sem previsão por quanto tempo, centenas de milhares de famílias estão apreensivas sobre a possibilidade de se cancelar o ano letivo. Nesse sentido, uma MP que mostrasse claramente o caminho que o governo pretende seguir, era muito esperada. A MP 935 permite corretamente a flexibilização dos dias letivos necessários para se cumprir o ano com o mínimo de perda para os estudantes, mas mantém intacta a carga horária dos cursos, o que é contraditório.

    No depoimento abaixo, o coordenador da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, Daniel Cara, critica a MP informando que a aposta governamental na tecnologia como “salvadora da educação” através do Ensino à Distância – EaD irá apenas aprofundar o abismo que já existe na educação e, consequentemente, na desigualdade social. Ele lembra que além de não dimensionar o número de alunos com acesso a computadores e internet rápida e estável, o governo ignora a necessidade de acompanhamento dos estudantes pelos pais, o que nem sempre é possível e as diferenças regionais no Brasil. Segundo ele, ao invés de solucionar o problema, o governo dá mais trabalho aos parlamentares que precisarão alterar a MP para que ela seja factível. Para Cara, esses erros grosseiros estão acontecendo porque o governo não está trabalhando de forma transparente e democrática. No caso da educação, o Ministério da Educação estaria ouvindo somente o Conselho Nacional de Educação, no qual muitos profissionais jamais pisaram numa sala de aula, não conhecem a realidade das escolas públicas e apenas referendam o que quer o MEC.

    “É preciso que a MP seja alterada no Congresso Nacional para permitir os seguintes caminhos: a flexibilização precisa ser tanto nos dias letivos como na carga horária e a decisão de como vai ser a operacionalizada essa flexibilização cabe a cada sistema estadual e municipal de educação. A gente precisa reconhecer que em cada localidade vai ser tomada a melhor decisão e essa decisão tem que envolver secretários estaduais e municipais de educação, todos os profissionais da educação (não apenas os professores) e tem que mobilizar os familiares dos estudantes e os próprios estudantes. Esse é o caminho. Esse é o único caminho possível”.

    Ouça abaixo o depoimento completo:

     

     

    Pouco depois, Daniel Cara divulgou um texto mais completo analisando a MP. Veja abaixo:

    A EDUCAÇÃO NA PANDEMIA DE COVID-19

    Orientações e breve comentário sobre a Medida Provisória 934 que flexibiliza os dias letivos em 2020

    E saiba por que Educação a Distância (EaD) não é solução

    Por Prof. Dr. Daniel Cara

    O presidente Jair Messias Bolsonaro editou a Medida Provisória (MP) 934. Ela flexibiliza, excepcionalmente, o cumprimento dos 200 dias no calendário letivo de 2020. Contudo, não reduz a exigência de 800 horas da chamada carga horária letiva.

    Para a educação básica (que vai da educação infantil ao ensino médio), o texto não traz uma solução nova. Ele faz uso do que já está disposto no parágrafo segundo do art. 23 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, Lei 9.394/1996).

    Esse comando legal permite, em respeito a “peculiaridades locais”, flexibilizar os 200 dias a critério dos sistemas de ensino, mas “sem com isso reduzir o número de horas letivas”, que é de 800 horas. É a mesma linha da MP 934, contudo troca-se a “peculiaridade local” pela crise causada pelo coronavírus.

    No entanto, diante da pandemia de Covid-19, ao flexibilizar o cumprimento dos 200 dias letivos sem reduzir a carga de 800 horas por ano, a MP gera enorme pressão, levando escolas públicas, privadas e sistemas estaduais e municipais de ensino a optar por quatro alternativas:

    1) ampliação da educação em tempo integral;

    2) conclusão do atual ano letivo em 2021;

    3) reposição de aulas com atividades complementares;

    4) Educação a Distância (Ead) – que não é uma solução.

    Análise:

    Vamos analisar cada uma dessas alternativas e, ao final, propor uma solução razoável.

    1) A simples ampliação da “Educação em Tempo Integral” (EdTI) não vai acontecer. Não é possível construir escolas após o isolamento social. Nem abrir novas salas de aula. Não haverá dinheiro, nem tempo. E nem todos alunos poderão estudar por mais horas. Ou seja, ampliar a carga horária de 4 ou 5 horas diárias para 7 horas não será uma solução materialmente factível, salvo raras exceções de escolas e redes públicas.

    Uma alternativa mais plausível seria aumentar em uma hora a carga horária diária. Cada escola ou sistema de ensino pode avaliar essa possibilidade, porém ela é de difícil execução: faltará infraestrutura e professores disponíveis para implementá-la. Mas esse é um caminho a ser considerado.

    2) A alternativa de conclusão do ano letivo de 2020 em 2021 é correta, mas arriscada. Sendo sincero, na prática, essa MP nem cabe nesse momento, pois não sabemos quando terminará o isolamento social. Só essa resposta nos permitirá decidir com razoabilidade. E é justamente nas crises que precisamos tomar as melhores decisões. Contudo, sempre é importante lembrar: o calendário letivo pode divergir do ano corrente. Nada impede que o ano letivo de 2020 seja finalizado em 2021. Mas é preciso construir um amplo acordo para isso.

    3) A reposição de aulas por atividades complementares também é uma alternativa, mas não vai dar conta de resolver todo o problema. Aqui é preciso voltar ao principal: não sabemos quando terminará o isolamento social.

    4) Utilizar a Educação a Distância (EaD) para dar continuidade ao ano letivo. Considero isso inviável tanto em termos operacionais quanto em termos de justiça social.

    Vale relembrar aqui o primeiro princípio da educação nacional inscrito no art. 206 da Constituição Federal: o ensino deverá ser ministrado garantindo a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”. Sendo outro princípio fundamental a “garantia de padrão de qualidade”.

    Ocorre que a EaD ampliará as desigualdades educacionais. Deixo claro que não sou contra utilizar EaD como um dos meios e recursos em processos educativos. Contudo, nem todos podem utilizá-la.

    A EaD não é acessível universalmente. E não sendo universal, não pode se tornar a política educacional: o Brasil precisa superar o fato de que existe a educação para a elite e a educação para os mais vulneráveis, os mais pobres. É preciso que a educação seja de qualidade para todas e todos.

    Nesse sentido, a questão é complexa. Aqui no Brasil, pelas desigualdades socioeconômicas, até a lição de casa é problemática. Já pensaram nisso? Nem todas e todos estudantes têm as mesmas condições para realizá-las. Imaginem um ano letivo cumprido em EaD.

    Mas você ainda deve estar se perguntando: por que a Educação a Distância (EaD) amplia as desigualdades educacionais?

    Basicamente porque nem todos estudantes têm: 1) computador, celular ou tablet; 2) acesso à Internet; 3) responsáveis que podem acompanhá-los; 4) casas que permitem o estudo; e 5) principalmente, autonomia de estudo. Aliás, a funcionalidade da EaD depende muito da idade do educando. Mas mesmo as universidades estão contra o uso indiscriminado dela. Vale reiterar: se mesmo para os universitários a EaD não serve, imagine para os estudantes de educação básica.

    Assim, se você conhece algum gestor público ou “especialista” radicalmente a favor do uso da EaD, desconfie. Essa figura não se preocupa com o direito à educação.

    Solução:

    Em termos bem práticos, a solução é confiar as decisões às escolas, desde que sejam respeitadas normas e orientações que devem ser elaboradas democraticamente pelos sistemas estaduais e municipais de educação.

    Porém, isso deve ser feito a partir de diretrizes nacionais acordadas, envolvendo toda a comunidade educacional – ou seja, essa não pode ser uma decisão a ser tomada unilateralmente pelo Ministério da Educação e/ou pelo Conselho Nacional de Educação. É fundamental reiterar isso, pois essa tem sido a prática há alguns anos.

    Como ponto de partida, defendo que o caminho será avaliar e combinar nacional e localmente as três primeiras alternativas acima listadas, excluindo a EaD como solução. Ela deve ser tratada apenas como um apoio.

    Por último, antes mesmo do isolamento social acabar, precisamos acordar um “Pacto Nacional pelo Direito à Educação” pautado no PNE 2014-2024 (Plano Nacional de Educação).

    Esse pacto deve representar um esforço pelo ensino-aprendizado de todos os estudantes do país, pois a educação só se realiza na relação entre educadores e educandos. E isso exige educação presencial de qualidade.

    Por ora, é essencial que as escolas e as/os professoras/es mantenham contato com seus alunos, estimulando atividades, leituras, reflexões – desde que respeitado o isolamento social. Esse contato por voz, correio ou por meio de ferramentas virtuais é importante para a aprendizagem, mas principalmente para a saúde mental dos estudantes.

    Precisamos sair mais fortes dessa pandemia de Covid-19. E a educação, que já é essencial, será ainda mais importante nesse momento de reconstrução.

    Juntos vamos vencer essa crise.

    Daniel Cara, Campanha Nacional pelo Direito à Educação

    DOIS GUIAS: COMO EDUCAR CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA PANDEMIA DE CORONAVÍRUS?

    Quais medidas devem ser tomadas para a proteção e educação das crianças e adolescentes?

    Guias para mães, pais, comunidades escolares, professores e gestores.

    Campanha Nacional pelo Direito à Educação e plataforma Cada Criança lançam dois guias de orientações

    GUIA 1 – Para comunidade escolar, família e profissionais da educação e proteção da criança e do adolescente
    Acesse aqui: https://media.campanha.org.br/acervo/documentos/COVID-19_Guia1_FINAL.pdf

    GUIA 2 – Para tomadores de decisão do poder público em todas as esferas federativas –
    Acesse aqui: https://media.campanha.org.br/acervo/documentos/COVID-19_Guia2_FINAL.pdf

    A Campanha Nacional pelo Direito à Educação e a plataforma Cada Criança/100 Milhões (“Livres, seguras e com direito à educação”) agradecem às dezenas de voluntários ligados à Rede da Campanha – destacados nos volumes – que contribuíram para a produção dos guias.

    Leia mais aqui:
    https://campanha.org.br/noticias/2020/03/23/covid-19-quais-medidas-devem-ser-tomadas-pela-protecao-e-educacao-das-criancas-e-adolescentes-campanha-lanca-dois-guias-de-orientacoes/

  • Professor é vaiado em formatura de jornalistas por apontar ataques do governo à imprensa

    Professor é vaiado em formatura de jornalistas por apontar ataques do governo à imprensa

    Fazer jornalismo no Brasil está cada vez mais perigoso. Ensinar como se faz bom jornalismo, também. E os ataques não vêm somente do governo que deveria respeitar a imprensa e as instituições democratas. Vêm também, incrivelmente, de familiares de jovens decididos a fazer jornalismo. Sua primeira batalha, portanto, será dentro de casa: mostrar aos parentes os FATOS e a importância desses fatos serem bem reportados a toda população.

    Felipe Boff certamente é um professor querido no curso de Jornalismo da  Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos. Não fosse assim, não teria sido convidado para ser o paraninfo da formatura, realizada na sexta-feira (7), em São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Boff abriu seu discurso com um fato triste:

    A imprensa brasileira vive seus dias mais difíceis desde a ditadura militar. Entre 1964 e 1985, jornalistas foram censurados, perseguidos, presos, torturados e até assassinados, como Vladimir Herzog. Hoje, somos insultados nas redes e nas ruas; perseguidos por milícias virtuais e reais; cerceados e desrespeitados por autoridades que se sentem desobrigadas de prestar contas à sociedade. Todos sabem – mesmo aqueles que não acompanham as notícias – quem é o principal propagador dessa ameaça crescente à liberdade de imprensa. É o mesmo que também considera como inimigos os cientistas, professores, artistas, ambientalistas – como se vê, estamos bem acompanhados.

    A plateia, no entanto, não gostou dos fatos. Parentes dos formandos começaram a vaiar e xingar o professor. Aparentemente não compreenderam o que os próprios estudantes traziam escrito na camiseta:

    “Não existe democracia sem jornalismo”

     

     

    Conforme o professor seguia citando fatos, como os ataques com insinuações sexuais contra jornalistas mulheres e os xingamentos a cada pergunta incômoda na palhaçada literal que se tornaram as “coletivas” na frente do Palácio, mais parte da plateia reagia gritando histérica, certamente envergonhando alunos e parentes esclarecidos. Até nisso o discurso do Professor Boff foi preciso:

    Esta é a mensagem a ser destacada nesta noite: quando tenta calar e desacreditar a imprensa, o atual presidente da República ameaça não só o jornalismo e os jornalistas. Ameaça a democracia, a arte, a ciência, a educação, a natureza, a liberdade, o pensamento. Ameaça a todos, até aqueles que hoje apenas o aplaudem – estes, que experimentem deixar de bater palma para ver o que acontece.

     

    No final, os seguranças da universidade acharam por bem escoltar o professor para fora do evento, evitando que agressões verbais de fascistas ignorantes pudessem se tornar físicas. A coordenação do Curso de Jornalismo emitiu depois uma nota em solidariedade ao professor. Nós, jornalistas ativistas pelos Direitos Humanos, também nos solidarizamos com o professor e com os agora jornalistas do curso da Unisinos que não compactuam com os fascistas na plateia, por mais que sejam parentes. Ouçamos, TODOS e TODAS a convocação do professor:

    Jornalistas, este é o nosso compromisso. Não deixaremos que a tirania nos cale mais uma vez.

     

     

     

    Ainda na noite de sábado, o professor escreveu em sua página numa rede social:

    Hoje à noite, algumas pessoas pouco afeitas à liberdade de expressão e à democracia tentaram, aos gritos, me impedir de prosseguir com meu discurso de paraninfo na formatura da turma de Jornalismo da Unisinos. A virulência desse ataque – que fez até a instituição colocar seguranças para me acompanharem na saída do auditório – só reforçou a importância do que foi dito. Por isso, compartilho a seguir o discurso, que pôde ser proferido até o fim graças ao apoio de professores, formandos, alunos, ex-alunos e muitos mais.

    Confira o discurso completo do Professor Felipe Boff na cerimônia de formatura:

    A imprensa brasileira vive seus dias mais difíceis desde a ditadura militar. Entre 1964 e 1985, jornalistas foram censurados, perseguidos, presos, torturados e até assassinados, como Vladimir Herzog. Hoje, somos insultados nas redes e nas ruas; perseguidos por milícias virtuais e reais; cerceados e desrespeitados por autoridades que se sentem desobrigadas de prestar contas à sociedade. Todos sabem – mesmo aqueles que não acompanham as notícias – quem é o principal propagador dessa ameaça crescente à liberdade de imprensa. É o mesmo que também considera como inimigos os cientistas, professores, artistas, ambientalistas – como se vê, estamos bem acompanhados.

    No ano passado, segundo levantamento da Federação Nacional dos Jornalistas, o presidente da República atacou a imprensa 116 vezes em postagens nas suas redes sociais, pronunciamentos e entrevistas. Um ataque a cada 3 dias.

    Querem exemplos? “É só você fazer cocô dia sim, dia não.” “Você está falando da tua mãe?” “Você tem uma cara de homossexual terrível.” “Pergunta pra tua mãe o comprovante que ela deu para o teu pai.” É dessa forma chula e rasteira que o presidente da República, a maior autoridade do país, costuma responder aos jornalistas. Seus xingamentos tentam desviar a atenção das respostas que ele ainda deve à sociedade. Nos casos citados, explicações sobre o retrocesso da preservação ambiental no país, sobre os depósitos do ex-assessor Fabrício Queiroz na conta da hoje primeira-dama, sobre o esquema da “rachadinha” de salários no gabinete do filho hoje senador, sobre o envolvimento da família presidencial com milicianos.

    O presidente das fake news, que bate na imprensa cada vez que ela informa um fato negativo sobre ele e seu governo, é o mesmo que deu 608 declarações falsas ou distorcidas – quase duas por dia – ao longo de 2019. O levantamento é da agência de checagem Aos Fatos. Querem exemplos? “O Brasil é o país que mais preserva o meio ambiente no mundo.” “Leonardo Di Caprio tá dando dinheiro pra tacar fogo na Amazônia.” “O Brasil é o país que menos usa agrotóxicos.” “Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira.” “Nunca teve ditadura no Brasil.”

    Em 2020, depois de completar um ano de mandato com resultados pífios na economia e desastrosos na educação, na cultura, na saúde e na assistência social, o presidente não serenou. Redobrou os ataques à imprensa. Aplicou o duplo sentido mais tosco à expressão jornalística “furo” para caluniar a repórter que denunciou a manipulação massiva do WhatsApp na campanha eleitoral. Atacou outra jornalista, mentindo descaradamente, para negar a revelação de que compartilhou vídeos insuflando manifestações contra o Congresso e o STF.

    E segue promovendo o boicote à imprensa, com exceção daqueles que aproveitam o negócio de ocasião para vender subserviência e silêncios estratégicos. Aos veículos que não se dobram ao seu despotismo, o presidente da República impinge pessoalmente retaliações financeiras diretas, pressão sobre anunciantes e difamação de seus profissionais. Pratica, enfim, toda sorte de manobras sórdidas para tentar asfixiar o jornalismo e alienar a população dos fatos. E já nem se preocupa em disfarçar suas intenções. Querem um último exemplo? Declaração de 6 de janeiro deste ano, dita pelo presidente aos jornalistas “Vocês são uma raça em extinção”.

    Não, presidente, não somos uma raça em extinção. Ao contrário. Somos uma raça cada dia mais forte, mais unida, mais corajosa, mais consciente. Basta olhar para estes 21 novos jornalistas que estamos formando hoje. Basta ler os dizeres na camiseta deles: “Não existe democracia sem jornalismo”.

    Esta é a mensagem a ser destacada nesta noite: quando tenta calar e desacreditar a imprensa, o atual presidente da República ameaça não só o jornalismo e os jornalistas. Ameaça a democracia, a arte, a ciência, a educação, a natureza, a liberdade, o pensamento. Ameaça a todos, até aqueles que hoje apenas o aplaudem – estes, que experimentem deixar de bater palma para ver o que acontece.

    Para encerrar, gostaria de citar o exemplo e as palavras do grande escritor e jornalista argentino Rodolfo Walsh. Precursor da reportagem literária e investigativa e destemida voz contra o autoritarismo e o terrorismo de Estado, Walsh pregava que “Ou o jornalismo é livre, ou é uma farsa, sem meios-termos”. Dizia também que “um intelectual que não compreende o que acontece no seu tempo e no seu país é uma contradição ambulante; e aquele que compreende e não age, terá lugar na antologia do pranto, não na história viva de sua terra”.

    Rodolfo Walsh foi sequestrado e assassinado pela ditadura argentina em 25 de março de 1977. Na véspera, publicara corajosamente uma “carta aberta à junta militar”, denunciando os crimes do sanguinário regime, que então completava apenas seu primeiro ano. Estas foram as últimas palavras que Walsh escreveu: “Sem esperança de ser escutado, com a certeza de ser perseguido, mas fiel ao compromisso que assumi, há muito tempo, de dar testemunho em momentos difíceis”.

    Jornalistas, este é o nosso compromisso. Não deixaremos que a tirania nos cale mais uma vez.

     

    Confira a nota da Coordenação do Curso de Jornalismo da Unisinos:

    Declaração de apoio e solidariedade ao professor e jornalista Felipe Boff

    Na noite de 7 de março, sábado, na cerimônia de formatura do curso de Jornalismo da Unisinos em São Leopoldo, pessoas da plateia, aos gritos e vaias, tentaram impedir o paraninfo, professor Felipe Boff, de prosseguir seu discurso. A virulência desse ataque foi tão grande que a instituição teve que colocar seguranças para o acompanharem na saída do auditório.

    Em sua fala corajosa e necessária, principalmente na ocasião em que jovens colegas chegam ao mercado de trabalho, Felipe, embasado em dados e exemplos, alertava para o que deveria ser óbvio: o presidente da República vem constantemente ofendendo e destratando jornalistas. “No ano passado, segundo levantamento da Federação Nacional dos Jornalistas, o presidente da República atacou a imprensa 116 vezes em postagens nas suas redes sociais, pronunciamentos e entrevistas. Um ataque a cada três dias”, destacou o professor.

    Como também salientou o paraninfo, o atual presidente da República vem ameaçando não só o jornalismo: “Ameaça a democracia, a arte, a ciência, a educação, a natureza, a liberdade, o pensamento. Ameaça a todos, até aqueles que hoje apenas o aplaudem”. Esses que na formatura tentaram calar um jornalista por dizer o que é fato não enxergam que estão abrindo mão de um direito básico e constitucional de todos os cidadãos brasileiros: o de serem informados. Não existe democracia sem jornalismo livre. Jornalistas já foram censurados, perseguidos, presos, torturados e até assassinados durante o período de ditadura militar no Brasil, como também lembrou Felipe.

    Mas não nos deixaremos intimidar com ameaças. Por isso, nós, jornalistas, professores e professoras de jornalismo abaixo assinados, declaramos total apoio e solidariedade ao professor e jornalista Felipe Boff, que conseguiu, em sua fala verdadeira, representar a todos e todas nós neste momento tão difícil que o país atravessa.. Também por nossos alunos e alunas, temos o dever de dizer: cada ataque nos tornará mais fortes. Por fim, reafirmamos o que o professor Felipe disse no encerramento de sua fala: “Não deixaremos que a tirania nos cale mais uma vez”.

    Porto Alegre, 8 de março de 2020.

    Micael Vier Behs

    Coordenador Jornalismo São Leopoldo
    Coordenador Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades, Artes e Tecnologias

     

  • ALESP recebe com violência e tropa de choque o servidor público/trabalhador

    ALESP recebe com violência e tropa de choque o servidor público/trabalhador

    É assim que se recebe o funcionário público que presta serviços ao povo do estado de São Paulo?

    Um dia histórico que poderia ter um desfecho diferente se a Assembléia Legislativa de São Paulo fosse realmente a representante dos anseios e demandas do povo paulista.

    Cidadã paulista, funcionária pública cheguei logo cedo para exercer o direito democrático de protestar contra a forma autoritária, desumana, com justificativas inaceitáveis com que a Reforma da Previdência vem penalizar mais uma vez o funcionário público. `Somos nós que garantimos a educação pública e gratuita, o atendimento no SUS, na assistência social, nas políticas urbanas, na segurança pública, no judiciário e demais setores da vida pública do estado mais rico do país.

    Cerca de 20.000 servidores, funcionários públicos, trabalhadores, vindos de todos os cantos do estado Bauru, Marília, Franca, Palmeira do Oeste (há 600 km), Carapicuiba, Osasco, Praia Grande e muitos outros, vieram organizados exercer o seu direito democrático de reivindicar seus direitos, protestar contra esta Reforma da Previdência e contra a forma com que o governo do estado vem tratando o funcionalismo. Cinco anos sem aumentos, descaso com o serviço público, dilapidação do patrimônio, falta de investimentos em infra estrutura e recursos dos equipamentos, cortes nos orçamentos para execução dos serviços que o povo de São Paulo merece. Com a crise econômica, as demandas aumentam e é todo o povo que estará sendo afetado.

    Uma visão de quem estava lá dentro nos corredores e no Plenário

    O clima era de solidariedade e compromisso, várias delegações, horas de viagem, de partilha de sonhos e do desejo de com sua presença fazer pressão e sensibilizar os deputados eleitos para ser os representantes do povo. A meta era não deixar passar esta Reforma. Aos poucos essa alegria dos corredores foi se dissipando. Para entrar no Plenário, revista da segurança legislativa. Não pode entrar lanche, garrafa d’água, guarda chuvas,  rolo de fita adesiva, varetinha que segurava cartaz… Garantir a segurança e a não violência no Plenário impedindo a entrada dessas “armas”, era a justificativa.

    Impassível, impermeável a qualquer apelo dos participantes e ao apelo de deputados da oposição o presidente da Assembleia, deputado Cauê Macris do PSDB deu início à seção de votação. A voz de uma deputada que quis ter acesso ao microfone para solicitar que retirasse a polícia do Plenário foi interrompida. Com a palavra os deputados fizeram denúncias: o governador João Dória irresponsável com a coisa pública, em plena época que ocorriam enchentes no estado, foi pular o Carnaval no Rio de Janeiro;  a voz de uma deputada que quis ter acesso ao microfone para solicitar que retirasse a polícia do Plenário foi interrompida. Deputados da oposição denunciaram o golpe e a forma autoritária com que a discussão da PEC foi conduzida, atropelando prazos e não ouvindo duas Comissões. A divida pública do estado de São Paulo, 25 anos na mão do PSDB não é culpa do servidor mas do governo:, a sonegação fiscal é enorme, não há controle das grandes fortunas, a desoneração fiscal é de 20 bilhões  e querem penalizar o trabalhador/servidor público.O  PSDB é o pior usurpador do povo brasileiro e os deputados do PSL, DEM e partidos da situação são todos “dorianos”, mandados pelo governador. Uma deputada declarou: quero parabenizar os servidores que asseguram a educação pública, a saúde,  a segurança. Esta reforma é um tapa na cara do servidor que terá que trabalhar muito mais, retirará parte das aposentadorias e das pensões. Golpe na mudança do horário da votação em Plenário para impedir a manifestação de repúdio à esta Reforma da Previdência do des-governo Dória. É preciso ter lado e os partidos da oposição estão do lado do povo.

    Denúncias de que “a repressão estava comendo solta lá fora”, plateia e deputados da oposição pedindo interrupção da votação para que o presidente fosse pedir para cessar a violência da polícia e a retirada de tanques de guerra contra o servidor/trabalhador público que estava reivindicando seus direitos garantidos pela Constituição. Barulho de tiros de balas de borracha e de gás de pimenta, cheiro de gás invadindo o Plenário, pessoas passando mal. Protestando, ficamos sem saída, medo de que os ânimos se acirrassem, plateia cheia de polícia. Cortam a internet, barulho de tiros.

    Deputados da situação impassíveis, presidente da Mesa Diretora sorri irônico, como se nada estivesse acontecendo e cumprindo “a sua função pública”. Nem nos tempos da ditadura se viu tanta violência na CASA DO POVO.  Tensão dentro e fora do Plenário. A votação transcorreu, a oposição afirmando que entrará com recursos. Pessoas feridas, polícia a mil. EMENDA APROVADA placar 59 SIM, 32 NÃO.

    VERGONHA!

    Novo capítulo

    JUNTOS SOMOS MUITOS! NOSSO COMPROMISSO É COM A POVO. Vamos exercer a solidariedade e a união em torno das lutas do povo. Quem viu e viveu estes momentos tão fortes, repasse estas informações, fique indignado, nunca mais vote em quem votou e reprimiu o povo. DE OLHO NOS DEPUTADOS, NO DÓRIA QUE MANDA BATER NO POVO E QUER SER PRESIDENTE. HOJE VOCÊ VIU UM POUCO DE QUE LADO CADA UM ESTÁ.

    Parabéns aos deputados aguerridos que não se renderam. Parabéns aos funcionários públicos que não abrem mão da luta, de seus direitos. A luta continua. Assumimos o compromisso de lutar por direitos de cidadãos: direito à livre organização e expressão, direito à participação. DITADURA NUNCA MAIS!

    NÃO DEIXE DE LER E VER! VOCÊ IRÁ SE INDIGNAR!