Jornalistas Livres

Tag: educaçao publica

  • Quanto vale um estudante para o Brasil?

    Quanto vale um estudante para o Brasil?

    Hoje, às 20h30 Daniel Cara entrevista José Marcelino Rezende, professor da USP

    Bem na semana da vitória histórica do FUNDEB, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica, completamos 3 meses de encontros com mais de 15 programas, desde o início da pandemia, com o cientista político Daniel Cara, um forte defensor de uma educação pública e de qualidade, por isso, hoje (20h30), comemoramos essa marca com o Professor Titular José Marcelino de Rezende Pinto (USP) num papo sobre Custo Aluno Qualidade no FUNDEB.

    Sem dúvida, essa é a melhor oportunidade para quem deseja entender o CAQ e fortalecer o próximo período de defesa do FUNDEB, que passará por votação final, em breve, no Senado Federal.

    Na vitória dessa semana, o texto-base da PEC que aumenta a participação da União no fundo de 10% para 23% até 2026 e o torna permanente obteve vitória expressiva.

    No primeiro turno, a aprovação foi por 499 favoráveis contra sete.

    O texto foi obviamente rejeitado pelos seguintes bolsonaristas: Bia Kicis (DF), Chris Tonietto (RJ), Filipe Barros (PR), Junio Amaral (MG), Luiz Orleans e Bragança (SP), Márcio Laber (RJ), todos do PSL; e Paulo Martins (PSC-PR). No segundo turno, a votação ficou em 492 x 6. Os contrários foram Kicis, Tonietto, Barros, Amaral, Martins e Dr. Zacharias Calil (DEM-GO)

    E como sabem: #FundebPraValer É #FundebComCAQ. No YouTube e Facebook dos JLs.

    Assista:

  • Fature-se ou FXXX-SE – MEC mente ao dizer que mercado vai investir em educação

    Fature-se ou FXXX-SE – MEC mente ao dizer que mercado vai investir em educação

    FUTURE-SE É O PROGRAMA
    DO DESMONTE DA UNIVERSIDADEOS FINANCISTAS DO MEC apresentaram hoje pela manhã o projeto Future-se, que busca alterar radicalmente o ordenamento jurídico, patrimonial, pedagógico, trabalhista e o papel social das Universidades públicas. Toda a apresentação tinha o figurino de encontro de negócios espertos. Não faltaram painel de Led e apresentador de bleiser azul marinho sem gravata a recitar vantagens para todos, promessas de happy startups, criação de fundos, investimentos, PPPs, organizações sociais e a possibilidade de professores “ficarem ricos”.”Nós nos inspiramos em Friedman”, foi dito a certa altura. Às escâncaras, trata-se de um acelerado processo de privatização das instituições públicas, que ganharão suposta eficiência e vinculação ao mercado, como as krotons da vida.NO GOVERNO FHC, anos 1990, as privatizações eram alardeadas como forma de se superar a chamada ineficiência estatal, a falta de telefones, as carências no mercado de energia, os cabides de emprego, os cartórios corporativos etc. etc. Para chegar ao objetivo pretendido, foi preciso massacrar a opinião pública com a ladainha de que a venda de estatais era o segredo para a superação de nosso “atraso”, e que com auxílio do mercado estaríamos em sintonia com o “primeiro mundo”.

    No governo Bolsonaro, nem argumentos desse tipo há mais. Existe chantagem, feita por quem nada tem a ver com educação. Cortam-se orçamentos – o que inviabiliza de imediato o funcionamento das instituições – , coloca-se a faca no pescoço de reitores, professores, alunos, técnicos administrativos e monta-se um teatro midiático, cuja adesão seria opcional.

    A UNIVERSIDADE PÚBLICA BRASILEIRA é um modelo internacional de sucesso. Ela não apenas produz ciência de ponta, como se volta – na maior parte dos casos – para a resolução de problemas concretos e materiais da sociedade. A “torre de marfim” autossuficiente tornou-se anacrônica, em especial ao longo das últimas décadas, fruto da expansão de unidades pelo país.

    O aumento do número de vagas, as políticas de cotas e sua presença cada vez maior na vida pública faz dessas instituições a marca de um Estado que verdadeiramente se articula com as demandas sociais. Temos aqui algo raro nos Estados Unidos ou na Europa Ocidental: universidades de massa, amplas, plurais e financiadas com o dinheiro dos impostos.

    HÁ UMA DÉCADA, o documentário “Inside job”, de Charles Ferguson, ganhou o Oscar da categoria ao fazer uma varredura profunda nas causas e consequências do tsunami financeiro originado nos EUA, em 2008. Secundariamente, a fita exibiu a imensa teia de interesses privados que se sobrepõem à Universidade estadunidense. Lá, é bom lembrar, cresce a legião de jovens inadimplentes que não conseguem arcar com os altos custos das anuidades (O ministro da Educação afirma que não haverá cobrança de anuidades. Por enquanto).

    Três professores de Harvard – também operadores no mercado financeiro – foram desmascarados diante das câmeras por darem aval acadêmico à saúde financeira de empresas e países a peso de ouro.

    Harvard é um centro de excelência global, especialmente nas áreas de Direito e Finanças. Tem cerca de 23 mil alunos e é privada. A USP tem 95 mil alunos e é pública.

    SEGUNDO O CENSO DA Educação Superior do INEP, o Brasil possui “296 Instituições de Educação Superior (IES) públicas e 2.152 privadas, o que representa 87,9% da rede. Das públicas, 41,9% são estaduais; 36,8%, federais e 21,3%, municipais. Quase 3/5 das IES federais são universidades e 36,7% são Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs) e Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets)”.

    Com raríssimas exceções, a pesquisa está concentrada nas públicas. Por esse motivo, é aí que se concentra o pensamento crítico e seus resultados em diversas áreas se traduzem em importante apoio para políticas públicas.

    Os milicianos da gestão Bolsonaro não conseguem externar a mesma distorção conceitual que fazem no debate da Previdência, de que “o sistema dá prejuízo”.

     

    Se olharem apenas para o que o orçamento do MEC, com pensamento terraplanista de contador, “o sistema dá prejuízo”, sim.

    O raciocínio é evidentemente torto. Direitos e serviços públicos não são negócios regidos pelas sacrossantas leis do mercado, mas pelo benefício universal que geram. O modelo de gestão proposto pelo “Future-se” é o “Vire-se” para captar recursos. Quem conseguir dinheiro, segue funcionando – com alta ingerência de investidores nos conteúdos pedagógicos – e quem não conseguir, adentrará literalmente no programa “Foda-se”

    Como o projeto bolsonarista é o da entrega da Petrobrás, da Embraer, da Eletrobrás, do saneamento e do desmonte do BNDES, do SUS e de várias ferramentas do desenvolvimento e da soberania nacional, acabar com a Universidade é algo que está na conta. Pesquisa e inovação de ponta será feita pelos novos donos desses ativos.

    Impedir esse ataque fulminante é impedir que se acabe com o futuro do país. Apesar do nome do programa ser o horrível trocadilho Future-se.

  • O MINISTÉRIO ANTI-EDUCAÇÃO DE BOLSONARO

    O MINISTÉRIO ANTI-EDUCAÇÃO DE BOLSONARO

    Com cinco meses de governo, dois ministros na conta do Ministério da Educação (MEC), e um número muito maior de polêmicas e ataques contra a própria pasta, Bolsonaro é, sem dúvida, o presidente brasileiro recordista quando o tema é absurdos. O ministro, por enquanto, é Abraham Wentraub, que substituiu o colombiano, sem talento para a pasta, Ricardo Vélez Rodríguez.

    As investidas contra o Brasil continuam sem precedentes. Em pouco mais de cinco meses os dois ministros já somam cortes desde o ensino básico até no campo da pesquisa de doutores. Com tantas mazelas, está claro que o “critério” para sentar-se na cadeira mais alta do Ministério da Educação é ter ódio contra a ciência, escolas, professores e alunos.

    Bolsonaro tem um verdadeiro time de pessoas bizarras, desajeitadas travestidas com a capa de anti-ministros. No Ministério das Mulheres e dos Direitos Humanos, o país tem Damares Alves, no Itamaraty: Ernesto Araújo, no Meio Ambiente, uma posse grilada de Ricardo Salles, na Justiça, Moro, e na Economia, Guedes. Todos dispensam apresentações. Todos já são figuras muito bem conhecidas dos ricos e decadentes noticiários dos veículos de comunicação que não conseguem de nenhuma forma, esconder as atrapalhadas e absurdos permeados pela inabilidade de cada um desses verdadeiros personagens de uma novela de quinta categoria. Não é possível sequer adjetivar a turma que Bolsonaro colocou nesses ministérios. É de dar vergonha. Mas o capitão, claro, nos extremos de sua estupidez mórbida, tem apoiado seus escolhidos.

    O atual dono da cadeira da educação, Wentraub foi mais longe e caracterizou todos os universitários como praticantes de balburdia.

    Isso tudo, depois de meses com Vélez achincalhando a pasta e comprometendo a possibilidade de se realizar o Enem. O Colombiano não tinha ideia se o Exame Nacional do Ensino Médio custaria aos cofres 500 mil reais ou, de repente, 500 milhões. Wentraub permanece na mesma, também não sabe ou no mínimo, não sabe ainda informar. Deve ser porque acabou de chegar.

    Enquanto isso a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) cortou, pelo menos, três mil bolsas de pesquisa. A promessa de Wentraub para Universidades Federias e Institutos Federais é de um contingenciamento de bilhões nas despesas discricionárias (gastos com luz, água e limpeza).

    Mas os estudantes, pesquisadores e professores passaram as últimas semanas em movimento e marcaram para esta quarta, 15 de maio, um dia nacional de paralização, confirmado na maior parte das universidades federias e estaduais, além de Institutos Federais e diversas Escolas públicas. Algumas faculdades privadas, como a PUC-SP, e colégios privados também aderiram.

    Para compreender um pouco melhor o que se passa no Ministério da Educação e Cultura conversamos com Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, doutorando na Faculdade de Educação da USP e ex-candidato ao senado em São Paulo, pelo PSOL.

     

    Jornalistas Livres: Dois ministros já passaram pela pasta. O Vélez foi um descalabro. A coisa começou como se não houvesse projeto, agora parece que existe um projeto. Um projeto de oposição contra tudo que foi construído nos últimos anos. Como você definiria essa nova etapa do MEC, com o ministro Abraham Weintraub?

    Daniel Cara: Em primeiro lugar, é importante ressaltar, toda a questão começa a partir do processo de impeachment [da presidenta Dilma Rousself], momento em que emergiram ao poder, uma vez que elas já existiam, uma aliança ultraliberal e ultrarreacionária. Temer foi um presidente ultraliberal em aliança com os ultrareacionários. Na eleição, como o ultraliberalismo é muito ruim de voto e não possui a capacidade de conquistar setores majoritários da população, pois a população sabe da necessidade de serviços públicos e não quer a redução do Estado, o Bolsonaro foi representante de uma aliança remodelada: ultrareacionários com a condução do governo, ancorados nos ultraliberais. Uma vez que os ultrareacionários não têm agenda pública nasce uma agenda pública do governo Bolsonaro a partir do Paulo Guedes, o “superministro”, com uma agenda ultraliberal. Moro é o responsável pelo ultraliberalismo jurídico, que domina o liberalismo econômico do Paulo Guedes. Mas Moro não tem tido capacidade de implementar uma agenda: o pacote anticrime, que é a grande iniciativa dele, não anda. No caso da educação, Vélez Rodriguez [primeiro ministro da Educação, do governo Bolsorano] era de fato um ultraconservador e não chegava a ser um ultrareacionário – é importante distinguir. Acaba acontecendo o rompimento dele com Olavo de Carvalho, uma vez que Vélez era, essencialmente, apoiado pelos militares… até porque ele é professor emérito da Escola Superior de Guerra e, por ser ultraconservador, como se já fosse pouco, é uma pessoa alheia à área. Ele acabou caindo e entra Abraham Wentraub, que é de fato uma pessoa ultrareacionária.  Vélez paralisou a máquina do Ministério da Educação por incompetência. Ele não teve a capacidade de manejar o olavismo, que tinha grandes expectativas e, mais do que isso, não consegue agradar os militares. Ele perdeu os dois esteios de poder. O fato é que o Ministério da Educação representou o primeiro revés dos militares no governo. Quando cai Vélez e entra Abraham ele retira os militares do MEC, que passa a ser agora a imagem mais seca do governo Bolsonaro. Com o Vélez o MEC era exclusivamente ultraconservador e agora, com Abraham Weintraub, é dominado pelo ultrareacionarismo.

    JL: Quais as diferenças entre os polos ideológicos do governo Bolsonaro?

    DC: Ultrareacionarismo e ultraliberalismo são duas estratégias de freio, de contenção, da democratização da sociedade brasileira que começa, efetivamente, nas lutas pela superação da ditadura, na Diretas Já, e se materializa na Constituição de 88. Os ultrarreacionários buscam constituir um freio para a agenda dos direitos civis e dos direitos políticos. A meta do movimento ultrarreacionário é limitar os direitos civis e os direitos políticos. O que é a limitação dos direitos civis, por exemplo: toda a pauta regressiva contra população LGBT, contra as mulheres, contra os negros, contra os trabalhadores. É restringir aqueles que ainda lutam pela sua inclusão real na sociedade brasileira, uma vez que ela não veio ela não existe. A sociedade continua sendo machista, homofóbica, sexista. Toda a agenda de segurança pública nega, essencialmente, o fato de que o Brasil é um país que pratica genocídio contra a população jovem, negra e masculina. Também agridem direitos políticos: como a liberdade de associação, agride as reivindicações associativas, agride ações coletivas do MTST, por exemplo. Ou seja, é uma tentativa de retornar a um passado anterior da Constituição de 88. É o freio e uma introdução de uma política de retrocesso. O governo é ultrarreacionário e tem voto, porque setores da sociedade brasileira que se ressentem com a expansão dos direitos civis e políticos pós Constituição de 88. O problema do governo é que ele não tem pauta econômica, o ultrarreacionaríssimo não tem pauta econômica, ele se circunscreve na tentativa de limitar os direitos civis e direitos políticos, que não é só uma questão moral. Porque muitas vezes as pessoas falavam que é agenda moral e aí o partido Novo, por exemplo, percebendo essa dificuldade pode ser extremamente liberal e conseguir atingir o eleitorado dizendo ‘somos liberais na economia e conservador nos costumes’, isso não é costume! É direito, é direito civil, direito político! E a ideia de direitos agride o ultrareacionarismo. O direito sempre tem a função de expansão da sociedade. A afirmação do direito significa, essencialmente, atribuição cidadania. E quanto mais expandida é a cidadania no Brasil, mais o tensionamento nos espaços de elite. O que acontece no Brasil hoje? Hoje os homens brancos, heterossexuais, de classe média morrem de medo de qualquer transformação para ele não perder o seu lugar de privilégio. É inegável que a forma machista da sociedade brasileira privilegia o homem branco heterossexual. O machismo privilegia todos os homens brancos, héteros sexuais. Isso é um fato. Você é beneficiado. A questão é se você tem a decência ética de considerar isso justo ou não e luta contra esses privilégios. Isso que diferencia os lados do jogo. Os ultrareacionários são contra isso. Esse é o elemento estrutural desse polo, já os ultraliberais querem a redução do Estado, mas a redução do Estado é totalmente antipática para a sociedade brasileira. Porque as pessoas sabem que é preciso ter escola pública, universidade pública… até porque, sem salário, sem emprego, ela sequer tem condição de pagar por esse serviço. Então esse é o nó do bolsonarismo: como ele não tem pauta econômica ele acaba pegando emprestada a pauta econômica dos seus aliados liberais. Mas ele tem aí um limite, uma vez que se ele absorver toda a agenda liberal, ele não vai conseguir vencer eleições.

    JL: Esse apelo que foi usado na eleição, é uma das formas que Bolsonaro encontrou para se sustentar e acaba usando uma espécie de “cruzada contra o esquerdismo”, que se configura no que você está analisando. Esse ataque ideológico pode ser entendido como uma agenda principal do governo?

    DC: O que acontece no Brasil, é que a luta contra os direitos civis e direitos políticos tem apelo eleitoral. Porque a sociedade brasileira é tradicionalmente conservadora. Você vai ver uma série de mulheres ou mesmo uma série de pessoas inclusive do movimento negro defendendo as falas do bolsonarismo. Os ultraliberais atacam os direitos sociais. Nisso entra a reforma da Previdência, o financiamento da educação pública, expansão de uma ação redistributivas do Estado. Ação distributiva vinha andando lentamente com Fernando Henrique Cardoso, quase como um consentimento autorizado das elites. Já no governo Lula começa o processo mais acelerado de distribuição a partir do bolsa família, mas essencialmente, pelo elemento estruturante que é a política de valorização do salário mínimo. O que foi estrutural, pensando em médio e longo prazo, é a política de expansão da universidade. E, se conseguirmos manter a política de democratização da universidade, a sociedade brasileira vai ser outra em vinte ou trinta anos. Por conta da própria dinâmica e extensão da Constituição de 88, de caracterizar o que é a comunidade política, o que é sufrágio universal do voto, o sufrágio dos analfabetos… a preocupação em colocar a educação como o primeiro direito social, listado no artigo sexto da Constituição, reconhecimento de diversos direitos sociais. É uma constituição que não reconhece como deveria, mas segue as teses do Anísio Teixeira, do Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro e do Paulo Freire em termos da composição constitucional. É uma constituição que, no capítulo da educação, é especialmente dedicada a democratização da sociedade. A escola pública é tratada, na Constituição Federal… aí nesse caso tenho uma crítica a construção, que não é feita de forma direta como deveria ser tratada, mas de uma forma consistente ainda assim… como uma instituição tanto da República como a Democracia. É uma constituição democratizante, com efeito democratizador. E a sociedade brasileira vinha se democratizando efetivamente. Conseguimos a aprovação da Lei das cotas, caminhávamos para a democratização do ensino superior, conseguimos o Plano Nacional de Educação, o sistema atual do Fundeb, incluindo as creches. Teve uma expansão, e eu acho que essa foi a grande medida do governo Lula, das universidades públicas federais, não o ProUni ou o Fies. O ProUni e o Fies são pautas relevantes pelo sentido de urgência. Mas o fato é que o ReUni, que na minha opinião, foi a grande medida na história de vida do Haddad e ele dá pouco valor. O ProUni e o Fies têm mais apelo eleitoral, mas não apelo estratégico. Mas a expansão das Federais e dos Institutos Federais foi a grande questão estratégica da democratização da sociedade brasileira, por meio da educação. Faltou, em todo o período democrático, isso incluindo Lula e Dilma, a capacidade de apresentar um projeto de educação que ficasse além da expansão de ensino. Mesmo sendo essa expansão um processo revolucionário, em termo de democratização. Mas só expansão do ensino, sem o projeto educacional, resulta efetivamente numa capacidade democratizadora, limitada, com mais dificuldade de articulação, que tem encontrado dificuldade para implementar uma agenda democratizadora da sociedade. Com isso não é possível garantir o preceito liberal de igualdade de condições na realização da vida.

    JL: E como ficam esses ataques do Bolsonarismo e do Olavismo que identificam a universidade como um espaço de esquerda. O que é isso?

    DC: Isso é uma besteira enorme. Eu sou doutorando na USP, sou do conselho da Unifesp e já estou com mais de vinte e quatro anos de escolarização. Posso te dizer com toda clareza que a universidade está distante de ser um espaço da esquerda. O que acontece é que – e esse é um elemento que gera muito ressentimento do bolsonarismo e de todos os movimentos ultrareacionários – os intelectuais de esquerda por uma contingência da luta social, como eles remendam contra a corrente, eles têm que ter uma melhor formação. Eu me ressinto de não ter, na área de educação, por exemplo, pessoas de direita que tenham uma boa formação e que tragam boas ideias para o debate. O fato do Olavo de Carvalho ser o maior expoente deles, porque teve mais leitura – até estou fazendo um reconhecimento ao fato de que o Olavo de Carvalho é uma pessoa que lê mais, muito mais. Ele é uma exceção, dentro do campo ultrarreacionário. Mas é sempre bom lembrar: a esquerda e centro-esquerda procuram ou humanizar o sistema capitalista ou elas procuram superar o sistema capitalista. Só que o sistema capitalista é a estrutura Econômica, ele é muito maior. Então você tem que ter melhor formação para poder responder a este desafio programático: de como superar ou humanizar algo que é que se impõe e que é um sistema reprodutor de desigualdades. E é um sistema que tem muita legitimação social porque conta com enormes canais de propaganda.

    JL: Os últimos ataques e cortes, anunciados nas últimas semanas, contra a educação pública, desde o fundamental até programas de pós-doutorado, anunciado pelo ministro da Educação, a criação da CPI das três estaduais (USP, Unicamp e Unesp) na Assembleia Legislativa de SP e o ataque do Bolsonaro nominando as Ciências Humanas, Filosofia e Sociologia em especial, parecem ter sido a manifestação prática desse discurso de demonização das Humanidades e, agora, de toda a ciência. Como isso se articula no governo Bolsonaro e aliados, como, por exemplo, Doria?

    DC: Os ultraliberais querem reduzir o custo da educação pública. E parte do curso de educação pública, que não é a maior: a cada um real investido em educação no Brasil, pelos esforços da União, dos Estados e dos Municípios 82 centavos vão para Educação Básica e 18 ensino superior. O hoje, inclusive, o governo federal tranfere muita mais do que trabsferia no passado, graças ao Fundeb atual. Fundeb que foi fruto de luta da sociedade civil, não era pauta nem do governo Lula fazer essa transferência toda. Isso é pra dessacralizar o governo Lula, no que trata da educação, mas naquele momento existia uma interlocução positiva em favor da área. Mas tinha luta e disputa. Várias vezes ganhamos do ministério da educação ou da fazenda. Mas havia espaço para uma interação positiva. O governo [Lula] não era contra a pauta da educação como é esse governo e como foi o anterior [Temer]. Ele era favorável, mas tinha outros constrangimentos econômicos, com outras áreas… ele não podia só beneficiar a educação…, mas a gente fazia a luta. Mas voltado aos cortes. A educação não é uma agenda positiva para o Bolsonaro, em si. O direito à educação não é uma agenda positiva para esse governo. O que ele aproveita da educação, o que traz ganhos para ele, é a idea de que a educação é uma ferramenta de propaganda ultrarreacionária. Isso é: O Escola Sem Partido, a defesa da educação domiciliar, a desqualificação da escola como espaço de cidadania. A educação, para o bolsonarismo, serve como uma política de controle, por isso ele defende a militarização de escolas. A educação é a expressão da agenda ultrarreacionária, em termos de valores. Ela serve para exprimir agenda ultrarreacionária pelos valores, disseminar e implementar esses valores. Mas, para fazer isso, ele tem que escolher os adversários, que são: a pedagogia, que é o oposto do que ele considera prioritário, como a disciplina autoritária. O outro adversário: a escola, que ele considera um espaço de desvirtuamento. Quando você coloca o teu filho na escola eles dizem que ele “vai sofrer uma doutrinação marxista e uma doutrinação de ordem sexual, desconstruindo as identidades de gênero”. E as universidades também são inimigas, uma vez que elas também são irradiadoras de valores. Elas têm o potencial de formação dos professores. O problema é que ele fazendo todo esse enfrentamento, ele ajuda muito a necessidade de corte dos ultraliberais. Porque, se as escolas e as universidades são espaços tão ruins e a prática pedagógica é algo tão condenável, então para que tem essa política? Então vamos cortar! Aí saem com uma proposta, absurda, de corte linear de 30% nas universidades. O que é inconstitucional, uma vez que são despesas obrigatórias. Não podem cortar 30% sem uma ampla justificativa porque isso vai significar a necessidade de demissão de pessoas, que têm estabilidade. É nessa hora que os ultraliberais encontram nos ultrarreacionários uma justificativa social para os cortes que querem implementar.

    JL: Desse encontro é possível, como já voltaram a circular comentários, que se tenha as cobranças de mensalidades? Uma secretaria de Doria já mencionou, é um tema que vai e volta em discussões. Isso pode virar realidade?

    DC: A cobrança de mensalidade vai ter muita resistência, por parte de quem é responsável, no debate universitário. hoje o aluno cotista já sofre um enorme problema, sendo considerado um aluno de segundo grau. Isso sem contar todas as dificuldades de permanência. Mas tem outro aspecto, que é tão perverso… se começarem a cobrar mensalidade, com nossa cultura política, que é uma cultura política pautada na Casa Grande e Senzala, os alunos pagadores vão se considerar com mais direitos ou os únicos com direito àquele espaço. Agora que se começou a democratizar o ambiente O Brasil não pode criar, dentro do ambiente universitário, mais um fator de segregação.

    JL: Com relação a votação do Supremo Tribunal Federal que tratava da cobrança de mensalidade, como vê o resultado que limitou a cobrança para cursos de extensão?

    DC: O sinal que o STF deu é ruim. Ele tá dizendo que a universidade pode cobrar. Que a universidade pública e gratuita pode cobrar por alguns cursos. A questão é que dentro do ambiente universitário, existia muita pressão em favor disso, porque os orçamentos das universidades já eram baixos. Essa virou uma estratégia de captação de recursos. Não é grave, mas traz um princípio ruim.

    JL: E quais são as possibilidades e estratégias possíveis para resguardar a educação?

    DC: Todo o estado brasileiro e os ditames constitucionais estão tensionados. Temos que fazer da constituição um freio e, ao mesmo tempo, um ponto de partida para retoma dos processos democratizantes da sociedade, que agora estão em questão. É sempre bom lembrar, isso começa, em termo de hegemonia política, com o impeachment da Dilma e ascensão do Temer. O Temer é a introdução disso tudo. Ele ataca o Ensino Médio que é, exatamente, a política educacional que cabe sob o teto dos gastos públicos, da emenda constitucional 95. É uma política educacional de baixo custo. A educação profissional se assemelha muito mais com cursinho de educação profissional do que ao sistema de educação profissional como os que temos nos Institutos Federais ou no Centro Paula Souza, em são Paulo. A política do Temer para o Ensino Médio foi um acerto educacional para o arranjo constitucional que ele construiu: o Teto dos Gatos Públicos e a reforma trabalhista. Funciona assim: o profissional que se formar pela reforma do ensino médio vai ser um profissional que tem uma pior qualidade de educação. Ele vai ser mais dócil ao mercado de trabalho desregulamentado. E pra quem vem da periferia, ainda hoje, encontra nas escolas técnicas uma facilidade de ingresso nas universidades. É um início de uma inserção qualificada ao ambiente escolar.

    JL: Parece contraditório piorar, inclusive os institutos de formação técnica, como os Institutos Federais ou o Centro Paula Souza, com o intuito de formar trabalhadores que recebam, nas palavras do próprio presidente, retorno imediato. Esses cursos profissionalizantes não deveriam se tornar prioridade?

    DC: Isso se dá por conta da natureza dos nossos ultraliberais. O ultraliberal brasileiro é um liberal sem substância. Ele não quer toda a agenda liberal, ele só quer a redução do Estado, porque essa redução busca conter a democratização da sociedade. É o encontro, de novo, do ultraliberal, com o ultrarreacionário. O Jessé Souza, com muita propriedade, falou que o Bolsonaro agride as universidades e a educação, junto com o Abraham Weintraub, por serem os dois, pessoas que não tiveram a capacidade de se integrar ao ambiente da educação formal. Eles são ressentidos porque não tiveram capacidade de pertencer nesses espaços.

    JL: Esse ressentimento pode ser uma janela a ser explorada?

    DC: O primeiro ponto para atacar o bolsonarismo, enquanto projeto político, é mudar a nossa forma de agir. Entrar nas polêmicas, de maneira franca e aberta e com as mesmas estratégias de lacração do Bolsonaro só tem ajudado o próprio Bolsonaro, gerando mais fluxo e alcance para as loucuras dele. É uma questão de modus operandi da esquerda. Tem uma questão concreta: precisamos ter, novamente, um projeto articulador. E acredito que o ponto de partida é a própria constituição, que tem que ser utilizada como instrumento para impor freios aos arroubos autoritários e ultraliberalizantes, no sentido estrito de diminuição do Estado e de direitos civis. Infelizmente não temos os liberais defendo os direitos civis, como poderiam fazer. E precisamos, de maneira muito clara, ter a capacidade, no caso da educação, de retomar os debatas sobre a implementação do plano nacional de educação. A pergunta que fica é: o plano nacional de educação, que completa agora cinco anos de descumprimento, vai ser cumprido? Provavelmente ele não vai ser realizado no conjunto de suas metas e estratégias, mas abandonar o plano como ferramenta política significa abandonar algo que foi fortemente construído pela sociedade e que precisa ter sentido político. E ele baliza o processo de democratização ao acesso para a escola e universidade e, fundamentalmente, a qualidade da educação básica.

    JL: É possível utilizar a educação, como ferramenta ideológica e retórica da forma como eles utilizam?

    DC: O bolsonarismo conseguiu descobrir qual é o papel da educação para ele. Submetendo a educação a uma propagando ultrareacionária e a disseminação de valores ultrarreacionários, ele pode tirar algo dela. Propaganda nunca é só divulgação. É também uma divulgação massificada que determina um conjunto de valores. O bolsonarismo tem sido muito hábil nesse sentido. E o campo da educação tem sido pouco articulado em torno do direito à educação. Hoje, os movimentos, institutos e fundações empresariais têm como pergunta, não “como defender a educação?”, mas sim como conseguir convencer o bolsonarismo a implementar a agenda deles. E não vai implementar. A agenda dos movimentos empresariais, na área de educação, não é de redução estrita da ação do Estado, é de se apropriar do orçamento da educação. Só que esse orçamento está sendo reduzido.

    JL: As Organizações Sociais podem crescer muito nesse período? Elas se articulam nesse sentido de absorver e gerenciar os espaços públicos.

    DC: Sim. A ideia de, por exemplo, creches conveniadas, universidades conveniadas, etc…

    JL: Isso afeta a própria autonomia de cátedra?

    DC: Exato. A ideia de dar a gestão de equipamentos públicos para o setor privado é uma ideia que está viva. Só que ela é uma ideia que está viva dentro de um contexto em que, cada vez mais, o bolsonarismo reduz recursos. Quem visa lucro não vai querer assumir uma universidade, uma escola, uma vez que o valor por aluno/ano é muito baixo. Mesmo das universidades. O problema é que movimentos, fundações e institutos empresariais são tão sedentos por influenciar que perdem o sentido lógico. O sentido prático de que a política de educação, no geral, está sendo submetida a uma estratégia de propaganda. A pauta orientadora tem que ser a – pauta do Direito à educação. Expansão da qualidade, expansão do acesso. Em um primeiro momento isso é um freio ao açodamento bolsonarista de se apropriar da área para fazer dela um instrumento de propaganda. Em um primeiro momento vai ser um freio. Em um segundo momento ela tem quer ser o próprio programa articulador.

    JL: Nessa defesa um personagem de destaque é o professor, tanto como alvo de ataques quanto no protagonismo do dia a dia da educação?

    DC: Os professores são inimigos por não existir nenhuma outra categoria como eles. São alguns fatores, na minha opinião, dois deles são peculiares da educação e um terceiro fator político real. Para quem é educador, para todos nós que somos educadores, resistir é cotidiano, não palavra de ordem. Você vai ver um monte de gente reivindicando a questão da resistência, mas a resistência para o professor acontece no dia a dia, quando ele acorda na segunda-feira, no início da semana, vai para uma escola precarizada sem nenhuma condição de trabalho, sala de aula super lotada, salário ruim e assim faz o seu trabalho. A resistência é um meio de vida, faz parte da ética profissional. É claro que outras profissões públicas vivem a mesma situação, mas não de maneira tão radical quanto os professores, que são as maiores vítimas de problemas de doenças de saúde mental, problemas psiquiátricos e isso é evidente em todas as pesquisas. Essa é a primeira questão. Os professores são atacados porque eles sabem resistir, eles têm toda uma vida de resistência. O segundo ponto é a própria pedagogia brasileira, que por mérito de todo um projeto educacional, que é mundial, mas que tem muita força no Brasil a partir do manifesto dos Pioneiros da Educação Nova e, posteriormente, nas figuras do Florestam [Fernandes, sociólogo brasileiro] e do Paulo Freire (o Florestam é um ponto de encontro entre o Paulo Freire e Escola Nova). A partir disso são criadas propostas mais avançadas, especialmente pelo Paulo Freire. Nesse projeto tem uma contribuição brasileira para a pedagogia mundial que a ideia de que a própria educação é um instrumento essencialmente democratizador da sociedade. A educação é libertadora, é emancipadora e democratizadora. E esse projeto está nos professores e eles acabam passando isso na sala. O terceiro ponto é que, como categoria política, os professores são a categoria que mais consegue se mobilizar contra os ataques do bolsonarismo, até porque tiveram uma formação melhor. Não que todos os professores sejam progressistas, defendam a democracia ou sejam contra a privatização, mas as lideranças do professorado e boa parte da base comungam desses valores e tem capacidade de mobilização. Eles têm a capacidade de fazer a leitura do processo. Por exemplo, eu convivi com professores que defendiam, lá no começo, o Escola Sem Partido. Eles estavam muito desgastados como petismo, com as baixas condições de trabalho e colocavam a culpa disso no governo federal, mas reencontrei eles e, hoje, são contra o projeto e contra o bolsonarismo. Existe um quarto fator, para esses ataques. Os professores são a principal cadeia de transmissão do Estado com a sociedade e com o futuro da sociedade. E na relação professor/aluno existe uma potência democratizadora. Quando o Escola Sem Partido, que utiliza a mesma estratégia do Alternativa Para Amanhã que é um partido nazista alemão atual, ou do Vox, da Espanha. Essa estratégia de gravar os professores, constranger, vai estimulando a quebra de relação entre o professor e o aluno. E esse potencial democratizador, que existe no exercício cotidiano da profissão docente vai sendo corroída.

    JL: Os estudantes, que também estão nessa ponta da relação, tem sido uma das categorias mais mobilizadas nos últimos anos, principalmente os secundaristas com as ocupações. O que podemos esperar deles?

    DC: Esse é um ponto importantíssimo. O que representou a ocupação das escolas? Uma reivindicação dos estudantes pelas teses da Escola Nova, do Anísio Teixeira, dos Pioneiros da Educação e do Paulo Freire, sem saber que pediam e defendiam essas teses. Eles queriam uma outra pedagogia, para uma outra escola, para uma outra formação e queriam o fortalecimento dos professores. Eles não tratavam o professore como inimigo. Pelo contrário, o professor era um aliado. O professor podia estar implementando uma política pedagógica ruim e, em muitos casos havia críticas aos professores, mas os estudantes viam uma possibilidade do professor mudar, se tivesse mais condições de trabalho como também viam a disposição dos professores em colaborar com os estudantes. Essa união é muito potente, pode mudar um país. E acho que um bom caminho seria o Brasil retomar e reler o que foi escrito no manifesto dos Pioneiros da educação, pelo próprio Anísio Teixeira, Florestan Fernades, Darcy Ribeiro e o Paulo Freire.

    JL: E como potencializar os estudantes secundaristas ou universitários?

    DC: Eu acho que eles já são potentes. O que é a potência? Ela tem duas características: ela é um devir, enquanto possibilidade de se realizar, ou ela já é um fato. A potência dos alunos está escondida, mascarada, pelo contexto político. É preciso colocar essa potência em movimento. E isso pode ser feito de diversas formas. Por meio de intervenções em escolas, trabalhos em escolas. Por meio da utilização da cultura, como um projeto pedagógico. Eu era estudante, na periferia de São Paulo, durante a prefeitura da Luiza Erundina e teve um projeto chamado RAPensando a educação que levava o RAP para a escola. Se discutia a educação a partir do cotidiano dos estudantes, que era o próprio RAP. Não existe nada mais freiriano do que isso. O cotidiano dos educandos que por meio de uma manifestação cultural, gerava uma conscientização e isso era utilizado pela própria escola. Isso era algo emergente que a escola fazia. Essa é uma questão que precisa ser retomada. O Bolsonaro tem dois ataques sistemáticos: a educação e a cultura. Mais do que muitos militantes de esquerda e de centro-esquerda, o Bolsonaro tem consciência de que se essas duas Políticas se encontram, ele não consegue sobreviver. Esse encontro gera conscientização, gera mobilização e mudança da hegemonia política. A potência dos estudantes não vai ser materializada pelos instrumentos tradicionais. Seria preciso ser mais ‘Ocupacionista’, usando essa experiencia das ocupações das escolas. Fazer um novo debate nas escolas, mobilizar as escolas para aquilo que importa aos estudantes. Perguntado para os estudantes. E como temos uma concorrência difícil, contra as redes sociais, a cultura é um dos melhores instrumentos pedagógicos.

  • Professor de SC denuncia perseguição e demissão ideológica ao MP

    Professor de SC denuncia perseguição e demissão ideológica ao MP

     

    Escola Municipal Oswaldo dos Reis, em Itapema, de onde professor foi demitido por discutir texto sobre tortura, classificado como crime hediondo e inafiançável. (Foto: Arquivo da Prefeitura de Itapema)

    Era a Semana do 55° aniversário da Ditadura Militar brasileira. A quadra de Educação Física da Escola Municipal de Educação Básica Oswaldo dos Reis estava perigosa com as reformas inacabadas. O professor da disciplina, Willian Meister, se viu levado a desenvolver um conteúdo pedagógico em sala com os alunos do sétimo ano. Decidiu apresentar um texto poético sobre a ditadura para discussão dentro do projeto de incentivo à leitura que integra todas as disciplinas. O texto escolhido foi o do poeta paraibano Alex Polari, preso e torturado pelos militares aos 20 anos, suplício que inspirou um conjunto de poemas sobre os porões da ditadura. Polari tornou-se célebre também pelas cartas que escreveu à estilista Zuzu Angel, revelando-lhe ter testemunhado o assassinato, sob violenta tortura, do filho Stuart Angel Jones, desaparecido político que ela procurava obstinadamente há quatro anos. Na carta, Polari descreve os requintes de crueldade sofridos pelo jovem até o último suspiro, calvário de horror que ele conseguiu espiar por um buraco na parede do cárcere.

    As cartas e poemas sobre a tortura na obra de Polari, hoje seguidor do Santo Daime, fazem parte indelével da literatura memorial sobre o Golpe de 64. Já foram inclusive objeto de encenação em especial da rede Globo sobre Zuzu Angel. Embora esses fatos sejam de amplo conhecimento público, a aula provocou a ira de um pai de aluno, o radialista e ex-militar do Exército, Marcelo Fidêncio, que compareceu ao gabinete da prefeita Nilza Simas (PSL) para prestar queixa contra o conteúdo da leitura. Foi o pretexto para Willian Diógenes Meister receber uma advertência por conduta inadequada da direção da escola pública, localizada no bairro Várzea, no município de Itapema, Litoral Norte de Santa Catarina. Na terça-feira, véspera do Dia do Trabalhador, quando deveria renovar o seu contrato como professor Admitido em Caráter Temporário (ACT), a secretária municipal de Educação, Alessandra Simas Ghiotto, irmã da prefeita e ambas aliadas do Governo Bolsonaro, comunicou-o da dispensa do posto que ocupava de forma intermitente desde 2012 através de concurso público. O último contrato se referia ao seletivo do final de 2017, quando ficou em segundo lugar na sua área para escolha de vagas nos dois anos seguintes.

    Professor Willian Meister, ao lada da esposa, também professora: livros em vez de armas. (Foto: arquivo pessoal)

    Em linguagem de ACT, não renovar o contrato significa demissão. Casado com a também professora Alessandra Silva, dois filhos e desempregado, o professor não pensou um momento sequer em se curvar à arbitrariedade. No mesmo dia, entrou com representação no Ministério Público de Santa Catarina – MPSC denunciando a direção da EMEB Oswaldo dos Reis e a Secretaria de Educação da prefeitura por improbidade administrativa, assédio moral e violação da liberdade de cátedra.

    DESEMPREGADO NO PRIMEIRO DE MAIO

    Formado em Educação Física e dedicado à pedagogia, Willian Meister declarou em entrevista aos Jornalistas Livres que o caso dos poemas sobre tortura, classificado como crime hediondo, foi o ápice de um longo processo de perseguição político-ideológica. Assessorado pelo advogado Luiz Fernando Ozawa, ele explica o teor do documento jurídico: “Nossa representação ao MP contra a minha demissão denuncia vários indícios de assédio moral, com farta documentação, ocorridos desde o início do ano, que levaram a gestão da escola a cometer crime de improbidade administrativa”, afirma ele, que atua como militante social nas áreas de direitos humanos, políticas públicas e meio ambiente, hoje não mais filiado a nenhum partido.

    Marcelo Fidêncio, ex-militar do Exército que denunciou professor por abordar tema da tortura. (Foto do perfil do Facebook)

    A representação argumenta que a demissão fere o princípio da legalidade porque está baseada em uma advertência irregular, amparada unicamente na queixa do pai contra a discussão de um texto sobre a ditadura. No dia 14/04 último, coincidentemente data do 43° assassinato de Zuzu Angel, a reprimenda foi formalizada pelo diretor da escola sem direito à defesa, como pressupõe a lei, segundo afirma o professor: “Não fui ouvido, ninguém mais foi ouvido, não houve direito ao contraditório”, afirma, lembrando que os textos foram contextualizados e discutidos com os alunos para que levassem a uma compreensão histórica do período da ditadura. Acusado pelo pai de ministrar um conteúdo inapropriado para a disciplina, afirmou que o incentivo à leitura está previsto no projeto pedagógico interdisciplinar da escola.

    O advogado alega também quebra do princípio da impessoalidade, sustentado no fato de que a dispensa se caracteriza como punição a adversário político. Explica-se: em 2012, Willian Meister se candidatou a prefeito de Itapema pelo PSoL e, novamente em 2016, quando fez oposição à chapa vencedora do PSD, encabeçada por Nílza Simas. Eleita, a prefeita nomeou sua irmã Alessandra, também do PSD, ao cargo de secretária municipal de Educação e ambas se engajaram na campanha pela eleição de Bolsonaro (PSL), alinhadas com o diretor da escola, Emílio César da Silva (também presidente do Conselho Municipal de Educação de Itapema).

    Dois dias antes de receber a advertência, Meister soube pelo diretor que havia uma denúncia anônima de um pai “youtuber” à prefeita Nilza Simas por questões político-partidárias. Por conta disso, a secretária de Educação, irmã da prefeita, solicitou ao diretor e à supervisora que gerassem um relatório para apresentar ao “pai-denunciante”, mas não houve consulta ao denunciado. Desde a sua chegada à escola, em 2018, começaram os desentendimentos com Emílio que, segundo a representação, começou a deixar claro que a sua presença era indesejável na instituição. “No início, com divergências de ideias, metodologias e práticas, em discussões dentro dos limites do processo educacional. Porém, a partir do início do ano letivo de 2019, o diretor passou a intensificar suas ações no sentido de expulsar Meister de ‘sua’ escola, usando da burocracia para constranger o professor, seus alunos e suas práticas de ensino”.

    O professor demitido garante que não vai se submeter à sanção sem recorrer à justiça porque tem muito respeito e afeto pelos alunos e pela instituição, tanto é que escolheu a mesma escola onde trabalhou no período da seleção anterior, em 2016. “Quero levantar a cabeça e retornar à sala de aula. Acho importante passar essa mensagem à comunidade escolar de que o poder político cometeu excessos contra o professor, mas isso depende da interpretação do judiciário. Vou aguardar confiante”. Ainda que o tema seja forte, considera necessário conscientizar adolescentes e jovens sobre a tortura como crime contra a humanidade, considerado hediondo, inafiançável, imprescritível e não suscetível à anistia pelo Art. 5º, inciso XLIII da Constituição Federal.

    ESCOLA SEM TORTURA

    Governada por um militar reformado, o comandante Carlos Moisés, Santa Catarina tem sido cenário de assédios constantes de partidários do Projeto Escola Sem Partido a escolas e professores, como ressalta também a representação ao MP/SC. Deputada Ana Caroline Campagnolo (PSL), que se declara antifeminista e uma das baluartes desse projeto, embora sua inconstitucionalidade já tenha sido atestada pelo STF por violar a liberdade de ensino, estabeleceu sua base na região do Litoral Norte, à qual pertence o município de Itapema.

    Foto de Otávio Magalhães (O Globo), que comprova o assassinato de Zuzu Angel pelo coronel Perdigão (de branco, encostado no poste)

    Há 43 anos, fortemente impactada pela carta do poeta Alex Polari, Zuzu Angel deslanchou sua campanha nacional e internacional contra as atrocidades da ditadura militar e o assassinato do seu filho, cujo corpo nunca foi devolvido pelos militares. Só se calou ao morrer no dia 14 de abril de 1976, num sinistro acidente na Estrada da Gávea (Rio de Janeiro), na saída do túnel que hoje leva seu nome. O acidente é atribuído a uma sabotagem criminosa no seu Karmann Ghia executada pelo coronel do Exército Freddie Perdigão, identificado como torturador por vários presos políticos no governo Geisel. Além de vários outros indícios, ele foi flagrado numa foto jornalística ao lado do carro capotado, revelada somente em 2014, pelo ex-agente de repressão Cláudio Guerra.

    Em depoimento para a Comissão Nacional da Verdade, o advogado José Bezerra da Silva, outra testemunha da morte de Stuart, relatou que assistiu, no dia 14 de junho de 1971, à sessão de suplício final em que o jovem foi amarrado pela boca ao cano de descarga do jipe de um oficial militar e arrastado. Bezerra, que era soldado da Aeronáutica na época, reclamou da covardia e em resposta foi levado para a guarda e torturado. Por conta do espancamento, sofreu uma hemorragia no tórax e passou por uma cirurgia e ainda em recuperação foi arrancado da cama pelo tenente, seu chefe, para nova sessão de tortura. Parece que a prática de eliminar do cenário mães, poetas, militantes, jornalistas, professores e até militares que insistem em dar o testemunho das crueldades indecorosas do regime autoritário às futuras gerações voltou à cena nessa marcha-ré da história brasileira.

    Canção para ‘Paulo’ (A Stuart Angel)

     

    Por Alex Polari

    Poesia de Alex Polari denuncia a própria tortura e a de outros jovens nos porões da ditadura. (Foto: Socialista Morena)

    Eles costuraram tua boca
    com o silêncio
    e trespassaram teu corpo
    com uma corrente.
    Eles te arrastaram em um carro
    e te encheram de gases,
    eles cobriram teus gritos
    com chacotas.
    Um vento gelado soprava lá fora
    e os gemidos tinham a cadência
    dos passos dos sentinelas no pátio.
    Nele, os sentimentos não tinham eco
    nele, as baionetas eram de aço
    nele, os sentimentos e as baionetas
    se calaram.
    Um sentido totalmente diferente de existir
    se descobre ali,
    naquela sala.
    Um sentido totalmente diferente de morrer
    se morre ali,
    naquela vala.
    Eles queimaram nossa carne com os fios
    e ligaram nosso destino à mesma eletricidade.
    Igualmente vimos nossos rostos invertidos
    e eu testemunhei quando levaram teu corpo
    envolto em um tapete.
    Então houve o percurso sem volta
    houve a chuva que não molhou
    a noite que não era escura
    o tempo que não era tempo
    o amor que não era mais amor
    a coisa que não era mais coisa nenhuma.
    Entregue a perplexidades como estas,
    meus cabelos foram se embranquecendo
    e os dias foram se passando.

     

    Abaixo, cenas do especial da Globo sobre Zuzu Angel, no qual sua filha, Hildegard, fala do impacto da mãe ao receber a carta de Alex Polari, em maio de 1975, dando detalhes sobre a tortura e a morte de seu filho Stuart:

     

     

    Leia a matéria publicada pelo DIARINHO, de Itajaí, sob o título “Professor denuncia perseguição”, assinada por Sandro Silva

    Professor denuncia perseguição ideológica

    O professor Willian Meister, de Itapema, apresentou ontem no MP uma denúncia de perseguição político-ideológica praticada, segundo ele, pela direção da escola onde trabalhava e pela secretária de Educação da prefeitura de Itapema. Na terça-feira, Willian não teve o contrato de trabalho temporário renovado porque, segundo a secretaria, aplicou conteúdos inadequados. O professor havia lido com os alunos um texto-poema sobre tortura na ditadura militar.

    Willian dava aulas de educação Física na escola Básica Municipal Oswaldo Reis, na Várzea. Há cerca de 10 dias, como estava chovendo, a quadra estava em reforma e a última aula integrava um projeto de incentivo à leitura dos alunos, ele apresentou a uma turma da sétima série a coletânea de textos “A Tortura na Poesia de Alex Polari”.

    O poeta paraibano Alex Polari foi um dos muitos presos políticos do Brasil e foi quem, por exemplo, alertou a socialite e estilista Zuzu Angel que o filho Stuart havia sido preso, torturado e assassinado pela ditadura. Zuzu, na busca pelo filho, também foi assassinada pela ditadura. O professor diz que recebeu uma advertência sobre isso, mas sequer lhe apontaram detalhes de uma suposta denúncia de pai e que não teve direito à defesa.

    A Secretaria de Educação confirmou que a não renovação do contrato de trabalho de Willian tem a ver com o caso. “As denúncias foram realizadas por pais dos alunos referentes a prática e conteúdos abordados que não estavam de acordo com o planejamento pedagógico da disciplina de educação física”, informou a nota.

    Na representação contra a prefeitura e a direção da escola, Willian pede à promotoria que saia em defesa ao chamado direito de cátedra, que permite ao professor conduzir as aulas sob seu ponto de vista. Também pede a abertura de um inquérito civil para apurar crime de improbidade administrativa. “Esses ataques à educação, à liberdade de cátedra e à atuação do professor não são normais e não podem ser aceitos dentro de um estado democrático de direito”, argumenta.

    A coletânea de texto de Alex Polari, usada pelo professor, pode ser lida no link: encurtador.com.br/vKQY3

     

    Pai que denunciou professor é ex-militar

    O trabalho em sala de aula despertou a ira do ex-militar Marcelo Fidêncio, pai de um aluno de 12 anos. Foi ele quem, por duas vezes, procurou a escola e a secretaria de Educação para reclamar do professor.

    Marcelo sabe do programa de incentivo à leitura. Mas não concorda com o conteúdo do texto apresentado por Willian. “O texto dizia palavrões, que as crianças que ficavam enfileiradas para cantar o hino nacional eram retardadas e endemonhados”, diz o pai, que também não gostou do fato do professor ter citado que um prefeito de Balneário Camboriú (Higino Pio) chegou a ser torturado pela ditadura.

    “Ele é professor de educação e poderia ter dado texto sobre o Pelé ou sobre qualquer coisa”, entende o pai, que ainda acusa o professor de ter feito uma pressão generalizada nos alunos quando descobriu a denúncia e mesmo sem saber quem era o autor o chamou de “covarde” em sala de aula.

    Fidêncio esteve no Exército durante três anos.

    Tem 31 anos de jornalismo, formado em pedagogia pela Udesc e com MBA em Gestão Editorial. geral@diarinho.com.br

     

    https://diarinho.com.br/noticias/geral/professor-denuncia-perseguicao-ideologica/

     

     

     

     

  • Deputada eleita do PSL faz campanha pela perseguição política de professores em sala

    Deputada eleita do PSL faz campanha pela perseguição política de professores em sala

    Especulação de que deputada eleita seria nomeada Secretária da Educação pelo comandante Moisés já provoca levante na comunidade escolar

    REPORTAGEM  ATUALIZADA EM: 2/11, às 22h30min

    Nem tomou posse ainda, a militante do MBL, Ana Caroline Campagnolo, eleita deputada estadual em Santa Catarina pelo partido de Bolsonaro, já tenta instalar o terror político e a discórdia nas escolas públicas estaduais, violando as leis e a Constituição.  No domingo, antes da eleição do seu candidato ser consumada, ela espalhou um aviso nas redes sociais exortando estudantes catarinenses a filmarem ou gravarem “professores doutrinadores” em sala de aula que estariam hoje, segundo ela, “inconformados e revoltados” com a eleição de Bolsonaro. Parlamentares, entidades, advogados populares e gestores da educação pública se mobilizam hoje para pedir a impugnação do seu mandato.

    Natural de Chapecó, no Oeste do estado, mas com domicílio eleitoral em Itajaí, a ativista do Projeto Escola Sem Partido incita os alunos a denunciarem os professores descontentes em suas páginas nas redes sociais, onde costuma posar em fotos ameaçadoras com armas de fogo. Filha de um Policial Militar da reserva e evangélica, depois de eleita, ela publicou um post onde afirma: “Acabou a paz da petezada!”. Noutro, ela posa com um cassetete policial com a inscrição “direitos humanos”, como forma de afronta aos professores dedicados ao ensino dos valores baseados na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

    Causando indignação nacional, a ofensiva viola vários preceitos legais de proteção às escolas, às crianças e adolescentes e à liberdade de cátedra e será motivo de uma ação coletiva de denúncia criminal no Ministério Público. No aviso que publicou e espalhou nas redes sociais, a militante do MBL derrotada na justiça num longo processo de perseguição contra sua orientadora de mestrado iniciado em 2013, escreve literalmente:

    “Muitos deles não conterão sua ira e farão da sala de aula um auditório cativo para suas queixas político partidárias em virtude da vitória de Bolsonaro. Filme ou grave todas as manifestações político-partidárias ou ideológica. Denuncie!” (Ana Caroline Campagnolo, deputada eleita por Santa Catarina)

    Hoje à tarde, o Sindicato dos Trabalhadores na Educação (Sinte) e vários outros sindicatos estaduais e municipais se reúnem com parlamentares, lideranças de movimentos de mulheres e movimentos sociais da Rede Nacional de Advogados Populares para apresentar uma queixa-crime contra a deputada. Um manifesto assinado por oito grandes sindicatos ligados à educação, incluindo a CUT (leia abaixo), foi publicado no final da tarde de hoje (29/10), na página do Sinte.  Entre vários flagrantes de desrespeito à legislação e aos direitos na área da educação, a ofensiva desrespeita a lei estadual 18.289 de 25 de janeiro de 2008, que proíbe expressamente o uso de celular em escolas públicas e particulares. O Estatuto da Criança e do Adolescente também não permite que alunos e professores sejam filmados em sala de aula sem a sua expressa autorização e a dos pais.

    Os movimentos alegam ainda que o Projeto Escola Sem Partido não integra a política pública de educação em Santa Catarina. Além disso, as postagens da candidata ainda não empossada incitam à violência e à discórdia. “Todos que se sentirem ameaçados por ela podem registrar um Boletim de Ocorrência na Delegacia de Polícia e processá-la, pois sua ação fere a liberdade constitucional de cátedra e viola o direito à proteção de imagem”, afirma a advogada Daniela Felix.

    Aluno aproveita o incentivo à deduragem e delata a própria inquisidora: doutrinação ideológica de quem mesmo?

    Em postagens frequentes, ofensivas e ameaçadoras contra “a esquerdalha” e “petralhada”, as “feministas comunistas”, na qual aparece apontando armas de fogo, Carolina deixa claro que só se elegeu para infernizar a vida de educadores e de alunos que não compactuam com o seu projeto de sociedade falso moralista, excludente e violenta do pensamento único. Em termos concretos, ela acusa os outros do crime de “doutrinação ideológica” que ela mesma pratica e difunde, promovendo a intolerância política e doutrinando as mulheres a serem donas de casa e mães de família submissas, modelo que ela mesma, divorciada e dedicada à política, não segue.

    Como se incitar o ódio contra os movimentos sociais, os partidos de oposição, o pensamento crítico, os grandes legados intelectuais da humanidade, as minorias, a liberdade de ensino não fosse uma doutrina, uma velha doutrina, exterminadora de povos e destruidora da vida em sociedade, chamada NAZIFACSISMO. Uma demonstração bem concreta da hipocrisia do seu projeto e da sua conduta é que durante a campanha do candidato extremista, ela foi trabalhar com a camisa de Bolsonaro. Ironizando o convite à deduragem na escola pública, um ex-aluno seu identificado no twitter como Sebastian (poetjjong), seguiu os seus conselhos e entregou a própria mestra por doutrinação:

    “Professora, lembra do dia que vc usou uma camisa do bolsonaro nas aulas?? pq eu [lembro] sim! ainda por cima posando pra foto com aluno, tsc tsc…”

    The Wall, Pink Floyd em analogia ao Escola Sem Partido

    Ao final do primeiro turno, começou a correr a especulação de que a deputada seria nomeada secretária da Educação pelo comandante do Corpo de Bombeiros, Carlos Moisés da Silva, aposentado aos 40 anos, então candidato a governador pelo PSL, agora confirmado no segundo turno com mais de 71% dos votos. Pela reação da categoria de professores e também de alunos, caso esse boato se confirme, o que está desenhado para o novo governo é um quadro de guerra e de greve já de saída.

    O comportamento persecutório da historiadora do negacionismo, que nega a Ditadura Militar, a tortura, o machismo e até o assassinato em massa de mulheres que foram queimadas vivas no histórico episódio de incêndio a uma fábrica na Inglaterra que marca a luta pelos direitos trabalhistas na Inglaterra, ganha contornos ainda mais doentios com detalhes revelados sobre sua vida pessoal.

    Em Chapecó, a deputada vivia num apartamento adquirido pelo Minha Casa, Minha Vida, Programa de Habitação Popular promovido pelos governos do Partido dos Trabalhadores e foi casada com um militante do PT. Ela chegou a ingressar no Curso de Enfermagem da Universidade Fronteira Sul, criada no Governo Lula da Silva, mas desistiu. Pouco antes de se lançar como Bolsocandidata, ela se mudou para o município de Itajaí, no Norte do Estado, supostamente para aproveitar o Caixa 2 dos biliardários donos das lojas de departamentos do Sul do País, como Luciano Hang da Havan, ou Dalçoquio, que financiou a greve dos caminhoneiros. Através do esquema da Lava-Zap, eles financiaram políticos de extrema-direita como ela, sem nenhuma história de contribuição à sociedade, baseados apenas no discurso do falso combate à corrupção como cavalo de troia para implantar no Brasil um terrorismo de direita. Dizendo-se conservadora e cristã, Campagnolo disputou pela primeira vez um cargo eletivo e jamais ocupou qualquer função pública. Em outras palavras, a “nazipaquita” se elegeu surfando na onda extremista de Bolsonaro e computou 34 mil 825 votos. Sua campanha serviu de exemplo para bolsonaristas ameaçarem professores de perseguição em todo o país.

    PETIÇÃO PÚBLICA PEDE IMPUGNAÇÃO DO MANDATO

     

    Depois das denúncias, Caroline  deixou mais claro o caráter seletivo de sua perseguição. Também diz que estudantes podem usar “gravadores ou câmeras”

    Logo após eleita, o primeiro gesto da musa do fascismo, que fará 28 anos em novembro, foi gravar um vídeo onde ao responder perguntas de internautas afirma que as verbas públicas não resolvem o problema da educação e também acusando a categoria dos professores de serem “dinheiristas, que só pensam no próprio salário”. Todo militante de perfil fascista ama dar publicidade a suas ações de crueldade política, de modo que o horror causado na sociedade encubra a sua mediocridade intelectual e espiritual e o salve do destino à invisibilidade por falta de outros talentos ou méritos.

    As manifestações de repúdio e denúncias contra Campagnolo já começaram a aparecer no domingo (28/10) à noite e pelo movimento nas redes sociais devem originar uma avalanche de protestos. Além de emitir uma nota de repúdio, o Sindicato dos Trabalhadores na Educação de São José (município vizinho a Florianópolis) protocolou no início da tarde de segunda uma representação na Promotoria de Justiça da Capital, em que pede ‘medidas cabíveis’. Afirma a nota pública que a deputada eleita incita o descumprimento da lei do uso do celular e “promove a coação dos professores em sala de aula e o desrespeito aos educadores, comprometendo a didática pedagógica profissional”. A Secretaria de Estado da Educação também emitiu Nota Oficial a respeito e a Ordem dos Advogados do Brasil publicou em sua página uma contundente reprovação da conduta autoritária e anticonstitucional da deputada eleita.

    Em petição pública já com 121 mil assinaturas (atualizado às 19 horas de hoje (29), professores, estudantes e comunidade escolar pedem a impugnação do mandato de Ana Caroline, alegando que a liberdade de expressão dos professores em sala de aula foi explicitamente atacada pelo seu anúncio. O abaixo-assinado denuncia Campagnolo de incitar o ódio ao afirmar inverdades contra professores e provocar um ambiente escolar insalubre. “Nas atribuições em sala de aula, os professores, sobretudo os da área de Humanas, não fazem doutrinação ao ensinarem seus conteúdos, mas os apresentam e promovem debates com a total lisura, respeitando o livre pensamento”. O documento diz ainda:

    “Diante do ocorrido, pedimos que você professor, estudante, pais que prezam por uma Educação livre e democrática, compartilhem e nos ajudem a denunciar a tentativa de cerceamento que os professores já estão sofrendo por uma candidata que mesmo sem ter assumido está se valendo de autoritarismo para promover suas ideias de forma leviana e antidemocrática!”

    A petição lançada no site Avaaz pedindo a impugnação da deputada colheu mais de 413 mil assinaturas até a noite de sexta-feira, 2 de novembro.

     

    DE PERSEGUIDORA DA PRÓPRIA CLASSE À RÉ POR CALÚNIA E DIFAMAÇÃO

    “Candidata armamentista porém fofa”, assim ela se define no Facebook, posando com modelo de arma rosa, especialmente fabricada para mulheres feito ela

    Declarando-se “antifeminista” e “antipetista” radical, a jovem está envolvida em vários casos de perseguição à própria categoria. Graduada em História pela Universidade Comunitária Regional de Chapecó, ela também é professora de ensino médio em uma escola da rede pública estadual de Chapecó. No caso mais famoso, processou sua ex-orientadora de mestrado, a reconhecida historiadora Marlene de Fáveri, após infiltrar-se no Curso de Pós-Graduação em Teorias de Gênero da Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina como uma agente do Escola sem Partido. Marlene aprovou-a no curso pelo projeto de pesquisa intitulado Virgindade e famíliamudança de costumes e o papel da mulher percebido através da análise de discursos em inquéritos policiais da Comarca de Chapecó, que propunha um estudo sobre os casos de estupro na sua região durante a década de 80, simulando uma visão crítica sobre a violência da sociedade patriarcal.

    Assim que ingressou no curso, Caroline começou a armar ciladas contra sua orientadora, filmando-a em sala de aula e divulgando suas falas de forma fragmentada e descontextualizada no Youtube e redes sociais. Paralelamente, manifestava nas redes suas posturas dogmáticas e insultantes contra os movimentos feministas e sociais estudados na pós, valendo-se de pensadores homens de posição ideológica de ultra direita e machista, como Olavo Carvalho. Esses e outros comentários desabonadores do próprio curso que ele frequentava foram alertadas à orientadora pelas próprias colegas de classe.

    Quando isso ocorreu, a orientadora assinou a desistência de sua orientação, alegando incompatibilidade metodológica (o que é previsto no regulamento) e Caroline foi encaminhada para outro professor, identificado com ideologia de direita. Ela mudou seu tema de pesquisa para Segurança Pública, mas foi reprovada na banca pela má-qualidade teórica e escrita do trabalho Traços de Violência e por ter perdido todos os prazos regimentares. Depois de reprovada na qualificação, iniciou, em 2016, a perseguição judicial contra Marlene de Fáveri, alegando discriminação religiosa. Em setembro, o processo foi arquivado em primeira instância, na comarca de Chapecó e julgado improcedente por falta de provas. A inquisidora recorreu da decisão.

    De perseguidora, a militante do Escola Sem Partido tornou-se ré quando no mês seguinte o processo foi revertido contra ela por crime de honra, calúnia, difamação e injúria na 3ª Vara Criminal de Florianópolis, em ação que corre em segredo de Justiça. Apoiada por mais de 30 entidades da América Latina, a historiadora Marlene de Fáveri questiona o uso de seu nome e imagem como exemplo de “doutrinação ideológica” em eventos do projeto Escola sem Partido e em publicações nas redes sociais, incluindo vídeos no Youtube e nas divulgações da ação cível indenizatória por perseguição ideológica contra a professora. Somados os crimes ultrapassam quatro anos e não havendo conciliação, podem levar à condenação com pena privativa de liberdade.  . Segundo os autos, os crimes contra a honra da professora foram cometidos em palestras, publicações em redes sociais

    Leia matéria sobre o caso: https://docs.google.com/document/d/1AY00ZREJc3NdpZmDmUZTPQuYe8Yf3N55WWeO0lmmLuU/edit

     

    OAB/SC repudia manifestação que pede a denúncia de profissionais da educação e impede a exposição do livre pensamento

    29/10/2018

    A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Santa Catarina vem a público manifestar repúdio às manifestações que sugerem a denúncia da exposição de pensamentos político-sociais, e identificação de professores em Santa Catarina. Em que pese a polarização observada em todo o país no recente pleito eleitoral, a OAB/SC relembra a importância da preservação dos direitos constitucionais dos cidadãos e das garantias individuais e coletivas conquistadas a duras penas, em prol da construção e consolidação do regime democrático e republicano brasileiro.

    A OAB/SC tem acompanhado com muita preocupação a disseminação de estímulos à perseguição, violência e intolerâncias diante da livre manifestação, incentivo ao anonimato como meio de ofender o direito à discordância de pensamentos. A instituição entende ainda como um agravante, insuflar alunos a agirem como censores/delatores dos seus próprios professores, numa cultura lamentável.

    Por fim, a Ordem reitera a necessidade essencial do respeito à democracia, à Carta Constitucional e à legislação vigente, dentre elas a própria Lei Estadual n° 14.636/2008, que estabelece a proibição do uso de aparelhos celulares em sala de aula.

    Paulo Marcondes Brincas
    Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Santa Catarina

    José Sérgio da Silva Cristóvam
    Presidente da Comissão Especial para Estudo e Parecer na Defesa de Liberdade de Expressão e Autonomia Universitária da UFSC

     

    NOTA CONJUNTA DAS ENTIDADES REPRESENTATIVAS DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE SANTA CATARINA EM REPÚDIO ÀS MANIFESTAÇÕES DA CANDIDATA ELEITA ANA CAROLINA CAMPAGNOLO

    29/10/2018

    Os sindicatos representantes dos trabalhadores em educação das redes pública e privada municipal, estadual e federal do Estado de Santa Catarina denunciam com perplexidade a publicação da candidata eleita Ana Caroline Campagnolo (PSL), no último dia 28 de outubro, logo após a divulgação dos resultados do segundo turno das eleições 2018, na qual a mesma orienta estudantes a filmar os professores em sala de aula para denunciá-los por uma suposta “doutrinação”.

    Esse tipo de ameaça publicada em rede social é um ataque à liberdade de ensinar do professor (liberdade de cátedra), tipicamente aplicado em regimes de autoritarismo e censura. É mais grave ainda por partir justamente de alguém recém-eleita para um cargo público, e que deveria fiscalizar o cumprimento das leis.
    A sugestão de denúncia dos professores por estudantes caracteriza um assédio e uma perseguição em ambiente escolar, algo que remonta aos tempos da ditadura civil-militar brasileira.

    A educação formal brasileira tem seus critérios estabelecidos na Constituição Federal de 88 e na Lei 9.394/96 – a LDB, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, cuja base é a gestão democrática e o pluralismo de ideias.
    Os próprios sistemas de ensino, as escolas e os/as educadores/as têm autonomia para propor, em conjunto com toda a comunidade escolar, o currículo e demais atividades pedagógicas. Atitudes de provocação interferem de forma ilegal e inconstitucional no processo democrático de organização escolar, extrapolando a competência de fiscalização do trabalho escolar e do acompanhamento das atividades profissionais feitas pelas equipes pedagógicas.

    O histórico da candidata eleita é repleto de perseguições, provocações e desrespeitos ao magistério, além de constantes manifestações públicas de incitação à violência. Já declarou que o problema da educação é que “os professores só pensam em dinheiro e seu salário”. Em sua página nas redes sociais, trata os professores como inimigos que precisam ser “desmascarados”.

    Campagnolo também teve uma ação julgada improcedente contra uma professora da UDESC. Neste caso, mais de 30 entidades da América Latina se manifestaram a favor da professora Marlene e contra a candidata eleita.

    A lei da mordaça (“Escola Sem Partido”) em que a deputada baseia seus ataques já foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e considerada censura e afronta à liberdade de expressão de estudantes e professores pela Organização das Nações Unidas (ONU).

    Na prática, Ana Caroline comete justamente aquilo de que acusa os docentes: o estímulo à violência e à barbárie. Há pouco tempo, repercutiram na internet imagens da candidata eleita segurando um cassetete com a expressão “direitos humanos” ou empunhando armas.

    Os sindicatos representantes dos trabalhadores em educação repudiam mais essa ofensa e veem tal provocação como uma atitude antipedagógica prejudicial não apenas à educação – a qual deve ser sempre democrática, plural e livre de perseguições –, mas a toda a sociedade.

    Ao contrário do que Campagnolo afirma, as melhorias na educação dependem sim de mais investimentos, especialmente no precarizado setor público – seja para materiais pedagógicos, infraestrutura, valorização salarial, inclusão, concurso público, redução do número de alunos por sala e outros.

    Por fim, a candidata eleita deveria lembrar aos seus seguidores que as agressões e o desrespeito aos professores em sala de aula só vêm aumentando, e que tal posicionamento agrava a violência em um ambiente que deveria ser de civilidade, respeito, aprendizado e formação.

    Não podemos permitir que a escola se transforme em palco desse autoritarismo populista que ataca e ameaça os estudantes, os trabalhadores e as trabalhadoras da educação. É preciso sempre lutar em defesa da educação democrática, plural, laica e de qualidade!

    ASSINAM:
    CUT-SC – Central Única dos Trabalhadores Santa Catarina
    SINTE-SC – Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Santa Catarina
    (FETRAM-SC) – Federação dos Trabalhadores Municipais de Santa Catarina
    SINTRASEM – Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Florianópolis
    SINTRAM-SJ – Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de São José
    SITRAMPA – Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Palhoça
    SINPROESC – Sindicato dos Professores no Estado de Santa Catarina
    SINTRAFESC – Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público de SC

     

    NOTA DE REPÚDIO

    29/10/2018

    Nós do Sindicato dos trabalhadores em educação da regional São José denunciamos a prática da Deputada Ana Carolina Campagnolo eleita para assumir o cargo de deputada estadual em SC em 2019, que em sua última postagem na noite do dia 28/10/2018 induz os alunos a descumprirem a LEI Nº 14.363, DE 25 DE JANEIRO DE 2008, que Dispõe sobre a proibição do uso de telefone celular nas escolas estaduais do Estado de Santa Catarina.

    Tal postagem incita a coação dos professores em sala de aula, e promove o desrespeito aos educadores, comprometendo a didática pedagógica profissional.

    A mesma por ser uma futura legisladora que deve cumprir com suas obrigações constitucionais não pode promover o descumprimento das leis. Nesse sentindo solicitamos ao MP que tomem as providências cabíveis.

    Ingrid Assis
    Dirigente de Assuntos Políticos
    SINTE SJ

     

    COMUNICADO

    SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DE SANTA CATARINA

     

    LEI Nº 14.363, DE 25 DE JANEIRO DE 2008

    Procedência: Dep. Antonio Aguiar
    Natureza: PL./0402.4/2007
    DO: 18.289 de 25/01/08
    Fonte: ALESC/Coord. Documentação
    Dispõe sobre a proibição do uso de telefone celular nas escolas estaduais do Estado de Santa Catarina.
    O GOVERNADOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA,
    Faço saber a todos os habitantes deste Estado que a Assembléia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
    Art. 1º Fica proibido o uso de telefone celular nas salas de aula das escolas públicas e privadas no Estado de Santa Catarina.
    Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
    Florianópolis, 25 de janeiro de 2008
    LUIZ HENRIQUE DA SILVEIRA
    Governador do Estado

    CORRESPONDÊNCIAS TERRORISTAS

    Ainda na segunda-feira, o ex-vereador pelo PCdoB de Florianópolis, João Ghizoni, denunciou nas redes sociais o recebimento de uma correspondência apócrifa com remetente de Balneário Camboriú, que fica a meia hora de Itajaí, onde mora a deputada eleita. Dentro do envelope destinado ao diretório do PCdoB, em Florianópolis, havia duas folhas grampeadas, uma com montagens de fotos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na prisão, acompanhadas de ofensas ao candidato Fernando Haddad. A outra folha traz fotos da deputada eleita posando com armas de fogo e a mensagem ameaçadora em letras garrafais no alto da página: “PETISTAS: NÃO SE METAM COM BOLSONARO”. Outra mensagem abaixo das fotos finaliza o recado que lembra táticas terroristas de direita de última categoria: “DEPOIS NÃO DIGAM QUE EU NÃO AVISEI”.

    ATUALIZAÇÕES:

    MPSC DENUNCIA DEPUTADA POR “SERVIÇO ILEGAL DE CONTROLE POLÍTICO-IDEOLÓGICO DE PROFESSORES”

    Enquanto instiga alunos a delatarem professores que não sejam neutros e imparciais, deputada se sente autorizada a propagar sua própria ideologia do ódio. Só que não!

    Numa ação coletiva pública exemplar, o promotor do Ministério Público, Davi do Espírito Santo, entrou na justiça na terça-feira (30) para que a deputada estadual eleita por Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo (PSL) pague indenização de R$ 70 mil por criar um  “serviço ilegal de controle político-ideológico da atividade docente”. Por essa iniciativa, o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) pede a condenação por danos morais coletivos no valor de R$ 1,00 para cada um dos 71 mil 515 seguidores da deputada em uma rede social, tomando como critério de cálculo o potencial de compartilhamento de cada um. O dinheiro deve ser destinado ao Fundo para Infância e Adolescência (FIA), segundo a própria denúncia.

    Ao solicitar o deferimento da liminar (decisão temporária), o promotor pede que ela se abstenha de manter qualquer tipo de controle ideológico das atividades dos professores e alunos de escolas públicas e privadas do estado. A defesa da deputada afirmou que vai aguardar citação formal para se manifestar sobre o caso.  O Ministério Público Federal (MPF) também investiga o caso e instaurou um inquérito sobre o assunto na segunda (29). No pedido de liminar, o MPSC pede à Justiça ainda que a deputada eleita seja obrigada a retirar das redes sociais o post que instiga a perseguição ideológica de professores e ainda que a operadora de celular bloqueie o canal divulgado pela parlamentar para envio dos vídeos resultantes desse processo de “deduragem política” nas escolas públicas.

    A peça jurídica de admirável coragem e brilhantismo para esses tempos de adesão do judiciário à política da truculência, o promotor de justiça David do Espírito Santo foi firme em defesa da democracia constitucional e da liberdade de pensamento. Conforme ele, a deputada “implantou um abominável regime de delações informais, anônimas, objetivando impor um regime de medo”. Ao citar a Constituição Federal, ele destaca: “O direito à crítica pode e deve ser exercido na escola, sem cerceamentos de opiniões políticas ou filosóficas”, afirma o promotor. Nessa linha, a ação civil pública tem como objetivo, segundo o PMSC, “garantir o direito dos estudantes de escolas públicas e particulares do estado e dos municípios à educação segundo os princípios constitucionais da liberdade de aprender e de ensinar e do pluralismo das ideias”.

    O uso de canais informais e privados para o recebimento de denúncias de supostas irregularidades ou desvios de conduta cometidas por funcionários públicos não tem é reconhecido pela legislação nacional, conforme argumentou o promotor. “É ilegal o uso de qualquer outro canal de comunicação de denúncias que não esteja amparado em uma ato administrativo válido”.

    Embora atuasse como professora de Ensino Médio em Chapecó, Ana Caroline, mudou-se para Itajaí nas vésperas do lançamento de sua candidatura, por motivos ainda não esclarecidos. Na noite de domingo, ela fez uma publicação em redes sociais oferecendo um contato telefônico para alunos enviarem vídeos de professores em sala de aula que estejam fazendo “manifestações político-partidárias ou ideológicas”.

    Decisão liminar proíbe deputada de impor “regime de medo e terror nas salas de aula”

    postado em 01/11/2018, 17:37

     

    A ordem liminar do Juiz da Vara da Infância e da Juventude da Capital foi expedida nesta quinta-feira/Foto: Catarinas

    A deputada eleita para a Assembleia de Santa Catarina, Ana Caroline Campagnolo (PSL), terá que retirar do ar imediatamente a publicação que incentiva o controle das atividades dos professores e alunos das escolas públicas e privadas do sistema de ensino do Estado e dos municípios, postada em seu perfil do Facebook. Ela também está proibida de manter o “canal de denúncias” por ela criado sem qualquer amparo legal. Caso a liminar seja descumprida a multa diária é de mil reais.

    Entenda o caso.  

    A ordem liminar do Juiz da Vara da Infância e da Juventude da Capital foi expedida nesta quinta-feira (1/11) e atende ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina. Conforme o MP, a deputada violou princípios constitucionais como o da liberdade de expressão da atividade intelectual, científica e de comunicação, “e que deve ser exercida independentemente de censura ou licença (art. 5.º, IX, CF/88”), assim como da “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”, bem como do “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas”, previstos nos arts. 206, II e III da Constituição Federal.

    Ainda de acordo com a decisão, a atitude de Campagnolo infringe o direito dos estudantes, como crianças e adolescentes, à proteção contra toda forma de exploração (art. 227, caput, CF). “Sua conduta ao recomendar a realização de filmagens nas salas de aula representa, exploração política dos estudantes, pois está ligada à intenção de deles tirar proveito, político ideológico, com prejuízos indiscutíveis ao desenvolvimento regular das atividades escolares, quer pelo incentivo à desconfiança dos professores quer pela incitação dos alunos catarinenses ao descumprimento da Lei Estadual n. 14.363/2008, que proíbe o uso do telefone celular nas escolas (…)”.

    Como explica o juiz Giuliano Ziembowicz, na decisão liminar, a deputada eleita teria

    “implantado o que seria um regime de delações informais e anônimas, visando impor um regime de medo e terror nas salas de aula”. Além disso, estaria “desafiando e humilhando professores com suas postagens”.

    Efeito em todo país

    Segundo a decisão, as “mensagens produzem intranquilidade e animosidade nos ambientes escolares, com danos incomensuráveis à educação”. “As ações da requerida na rede social ‘Facebook’ têm gerado efeitos nos outros Estados da Federação, produzindo revolta generalizada dos educadores, que se veem intimidados com a referida atitude da requerida”.

    O juiz defendeu que à deputada eleita, assim como a todos as/os cidadãs/os brasileiras/os, é assegurado o direito de exercer a livre manifestação de pensamento através das redes sociais. “No entanto, a publicação como a que está em tela possui conteúdo que vai além do exercício da liberdade de pensamento e expressão de ideias e críticas… fere diretamente o direito dos alunos de usufruírem a liberdade de expressão da atividade intelectual, científica e de comunicação”.

    Em sua fundamentação, o Juiz faz menção ao posicionamento do ministro do STF Gilmar Mendes sobre a importância do debate nas universidades durante o julgamento, na quarta-feira (31), que suspendeu atos de fiscalização da Justiça Eleitoral em universidades públicas e privadas de diferentes estados.

    “Bem mencionou que as universidades são ambientes de profícuo desenvolvimento do pensamento crítico, inclusive político e de circulação de ideias, onde nascem lideranças políticas vindas dos movimentos estudantis, algo que já foi muito mais presente no Brasil e que merece ser reavivado.”

    Para o magistrado, essa realidade não deve ser diferente no ambiente da Educação Básica, pois, segundo ele, a discussão política deve fazer parte da realidade escolar, sempre com respeito às diversas opiniões, como deve ser. “Efetivando-se, assim, os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal e relativos ao tema, com importante incidência do pluralismo de ideias”, afirmou na decisão.

    Quanto ao “canal de denúncias”, o Juiz segue a sustentação do Promotor de Justiça Davi do Espírito Santo na Ação Civil Pública. Diz que os serviços de recebimento de denúncias acerca da atuação de servidor público só podem ser realizados no âmbito do Poder Público, nunca por particulares, sob pena de ferir a Constituição Federal e o princípio da impessoalidade.

    “O princípio da impessoalidade, próprio da Administração Pública e que vem de encontro a qualquer direcionamento ideológico, ao contrário do que aparentemente proporciona o ‘canal de denúncias’ criado e utilizado pela requerida, onde existe expressa referência às eventuais discordâncias ideológicas que são objeto das pretendidas denúncias”, sustenta a liminar.

    Sem base legal também é a implementação de serviço de controle político ideológico das atividades docentes, em prejuízo da liberdade de manifestação e de um universo de estudantes, composto fundamentalmente de crianças e adolescentes.

    A Ação Civil Pública com pedido de liminar foi ajuizada pelo MPSC na terça-feira (30) com o objetivo de garantir o direito dos estudantes de escolas públicas e particulares do Estado e dos municípios à educação segundo os princípios constitucionais da liberdade de aprender e de ensinar e do pluralismo de ideias.

  • Mulheres ativistas assumem ECO-UFRJ

    Mulheres ativistas assumem ECO-UFRJ

    Duas mulheres de fibra passam a dirigir uma das mais tradicionais e reconhecidas escolas de comunicação do país, a ECO – Escola de Comunicação – da UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro. Sétima no ranking mundial de universidades e oitava no do Ministério da Educação, a UFRJ forma na ECO jornalistas, publicitários, produtores editoriais e profissionais para rádio e televisão – e possui o primeiro Programa de Pós-graduação a ter a nota máxima para a Comunicação no Brasil. A importância de seus pesquisadores e pesquisas é indiscutível na área.

    Academicamente, “área” é uma abstração que equivale a “campo”, campos do conhecimento neste caso. São microcosmos sociais com autonomia relativa, leis e regras específicas, que influenciam e sofrem influências de um espaço social mais amplo. É nessa inferência social que, como diriam meus avós, a porca torce o rabo. Não há dúvidas da importância interna ao “campo” da ECO, mas e de sua inferência social em um Rio de Janeiro sob intervenção militar, vitrine, laboratório e experimentação de sórdido golpe político?

    Foto: Bernardo Guerreiro/ Divulgação.

    A escolha dessas duas mulheres por seus professores e reitoria, marca o claro posicionamento político da UFRJ: a academia tem que subir o morro, ir para a baixada, combater desigualdades, integrar o comum, promover o bem social, colocar a cultura e a comunicação como alicerce e agente da sociedade.

    As doutoras Ivana Bentes e Suzy dos Santos assumem a direção e vice-direção da ECO com o também claro desafio de levar a excelência acadêmica à ação social. Ivana diz: “Apostamos no comum e nas universidades públicas como territórios de resistência e invenção”. Ok, resistimos, e os ataques à disciplina sobre o Golpe de 2016 na Ciência Política da UnB evidenciam isso ao fragilizarem a autonomia universitária (campo). Mas como avançamos?

    A escolha destas duas mulheres pode começar a ser resposta. A amazonense  Ivana Bentes, autora, ensaísta, professora, ativista, já dirigiu a ECO de 2006 a 2013, quando “abriu as portas da universidade”, fez chegar quem jamais pensou em ali estar pelo Pontão de Cultura Digital. Aproximou comunidades, grupos, mobilizou, reconheceu e forneceu meios para potencializar ações midiáticas e políticas transformadoras. Assumiu a Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, de 2015 a 2016. É influência e influenciadora do movimento Fora do Eixo e da Mídia Ninja, onde possui coluna sobre comunicação e cultura.

    Foto painel “Os Donos da Mídia”, 3º Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação, UnB, junho 2017.

    A paranaense-quase-gaúcha Suzy dos Santos atua em Políticas de Comunicação. Conhece como poucas pessoas neste país a questão da convergência de mídias e da necessidade da democratização dos meios de comunicação. Autora e ensaísta, é conhecida na ECO por sua atuação com projetos sociais junto a comunidades.

    Estas mulheres são ativistas sociais, feministas, do norte e do sul, representam pelo que as compõem, por suas trajetórias, histórias de vida e valores a tão temida diversidade. Essas não beijaram mãos ou baixaram cabeças, não aceitaram os famosos pactos de  mediocridades. Essas falam suave e forte, se posicionam, trazem os valores do feminino em seu mais amplo sentido, são livres pensadoras iconoclastas.  São mulheres fortes com valores que nos representam, #merepresenta.

    Conservadores, tremei. Bolsominions, tremei. A diversidade aí está, e irá avançar. Mulheres no poder é transformar. E que sejam possíveis projetos e metodologias como a Universidade das Quebradas de outra mulher fodástica, a Heloísa Buarque de Holanda, que abriu a UFRJ para os produtores culturais da periferia, potencializando saberes e fazeres. Que surjam muitas Universidades das Quebradas para a Comunicação, as Mídias e o Jornalismo. Que a universidade rompa o academicismo e seja povo, quebrada, periferia.

    E em posse de ativista social, a entrada é livre. Elas convidam: dia 12 de março, às 17h na ECO-UFRJ. Av. Pasteur, 250 – Praia Vermelha, Rio de Janeiro, capital. #ColeLá

    Caru Schwingel | Jornalistas Livres | Mestre e Doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas