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  • NAZISMO ESCANCARA SUA AMEAÇA: Slogan de Bolsonaro é tradução literal do lema de Hitler

    NAZISMO ESCANCARA SUA AMEAÇA: Slogan de Bolsonaro é tradução literal do lema de Hitler

    O ódio foi perigosamente inoculado no coração de milhões de brasileiros na velocidade de uma epidemia viral devastadora. Até que ponto o resultado das pesquisas representa o prêmio das massas às atrocidades que horrorizaram o país nas últimas semanas ou são apenas trunfo da lógica dos algoritmos na bolha virtual do candidato Bolsonaro? Ódio e seu modo de propagação são agora inseparáveis. Assassinatos políticos, estupros, espancamentos, profanação da memória de Marielle Franco, marcação da suástica no corpo de pessoas e nas paredes de igrejas, escolas, prédios públicos: todos esses episódios se assentam na base da crueldade nazista. É o que a filósofa Hannah Arendt chamou de “banalização do mal”, justificada pelo ódio ao inimigo, pelo medo à falsa ameaça do comunismo e pela mentira. Bombada pelas Fake News, a campanha eleitoral de Bolsonaro potencializa a banalização com a viralização do mal na política.

    Dias após reunião de Haddad com a Confederação dos Bispos do Brasil, Igreja amanhece pichada com suástica

    Na manhã deste domingo (14/10) a Capela da Igreja Católica de São Pedro da Serra, em Friburgo (RJ), amanheceu pichada com símbolos da suástica, como provável resposta ao encontro mantido pelo candidato Fernando Haddad com a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil. O fato coroou de horror a onda de violência na semana em que bolsonaristas assassinaram o mestre baiano Moa do Katendê, agrediram e marcaram uma estudante gaúcha de 19 anos com a suástica na barriga porque vestia uma camiseta do Ele Não, entre outros diversos  exemplos da intolerância cruel importada do nazismo dos EUA da era Trump.

    A identificação do candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro (PSL) com o neonazismo fica a cada dia mais escancarada e assumida, desde o seu slogan de campanha. “Brasil acima de tudo” é o plágio criminoso de “Deutschland Über Alles”, que significa “Alemanha acima de tudo”. Submetidos à lavagem cerebral da propaganda nazista, os alemães bradavam com ardor patriótico, a mão direita sobre o peito ou a o braço erguido, o lema dessa política de terror que levou o mundo à Segunda Guerra Mundial e exterminou mais de seis milhões de judeus e de 11 milhões de outros povos. O processo de aliciamento das massas, alojado no que Hannah Arendt chamou de “banalização do mal” (e da mentira) parece ganhar proporções ilimitadas. Alastra-se na velocidade dos algoritmos manipulados pelo cientista da “bomba atômica” virtual, Steve Bannon, o gênio do marketing que está bombando Bolsonaro, considerado o homem mais perigoso do mundo.

    Levando para o tradutor do Google

    A segunda parte do bordão, “Deus acima de tudo”, também era inscrita na fivela dos soldados do Exército Nazista. O refrão integrou inclusive o Hino Nacional da Alemanha até ser suprimido no final da guerra. Católico de batismo, Hitler se esforçava para demonstrar fervor religioso. Em muitas imagens do período de guerra ele aparece apertando a mão de um padre durante um discurso, ou marchando à frente de um pelotão de padres que o seguia fazendo o sinal nazista.  Indícios de prática e incentivo a essa ideologia proscrita da civilização vão, contudo, bem além do slogan da campanha eleitoral bolsonarista. O mais espantoso é que essa contravenção política siga em frente sem ser ao menos interpelada por uma justiça cúmplice, quando não protagonista, de uma espécie de banalização do mal na política.

    Às vésperas do segundo turno, as referências explícitas ao nazismo do candidato que obteve 46% dos votos válidos no primeiro turno já escandalizam o mundo e provocam reações de indignação de outros países. A justiça brasileira, porém, finge não perceber o que está acontecendo, embora a exaltação ao nazismo seja crime inafiançável no Brasil, assim como em qualquer país signatário das Nações Unidas e da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O avanço inexplicável do candidato, aliás, se sustenta na doutrinação nazista intensificada há cerca de cinco anos com o ataque à política de direitos humanos, como se ela, e não a intolerância social, fosse responsável pela violência no país. A violação do mais importante legado da civilização ocidental encontra sua síntese perfeita na declaração de Bolsonaro de que “as minorias terão que se curvar às maiorias”. Essa máxima da filosofia do holocausto, proferida num comício realizado em Campina Grande, na Paraíba, levou ao delírio uma multidão aos gritos de “mito, mito, mito!”

    Sobretudo na Alemanha e Europa, que foram inteiramente destruídas pela demência de Hitler, a presença de um candidato com esse nível de ameaça à justiça, à paz social e aos direitos humanos causa neste momento pavor e perplexidade. Neste sábado (13/10), a Alemanha anunciou que caso o candidato seja eleito, vai romper unilateralmente as relações comerciais com o Brasil e a tendência é ser seguida por outros países democratas. Trata-se da potência com mais investimentos de multinacionais no Brasil, como a Volkswagen, Mercedes e Siemens. Segundo a presidente do Grupo Parlamentar Teuto-Brasileiro, Yasmin Fahimi, a possível eleição de Jair Bolsonaro pode impedir uma retomada da parceria estratégica fundamental para a já combalida economia brasileira. Declarou ela:

    “O Brasil está à beira de uma grande ruptura. Ficamos chocados com o fato de que, Jair Bolsonaro, uma pessoa que tornou socialmente aceitável um discurso de ódio tenha chegado à liderança. Do lado alemão, não vejo nenhuma base para uma parceria estratégica com um presidente como Bolsonaro”.

     

     

    Mesmo combatendo o nazismo com rigor, a Alemanha vive sob a ressurgência de grupos terroristas, como a Ku Klux Klan, os Skinheads, as milícias paralelas de extermínio, entre outros. Eles não cessam de reeditar a memória vexaminosa do holocausto que tornou o povo alemão cúmplice do Terceiro Reich no maior extermínio humano da história mundial. O problema é que o clamor e o aviso dessas forças internacionais não chegam à metade da população brasileira que teve suas consciências sequestradas pelo aliciamento político intensificado a partir de 2013. A esse nazismo mais rudimentar soma-se uma especie de nazismo às avessas, de ligações sionistas, como o orquestrado por Bolsonaro, que aparece em fotos rezando para a bandeira do Brasil, para a dos Estados Unidos e para a do Estado de Israel, ao qual declara seu apoio e devoção.

    Lado a lado nazismo/bolsonarismo

    Conivente com a onda de horror, a grande mídia brasileira, sobretudo os monopólios de televisão, finge não estar vendo a invasão fascista e já trata Bolsonaro como eleito. Seja por intimidação, adesão, omissão, conveniência ou interesses de negócios, a Record, chefiada pelo mercenário bispo Edir Macedo; Globo; Bandeirantes e SBT, todas sabotam os alertas que chegam do exterior ao povo brasileiro, tentando salvá-lo da bolha hipnótica desse neonazismo. E também dos artistas, intelectuais, ativistas poetas, músicos que enviam suas mensagens náufragas na tentativa de salvar o pais da tragédia anunciada.

    Arnaldo Antunes gravou o compungente “Isto não é um poema”. Numa sintaxe de guerra, em que a poesia se torna impossível, o videotexto reúne todos os episódios que mancham de sangue vermelho a bandeira nacional e a diversidade do povo brasileiro. Durante o feriadão, uma onda de mensagens vindas de todas as partes do mundo inundou as redes sociais, com a hashtag #BOL卐ONARO, que ganhou o topo mundial do Twitter, acentuando o símbolo da suástica no nome do candidato extremista.

    Em sua passagem pelo Rio, Roger Waters enfrentou a reação bolsonarista ao projetar um Ele Não no palco. E em artigo publicado pela Folha de S. Paulo de domingo, Caetano Veloso afirmou que é dever de todo brasileiro fazer algo para evitar a eleição de Bolsonaro, em repúdio a um artigo de Olavo de Carvalho exortando o candidato a destruir totalmente seus opositores enquanto grupos, organizações e até indivíduos, imediatamente após sua posse. “É evidente que todo cidadão brasileiro que mereça esse nome deve agir contra a possibilidade de eleição de Bolsonaro”, afirmou o cantor baiano.

    Na negligência do dever patriótico das grandes redes de ajudar a afastar essas práticas criminosas da política, a mídia independente luta sem trégua e descanso contra o perigo, enfrentando sozinha o império robótico das Fake News na campanha do militar reformado. Suas páginas são invadidas dia e noite por um exército de autômatos, muitos deles com perfis também falsos, que não dialogam, não interagem, não argumentam. Apenas intimidam, xingam e repetem o bordão de sempre no qual todos que não concordam com o #B17 são tachados de “comunistas”, “maconheiros”, “vagabundos”, “corruptos”, “ladrões”, “petralhas” ou “encostados na Lei Rouanet”.

    Por último, a histeria e a maldade fascistas chegou ao cúmulo de acusar de promover prática de pedofilia quem apoia o candidato Fernando Haddad, advogado e professor universitário, mestre em Economia, doutor em Filosofia, ex-ministro da Educação, que se opõe ao armamento da população e ao ensino do uso de armas a crianças. Calúnias desse nível, baseadas em montagens grosseiras, continuam circulando nas redes sociais.  Baseada na disseminação da mentira, a tecnologia de Chicago que elegeu Trump traz para as eleições brasileiras uma prática das mais sujas, fora do jogo da democracia. Ela potencializa e profissionaliza o emprego de baixarias como as que vimos na campanha contra Dilma Rousseff nas eleições de 2014.

    Desde a vida militar ativa, as “ideias” do militar. punido nos anos 80 com a reserva pelo Comando Maior do Exército por tentar explodir bombas nos quartéis para protestar contra os baixos salários, sempre dividiram o seu público entre aduladores e pessoas horrorizadas com o seu comportamento. No início dos anos 90, já no governo Sarney, foi proibido de entrar nos quartéis do Rio de Janeiro em decisão exemplar única na história do Exército Brasileiro, que nunca mais repetiu essa medida com um parlamentar. Acusado de “canalha, covarde e contrabandista” por um oficial e denunciado por ameaças de morte contra uma jornalista, agressões à ex-mulher e a colegas de farda, o capitão Jair Bolsonaro foi banido durante um ano dos quartéis. A justificativa  alegava desrespeito à hierarquia das Forças Armadas, intriga, com presença invasiva nos corredores militares para promover campanha política e angariar votos para sua candidatura a deputado federal, conforme reportagem publicada no DCM e nos Jornalistas Livres por Vinícius Segalla, que teve acesso a um dossiê do Exército-Maior das Forças Armadas.

    Analisando-se a trajetória de rebeldia e de submissão do capitão ao poderio militar, não há qualquer contradição: fica claro que ele infernizou a vida do Exército sob a égide da Nova República, após a democratização, justamente opondo-se aos que se recolheram para as casernas e decidiram deixar a política para as instituições civis. Em contrapartida, sempre enalteceu os ícones das Forças Armadas que atuaram na ditadura e continuam chamando o golpe de Revolução de 64. Desde sempre Bolsonaro se identificou com a parte mais torpe e inescrupulosa da corporação. Daí vem o culto à imagem dos torturadores, em especial ao seu ídolo general Brilhante Ustra, “o terror da presidente Dilma Rousseff”, como declarou ao dizer sim ao impeachment e dedicá-lo à memória do criminoso que introduzia ratos vivos na vagina de suas vítimas durante as sessões de tortura.

    “Uma mentira repetida muitas vezes torna-se uma verdade”, na famosa máxima de Joseph Goebbels, o ministro da propaganda de Hitler, que inspira Steve Bannon, guru da campanha de Bolsonaro e Mourão nas redes sociais. Repetindo calúnias sobre judeus e comunistas, Goebbels inflava o sentimento de superioridade dos alemães em jornais e panfletos. Mas foi usando o rádio e o cinema (dois meios insurgentes que exerciam grande fascínio, como as redes sociais hoje), que o líder mais cruel da humanidade aliciou grandes massas como cúmplices do seu projeto de morte. Valendo-se sempre da mentira contra os seus inimigos, que chamava de fracos e de ratos, ergueu seu mundo insano mentindo também sobre as qualidades dos que considerava fortes e belos, embora ele mesmo estivesse longe de corresponder ao padrão de beleza que vangloriava. Esse sentimento parece estar bem representado nas palavras do general Mourão, o vice do B., ao encerrar uma entrevista a jornalistas no aeroporto de Brasília para atender o neto e o filho que o aguardavam. Apontando para o neto, bem mais claro que ele e o filho, afirmou, como se desculpando pela própria descendência negra: “Meu neto é um cara bonito, viu ali, é o branqueamento da raça. Valendo-se de propaganda racista e de mensagens subliminares que estimulam o ódio e a xenofobia, incutiu a crença da superioridade ariana no inconsciente alemão com a ajuda da invenção de uma linguagem cinematográfica. No cinema nazista, os militares aparecem sempre filmados de baixo para cima, para ressaltar a supremacia bélica, enquanto os judeus são mergulhados no efeito de inferioridade pela câmera alta.

    Adolf Hitler apresentava, porém, uma vantagem sobre Bolsonaro: hábil orador, tinha larga cultura clássica e conhecimento de economia e geopolítica que usou para legitimar seus planos de purificação da raça ariana, com o extermínio de militantes de esquerda, judeus, imigrantes árabes, negros, homossexuais. Muitos estudos foram realizados sobre as relações entre o seu desvario pelo poder e seu caráter ressentido e agressivo com mulheres. Temperamental, explosivo e inculto, Bolsonaro não demonstra cultura mínima para a posição que pretende ocupar ou capacidade de desenvolver uma conversa inteligente. É acusado de fugir dos debates por medo de suas próprias declarações. Afirma coisas como “um afrodescendente não serve nem para procriar”, “claro que as mulheres deveriam ganhar menos porque engravidam”, “preferia ter um filho morto a ter um filho gay”, “ou os trabalhadores precisam escolher entre ter direitos ou emprego” e “não te estupro porque você não merece”, figuram na sua longa coleção de bestialidades.  E, no entanto a vítima do oportuno atentado a faca que o feriu gravemente e o premiou com intermináveis atestados médicos é aclamada por uma multidão de seguidores de cujo fanatismo nem a história, nem a estupidez do próprio líder é capaz de arrancar.

    Mas se nazismo é crime, como pode um candidato que faz apologia à tortura, a símbolos e ideias nazifascistas estar solto e ainda ser candidato a presidente da República?

    O que falta acontecer para acordarem os que deveriam zelar para manter o país livre dessa degradação ética, moral, política e social? Como não reagem as instâncias jurídicas e as instituições democráticas brasileiras, o STF, a OAB, o Senado, a Câmara Federal, os partidos, o próprio PT, a própria Frente Unificada Haddad Manuela Presidente para impedir que a aberração política se instale no Palácio do Planalto do maior país da América Latina? A ascensão pelo voto de um presidente que prega a violência nazista num país com as dimensões e importância do Brasil seria uma tragédia de proporções não só continentais, para a América Latina, mas para toda a democracia ocidental, como apontou o jornalista Pepe Escobar, em artigo publicado no sábado pelos Jornalistas Livres. Equivaleria ao lançamento de uma bomba atômica no século XXI e chega a representar a ameaça de uma III Guerra Mundial, segundo palavras do Papa Francisco. Mas parece que muito tarde acordamos de um sono comatoso, com a ilusão de que esse passado de horrores estava encerrado no século XX.

    Enquanto isso, o nazifascismo ressurge assustador na promessa da sinistra dinastia Bolsonaro, com sua fábrica de ogros fazendo já centenas de vítimas em via pública, onde a ordem de extermínio já está dada. Enquanto o bolsonarismo está livre para inocular no seio do povo brasileiro o vírus da sua ideologia de morte, negros, gays, trans, mulheres, estudantes, nordestinos, indígenas são abatidos nas ruas feito animais antes mesmo do segundo turno. O símbolo da suástica sobe as paredes das universidades brasileiras, igrejas e muros de escolas. Também é marcado a ferro e fogo, como gado, na barriga da estudante de 19 anos, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

    Nazismo em Blumenau: comemoração com o símbolo da suástica na bandeira vermelha

    Acrescentada dos ingredientes do neoliberalismo, a droga nazista parte  do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, onde refaz a volta cruel da história, acordando a herança ancestral do hitlerismo. O Partido Nazista fez mais adeptos no Sul do que em qualquer outra região do Brasil, como mostra o documentário Anauê! o integralismo e o nazismo na região de Blumenau, do cineasta Zeca Pires. Santa Catarina chegou a ter 45 mil simpatizantes, quase um terço do total no Brasil. Ainda no ano passado, grupos extremistas foram presos e investigados por comemorar o aniversário do Führer, um advogado negro recebeu ameaça de morte e a cidade acordou pichada de símbolos e cartazes com símbolos da suástica e cruz de celta ou cruz de ferro.

    Se antes o vírus nazista ficava restrito à Região Sul, a campanha Bolsonaro inoculou-o no inconsciente de grupos espalhados por todo o Brasil, de modo que hoje o ódio racista não poupa classe, nem idade, nem cor. Negros são esfaqueados por negros, nordestinos humilhados por nordestinos, mulheres esmagam mulheres. Está no cerne do nazismo semear a discórdia entre os povos, as etnias, os gêneros para manter o poder do dominador. E um povo antes considerado no mundo inteiro como relativamente pacífico e amoroso aplaude essas atrocidades aos gritos de “Mito, mito, mito!”. Como disse a filósofa da UFSC. Maria de Lourdes Borges, PhD em Hegel e Kant, no dia seguinte ao primeiro turno das eleições, dormimos no Brasil e acordamos com a sensação de estarna Alemanha de 1945.

     

    FÓRMULA EXPLOSIVA DE BOLSONARO CONJUGA

    NAZIFASCISMO COM NEOLIBERALISMO

    Campanha política eleitoral do PT mostra vínculos de Bolsonaro com nazismo

    Homem de ideias medíocres e insanas, odioso e sedento de poder, Hitler foi, durante longo tempo, ignorado e subestimado em suas pretensões de dominar o mundo até ascender ao comando do Terceiro Reich com amplo apoio popular. De modo muito semelhante, Bolsonaro também foi negligenciado nos quase 30 anos de vida parlamentar em que esteve abrigado em várias siglas de representatividade insignificante. Nesse período, deixou como saldo dois únicos projetos aprovados de agrados à caserna, sempre em benefício dos privilégios militares, que lhe garantiram o apoio inegável dos aparatos de repressão. Ao contrário de Hitler, que usou seu lastro cultural e sua erudição clássica em favor de suas ambições, Bolsonaro representa o culto à ignorância para um povo condicionado a se informar e se formar pelas redes sociais do MBL, Vem pra Rua e da Candidatura “O Brasil acima de tudo”, onde imperam a vulgaridade e o Fake News. Declaradamente dispensa a leitura de livros, despreza a formação superior e combate as instituições universitárias, que ele diz propagadoras da “ideologia de gênero e do comunismo”, sobretudo as áreas humanas, em favor da formação tecnicista. O marketing do novo embala os piores invólucros dos velhos e perigosos militares de 64.

    Em meio a propostas parlamentares marcadas pelo ridículo e irrelevância, votou contra todos os direitos trabalhistas, inclusive das empregadas domésticas, feito do qual ele se orgulhou várias vezes publicamente, para tornar pública a aliança com o empresariado e com as elites brasileiras. Sua principal obra foi a disseminação do vírus de uma política baseada no ódio às minorias, no combate aos direitos trabalhistas, na desmoralização das políticas públicas na mentalidade mediana do povo brasileiro. Tudo isso, como na experiência nazista, encoberto por um falso moralismo de quem legitima os atos mais execrados pela moral cristã, como estupro, feminicídio, milícias de extermínio, às quais ele declarou apoio em entrevistas, adultério, tortura, prostituição, zoofilia, enfim, violência racial, ambiental, política e de gênero.

    À diferença do nazismo alemão e do fascismo italiano, esse projeto é untado por um falso patriotismo que se desintegra ao ser contraposto à fúria bolsonarista pela privatização e entrega para as grandes corporações internacionais das riquezas nacionais: petróleo, energia, biotecnologia, meio ambiente, territórios indígenas, minério, Amazônia. Sem as benesses do nacionalismo europeu, o projeto privatizador de todas as estatais brasileiras, mesmo em áreas estratégicas para a soberania nacional, tende, ao contrário, a criar um Estado fraco, ausente e entregue aos ditames dos impérios estrangeiros.

    LIBERDADE É UM REVÓLVER NA MÃO E O ÓDIO NA CABEÇA

    Mesmo a proposta de garantir a segurança dos cidadãos se mostra uma farsa em favor do comércio da indústria armamentista mundial, há muito tempo empenhado em, através da influência na política, fazer do país um grande mercado consumidor de armas. E como o país pode aumentar o consumo de armas? Obviamente não com políticas de segurança, mas com ideologias que disseminem o ódio e a violência, capazes de justificar a compra de grandes lotes de armas pelo Estado. Todos os indícios desse plano perverso estão dados: desde o primeiro turno, grandes meios de comunicação (El País, Exame, Folha de S. Paulo, Estadão, Valor Econômico, Veja, Uol etc) anunciam o crescimento espantoso da Taurus, indústria gaúcha multinacionalizada, cujas ações nas Bolsas de Valores dispararam na frente de todas as outras com o efeito Bolsonaro durante a campanha eleitoral. O próprio candidato deixa essa mensagem bem explícita ao gravar um vídeo dentro da Taurus em que declara seu amor pelas armas como militar, acaricia o último modelo de um fuzil e promete promover a compra de um reluzente revólver para cada cidadão brasileiro. “Não que eu seja garoto-propaganda da Taurus, mas…”, inicia ele, na gravação de um vídeo tosco do ponto de vista técnico, mas eficiente do ponto de vista semiótico.

    Por isso as incontáveis cenas em que Bolsonaro aparece fazendo o gesto da metralhadora ou ensinando crianças a atirar, como diz ter feito com seus filhos desde os cinco anos, não devem ser vistas como bizarrice de um político mentecapto pela esquerda ou brincadeira sem maiores consequências pelos seus seguidores. Outra semelhança com o hitlerismo, esses gestos são ordens subliminares de armamento clandestino das milícias neonazistas plenamente obedecidas por homens e mulheres que já saíram às ruas para votar ou para matar. Elas são propagandas muito conscientes do candidato e de seus filhos (irmãos metralha?) para a indústria armamentista que patrocina sua campanha.  Cada pose fotográfica com uma arma imaginária que Bolsonaro dispara, seja sorridente ou bradando “vamos metralhar a petralhada do Acre” ou “vamos metralhar a favela da Rocinha como solução final” é um apelo de compra que será reproduzido aos milhões pelos seus seguidores.

    A promessa do “pai” fascista de garantir a cada cidadão brasileiro obediente a posse de uma arma esconde outra evidência: a de que a segurança pública será privatizada nas mãos de cada indivíduo. Com o revólver ele recebe a tarefa de cuidar de sua própria defesa, na base do olho por olho, dente por dente. “Não é apenas a sua segurança, é a sua liberdade. Povo armado é povo livre”, diz o líder no mesmo comercial.

    Campanha eleitoral do PT vai finalmente mostrar relações entre Bolsonaro e nazismo?

    Além do culto às armas, o modus operandi comum ao totalitarismo italiano mais evidente é o uso da bandeira do combate à corrupção como porta de entrada para a violência política. Em todas as experiências contemporâneas, o fascismo se fortalece colando a corrupção na mentalidade das massas como prática da esquerda, ainda que a direita se mostre infinitas vezes mais recorrente nessa prática. No caso brasileiro, o número de parlamentares de direita indiciados ou citados pela Lava-Jato ultrapassa de longe a esquerda, mesmo no caso do PT, que esteve 13 anos no poder, e perde em comparação proporcional ao PSL, um partido muitas vezes menor. Quanto mais à esquerda, menor o índice de corrupção. Mas ainda que a impunidade de inúmeros políticos de direita no Brasil, como Michel Temer, João Rodrigues, Roberto Jefferson (que acaba de anunciar apoio a Bolsonaro), Beto Richa, Aécio Neves ou Zezé Perrela, escancare a hipocrisia dessa bandeira levantada pelos próprios corruptos, a extrema direita se alimenta da ignorância para estalar o seu chicote calunioso no lombo alheio.

    Tratado de forma despolitizada e descontextualizada pelos meios de comunicação, o facho da corrupção tem um efeito de obliteração do raciocínio. Ele é capaz de cegar um povo sem formação política, para o qual nada tem um sentido mais simples e concreto do que culpar um político jogar pedras num político ladrão, não interessa se ele é alvo de lawfare, um processo assimilado sem crítica pela maior parte do povo brasileiro, cujas referências de verdade são a justiça, a mídia, a religião e a polícia. Grande parte da população só consegue se inserir na discussão política pelo viés da corrupção. Apresentada como causa estruturante das injustiças sociais e não com efeito da estrutura econômica,  essa bandeira esconde o fato de que a corrupção é a base da desigualdade social promovida pelo capitalismo. Num sistema em que o Estado só existe para manter a exploração das classes trabalhadoras, pois o poder de fato é exercido pelo mercado financeiro, o parlamento se coloca entre o Estado e a sociedade para ser corrompido pelo poder econômico. Desde o seu planejamento financeiro, as grandes empresas destinam em seus orçamentos gordas porcentagens para o pagamento de propinas em troca da aprovação de leis que reforçam os privilégios das elites, alargam os lucros dos bancos, sabotam os direitos trabalhistas, envenenam a alimentação com produtos cancerígenos do agronegócio, dizimam aldeias indígenas, entregam o petróleo, a Amazônia, a água, a energia elétrica…

    Na contramão dessa política de privilégios, as esquerdas têm um papel decisivo para impedir que o jogo de forças perverso seja completamente vitorioso e leve a classe trabalhadora à completa ruína. Por isso elas precisam ser combatidos ferozmente pelo nazifascismo em nome da ameaça do comunismo e do socialismo, hoje ironicamente os defensores mais intransigentes do respeito à democracia, enquanto o neoliberalismo não se cansa de violá-la. A esquerda precisa ser eliminada porque tem um papel importantíssimo no equilíbrio de forças, reconhecido pelas grandes potências da social democracia que convivem em relativa harmonia com os partidos comunistas. Só ela, com sua radicalidade de princípios em favor dos direitos sociais, é capaz de frear a sede de lucro e de destruição de projetos emergentes que conjugam a fórmula explosiva neoliberalismo mais nazifascismo.

    BANALIZAÇÃO DO MAL: candidatos apresentam prova da profanação da memória de Marielle

    “Chega de comunismo, acabou PCdoB”, brada em comício em Petrópolis, o candidato do PSC ao governo do estado do Rio, o ex-juiz Wilson Witzel. Ao seu lado, a dupla de candidatos a deputado estadual Rodrigo Amorim, e o candidato a deputado federal Daniel Silveira, ambos do PSL-RJ, mostram com o punho erguido e sorriso de vingança a placa em homenagem a Marielle Franco partida ao meio. Como os próprios anunciam orgulhosos, eles a arrancaram de um poste na esquina da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, onde ela cumpria seu primeiro mandato pelo PSOL quando foi assassinada. Dão assim prova material ao crime do qual se vangloriaram dias antes em vídeos, fotos e ao vivos nas redes sociais. Exibir o símbolo da profanação do túmulo de uma líder abatida a tiros e sem justiçamento é uma forma de legitimar o seu assassinato, matando-a e violando-a novamente. É como se pudessem impedir a propagação da sua imagem negra, capaz de alimentar multidões insurgentes contra o racismo e a exclusão social e de gerar sementes de Marielles, como as 12 parlamentares negras eleitas no país. Aí recuamos do mago racista do marketing de Donald Trump para os rituais de magia negra da Ku Klux Klan e para o fogo da Idade Média.

    O fanatismo viral à la Steve Bannon não dá chances de salvar o coliseu de si próprio: os violadores de túmulo não só foram ovacionados por uma multidão ensandecida, como acabaram eleitos: Amorim como o deputado estadual mais votado do Rio, com 140 mil votos e Silveira, com 31.789 votos, a federal. Até que ponto esse resultado representa o prêmio das massas a um carrasco nazista ou mero trunfo da lógica dos algoritmos da cambridge analytica na bolha virtual do candidato Bolsonaro é uma incógnita. A repercussão pública dessa maldade está assentada na base da crueldade nazista, que a filósofa Hannah Arendt chamou de “banalização do mal” movida pelo ódio ao inimigo, pelo medo e pela mentira. Mas aqui a banalização do mal bombada pela fábrica de Fake News é potencalizada pela viralização do mal na política.

    Quando a esquerda é aniquilada pela calúnia ou repressão a toda forma de ativismo, essa fórmula resulta em líderes truculentos, como Rodrigo Duterte, nas Filipinas; Salviani, na Itália; Fujimori, que ainda ameaça o Peru, ou Donald Trump, nos Estados Unidos, entre um conjunto de ditadores insurgentes cuja face mais vulgar promete ser Bolsonaro. Um líder “intransponível para a realidade europeia”, para se referir às recentes declarações da principal líder da extrema direita francesa, Marie Le Pen, segundo quem “Bolsonaro diz coisas impalatáveis para o padrão europeu”, trocando em miúdos.  Com sua violência grotesca e indisfarçada, que os seguidores chamam de “autenticidade”, ele expõe ao mundo a essência mais cruel e verdadeira da nova sereia nazifacista que ameaça a sobrevivência do Brasil multicolorido e da própria democracia ocidental.

     

    BOLSONARISTAS ESPALHAM TERROR E CAOS PELO PAÍS

    Capoeirista assassinado ainda tentou argumentar calmamente, mas foi brutalmente esfaqueado

    Inflamados pelo discurso de ódio do deputado, seus filhos e outros seguidores, militantes extremistas espalham atacam, matam, estupram, espancam mulheres, negros, gays, trans, estudantes e opositores à candidatura nazista pelo Brasil afora.

    A lista do terrorismo é uma amostra do cenário de guerra que espera o país caso Bolsonaro seja eleito. Veja alguns casos publicamente denunciados e notificados.

    🚨 CAPOEIRISTA é morto com 12 facadas por militante de Bolsonaro: https://bit.ly/2y4nMTm
    O mestre capoeirista Moa do Katendê foi morto com 12 facadas nas costas, em Salvador (BA), depois de falar que tinha votado em Fernando Haddad.

    🚨 MULHER é torturada por militantes de Bolsonaro: https://bit.ly/2PtgqzE
    As torturas aconteceram dentro de um carro, e as ofensas, além de homofóbicas, também eram racistas.

    🚨 MULHER é atacada com barra de ferro por militantes de Bolsonaro: https://bit.ly/2RGFQv2
    Vocalista foi agredida em passarela de Nova Iguaçu, após responder a ambulantes que a ameaçaram.

    🚨 CACHORRO é morto em carreata por militantes de Bolsonaro: https://bit.ly/2QuTxfe
    O cachorro, de nome Marley, que latiu para uma carreata em apoio a Bolsonaro, que passava pelas ruas de Muniz Ferreira (BA), morreu depois de tomar três tiros disparados por um integrante da carreata que tinha se irritado com os latidos.

    🚨 MULHER foi agredida e marcada com suástica por militantes de Bolsonaro: https://bit.ly/2A2UdDh
    Ela foi agredida por usar a camiseta #elenão.

    🚨 JOVEM é agredida por apoiadores de Bolsonaro: https://bit.ly/2Oq81Aj
    A mulher foi sofreu violência física e verbal enquanto voltava para casa.

    🚨 PROFESSOR é ameaçado de morte por militante de Bolsonaro: https://glo.bo/2INUOvi
    O pai de um aluno se sentiu atacado politicamente com a explicação do professor sobre os usos da Lei Rouanet.

    🚨 HOMEM é morto em Curitiba por militante de Bolsonaro: https://bit.ly/2y2Thxd
    O assassino, que tinha conhecido o rapaz em um aplicativo de paquera, teria gritado “viva Bolsonaro” depois do crime.

    🚨 JORNALISTA é agredida e ameaçada de estupro por militantes de Bolsonaro: https://glo.bo/2ykZUu4
    Uma jornalista, em Recife (PE), foi agredida por dois homens ao sair do local de votação. Um deles vestia uma camiseta do Bolsonaro.

    🚨 MULHER é brutalmente agredida por militantes de Bolsonaro: https://bit.ly/2ydbdFj
    As imagens são assustadoras.

    🚨 SERVIDORA PÚBLICA foi espancada em Pernambuco após criticar Bolsonaro: http://bit.ly/2ye1SNI
    Ela foi agredida por uma mulher que estava numa mesa de apoiadores do capitão reformado.

    🚨 MILITANTES de Bolsonaro postam fotos com armas nas urnas: https://bit.ly/2yqQBIY
    Um eleitor, usando o cano de uma pistola, digitou e confirmou o número de seu candidato (17) na urna eletrônica. Muito orgulhoso, postou o vídeo nas redes sociais.

    🚨 MÃE É AGREDIDA, COM A FILHA, por militantes de Bolsonaro: https://bit.ly/2pGhlkQ
    Homens, vestidos com roupas de alusão a Bolsonaro, gritaram no rosto da mulher e de sua filha.

    🚨 JOVEM É AGREDIDO por militantes de Bolsonaro simplesmente por estar vestindo vermelho: https://bit.ly/2C1ZEDM
    O rapaz foi agredido por um grupo de homens por ser de esquerda.

    🚨 JOVEM é agredida por militante de Bolsonaro: https://bit.ly/2IHKViu
    Vidro de seu carro foi quebrado e manchas de sangue foram registradas durante carreata no Paraná.

    🚨 FUNCIONÁRIA é ameaçada com arma por militantes de Bolsonaro: https://glo.bo/2MAXod0
    A mulher relatou ter sido ameaçada com armas de fogo.

    🚨 CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO acorda com suásticas e símbolos nazistas em ato de vandalismo: https://bit.ly/2QNmkvD
    Os registros foram feitos por uma das vereadoras da cidade.

    🚨 PROFESSOR DA USP faz saudação nazista enquanto defendia Bolsonaro: https://bit.ly/2RMPtIv
    A saudação foi feita numa discussão pública no Facebook.

    🚨 HOMEM com boné vermelho é agredido no Paraná por militantes do Bolsonaro: https://bit.ly/2OjDHHG
    Segundo relatos, agressores eram parte de uma torcida organizada e proferiram gritos de apoio ao deputado Jair Bolsonaro.

    🚨 LIVROS sobre ditadura foram rasgados na biblioteca da Universidade de Brasília: https://glo.bo/2Qv14KT
    Até obras de referência sobre artistas do Renascimento estão sendo alvo de vandalismo.

    🚨 PESSOAS são ameaçadas por torcida organizada com gritos homofóbicos: https://bit.ly/2OPiq88
    As falas teriam sido “Ô bicharada, toma cuidado/ O Bolsonaro vai matar viado”.

    🚨 HOMEM é agredido por motorista de Uber militante de Bolsonaro: https://bit.ly/2ORmBQT
    A agressão começou quando ele respondeu à pergunta do motorista sobre seu posicionamento político.

    🚨 MULHER é agredida por integrante de manifestação pró-Bolsonaro: https://bit.ly/2PtgqzE
    As rasteiras vieram porque ela não aceitou os adesivos da campanha.

    🚨 EDIFÍCIO foi vandalizado por simpatizantes de Bolsonaro: https://bit.ly/2PtgqzE
    Os agressores se irritaram com a bandeira na janela de um apartamento.

    🚨 PROFESSORA sofre ofensas raciais de alunos: https://glo.bo/2CaQepI
    Os alunos também desenharam uma suástica.

    🚨 SUÁSTICAS e outras propagandas neonazistas são registradas em vários bairros de São Paulo: https://bit.ly/2CCOciX

  • Geisel e Figueiredo operaram pessoalmente na execução de inimigos do regime

    Geisel e Figueiredo operaram pessoalmente na execução de inimigos do regime

    O texto a seguir foi publicado nas redes sociais por Matias Spektor, professor da Fundação Getúlio Vargas:

    Este é o documento secreto mais perturbador que já li em vinte anos de pesquisa.

    É um relato da CIA sobre reunião de março de 1974 entre o General Ernesto Geisel, presidente da República recém-empossado, e três assessores: o general que estava deixando o comando do Centro de Informações do Exército (CIE), o general que viria a sucedê-lo no comando e o General João Figueiredo, indicado por Geisel para o Serviço Nacional de Inteligência (SNI).

    O grupo informa a Geisel da execução sumária de 104 pessoas no CIE durante o governo Médici, e pede autorização para continuar a política de assassinatos no novo governo. Geisel explicita sua relutância e pede tempo para pensar. No dia seguinte, Geisel dá luz verde a Figueiredo para seguir com a política, mas impõe duas condições. Primeiro, “apenas subversivos perigosos” deveriam ser executados. Segundo, o CIE não mataria a esmo: o Palácio do Planalto, na figura de Figueiredo, teria de aprovar cada decisão, caso a caso.

    De tudo o que já vi, é a evidência mais direta do envolvimento da cúpula do regime (Médici, Geisel e Figueiredo) com a política de assassinatos. Colegas que sabem mais do que eu sobre o tema, é isso? E a pergunta que fica: quem era o informante da CIA?

    O relato da CIA foi endereçado a Henry Kissinger, então secretário de Estado. Kissinger montou uma política intensa de aproximação diplomática com Geisel.

    A transcrição online do documento está no link abaixo, mas o original está depositado em Central Intelligence Agency, Office of the Director of Central Intelligence, Job 80M01048A: Subject Files, Box 1, Folder 29: B–10: Brazil. Secret; [handling restriction not declassified].

    Você pode lê-lo aqui em inglês.

    Costuma-se dizer que Geisel foi uma espécie de “ditador esclarecido”, que conteve a “tigrada linha dura”, começou a “abertura política” e amenizou os rigores do regime militar brasileiro. Mas a descoberta do documento de 1974 desmonta essa  narrativa sobre Geisel, construída principalmente pelo jornalista Elio Gaspari, ao longo de seus livros “A Ditadura Envergonhada”, “A Ditadura Escancarada”, “A Ditadura Derrotada”, “A Ditadura Encurralada”, “A Ditadura Acabada”…

    A descoberta do documento de 1974 prova que Geisel não conteve a tigrada. Ele mesmo era o tigre, que comandou a execução sumária dos principais inimigos do regime.

     

    Segue a tradução do memorando da CIA a Kisinger sobre a execução sumária de presos no governo Geisel:

    “Relações Exteriores dos Estados Unidos, 1969–1976, Volume E – 11, Parte 2, Documentos sobre a América do Sul, 1973–1976

    1. Memorando do Diretor de Inteligência Central Colby ao Secretário de Estado Kissinger

    Washington, 11 de abril de 1974.

    Assunto

    Decisão do Presidente do Brasil, Ernesto Geisel, de continuar a execução sumária de subversivos perigosos sob certas condições

    1. [1 parágrafo (7 linhas) não desclassificado]

    2. Em 30 de março de 1974, o presidente brasileiro Ernesto Geisel reuniu-se com o general Milton Tavares de Souza (chamado General Milton) e com o general Confúcio Danton de Paula Avelino, respectivamente o chefe do Centro de Inteligência do Exército (CIE) que estava deixando o cargo e aquele que estava assumindo. Também esteve presente o general João Baptista Figueiredo, chefe do Serviço Nacional de Inteligência (SNI).

    3. O General Milton, quem mais falou, delineou o trabalho do CIE contra o alvo subversivo interno durante a administração do ex-presidente Emilio Garrastazu Médici. Ele enfatizou que o Brasil não pode ignorar a ameaça subversiva e terrorista, e disse que métodos extra-legais devem continuar a ser empregados contra subversivos perigosos. A este respeito, o General Milton disse que cerca de 104 pessoas nesta categoria foram sumariamente executadas pela CIE durante o último ano, aproximadamente. Figueiredo apoiou essa política e insistiu em sua continuidade.

    4. O Presidente, que comentou sobre os aspectos sérios e potencialmente prejudiciais desta política, disse que queria refletir sobre o assunto durante o fim de semana antes de chegar a qualquer decisão sobre sua continuidade. Em 1º de abril, o presidente Geisel disse ao general Figueiredo que a política deveria continuar, mas que muito cuidado deveria ser tomado para assegurar que apenas subversivos perigosos fossem executados. O presidente e o general Figueiredo concordaram que quando o CIE prender uma pessoa que possa se enquadrar nessa categoria, o chefe do CIE consultará o general Figueiredo, cuja aprovação deve ser dada antes que a pessoa seja executada. O Presidente e o General Figueiredo também concordaram que o CIE deve dedicar quase todo o seu esforço à subversão interna, e que o esforço geral do CIE será coordenado pelo General Figueiredo.

    5. [1 parágrafo (12½ linhas) não desclassificado]

    6. Uma cópia deste memorando será disponibilizada ao Secretário de Estado Adjunto para Assuntos Interamericanos. [1½ linhas não desclassificadas] Nenhuma distribuição adicional está sendo feita.

    W. E. Colby”

     

     

  • Chame o ladrão

    Chame o ladrão

    Tomando um café na manhã de quatro do quatro. Despretensiosamente olhando pela janela. Encosta um furgão cinza na frente da minha casa. Coração e mente disparam. Meu corpo revive tempos escuros, tempos da completa ausência de liberdade para pensar ou agir ou falar. A música de Chico Buarque quebra a linha de raciocínio.

     

    Acorda, amor
    Eu tive um pesadelo agora
    Sonhei que tinha gente lá fora
    Batendo no portão, que aflição
    Era a dura, numa muito escura viatura
    Minha nossa santa criatura
    Chame, chame, chame lá
    Chame, chame o ladrão, chame o ladrão

     

    Lembrei-me dos livros que foram queimados ou enterrados pelo medo de serem vistos como subversivos e se tornarem motivos para as pessoas serem presas. Quem definia o que era subversão ou não eram os militares, sem discussão. E o 477? Foi um decreto-lei de 1969 que determinava o seguinte:

    Art. 1º Comete infração disciplinar o professor, aluno, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino público ou particular que:

    I – Alicie ou incite à deflagração de movimento que tenha por finalidade a paralisação de atividade escolar ou participe nesse movimento;
    II – Atente contra pessoas ou bens tanto em prédio ou instalações, de qualquer natureza, dentro de estabelecimentos de ensino, como fora dêle;
    III – Pratique atos destinados à organização de movimentos subversivos, passeatas, desfiles ou comícios não autorizados, ou dêle participe;
    IV – Conduza ou realize, confeccione, imprima, tenha em depósito, distribua material subversivo de qualquer natureza;
    V – Seqüestre ou mantenha em cárcere privado diretor, membro de corpo docente, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino, agente de autoridade ou aluno;
    VI – Use dependência ou recinto escolar para fins de subversão ou para praticar ato contrário à moral ou à ordem pública.

    Acorda, amor
    Não é mais pesadelo nada
    Tem gente já no vão de escada
    Fazendo confusão, que aflição
    São os homens
    E eu aqui parado de pijama
    Eu não gosto de passar vexame
    Chame, chame, chame
    Chame o ladrão, chame o ladrão

    Chico, ao imaginar a quem poderia recorrer caso fosse preso, só encontrou uma saída para sua canção: chamar o ladrão! Posto que não havia ninguém a quem recorrer, mesmo que não se tivesse praticado qualquer ato que representasse risco ao regime. Você podia ser levado a qualquer momento, sem qualquer explicação e sem qualquer satisfação posterior à sua família.

    Se eu demorar uns meses
    Convém, às vezes, você sofrer
    Mas depois de um ano eu não vindo
    Ponha a roupa de domingo
    E pode me esquecer

    Quem ia não sabia se voltava. Por isso Chico, na música, pede que a mulher o esqueça depois de um ano. O período, talvez, mais violento aconteceu quando o país comemorava a vitória na Copa do Mundo do México em 1970. Sem que a maioria se desse conta, o verde-amarelo daqueles que exaltavam o tri se misturava com o vermelho do sangue que corria nos porões do regime.

    Acorda, amor
    Que o bicho é brabo e não sossega
    Se você corre, o bicho pega
    Se fica não sei não
    Atenção!

    As políticas econômicas prejudicavam os trabalhadores com alto desemprego e violento arrocho salarial. Qualquer manifestação contrária, no entanto, era violentamente reprimida. Num certo momento, as políticas adotadas para o país começaram a resultados que causavam prejuízos a todos, também à elite econômica: ausência de crescimento, alto desemprego, inflação altíssima, uma dívida impagável com bancos estrangeiros. E mesmo os partidários da extrema direita não podiam se manifestar. Os jornais que apoiaram o golpe tentaram mudar de lado e foram censurados. Havia censores nas redações. Censores nas editoras, nas gravadoras. A maior parte da população não sabia o que ocorria.

    Não demora
    Dia desses chega a sua hora
    Não discuta à toa, não reclame
    Clame, chame lá, chame, chame
    Chame o ladrão, chame o ladrão, chame o ladrão
    (Não esqueça a escova, o sabonete e o violão)

    O tuíte do Comandante do Exército Brasileiro, general Eduardo Villas Bôas, trouxe à vida fantasmas que julgávamos definitivamente extintos. O carro na porta da minha casa, hoje dia quatro do quatro, era um furgão cinza onde se lia em preto sobre fundo amarelo: ESCOLAR!

  • Nota de esclarecimento a população sobre a intervenção militar

    Nota de esclarecimento a população sobre a intervenção militar

    A Federação de Favelas do Rio é uma instituição sem fins lucrativos fundada em 1963 para lutar contra as remoções do governo Lacerda e a implantação da ditadura militar no Brasil em 1964. Dessa forma, alertamos que essa nova intervenção militar não começou ontem, anteriormente tivemos as UPP’s (unidades de policia pacificadora), as operações respaldadas sob a GLO ( Garantia da lei e da ordem) e PLC 464/2016 que passa para a justiça militar a responsabilidade de julgar as violações cometidas pelos integrantes das forças armadas em suas intervenções.

    Essas mesmas forças intervencionistas estiveram recentemente em missões de paz no Haiti e favela da Maré onde podemos observar que grande parte das ações foram marcadas por violação de direitos humanos.

    Nesse processo vale salientar que os investimentos em militarização superam os investimentos em políticas sociais. A ocupação da Maré custou 1,7 milhões de reais por dia perdurando por 14 meses envolvendo 2500 militares, tanques de guerra, helicópteros, viaturas, sem apresentar resultados efetivos tanto para as comunidades quanto para o país. Em contra partida nos últimos 6 anos só foram investidos apenas 300 milhões de reais em políticas públicas voltadas para o desenvolvimento social.

    Apesar de todo esse aporte financeiro investido na intervenção militar na Maré podemos observar que essa ação foi totalmente ineficaz, pois lá as facções criminosas ainda lutam pelo controle da região oprimindo os trabalhadores e trabalhadoras que lá vivem.

    O que a favela precisa na verdade é de uma intervenção social, que inclusive contaria com a participação das forças armadas. Precisamos de escolas e creches, hospitais, projetos de geração de emprego e renda e políticas sociais voltadas principalmente para juventude. Precisamos de uma intervenção que nos traga a vida e não a morte. O exército é uma tropa treinada para matar e atuar em tempos de guerra. As favelas nunca declararam guerra a ninguém.

    A favela nunca foi e nem jamais será uma área hostil. Somos compostos de homens e mulheres trabalhadoras que com muita garra e dignidade lutam pelo pão de cada dia. Somos a força de trabalho que move a cidade e o país. A ocupação de uma parcela das comunidades por marginais ocorre justamente pela ausência do estado em políticas públicas que possam garantir o desenvolvimento de nossas favelas.

    Nos últimos 54 anos a FAFERJ vem lutando por democracia nas favelas do Rio. Lá a ditadura ainda não acabou. Ainda vemos a polícia invadindo residências sem mandados, pessoas sendo presas arbitrariamente ou até mesmo casos de desaparecimento como o caso Amarildo que repercutiu mundialmente.

    Para finalizar gostaríamos de reafirmar que as intervenções militares são caras, longas, e ineficazes até mesmo do ponto de vista da segurança pública. Sugerimos que essas tropas sejam movimentadas para patrulharem as fronteiras do Brasil, pois é de conhecimento notório que é de lá que chegam as armas e as drogas que alimentam o comercio varejistas de entorpecentes nas comunidades cariocas. Sugerimos também que se faça uma grande intervenção social nas favelas do Rio de Janeiro. Precisamos apenas de uma oportunidade para provar que somos a solução que o Brasil tanto precisa para se desenvolver e tornar-se um país mais justo para todos e todas.
    Favela é potência! Favela é resistência!

    Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro.

  • Fernando Pacheco Jordão: Não esqueceremos!

    Fernando Pacheco Jordão: Não esqueceremos!

    Amigo-irmão de Vladimir Herzog, exemplo de coragem e destemor no enfrentamento do arbítrio: que falta Fernando nos faz neste momento em que a boa parte da imprensa se transformou em serviçal dos poderosos!

    Fernando era diretor do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo quando do suplício e assassinato do colega Vladimir Herzog, em 1975, nos porões do Doi-Codi. Em vez do silêncio, ele preferiu engolir o medo e saiu a enfrentar de peito aberto a Ditadura.

    Foi um dos organizadores, com o então presidente do sindicato, Audálio Dantas, do ato ecumênico na Catedral da Sé, um dos primeiros protestos de massa contra o regime, e um marco histórico da luta pelas liberdades democráticas.

    Seu nome ilumina o “Prêmio Jovem Jornalista Fernando Pacheco Jordão”, realizado pelo Instituto Vladimir Herzog desde 2009, destinado a prestigiar as boas práticas no jornalismo em Direitos Humanos.

    Jornalistas Livres deixam aqui sua solidariedade amorosa à mulher, a socióloga Fátima Pacheco Jordão, e aos filhos Bia, Júlia e Rogério.

    Fernando Pacheco Jordão seguirá como um farol de liberdade para os verdadeiros jornalistas.

  • Herança da Ditadura, a PM é uma máquina de matar pobre

    Herança da Ditadura, a PM é uma máquina de matar pobre

    Por Maria Vitoria Ramos, especial para os Jornalistas Livres

    Orlando Zaccone, delegado Rio de Janeiro e integrante do movimento Policiais Antifascistas, discorreu sobre a trajetória da PM até suas implicações atuais. “Quem fazia o policiamento ostensivo nas ruas antes da ditadura era a Polícia Civil. A Polícia Militar ficava quartelada, trabalhando apenas de forma emergencial. Foi durante a Ditadura que passou a fazer parte da segurança pública. E a redemocratização manteve isso”, inicia ele, levantando justamente a dúvida sobre o caráter democrático de tal processo. Segundo ele, a redemocratização foi negociada e a intromissão das Forças Armadas na Constituinte garantiu a manutenção dos militares através da segurança pública. Até hoje, a PM é auxiliar das Forças Armadas: “O órgão que mais perdeu espaço com a Ditadura foi a Polícia Civil.”, afirma Orlando.

    A continuidade das Forças Armadas no controle da ordem interna coloca o Brasil fora do parâmetro democrático mundial. “Em qualquer democracia minimamente estruturada cabe às Forças Armadas apenas a manutenção da ordem externa. Mas nossa Constituição inverteu isso no seu Artigo 142.”, explica. As Forças Armadas garantindo o funcionamento dos poderes é a inversão da lógica democrática. Na teoria, o governo eleito pelo povo deveria garantir o funcionamento do exército, não o contrário. Para o delegado, o Brasil não vive sob um Estado de Direito Democrático, mas num Estado de Exceção Permanente.

     

    A primeira vez que o Artigo 142 foi usado como respaldo legal para a interrupção da recém-estabelecida ordem democrática foi logo em 1988, durante o governo Sarney, quando foi autorizada uma intervenção do exército na metalúrgica CSN contra os operários em greve. Na ação foram assassinados três operários: Carlos Augusto Barroso, 19 anos, Walmir Freitas Monteiro, 27 anos e William Fernandes Leite, 22 anos. O episódio foi eternizado na música “Aos Fuzilados da CSN”, da banda de rock Garotos Podres.

    Em referência ao grito “Não acabou, | tem que acabar, |Eu quero o fim da Polícia Militar”, o delegado opina: “O grito é bacana, incendeia, mas do ponto de vista político é difícil de se concretizar.”. E esclarece que a briga não é pelo fim, mas para desvincular a PM como força auxiliar das Forças Armadas, entregar para o governador eleito e cortar de uma vez esse cordão umbilical. “Pelo menos o governador foi escolhido pelo povo”, completa.

    Outra reivindicação fundamental do delegado é o fim do estatuto militar. “Temos que construir o policial como trabalhador, porque hoje é visto como soldado e isso tem implicações inclusive jurídicas, como o direito de greve. Como pode ir preso o policial que está com o cabelo grande? Tudo naquele estatuto tem que acabar!”, condena.

    A estigmatização do policial vem de ambos os lados. Para a esquerda, o policial é reduzido a dois únicos sujeitos possíveis: o corrupto e o torturador. Já a direita criou a imagem única do policial-herói, que tem como missão defender o bem do mal, independente de qualquer coisa, inclusive salário ou condições de trabalho. Em tom de piada ele lembra: “O [José] Padilha inventou o torturador-herói, né? No [filme] ‘Tropa de Elite’, a banda boa é a que mata!”

    A construção do traficante como representante de todo o mal da sociedade é uma consequência e um instrumento da guerra às drogas. O delegado pergunta sério: “Vocês conhecem algum dos grandes traficantes do país?”. Em coro a plateia respondeu ‘Aécio Neves’ e o palestrante se fingindo surpreso replica ironicamente: “Vocês estão loucos gente? O Aécio é senador!”.

    Ainda interagindo com os estudantes, Orlando perguntou se matar alguém era crime no Brasil. Diante da resposta afirmativa contestou: “Claro que não. Tem a legítima defesa! O policial que mata traficante na favela é absolvido por legítima defesa. Todo crime é uma construção política.”. E afirma que o que mais se ouve das mães dos jovens assassinados é “meu filho não era traficante”… Ele questiona: “Por quê? Se fosse [traficante] não teria direito à vida?”. Para ele é absurda a obsessão da imprensa com os antecedentes criminais. A existência de crimes passados funciona como um salvo conduto para o assassinato dessas pessoas.

    A construção política do inimigo se transforma na medida em que mudam os interesses. Primeiro é o traficante, depois o MST e agora os Black Blocs, por exemplo. “Então, quando estamos falando em fascismo não estamos jogando com as palavras. Fascismo é a exterminação de grupos por sua condição ontológica, de vida.”, reitera ele. Lembra ironicamente que quem mora na favela também fuma maconha: “Hoje o consumo é do morador, se engana quem acha que é para zona sul. Quem tem dinheiro está tomando Rivotril para relaxar ou Ritalina se quiser um barato mais atento.” Dessa forma, o morador que passa para pegar a maconha na sexta-feira depois do trabalho, para seu uso próprio no fim de semana, indo para sua casa é usuário ou traficante? O delegado coloca: “São usados fatores subjetivos nessa diferenciação. Um desses critérios é o lugar do fato ocorrido. Maconha na favela é traficante. Mas o cara mora lá!”.

    Na América Latina, apenas o Paraguai e o Brasil criminalizam o usuário. “Qual o crime? Onde já se viu crime sem vítima? Se o estado estivesse preocupado com a saúde pública investiria no SUS. Somando as mortes por uso de drogas de todas as substâncias ilícitas existentes no país, pode incluir tudo, heroína, LSD, ecstasy, não chega nem perto das mortes causadas por essa guerra às drogas. E o alvo dessa guerra são os moradores do morro!”, conclui o delegado. A guerra às drogas tem como consequência também o encarceramento em massa, que por sua vez culmina na superlotação dos presídios do país. Orlando garante: “Não existe crise no sistema prisional. Como diz Darcy Ribeiro sobre a educação, é um projeto político! Nos Estados Unidos têm empresas que manejam o sistema prisional com capital aberto na bolsa.”.

    Com relação ao encarceramento feminino ele indaga: “Quem são essas grandes traficantes? A maioria das mulheres presas pelo tráfico de drogas é flagrada tentando levar pequenas quantidades de maconha para seus companheiros presos.”. Esses, por sua vez, provavelmente também foram encarcerados por tráfico de drogas, gerando uma reação em escala devastadora.

    Sem titubear o delegado carioca afirma que única forma de acabar com o tráfico é legalizar a produção, distribuição e a venda de todas as drogas. E provoca: “Não adianta só colocar a maconha do lado da cerveja. Não adiata essa luta ‘maconha é uma planta’; papoula também é planta. O Evo Morales tentou conseguir autorização da ONU para a produção de farinha de coca, um alimento milenar proibido. Os pesticidas jogados pelos americanos nas plantações de coca são muito mais nocivos que a droga.”. Para finalizar sua fala, o delegado colocou de forma direta: “Nós não estamos aqui por uma luta própria, mas para combater o genocídio de uma população!”

    Rodrigo Mondego, advogado e militante dos direitos humanos, conduziu sua fala de forma narrativa, ilustrando sua tese com três casos emblemáticos. Começou com a história de Anderson, que fora seu companheiro de luta por vários anos, havia acabado de se formar como assistente social quando teve uma filha. Sem encontrar trabalho na sua área, prestou concurso para Polícia Militar, que na época estava crescendo e em foco no Rio de Janeiro por conta do surgimento das UPPs. Por um tempo conseguiu sustentar sua filha, mas com a crise das fracassadas UPPs, foi recolocado para trabalhar para o policiamento na rua. Dez dias depois, quando fazia uma abordagem em dois motoqueiros levou um tiro e morreu na hora. Virou então apenas uma estatística, e sua família, um problema para o estado do Rio de Janeiro. “O tratamento para as famílias de policiais mortos é terrível. A morte dele destruiu a família e o Anderson virou um argumento para quem defende a lógica dele estar atuando como o herói que vai resolver o problema do bandido morto. Essas pessoas cagam para a família dos policiais.”, afirma Rodrigo. Ele pergunta para a plateia quem é o representante carioca da ‘causa dos policiais’, que responde alto ‘Bolsonaro!’. Ele concorda e esclarece: “Então, são 200 assessores trabalhando para ele e nenhum tem como tarefa assistir as famílias de policiais assassinados. Quem faz isso são justamente alguns deputados de esquerda, como o Freixo.”.

    A segunda história é de Hélio, um morador da favela no rio de 50 nos. Sua mulher havia pedido que ele furasse uma parede, tarefa que ele adiava há dias. Mas naquela mesma manhã estava em curso uma operação do BOPE. Um policial viu de longe Anderson com ‘o que parecia ser uma metralhadora apontada contra a parede’ e atingiu Hélio com um tiro de fuzil na cabeça. Sua mulher teve que assistir a massa cefálica do marido se espalhar pelo chão da sala. “Esse policial foi absolvido, pois o Hélio parecia um bandido. E bandido bom não é bandido morto? Não adianta só condenar o policial que atirou, teve um promotor, um delegado e um juiz envolvidos nisso.”, finaliza.

    Mateus, morador do Jacarezinho, é o protagonista do terceiro caso trágico resultante da militarização da polícia e da política de guerra às drogas. Foi com a namorada para outra favela visitar um amigo. A menina comprou três vidrinhos de loló e colocou no bolso da calça. O nome dela não pôde ser revelado, uma vez que atualmente é vítima de ameaças. Dois policiais abordaram os jovens no trem de volta para casa. Revistaram a menina, encontraram os frascos e pediram para todos saírem do vagão. Apenas Mateus se recusou, temendo deixá-la sozinha com dois policiais homens. Fazia muito calor no Rio de Janeiro e, morador de uma cidade litorânea, ele não usava camisa. Foi chamado de cracudo marrento: “Lógico, jovem negro no trem do RJ só pode ser cracrudo.”, ironizou Rodrigo. A discussão começou e Mateus levou um tiro debaixo do braço e morreu no próprio vagão. Os policiais levaram a única testemunha do crime para a delegacia, a namorada, e a obrigaram a assinar um papel dizendo que o jovem havia tentado pegar a arma do policial.

    São três histórias, três mortes ilustrando o resultado dessa luta movida, segundo o advogado, por lucro. “O principal instrumento é a PM, a principal desculpa é a guerra às drogas e o interesse é o lucro.”, sintetiza.

    Rodrigo contou também o caso de Frederick Barbieri, empresário e, segundo ele, um dos maiores traficantes de armas do Brasil, que vive uma vida de luxo em Miami. “Como é que ele consegue trazer fuzil de avião? Agora há pouco acharam 60 fuzis chegando de avião ao Rio de Janeiro e quem encontrou foi a policia civil, não a PF. Então cadê essa Polícia Federal das grandes operações, da Lava Jato? Têm 150 oficiais para condução coercitiva do Lula mas está errando fuzil de avião?”, indaga.

    Rodrigo afirma que a guerra às drogas se sustenta em uma questão meramente ideológica. “O Brasil é o único país do mundo onde Direitos Humanos é visto como algo negativo.”, diz. Ele explica que aqui a concepção é que o bandido nasce por essência mau e, portanto, inferior com relação aos sujeitos de bem, estes considerados superiores. “Ser a favor do direito da pessoa humana vai contra essa lógica que dá respaldo a essa guerra.”. O advogado quantifica que menos de 100 dos 500 deputados do Congresso Nacional se reivindicam defensores dos direitos humanos. “Já bancada BBB, Bíblia, que eu digo com muitas aspas, Bala e Boi representa 70% da Câmara.”. Para ele, a guerra só continua porque existe sustentação social para ela.

    O advogado não deixa de expor sua crítica à esquerda, que em sua avaliação respalda essa guerra com a lógica da segurança pública. Diz ver muitos governos progressistas na educação, saúde, transparência, mas conservadores no que tange à segurança pública. E completa: “Vejo muitas pessoas de esquerda em defesa da violência contra os Black Blocs, corroborando a lógica da violência. Não entrando no mérito da luta direta, mas a violência nunca pode ser justificada.”

    Rodrigo finalizou a mesa com um caso no Rio de Janeiro. Durante uma ocupação (Ocupa Cabral), a galera na rua começou a correr por algum motivo e a polícia cercou a rua e decretou prisão para todos aqueles que estavam naquele espaço, argumentando que o simples fato de estarem lá os transformava em suspeitos, incluindo até um entregador de pizza. O advogado estava presente, fez a defesa e conseguiu liberar as pessoas ali mesmo. Pouco tempo depois, um sujeito veio cumprimentá-lo por estar defendendo os ‘cidadãos de bem’. Rodrigo respondeu enfático: “Cara, aqui você é bandido.” Quando se cria essa dicotomia do inimigo, rapidamente ele pode virar você, finaliza.

    A última parte da mesa foi constituída por falas curtas de estudantes que se inscreveram para debater o tema. Helena, estudante de engenharia e militante do movimento negro, ressaltou que enquanto ouvia a perfilação do inimigo, o traficante, apenas conseguia pensar: são negros. Os moradores do morro, os traficantes, os usuários criminalizados, em sua maioria são negros. Cobrou dos palestrantes que isso fosse colocado de forma mais clara, explicitando o racismo estrutural que permeia a questão. A jovem atentou ainda a outra questão pouco trabalhada quando o assunto é a legalização das drogas: “Como estudante de engenharia venho lembrar que a proibição é também uma barreira tecnológica. O cânhamo, por exemplo, é muito melhor que a madeira em diversos aspectos. Mas a proibição é um entrave para o conhecimento!”, finaliza.