Jornalistas Livres

Tag: Democratização da Mídia

  • A volta da Esquerda na Argentina e o uso estratégico da televisão

    A volta da Esquerda na Argentina e o uso estratégico da televisão

    Por Antonio Lisboa, geógrafo e estudioso do uso político da televisão

     

    No retorno da esquerda ao poder na Argentina há um personagem fundamental que não pode passar despercebido: a televisão. Não fossem alguns elementos televisivos, dificilmente a esquerda teria vencido ontem. E o que digo aqui não é movido a elucubrações, apego à ideias específicas e especulações teóricas, mas a certos fatos concretos:

    1) A enorme ousadia dos empresários que insistiram em manter os riscos financeiros de se sustentar um canal privado de esquerda, o excelente C5N, em pleno governo Macri. No início, o canal sofreu perseguição jurídica e policial e chegou a ser vendido e mudar de linha editorial, inclusive demitindo alguns de seus maiores apresentadores, mais afinados à esquerda. Mas a experiência não deu certo, pois o público cativo do canal já era de esquerda e, meses depois, voltou ao comando original numa aposta corajosíssima de seus empreendedores (sim, neste caso, o termo é este, gostemos ou não). Com o ato ousado, seus principais apresentadores voltaram ao ar, entre eles, Victor Hugo Morales, Gustavo Sylvestre, Pedro Brieger, Ivan Schargrodsky, e outros.

     

    2) Graças à ousadia empresarial de se manter um canal de esquerda em um país onde todos os outros canais nacionais estão alinhados à direita, o canal C5N se converteu nos anos Macri no canal de notícias mais assistido do país, tendo batido diversos recordes de audiência nos últimos anos, superando seu maior rival, o direitista TN (Todo Noticias). Para um canal, antes pequeno e de baixa audiência, a decisão de assumir posição de esquerda se convertendo na maior janela televisiva de oposição ao neoliberalismo de Macri, foi um logro extraordinário.

    3) Mas nada disso caiu do céu. A construção de uma televisão mais progressista e não alinhada ao Império e seu discurso único e homogêneo pro-capitalismo é uma construção de anos, fruto da visão estratégica de Nestor e Cristina Kirchner. Diferentemente da estratégia adotada pela esquerda brasileira, que esteve 13 anos no poder, Cristina Kirchner incluiu na estruturação da TV digital aberta (TDA) da Argentina uma série de canais progressistas e não-alinhados que tornou a grade de programação da televisão argentina uma das mais democráticas e plurais do planeta.

    4) Graças a isso, a Argentina passou a contar com canais progressistas não apenas em sua TV paga, mas em sua TV aberta, incluindo canais como: a venezuelana TeleSUR, a russa RT en Español e a iraniana HispanTV, além de canais nacionais privados mais alinhados à esquerda e à luta dos povos, como a já mencionada C5N, o TeleNueve (antes de esquerda, depois vendido e reformulado) e o CrónicaTV (um canal tradicional que dá espaço para diferentes espectros políticos), sem falar na modernização do excelente canal estatal Televisón Publica de Argentina (TPA), cujo programa de debates políticos ao vivo, 678, de fortíssima postura esquerdista bateu diversos recordes de audiência em pleno horário nobre noturno.

    5) No caso da russa RT, por exemplo, Cristina não apenas o incluiu na grade da TV digital aberta, mas teve a ideia de lançá-lo ao vivo em teleconferência junto a Vladmir Putin, o que foi um golpe de mestre para a divulgação do canal junto ao seu novo público argentino. Ao invés de fugir da polêmica (os demais canais atacaram o ato em uníssono antes e depois), Cristina investiu nela e a usou a seu favor e do novo canal.

    6) E assim a esquerda argentina conseguiu equilibrar e colocar um freio no poder manipulador e alienante de seus canais privados tradicionalmente direitistas: AmericaTV, El Trece, Todo Noticias e Telefe.

    A eleição de domingo não caiu do céu. Só aconteceu graças à ousadia de dois governos de esquerda kirchneristas e de alguns empresários com coragem de contar uma história diferente. Tudo que não aconteceu “en el Gigante del Sur”, por aqui mais conhecido como Brasil.

  • Resistência e emancipação para democratizar a comunicação

    Resistência e emancipação para democratizar a comunicação

    Por Henrique Faria, para os Jornalistas Livres

    No dia 21 de Outubro, aconteceu na ocupação Carolina Maria de Jesus, em Belo Horizonte, a Roda de conversa “Web, Mídia e Resistência”, protagonizada por Florence Poznanski, do FNDC, pela Deputada Federal Margarida Salomão (PT/MG), pelo hackativista Lucas Oliveira, e pelas vereadoras de Belo Horizonte Áurea Carolina e Cida Falabella (PSOL), da Gabinetona. O debate fez parte da programação da Semana da DemoCom, organizada pelo FNDC.

    Após o golpe de 2016, a liberdade de expressão e de comunicação vem sofrendo, junto com os brasileiros. Um dos primeiros atos do ilegitimo governo foi atacar a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação, responsável pelas emissoras públicas, que em Minas Gerais são a Rádio Inconfidência e a Rede Minas de Televisão) acabando então com seu conselho curador, com a mídia pública e com o ministério das comunicações.

    Esse desmantelamento da comunicação pública cria uma lacuna no país, encoberta pela mídia comercial, ou seja, mantém-se o monopólio das grandes famílias que dominaram o cenário midiático durante anos, e desincentiva-se que a comunicação pública e as mídias independentes avancem. Temos hoje no país um cenário onde 50% da população ainda não tem acesso a internet, e com o fim do Plano Nacional da Banda Larga, ficará ainda mais dificil ainda alcançar essa população.

    Este debate nos mostra que a comunicação deveria ser central nas lutas políticas, pois de seu poder é que emana a emancipação dos povos, já que a mesma influencia e muito a população. Lucas Oliveira, hackativista, comenta: “se você comparar a informação que uma criança pobre pode acessar na Internet e a informação que uma criança rica acessa, não é a mesma coisa”

    Outro ponto debatido foi a atrocidade do projeto “Escola sem partido”, que retira das escolas o debate sobre política, raça, gênero e preconceitos que continuam matando milhões de brasileiras e brasileiros, todos os anos. A censura está tentando silenciar os meios de comunicação, as escolas e nos últimos meses, está atacando também as artes com as tentativas de fechar exposições em todo o país, cujosconteúdos não agradam à classe dominante, conservadora e burguesa.

    É das mídia hegemônicas a decisão de o que as pessoas irão assistir em seus televisores e rádios, e é papel dos novos meios pautar outra agenda cidadã, para quebrar estereótipos e narrar o novo. Revivendo os argumentos da deputada Margarida, se a escrita foi uma invenção revolucionária guardada para as elites que sabiam ler e escrever, a internet tem o potencial de transpôr barreiras e reescrever a história através da democratização da comunicação.

    Com este debate, o comitê mineiro do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação se preparou para sua plenária final, que aconteceu no domingo (22) e pautou quais seriam as principais ações mineiras na luta por voz no país e no estado.

    Revisado por Agatha Azevedo