Jornalistas Livres

Tag: Delação

  • Folha não teve coragem de publicar manchete real: “Lava Jato induziu Léo Pinheiro a mudar versão duas vezes até incriminar Lula”

    Folha não teve coragem de publicar manchete real: “Lava Jato induziu Léo Pinheiro a mudar versão duas vezes até incriminar Lula”

    Yuri Silva*

    A Folha de S. Paulo publicou neste domingo, 30, em parceria com o site The Intercept Brasil, a reportagem até agora mais impactante e contundente da Vaza Jato, sem sombra de dúvida.

    O conteúdo é incisivo ao mostrar que os procuradores da operação Lava Jato induziram o empresário baiano Léo Pinheiro, da construtora OAS, a incriminar o ex-presidente Lula.

    O jornal mostra como a delação da empreiteira, até hoje não homologada, foi sendo postergada (e ameaças de prender o empresário foram sendo feitas) para forçar que ele citasse Lula como participante de esquema de corrupção, a fim de condenar o líder petista.

    Somente após fazer isso, Léo Pinheiro passou a ter a “credibilidade” entre os procuradores da força-tarefa, mostram as trocas de mensagens entre os prepostos do Ministério Público.

    A manchete do jornal da família Frias, contudo, é pura vacilação jornalística.

    Na reportagem mais relevante desde que fechou parceria com o The Intercept para analisar as conversas conjuntamente com profissionais do site, a Folha saiu nas suas primeiras páginas dominicais (tanto no jornal impresso quanto na versão digital) com a tímida manchete “Lava Jato via com descrédito empreiteiro que acusou Lula”.

    Nas páginas internas, dizia o diário paulista: “Lava Jato desconfiou de empreiteiro que acusou Lula, indicam mensagens”. Em outra versão, esta no portal digital do veículo, o enunciado para a notícia mais bombásticas do País em muitos anos diferiu levemente do anterior: “Lava Jato desconfiou de empreiteiro pivô da prisão de Lula, indicam mensagens”.

    Em nenhum momento, a Folha de S. Paulo trouxe a manchete “correta”, aquela que cabia ao conteúdo revelado, embora tenha construído lastro para isso no corpo da sua matéria.

    Possivelmente sob o argumento de um pseudo equilíbrio jornalístico, quase sempre evocado nas redações como forma de ‘passar pano’ para poderosos imbricados em denúncias comprometedoras, o jornal fugiu de publicar que a “Lava Jato induziu Léo Pinheiro a mudar versão duas vezes até incriminar Lula”.

    Trata-se de um erro difícil de justificar para quem leu a matéria completa.

    Vários trechos deixam nítido o que a manchete não publicada pela Folha diz/diria.

    Já no segundo parágrafo, sub-lead da reportagem, seus autores dizem: “Enviadas por uma fonte anônima ao The Intercept Brasil e analisadas pela Folha e pelo site, as mensagens indicam que Léo Pinheiro, ex-presidente da construtora OAS, só passou a ser considerado merecedor de crédito após mudar diversas vezes sua versão sobre o apartamento tríplex de Guarujá (SP) que a empresa afirmou ter reformado para o líder petista.”

    Poucas linhas mais à frente, os repórteres Ricardo Balthazar, Flávio Ferreira e Wálter Nunes (da Folha) e Rafael Moro Martins e Rafael Neves (do The Intercept Brasil) fazem a levantada derradeira, que termina de consolidar tanto a força noticiosa da reportagem quanto o erro cometido ao não adotar uma manchete mais precisa em relação ao que diz a reportagem.

    “Léo Pinheiro só apresentou a versão que incriminou Lula em abril de 2017, mais de um ano depois do início das negociações com a Lava Jato, quando foi interrogado pelo então juiz Sergio Moro no processo do tríplex e disse que a reforma do apartamento era parte dos acertos que fizera com o PT para garantir contratos da OAS com a Petrobras. Os diálogos examinados pela Folha e pelo Intercept ajudam a entender por que as negociações da delação da empreiteira, até hoje não concluídas, foram tão acidentadas —e sugerem que o depoimento sobre Lula e o tríplex foi decisivo para que os procuradores voltassem a conversar com Pinheiro, meses depois de rejeitar sua primeira proposta de acordo.”

    A contextualização que segue faz a reportagem ganhar em qualidade e inteligibilidade, deixado bem cristalizado para quem a leu: a Lava Jato induziu Léo Pinheiro a mudar versão duas vezes até incriminar Lula. Uma pena que a Folha tenha optado pela covardia.

     

    Nota: A defesa do ex-presidente Lula publicou nota sobre a reportagem da Folha, que pode ser lida abaixo

    [aesop_document type=”pdf” src=”https://jornalistaslivres.org/wp-content/uploads/2019/06/Nota-Leo-Pinheiro-Folha.pdf”]

     

    *Yuri Silva é jornalista, editor-chefe do portal Mídia 4P (@midia4p e www.midia4p.com), ex-correspondente do Estadão na Bahia e ex-repórter de ‘Cidade’ e ‘Política’ do jornal A Tarde

  • A “Justiça” que forja delação é a mesma “Justiça” que forja flagrante na favela

    A “Justiça” que forja delação é a mesma “Justiça” que forja flagrante na favela

    Texto do Editorial 4P (@midia4p e www.midia4p.com)

    O que as alas nacionais progressistas estão sentindo com relação às falcatruas, acordos espúrios e delações forjadas – construídas no âmbito da Lava Jato por juiz, procuradores e empresários, e reveladas neste domingo, 30, por reportagem da Folha de S. Paulo e do site de notícias The Intercept Brasil – é o mesmo que o movimento negro denuncia por décadas a fio em suas ações de combate ao racismo, apontando para o tratamento dado à população periférica e pobre do Brasil.

    A matéria mostra como os procuradores “trabalhavam” mudanças de delações para, desse modo, incriminar pessoas. O exemplo usado foi o do empresário Léo Pinheiro, da construtora OAS, que ao mudar o seu depoimento por duas vezes, foi pivô da condenação de Lula e teve sua sentença reduzida 70% (de 10 anos e 8 meses para 2 anos e 6 meses).

    O caso de Lula é emblemático para o Brasil e para o mundo. Mas, se “a lei é para todos”, como tanto tem se falado nesses últimos tempos, porque a dor dos negros injustamente encarcerados não causa comoção geral e, principalmente, dos setores progressistas nacionais?

    Ao longo dos anos, casos semelhantes vieram a público inúmeras vezes, em vídeos mostrando policiais mudando cenas de crimes, disparando a arma e colocando mas mãos do cidadão abatido, da maconha colocada na mochila para incriminar, entre outros exemplos emblemáticos.

    Mas por que os que se comovem com o caso Lula, em grande maioria, não saem às ruas, não criam fóruns de debates para se manifestar, não inundam a internet com hashtags que demonstrem a sua indignação e tão somente alguns poucos políticos denunciam tais violências?

    Certamente porque os corpos negros encarcerados são invisibilizados pela cultura do racismo, que, além de estruturar a sociedade desumaniza os corpos negros, transformando injustiças em banalidade.

    Casos como os de Amarildo, Rafael Braga e da modelo Bárbara Querino, além de serem esquecidos, não causam comoção por muito tempo, não servem de inspiração para a criação de movimentos em defesa de justiça e equidade e não são utilizados como modelos para apresentar tanto à sociedade brasileira quanto às autoridades internacionais as violações de direitos desses cidadãos, promovidas pelo Sistema de Justiça.

    É como disse, certa feita, o sociólogo Jessé Souza:

    “Essa lei social está para além da nossa consciência e comanda o cara que vai carregar o corpo desse pobre, o advogado que vai cuidar do caso, o juiz que vai dar a sentença. Está na cabeça da sociedade inteira e é o que diz que aquela pessoa é subgente, indigna do nosso respeito”.

    Até quando?, perguntamos.

    A cidadania plena para a população negra passa por esforços de todos os setores da sociedade e, quem sabe, o caso Lava Jato possa servir para uma reflexão mais profunda sobre a atuação do Sistema de Justiça, afinal a lei e a busca por uma justiça imparcial é para todos.

  • Golpe dentro do Golpe

    Golpe dentro do Golpe

    O Brasil amanhece com a notícia de que a Polícia Federal realiza mandados de busca e apreensão em mais de 40 endereços pelo país, especialmente em Brasília e no Rio de Janeiro. Dentre os alvos da operação, o Senador Aécio Neves. Envolvido, junto com o Presidente Michel Temer em uma denúncia publicada pelo Jornal O Globo, o Senador foi visto ao final da sessão de ontem a noite saindo discretamente, logo depois de ter sido fotografado lendo as notícias que já corriam pela internet.

    De fato, o furo do jornalista Lauro Jardim parece ter implodido a república brasileira nas últimas horas.

    Depois do impeachment de Dilma Rousseff, a revelação de que delatores da JBS (que representa a Friboi), GRAVARAM o presidente Michel Temer em negociações de propina para comprar o silêncio de Eduardo Cunha, parece ter conseguido o feito de unificar o país dividido de um ano atrás. Até líderes de movimentos como o MBL – um dos principais mobilizadores para a derrubada de Dilma – ocuparam as redes esta noite para pedir a renúncia de Michel Temer.

    A Globo (aberta) anunciou em seu plantão, pouco antes do Jornal Nacional ir ao ar, que o colunista havia publicado as revelações “ainda sem os áudios, mas com confirmação dos investigadores da Lava Jato”. No referido material, diálogos gravados pelos delatores supostamente comprovam que Temer sabia do esquema de pagamento de “mesadas” à Eduardo Cunha, preso e condenado, para que este “não falasse o que sabe”. Além disso, outros trechos indicam que o Senador Aécio Neves também estaria envolvido, tendo pedido $ 2 milhões aos empresários da JBS e ainda, aparentemente, sugerido o assassinato de um dos envolvidos “antes que ele delatasse” o esquema.

    Em meio a esse cenário, uma das coisas que chamou a atenção da opinião pública foi o claro “desembarque” da Globo do governo que a própria emissora ajudou a colocar no poder. Mas alguns fatores podem estar por trás desta atitude, como o interesse numa transição de governo capitaneada pela Ministra Carmem Lúcia do STF e a posterior convocação de eleições indiretas, ou seja, decidida pelo Congresso, que podem levar ao poder algum aliado do mercado financeiro.

    É bom lembrar que completado um ano de governo Temer, a economia ainda apresenta números negativos e o empresariado ( especialmente aqueles representados pela FIESP), vêm demonstrando insatisfação em relação ao tímido resultado apresentado. E dentro da linha sucessória, tanto Rodrigo Maia, presidente da Câmara, quanto Eunício Oliveira do Senado, estariam teoricamente impedidos de assumirem um “mandato tampão”, por serem investigados pela Operação Lava Jato. Um desdobramento em consequência da ação que destituiu Renan Calheiros da presidência do Senado pelo mesmo motivo.

    Essa linha de raciocínio explicaria o jantar do qual a Ministra participou há alguns dias, com FHC, empresários e até um membro da Família Marinho. Carmem Lúcia pode representar ainda uma possibilidade de suspensão do calendário de 2018, com o argumento de “estabilizar o país” e concluir a Operação Lava Jato. No entanto, isso também poderia ser visto como uma tentativa de impedir a eleição do ex-presidente Lula, que vem aparecendo em primeiro lugar nas intenções de voto em todos os cenários e por institutos de pesquisa diferentes.

    Figuras como o Senador Ronaldo Caiado pedindo abertamente a renúncia de Michel Temer também indicam que a aliança formada para derrubar a presidenta Dilma Rousseff, começou a se diluir assim que as revelações começaram a circular.

    O Planalto soltou uma nota, cerca de uma hora depois que as notícias foram divulgadas, em que afirma que o presidente Michel Temer “não participou de nenhuma conversa” com aquele teor. Também o Senador Aécio Neves nega qualquer participação na negociação. Ambos disseram por meio desses comunicados que “confiam nas investigações e aguardam que o judiciário se pronuncie”.

    Pouco antes de uma multidão tomar as ruas em frente ao Palácio do Planalto em Brasília, também na Avenida Paulista e em várias outras cidades, os Ministros do STF fizeram algo bastante incomum para os jornalistas acostumados a cobrir a Côrte. Foi solicitado que a imprensa se retirasse e em seguida, fecharam as portas do Supremo. Ali, acredita-se que o Ministro Edson Fachin tenha se reunido com seus pares, não só para avaliar o tamanho da crise, mas também pelo fato de que agora ele está sendo pressionado a revelar rapidamente o conteúdo das conversas citadas.

    O Ministro Edson Fachin assumiu a relatoria da Operação Lava Jato depois que o avião que levava o Ministro Teori Zavatscki caiu e onde morreram todos os ocupantes, um acidente que ainda está sob investigação. Por sinal, o filho do Ministro, Francisco Zavatscki, chegou a publicar em seu perfil nas redes sociais uma espécie de “desabafo” em que pergunta “se o PMDB teria coragem de matar o pai dele”. Com a repercussão, o post foi apagado, mas já havia se espalhado pela internet. Francisco menciona ainda o Ministro Teori, dizendo que pouco antes de morrer, o pai estava “preocupado com o PMDB”, que segundo ele “tentava parar a Operação Lava Jato”.

    Também chamou atenção da opinião pública nos minutos seguintes em que a cúpula do Governo Temer começava rapidamente a ruir com a notícia, o fato de que há poucos dias foi revelado que o Juiz Sérgio Moro, que conduz de Curitiba a 1ª instância da Operação Lava Jato, disse em despacho que negava um pedido da defesa de Eduardo Cunha porque este havia tentado “chantagear Michel Temer”. Fica a pergunta no ar: se Moro sabia da tentativa do PMDB de parar a Operação, porque tentou censurar o que Eduardo Cunha tinha a dizer? Será que foi esse o motivo que levou os irmãos da JBS à procurarem a PGR e não Sérgio Moro, para fechar o acordo de delação premiada?

    Não se sabe ao certo muitas respostas e nem o que vai acontecer nas próximas horas, mas uma coisa é certa: o grito ouvido nas ruas nesta quarta-feira e a reação na internet foi unificada: #RenunciaTemer e #DiretasJá. E é a primeira vez, desde o impeachment de Fernando Collor na década de 90, que aparentemente todo o país se uniu em torno de uma ideia em comum. Não é pouca coisa.

  • Contra os vazamentos seletivos, por uma inundação de informações!

    Contra os vazamentos seletivos, por uma inundação de informações!

    #AbreSigilo

    A ministra Cármen Lúcia, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), homologou hoje (30/01) pela manhã as delações de 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht. Isso quer dizer que, a partir de agora, as delações adquirem peso jurídico e poderão ser usadas pela Procuradoria-Geral da República para aprofundar as investigações. Os procuradores poderão, por exemplo, pedir abertura de inquérito ou mandado de busca e apreensão.

    Por determinação da ministra Cármen Lúcia, porém, o sigilo das informações será mantido por enquanto pelo STF. Isso, apesar de haver, desde meados de janeiro a expectativa de que os documentos com as delações fossem tornados públicos pelo então ministro relator da Lava Jato, o finado Teori Zavascki.

    Teori morreu no dia 19 de janeiro, em um acidente para lá de conveniente, quando ultimava os estudos para homologar as delações dos executivos da Odebrecht.
    Reportagem do jornal “Valor Econômico” de 17 de janeiro, dois dias antes da morte de Teori, afirmava que as delações deveriam “ser tornadas públicas já em fevereiro”.

    Se vivêssemos em um Estado Democrático de Direito, essas delações seriam tratadas com o máximo cuidado, para que não se acusasse qualquer cidadão sem provas. Mas já se sabe que, neste preciso momento em que você, internauta, lê estas linhas, nas redações, os mesmos repórteres “de confiança do governo golpista”, os mesmos de sempre da mídia corporativa, já receberam os arquivos com as delações. E já preparam suas matérias com “vazamentos”.

    Não queremos que essa mídia descomprometida com a Democracia e com a Liberdade, essa mídia misógina e antipovo, essa mídia vergonhosamente facciosa e partidarizada, escolha os “melhores trechos” pra publicar.

    Já que essa mídia golpista escolherá os “vazamentos” que publicará, dizemos bem alto: queremos ser inundados de informações. O povo brasileiro não pode e não deve deixar que a turma a serviço dos corruptos selecione o que devemos conhecer ou não.

    Sabe-se que Temer foi citado 43 vezes em delações dos Executivos da Lava Jato. Queremos ler tudo! Queremos saber em que tramoias teria se metido Michel Temer, esse político medíocre, que nem conseguiu ser eleito presidente do centro acadêmico! Queremos conhecer todo o entulho de corrupção em que o traidor ancorou a nau sem rumo do golpismo brasileiro, tendo ele como capitão.

    A “Folha de S.Paulo” acaba de publicar reportagem dizendo do “alívio” do palácio do Planalto com a manutenção do sigilo sobre as delações.

    Segundo o repórter Valdo Cruz, “a equipe presidencial receia que quando o conteúdo das delações se tornar público, haverá turbulências políticas.”
    Temer, o PMDB e o PSDB não querem turbulências políticas porque isso pode atrapalhar seu projeto de aniquilação do país com uma política econômica desastrosa; porque pretendem aprovar a toque de caixa seu projeto de destruição da Previdência Social, que condena nossos idosos (mais os doentes e pessoas com deficiências) à terrível miséria exatamente quando mais frágeis. Porque querem aprovar a destruição dos direitos trabalhistas.

    Para tudo isso, eles precisam da paz dos cemitérios.

    Queremos saber tudo! Não confiamos na imprensa golpista. Que as delações sejam tornadas públicas de forma ampla e irrestrita. Que se faça a vontade de saber do povo brasileiro, que já não tolera mais mentiras, mais sujeiras e mais empulhações!

  • Sarney: “eles não aceitam nem parlamentarismo com ela”

    Sarney: “eles não aceitam nem parlamentarismo com ela”

    Corremos grande risco de nos enganar quando tentamos aprofundar uma análise antes que o calor dos acontecimentos se dissipe. No entanto, é preciso correr esse risco se queremos escolher de qual lado ficar, se queremos influir no desenrolar da história.

    O que conseguimos enxergar, hoje, nessa disputa pelo poder no Brasil? Vamos tentar montar um quadro com as declarações feitas sobre a presidenta Dilma nas gravações vazadas e ações que ela tomou nesses 17 meses de seu segundo mandato, especialmente no campo econômico.

    Dilma teve altos índices de popularidade, em seu primeiro mandato, até as manifestações de junho de 2013. Esses eventos, ainda que não consigamos entendê-los completamente, foram muito bem organizados para terem sido espontâneos. Sua aprovação desaba, mas mesmo assim vence as eleições em 2014, já tendo a oposição da elite política e econômica, bem como de ampla parcela da classe média.

    Entendemos a designação de Joaquim Levy e a linha neoliberal adotada em 2015, ajuste das contas públicas e reajustes abruptos de preços públicos no meio de uma recessão, como uma tentativa de conciliação, como um gesto de Dilma para conquistar apoio ao seu governo, após uma eleição que evidenciou a divisão entre dois projetos de país. Um projeto centrado na questão social, na diminuição de desigualdade com forte intervenção do Estado, por um lado, e um projeto privatizante com redução do Estado e de direitos sociais, por outro.

    A recessão, com aumento do desemprego, e a alta inflação foram resultantes das políticas adotadas por Levy e avalizadas por Dilma. Embora passível de discussão, a recessão e a inflação foram, no mínimo, agravadas pela busca de austeridade em meio a enorme incerteza política e debilidade econômica. De todo modo, a linha de política econômica adotada faz brotar críticas daqueles que votaram em Dilma. Seu nível de apoio político atingiu níveis assustadoramente baixos. A presidenta ficou quase só.

    No entanto, não sabíamos, imaginávamos, mas não tínhamos certeza, das movimentações subterrâneas que agora são trazidas à luz pelas gravações que têm sido divulgadas. As medidas contrárias aos direitos sociais adotadas pelo governo interino e as revelações gravadas culpando Dilma por não interceder nas investigações de corrupção dão as cores do golpe em curso.
    Ressaltemos que nunca houve tanta liberdade para que a Polícia Federal, o Ministério Publico e o Judiciário investigassem – o governo Dilma é o primeiro a abrir tamanho espaço.

    Vamos lembrar que o delator Delcídio afirmou que quem detinha o poder em Furnas era Eduardo Cunha e que Dilma o desalojou. Delcídio afirma ser essa a razão da vingança do ex-presidente da Câmara. As gravações mostram, ainda, o presidente do Senado, Renan Calheiros, revelando com grande ênfase a ira dos ministros do Supremo Tribunal Federal com a presidenta.

    A crença na independência do Judiciário, cantada em verso e prosa, fica absolutamente abalada e carente de explicações, quando o ex-presidente Sarney promete a Sérgio Machado que, sem advogado, não o deixará cair nas mãos de Sérgio Moro. As cartas da operação Lava-Jato são dadas pelos mais corruptos políticos?

    As gravações “acusam” Dilma, sobretudo, de ter “deixado” as investigações da Lava-Jato se aprofundarem demais. Sarney e Machado, na gravação divulgada em 25/05, concordam que Dilma não se “solidarizou” nem com Lula. As revelações da investigação atingiram fortemente o Partido dos Trabalhadores e a base de sustentação do governo e trouxeram à luz esquemas de corrupção que, de fato, viscejaram nos governos petistas. A grande imprensa e a oposição foram extremamente eficientes em criar a impressão de que havia corruptos apenas no Partido dos Trabalhadores. Aproveitaram-se da imagem já arranhada do partido por conta do mensalão.

    Vamos montar o mosaico?

    Dilma foi reeleita. A campanha sistemática dos meios de comunicação tradicionais mobilizou grande parte da classe média e elites econômica e política na oposição a ela. Ela tentou um programa econômico conciliador, mas perdeu apoio de quem a elegeu, sem conseguir novos apoios. Nenhuma medida que enviou ao Congresso, para fazer frente à crise econômica, foi aprovada. Sem holofotes, políticos e empresários investigados ou temerosos com as investigações tramaram sua queda. Contavam com a ira do Judiciário contra ela. “Não tem nenhuma saída para ela”, profetizou Sarney para o delator Sérgio Machado.

    Não contavam, no entanto que, mesmo com críticas profundas ao Partido dos Trabalhadores, diversos setores perceberíamos o golpe. Percebemos a seletividade e a morosidade suspeitas do Judiciário, percebemos o rancor que Dilma gerou nos políticos por não impedir as investigações, percebemos o enfurecimento da elite econômica e da classe média por garantir direitos sociais aos mais pobres, percebemos quantos investigados compõem o governo interino, percebemos que a democracia está suspensa. Percebemos, com os primeiros atos do governo interino, que conquistas importantes na renda dos mais pobres, na habitação, na cultura, na saúde, na educação, estão sendo destruidas.

    Percebemos o golpe e decidimos enfrentá-lo. Não tem mesmo saída para ela?