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Tag: Crise da Saúde

  • O modo de funcionamento da humanidade entrou em crise

    O modo de funcionamento da humanidade entrou em crise

     

     

     

     

    Em entrevista exclusiva, o líder indígena Ailton Krenak reflete sobre o significado da pandemia e faz um alerta:“Se voltarmos à chamada ‘normalidade’, não valeram de nada as mortes de milhares de pessoas”

     

     

     

     

     

     

    O mundo está em suspensão. O momento é de recolhimento, de silêncio. A experiência do isolamento social, para enfrentar o horror do novo coronavírus, pode trazer lições valiosas à humanidade. “Se essa tragédia serve para alguma coisa é mostrar quem nós somos. É para nós refletirmos e prestar atenção ao sentido do que venha mesmo ser humano. E não sei se vamos sair dessa experiência da mesma maneira que entramos. Tomara que não”, afirma o escritor Ailton Krenak, de 66 anos, um dos mais destacados ativistas do movimento socioambiental e de defesa dos direitos indígenas e doutor honoris causa pela Universidade de Juiz de Fora.

    Recolhido em sua aldeia no Rio Doce, o autor de Ideias para adiar o fim do mundo (Companhia das Letras) observa que o ser humano descolou-se da natureza e da sintonia com a terra, “devorada” por grandes corporações que controlam os recursos financeiros do planeta e persistem na concepção europeia colonizadora de que exista uma “humanidade”, enclausurada na maior parte de sua vida em ambientes artificiais. “Essa chamada humanidade, na verdade, constitui um grupo seleto que exclui uma variedade de sub-humanidades, caiçaras, índios, quilombolas, aborígenes, que vivem agarradas à terra, aos seus lugares de origem, que são coletivos vinculados à sua memória ancestral e identidade. Esse grupo exclui também 70% das populações arrancadas do campo e das florestas, que estão nas favelas e periferias, alienadas do mínimo exercício do ser, sem referências que sustentam a sua identidade. São lançadas nesse liquidificador chamado humanidade”, acredita.

    Para Ailton Krenak, os seres humanos têm neste isolamento social pelo qual passa a maior parte do planeta uma oportunidade para a pausa e correção de rumos: “Todos precisam despertar. Se, durante um tempo, éramos nós, os povos indígenas, que estávamos ameaçados de ruptura ou da extinção dos sentidos das nossas vidas, hoje estamos todos diante da iminência de a terra não suportar a nossa demanda. Tomara que, depois de tudo isso, não voltemos à chamada ‘normalidade’, pois se voltarmos é porque não valeu nada a morte de milhares de pessoas no mundo inteiro. Aí, sim, teremos provado de que a humanidade é uma mentira”. A seguir, mais trechos da entrevista exclusiva com o escritor.

    No início do livro Ideias para adiar o fim do mundo, o senhor introduz uma discussão que parte da indagação: Somos mesmo uma humanidade?.O senhor poderia responder à esta provocação, particularmente mais intrigante nestes tempos de pandemia: somos uma humanidade?

    Eu penso que essa pergunta fica em suspenso. Vivemos esta experiência de isolamento social, como está sendo definida a experiência do confinamento, em que o mundo inteiro tem de se recolher. Ao mesmo tempo, assistimos a uma tragédia de gente morrendo em diferentes lugares do mundo, ao ponto de na Itália os corpos serem colocados em caminhões para incinerar, sem sequer ser identificados. Essa dor, talvez ajude as pessoas a responder a essa pergunta. Nós nos acostumamos com a ideia de que somos uma humanidade. Embora a ideia tenha sido naturalizada, ninguém mais presta atenção ao sentido do que venha mesmo ser humano. É como se tivéssemos várias crianças brincando que, por imaginar essa fantasia da infância, continuassem a brincar por tempo indeterminado. Viramos adultos, estamos devastando o planeta, cavando um fosso gigantesco de desigualdades entre povos e as sociedades. De modo que há uma sub-humanidade que vive uma grande miséria, sem chance de sair dela. Isso também foi naturalizado. O presidente da República disse outro dia que brasileiros vivem no esgoto. Esse tipo de mentalidade doente está dominando o planeta. E veja agora esse vírus, um organismo do planeta, responder a essa alienação dos humanos com um ataque à forma de vida insustentável que adotamos por livre escolha, essa fantástica liberdade que todos adoram reivindicar, mas ninguém se pergunta sobre o seu preço. Veja que esse vírus está discriminando essa humanidade. Ele não mata pássaros, ursos, nenhum outro ser, apenas humanos. Apenas a humanidade está sendo discriminada. Quem está em pânico são os povos humanos, o modo de funcionamento deles entrou em crise. Consolidaram esse pacote que é chamado de humanidade, que vai sendo descolada de uma maneira absoluta desse organismo que é a Terra, vivendo numa abstração civilizatória que suprime a diversidade, nega a pluralidade das formas de vida, de existência e de hábitos. Os únicos núcleos que ainda consideram que precisam ficar agarrados nessa terra são aqueles que ficaram meio esquecidos pelas bordas do planeta, nas margens dos rios, nas beiras dos oceanos, na África, na Ásia ou na América Latina. Esta é a sub-humanidade: caiçaras, índios, quilombolas, aborígenes. Existe, então, uma humanidade que integra um clube seleto, vamos dizer, bacana. E tem uma camada mais rústica e orgânica, uma sub-humanidade, que fica agarrada na terra. Eu não me sinto parte dessa humanidade. Eu me sinto excluído dela. Por isso digo, no livro, que é um clube, seleto, que não aceita novos sócios.

    Filosoficamente, como interpreta a pandemia que acomete o mundo?

    Estamos há muito divorciados desse organismo vivo que é a Terra. Do nosso divórcio das integrações e interações com a nossa mãe, a Terra, resulta que ela está nos deixando órfãos, não só os que em diferente graduação são chamados de índios, indígenas ou povos indígenas, mas todos. Enquanto a humanidade está se distanciando do seu lugar, um monte de corporações espertalhonas tomam conta e submetem o planeta: acabam com florestas, montanhas, transformam tudo em mercadorias. Fomos, durante muito tempo, embalados com a história de que somos a humanidade e nos alienando desse organismo de que somos parte, a Terra, e passamos a pensar que ele é uma coisa e nós, outra: a Terra e a humanidade. Eu não percebo onde tem alguma coisa que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza. Nós, a humanidade, vamos viver em ambientes artificiais produzidos pelas mesmas corporações, que são os donos da grana. Agora, já imaginou que esse organismo, o vírus, possa também ter se cansado da gente e nos “desligado”? Sabe como faz isso? Tirando o nosso oxigênio. Dizem que a COVID-19, quando evolui para os pulmões, se não tiver bomba, aparelho para alimentar de oxigênio, a pessoa morre. Quantas máquinas dessa vamos ter de fazer? Para 6 bilhões de pessoas na terra? A nossa mãe, a Terra, dá de graça o oxigênio, põe a gente para dormir, desperta de manhã com sol, dá oxigênio, deixa pássaros cantar, as correntezas, as brisas, cria esse mundo maravilhoso para compartilhar, e o que a gente faz com ele? Isso pode significar uma mãe amorosa, que decidiu fazer o filho calar a boca pelo menos por um instante. Não é porque não goste dele, mas quer ensinar alguma coisa para ele. Filho, silêncio. A Terra está falando isso para a humanidade. E ela é tão maravilhosa que não é ordem imperativa. Ela simplesmente está dizendo para a gente: silêncio. Esse é também o significado do recolhimento.

    aldeia Lahatuha – origem Kuikuro – Alto Xingu/por helio carlos mello©

    Os idosos, chamados de grupo de risco, em algumas abordagens são lembrados como algo descartável – do tipo, “alguns vão morrer”, como algo inevitável. Como avalia esta abordagem que parece arrancar toda e qualquer humanidade do indivíduo, tornando-o uma estatística?

    Esse tipo de abordagem cria uma insegurança afeta as pessoas que amam os idosos, que são avós, pais, filhos, irmãos de outras pessoas, que estão na idade útil de trabalho. É uma palavra insensata, não tem sentido que alguém em sã consciência faça comunicação pública dizendo ‘alguns vão morrer’. É uma banalização da vida, mas também é uma banalização do poder da palavra. Pois alguém que faz uma emissão dessa está pronunciando a condenação. Seja diretamente dirigida a alguém em idade avançada, com 80, 90, 100 anos. Sejam os filhos, netos, ou todas as pessoas que têm afeto uns com outros. Imagine se vou ficar em paz pensando que minha mãe ou meu pai podem ser descartados. Eles são o sentido de eu estar vivo. Se eles podem ser descartados eu também posso. Olhando para além do Brasil, mirando o mundo, Foucault tem uma obra fantástica: Vigiar e punir. Nesse livro, diz que essa sociedade de mercado que vivemos, essa coisa mercantil, só considera o ser humano útil quando está produzindo. Com o avanço do capitalismo, foi criado um instrumento que é o de deixar viver e o de fazer morrer: quando deixa de produzir, passa a ser um custo. Ou você produz as condições para você ficar vivo ou produz as condições para você morrer. Essa coisa que conhecemos como a Previdência, que existe em todos os países com economia de mercado, ela tem um custo. Os governos estão achando que, se morressem todas as pessoas que representam custo, seria ótimo. Isso significa dizer: pode deixar morrer os que integram os grupos de risco. Não é ato falho de quem fala, a pessoa não é doida, é lúcida, sabe o que está falando.

    Ailton Krenak encontra Tom Zé, especulam do mundo, refletem, escaramuçam / helio carlos mello©

    Como está a sua rotina, agora com o isolamento social? 

    Parei de andar mundo afora, suspendi compromissos. Estou com a minha família na aldeia krenak, no Médio Rio Doce. Já estávamos aqui de luto com o nosso Rio Doce. Não imaginava que o mundo faria esse luto conosco. Está todo mundo parado. Todo mundo. Quando os engenheiros me disseram que iriam usar a engenharia, a tecnologia para recuperar o Rio Doce, perguntaram a minha opinião. Eu disse: a minha sugestão é impossível de colocar em prática. Pois teríamos de parar todas as atividades humanas que incidem sobre o corpo do rio, a 100 quilômetros na margem direita e esquerda do rio, até que voltasse a ter vida. O engenheiro me disse: ‘Mas isso é impossível’. O mundo não pode parar. E o mundo parou. Desde muito tempo a minha comunhão com tudo o que chamam de natureza é experiência que não vejo muita gente que vive na cidade valorizando. Já vi pessoas ridicularizando, ele conversa com árvore, abraça árvore, conversa com o rio, contempla a montanha, como se isso fosse uma espécie de alienação. Essa é a minha experiência de vida. Se é alienação, sou alienado no sentido comum que as pessoas. Há muito tempo não programo atividades para depois. Temos de parar de ser convencidos. Não sabemos se estaremos vivos amanhã. Temos de parar de vender o amanhã.

    Agora o prognóstico, ou algo do tipo: se continuarmos ao ritmo de sempre, em sua avaliação, que fim nos aguarda?

    O ritmo de hoje não é o da semana passada nem o do ano novo, do verão, de janeiro ou fevereiro. O mundo está agora numa suspensão. E não sei se vamos sair dessa experiência da mesma maneira que entramos. Desconfio que não vai ser a mesma coisa depois. Se tiver depois. Tem muita gente que suspendeu projetos, atividades que estavam fazendo. As pessoas acham que basta mudar o calendário. Estão enganadas. Pode não haver o ano que vem. Em artigo que li sobre a pandemia, o sociólogo italiano Domenico de Masi cita a obra profética A peste, de Albert Camus: a peste pode vir e ir embora sem que o coração do homem seja modificado. Ele cita trecho inteiro do romance em que o personagem diz, aquele bacilo que trouxe aquela mortandade, que parece que tinha sido dominado, podia continuar oculto em alguma dobra, algum corrimão, janela, poltrona, só esperando o dia em que, infortúnio ou lição aos homens, a peste acordará seus ratos para mandá-los morrer numa cidade feliz. Este vírus que nos ameaça não é o mesmo na China, na Itália, nos Estados e no Brasil. Ele muda. E se muda, não sabemos o que é. Então seria muito bom parar de fazer projetos para amanhã, para o ano que vem e nos ater ao aqui e agora. Não tenho certeza nenhuma se no ano que vem tudo vai continuar a acontecer como se nada tivesse mudado. E tomara que não voltemos à normalidade, pois se voltarmos é porque não valeu nada a morte de milhares de pessoas no mundo inteiro. Aí, sim, teremos provado que a humanidade é uma mentira. Se essa tragédia serve para alguma coisa, é nos mostrar quem nós somos. Estamos em suspensão. Vamos ver o que vai acontecer.

    cosmovisão das águas – helio carlos mello©

    Quais são as suas ideias e inspirações para adiarmos o fim do mundo?

    Precisamos ser críticos a essa ideia plasmada de humanidade homogênea em que o consumo tomou o lugar daquilo que antes era cidadania. Para que cidadania, alteridade, estar no mundo de uma maneira crítica e consciente, se você pode ser um consumidor? Essa ideia dispensa a experiência de viver numa terra cheia de sentido, numa plataforma para diferentes cosmovisões. Boaventura de Sousa Santos nos ensina que a ecologia dos saberes deveria também integrar nossa experiência cotidiana, inspirar nossas escolhas sobre o lugar em que queremos viver, nossa experiência como comunidade. Nosso tempo é especialista em criar ausências: do sentido de viver em sociedade, do próprio sentido da experiência da vida. Isso gera uma intolerância muito grande com relação a quem ainda é capaz de experimentar o prazer de estar vivo, de dançar, de cantar. E está cheio de pequenas constelações de gente espalhada pelo mundo que dança, canta, faz chover. O tipo de humanidade zumbi que estamos sendo convocados a integrar não tolera tanto prazer, tanta fruição de vida. Então, pregam o fim do mundo como uma possibilidade de fazer a gente desistir dos nossos próprios sonhos. E a minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar mais uma história. Se pudermos fazer isso, adiaremos o fim. Como os povos originários do Brasil lidaram com a colonização, que queria acabar com o seu mundo? Quais estratégias esses povos utilizaram para cruzar esse pesadelo e chegar ao século 21 ainda esperneando, reivindicando e desafinando o coro dos contentes? Vi as diferentes manobras que os nossos antepassados fizeram e me alimentei delas, da criatividade e da poesia que inspirou a resistência desses povos.

  • Documentário “Na fila do SUS” traz o impacto do sucateamento da saúde pública no Brasil

    Documentário “Na fila do SUS” traz o impacto do sucateamento da saúde pública no Brasil

    texto: Pedro Santi, para os Jornalistas Livres

    Saúde. Direito básico do cidadão

    Os serviços públicos são interesse popular, e boa parte do povo brasileiro necessita deles para sobreviver. Com o SUS (Sistema Único de Saúde) não é diferente – saúde é um direito básico de todo cidadão e em tempos de calamidade, como a pandemia do coronavírus, fica mais evidente a necessidade de um bom serviço de saúde pública. O Documentário “Na fila do SUS”, dirigido pela profissional e pesquisadora da área Ellen Francisco, retrata o impacto que o sucateamento do SUS têm na vida dos brasileiros mais vulneráveis socialmente.

    Manifestação contra o sucateamento do SUS

    “Na fila do SUS”. São Paulo, Rio e Amazônia

    Reconhecendo o sistema único de saúde como uma luta popular, a obra apresenta essa reflexão a partir de três diferentes situações e regiões do Brasil. Em São Paulo, o foco é com moradores de rua e dependentes químicos. A cidade não tem hoje políticas públicas para essa população, e isso implica em falta de ações como redução de danos e ressocialização. Pessoas em situação de rua vivem em constante ameaça de doenças respiratórias e dermatológicas, como tuberculose e escabiose, além de doenças psicológicas, fruto da falta de cuidado com a saúde mental dessas pessoas.

    No Rio de Janeiro, o debate gira em torno da precarização da atenção primária nos postos de saúde e hospitais. As Clínicas da Família sofreram com esse desmonte e isso gerou uma crise na rede. Funcionários com meses de salários atrasados e pacientes relatando superlotação e restrição de atendimento. Consequência direta da desestruturação do atendimento básico.

    Por último, “Na fila do SUS” denuncia a influência do agronegócio nas áreas de preservação ambiental da Amazônia. E o impacto disso na saúde dos povos indígenas. Como o sucateamento do SESAI (Secretaria Especial de Saúde Indígena) e a transferência para os precários serviços de saúde da rede municipal, a região carece de atendimento de qualidade para esse povo que vem sofrendo com doenças causada pelos impactos ambientais.

    “Na Fila do SUS é uma iniciativa para debatermos a importância da saúde pública e do SUS na vida do povo brasileiro. Se a situação já estava difícil em diversas capitais, agora em tempos de Coronavírus a coisa ganhou ares desesperadores. É uma produção urgente para mostrar que tem muita gente defendendo o SUS e a saúde pública.” diz Vito Ribeiro, roteirista do filme.

    Agentes comunitários da saúde participam de manifestação a favor do SUS

    Luta de classes na saúde

    O documentário, com a opinião de pesquisadores e acadêmicos especialistas no assunto, traz essa crítica ao poder político que precariza e limita a capacidade do SUS de atender os menos favorecidos. Dentre os responsáveis estão os planos de saúde privados, empresas, partidos e candidatos políticos – os interesses particulares nesse meio acabam causando esse desmonte, e milhões de brasileiros são prejudicados.

    A previsão para o lançamento de “Na fila do SUS” é de junho de 2020, na plataforma de documentários independentes Bombozila. O projeto faz parte de uma campanha de financiamento coletivo – para colaborar, basta entrar na página da vaquinha online e apoiar. O documentário também pode ser encontrado no instagram: @NaFiladoSus. Confira o trailer abaixo:

     

    https://www.youtube.com/watch?v=fTkq9BNu3Uc

  • Saúde indígena

    Saúde indígena

    Lideranças indígenas protestam contra as palavras do atual Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), que anunciou sua pretensão de extinguir a SESAI – Secretaria Especial de Saúde Indígena. Mandetta se pronunciou na Comissão de Constituição e Justiça, dizendo que transformará a SESAI em departamento, inserido numa  Secretaria de Atenção Primária.

     

    A assistência à saúde dos povos indígenas está na hora do caos, anunciam as lideranças dos índios, após ouvirem o pronunciamento do ministro Mandetta. Um grande retrocesso e negação de direitos aos povos indígenas, dizem as lideranças,  será uma grande batalha, a luta continua, pois os povos indígenas foram , são e serão sempre resistência às barbaridades de um sistema cruel e perverso, que ao invés de dar uma melhoria na qualidade de vida dos povos originários do país, promove o retrocesso e a negação dos direitos adquiridos dos povos indígenas. As CASAIs (Casa de Saúde Indígena) da cidade de  São Paulo  e Brasília já suspendem o acolhimento a indígenas que necessitam de abrigo nos grandes centros urbanos, para procedimentos e tratamento. Trabalhadores da saúde indígena estão a três meses sem receber salários.

     

     

    O Brasil conta com 34 DSEIs (Distrito Sanitário Especial Indígena), divididos por critérios territoriais, para adotar medidas qualificadas de atenção à saúde dos povos originários. No Brasil, os povos indígenas compõem 305 etnias, falam 274 línguas e totalizam, aproximadamente, 897 mil indivíduos a serem atendidos pela SESAI.  No atual modelo de saúde indígena, por meio da SESAI, o governo federal desenvolve ações de atenção integral à saúde indígena – sobretudo atenção básica – em consonância com programas do SUS (Sistema Único de Saúde) e práticas de saúde tradicionais indígenas em todo o país.

     

     

    Trata-se de um Subsistema de Saúde Indígena no interior do SUS articulado pela secretaria especial em parceria com órgãos vinculados ao Ministério da Saúde e voltados à atuação local, como os 34 DSEIs espalhados pelo território.

     

     

     

                                                                                                                                                                                Mariana Vick, do Nexo Jornal, escreve:

     

    A política de saúde indígena

     

     

     

     

    O QUE É O SUBSISTEMA

     

    Atribui-se a sigla SasiSUS ao Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, rede específica de serviços de saúde em âmbito federal. O SasiSUS foi criado em 1999, por meio da Lei Arouca, como forma de atender às especificidades sociais e epidemiológicas das populações indígenas. Desde 2010, a Sesai coordena o subsistema.

     

    COMO ELE SE ARTICULA

     

    Uma das principais características do atual modelo de gestão de saúde indígena são os DSEIS, unidades gestoras locais divididas a partir de critérios territoriais, com base na localização de comunidades indígenas. No total, são 34 em todo o país. Além dos DSEIS, a estrutura de atendimento local para a população indígena abrange postos de saúde, polos base (administrativos) e as chamadas Casas de Saúde Indígena.

     

    QUAIS SÃO SEUS SERVIÇOS

     

    A atenção básica (ou atenção primária) está no primeiro nível de atenção dos sistemas de saúde. Caracteriza-se por ações no âmbito individual e coletivo voltadas à promoção da saúde (como programas de educação) e à prevenção, ao tratamento e à reabilitação de agravos.

     

    O atual modelo de gestão atende a parâmetros da Política Nacional de Saúde Indígena, documento de 2002 que garante aos povos indígenas atenção integral à saúde, contemplando sua diversidade sociocultural e admitindo a participação das comunidades para controle dos serviços.

     

    Algumas facilidades do modelo são a proximidade das unidades de saúde com comunidades indígenas, a presença de equipes aptas para lidar com esses grupos e a manutenção dos trabalhadores nos DSEIS, mais resistentes a mudanças políticas que estados e municípios.

     

    Além de ações voltadas à atenção em saúde, a Sesai coordena ações de saneamento e edificações em regiões onde vivem grupos indígenas. É responsável também por articular com estados, municípios e ONGs outras ações em saúde e fortalecer o controle social sobre o setor.

     

    Por que a saúde indígena é diferente

    A política diferenciada de saúde indígena baseia-se no princípio constitucional de que cabe ao Estado assegurar aos povos originários suas culturas, cosmovisões e organizações sociais – devendo garantir, portanto, um sistema de saúde adequado a seus modos de vida.

     

    “Os povos indígenas têm direito a suas próprias medicinas tradicionais e a manter suas práticas de saúde, bem como desfrutar do nível mais alto possível de saúde, e os Estados devem tomar as medidas necessárias para atingir progressivamente a plena realização deste direito”

    Organização das Nações Unidas na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, documento aprovado em 2007

     

     

     

    “Para os povos indígenas, a saúde está intimamente relacionada com a Mãe Terra e uma relação equilibrada entre os seres vivos e a natureza. […] [seus sistemas de saúde] articulam diversos aspectos da sua organização social e da sua cultura, a partir do uso das plantas medicinais, dos rituais de cura e das práticas de promoção da saúde”

     

     

     

     

     

    Conselho Indigenista Missionário em encarte educativo sobre saúde indígena, de 2015

     

    No Brasil, a constituição de uma política diferenciada deve se basear na troca de experiências entre equipes médicas e comunidades e na gestão participativa no sistema de saúde, segundo lideranças indígenas. O modelo também estaria relacionado à demarcação de terras, consideradas essenciais para “a vida em seu sentido pleno”.

     

    A gestão da saúde indígena foi transferida ao governo federal tanto pela capacidade técnica da União, maior responsável pela política indigenista, quanto por seu montante de recursos – necessários, por exemplo, para a manutenção de ações permanentes em áreas geralmente remotas. Além disso, o governo não está envolvido em conflitos fundiários que afetam indígenas e lideranças políticas locais.

    As particularidades do atendimento de saúde indígena

     

    CULTURA

     

    O atendimento médico em comunidades indígenas caracteriza-se pelo que se chama de uma “situação de transculturação”, a partir do contato entre o sistema médico oficial e sistemas tradicionais de cura desenvolvidos pelas populações originárias. A “sobreposição” de ambas as medicinas envolve conflitos de compatibilização entre a equipe médica e o grupo atendido, diz artigo de 1989 da Fiocruz. Nesses casos, é importante haver mediação antropológica tanto no acompanhamento de programas de saúde quanto na formação de pessoal na área.

     

    GEOGRAFIA

     

    A maior parte das comunidades indígenas está no Centro-Oeste e na Amazônia, vivendo em aldeias distantes, esparsas e de baixa densidade demográfica. Isso implica dificuldades de acesso que, somadas à deficiência de recursos e de infraestrutura, exigem a articulação de um sistema de comunicações permanente, a fim de dar continuidade a ações (em saúde, por exemplo) voltadas a essas populações.

     

    PERFIL EPIDEMIOLÓGICO

     

    As comunidades indígenas costumam apresentar perfil epidemiológico diferente das não indígenas no Brasil. Incidências maiores de desnutrição, DSTs, doenças negligenciadas e enfermidades preveníveis tendem a ser comuns entre essas populações, devido a más condições sanitárias onde a maior parte delas vive e a dificuldade de acesso a serviços de saúde. Mudanças sociais, econômicas e ambientais também podem levar ao aumento de doenças crônicas (câncer, hipertensão, diabetes) e mentais (alcoolismo, suicídio) entre grupos que têm contato com áreas urbanas. São fatores diretos para esse quadro as transformações aculturativas em seus modos de vida, o estresse social e a marginalidade econômica.

     

    O que diz a experiência

     

     

     

    Antes da criação da Sesai, a saúde indígena era organizada, desde 1999, pela Funasa (Fundação Nacional de Saúde), agência federal responsável por criar políticas na área sanitária, além de atuar por prevenção e combate a doenças e atenção para populações carentes.

     

    Ainda que contasse com a estrutura do Subsistema de Saúde Indígena e os DSEIS – semelhanças com o paradigma atual -, o modelo antigo incluía convênios com municípios e com organizações destinadas a realizar serviços de atenção, prevenção e saneamento. A ideia era considerada uma “solução temporária” para as deficiências em saúde.

     

    Ao longo do tempo, lideranças indígenas consideraram que a manutenção do modelo havia tornado “figurativos” conselhos de participação e “inócuas” deliberações de movimentos organizados ligados à saúde. A falta de controle social resultou em piora da qualidade dos serviços.

     

    Em 2004, a execução direta do atendimento em saúde foi recuperada pelo governo federal, e às conveniadas sobrou o papel de contratar pessoal, fornecer insumos às aldeias e deslocar indígenas de sua residência até equipamentos de saúde distantes, por exemplo.

     

    Além da “falta de controle de recursos” concedidos a ONGs para essas atividades, os problemas de agora, segundo o ministro da Saúde, envolvem o alto volume de indicações políticas nos DSEIS.

     

    Para líderes e organizações do setor, no entanto, o repasse da responsabilidade pela saúde para estados e municípios não resolve problemas como esses – o ideal seria corrigi-los no sistema federal.

    O site do CIMI (conselho indigenista missionário) hoje divulgou porque a proposta de municipalizar a saúde indígena é um erro e está sendo combatida pelos povos indígenas:

     

    Neste momento, passados quase 20 anos da publicação da lei Arouca, que criou o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, os povos indígenas seguem na incerteza e insegurança quanto ao modo como se assegurará a atenção à saúde no governo Bolsonaro. Mesmo depois de terem sido realizadas cinco Conferências de Saúde Indígena, e nelas terem sido estabelecidas diretrizes e propostas para as políticas, pouco se avançou no sentido de consolidação de um modelo de atenção à saúde: diferenciado e participativo. Segue-se por um caminho sem direção determinada, e o mais grave, desconsiderando as discussões já realizadas em etapas locais e distritais da 6ª Conferência Nacional de Saúde dos Povos Indígenas, que ocorreram em 2018, nas quais se priorizou a discussão e elaboração de propostas tendo em vista o fortalecimento do Subsistema de Atenção à Saúde.

    Um dos pilares da 6ª Conferência Nacional de Saúde Indígena será a defesa da saúde como direito de todos, que só poderá ser garantida pela manutenção e fortalecimento do SUS. Entre os objetivos da conferência está a atualização da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, publicada em 2002, e a redefinição das diretrizes, no sentido de efetivamente levar em conta as particularidades étnicas e culturais no modelo de atenção à saúde dos povos indígenas. A conferência tem como tema central: “Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas: atenção diferenciada, vida e saúde nas comunidades indígenas”.

    Lamentavelmente, em meio à realização da 6ª Conferência, cuja etapa nacional se dará em maio de 2019, o governo federal anuncia mudanças nos rumos da política, propondo a municipalização e a estadualização da atenção à saúde aos povos indígenas, sem levar em conta as deliberações das conferências anteriores e, muito menos, as propostas que foram debatidas e aprovadas nas conferências distritais.

     

  • Jandira Feghali denuncia ministro da Saúde por mortes em hospitais públicos sucateados do RJ

    Jandira Feghali denuncia ministro da Saúde por mortes em hospitais públicos sucateados do RJ

    A situação trágica da Saúde no Estado do Rio de Janeiro já tem contornos de filme de terror, pela falta de médicos e insumos hospitalares. Já são dezenas de vítimas da incúria e da falta de verbas em hospitais do Estado. Um exemplo foi o que aconteceu com a paciente Maria Elizete Vanderley da Silva, de 77 anos, internada no Hospital Federal de Bonsucesso domingo, com hemorragia digestiva.

    Depois de esperar horas para ser intubada por um médico plantonista que deixou o hospital às 19h, ela sofreu uma parada cardiorrespiratória à 1h, quando não havia nenhum médico para socorrê-la. Morreu diante do pessoal da enfermagem, que no entanto não pôde ministrar nova medicação para dar conta do agravamento do quadro clínico da paciente.

    O óbito só foi constatado por volta das 9h do dia seguinte, pelo médico que havia chegado para o plantão geral. Durante oito horas, apesar de a enfermagem ter verificado a morte, o corpo da paciente ficou no leito, ligado a aparelhos.

    Leia a seguir a situação dramática do Rio, na representação da deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ), que cobra ação da Justiça, para que cesse o descalabro causado pelo ministro Ricardo Barros, preposto do golpista Michel Temer na Saúde.

     

     

     

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