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  • Samba, agoniza mas não morre

    Samba, agoniza mas não morre

    Por Patrícia de Matos

    Namur chegou com um pandeiro na mão e um cigarro na boca. Parecia se contentar com o cenário escolhido para a primeira entrevista desta reportagem: a escadaria situada na rua Treze de Maio, um dos lugares mais emblemáticos do tradicionalíssimo bairro do Bixiga, cravado no centro de São Paulo. Devagar, como quem comemora e, ao mesmo tempo, lamenta a rotina de quem tem horas de batuque pela frente, sobe os degraus para as primeiras fotos e se queixa: “o Bixiga mudou muito. Você saía aqui nas ruas e tinha casas noturnas, de samba tinham várias — Teleco-Teco, Igrejinha, Catedral do Samba, Boca da Noite. Cresci vendo Benito Di Paula iniciando carreira, trombando com Osvaldinho da Cuíca…”

    Namur Scaldaferri, líder do grupo Madeira de Lei, na escadaria da Treze de Maio. Foto Patrícia de Matos

    O saudoso é nada mais, nada menos, do que o responsável pela composição do samba-enredo que deu o primeiro título de escola campeã para a icônica Vai-Vai, em 1978. De lá para cá, foram 15 vitórias, das quais 7 são filhas diretas das inspirações musicais do filho de italianos. Os mais de 45 anos de samba de Namur Scaldaferri renderam um dos maiores suspiros boêmios e musicais da Bela Vista de hoje, o grupo Madeira de Lei. Formado por amigos que corriam pelas ruas quando meninos enquanto davam seus primeiros passos na música, o grupo realiza, há 11 anos, todas as sextas-feiras, o “Samba da Treze”, uma roda de samba de rua instalada na esquina da Conselheiro Carrão com a Treze de Maio.

    O som toca com uma técnica precária, acompanhado por uma multidão que canta alto, mal distribuída de forma caótica em uma rua disputada palmo a palmo por pessoas e automóveis. Jovens de classe média sedentos por uma dose de tradição se misturam a frequentadores da Vai-Vai e personagens como o Sol, que tem uma canção só para ele. Do outro lado da rua, há uma loja com focaccias e o seu letreiro é escrito em italiano. Pode-se ver a igreja da Achiropita, também, cujo padre se tornou um dos protagonistas de uma briga pelo fim da festa.

     

     

     

    Namur jovem na escadaria da Treze de Maio, o segundo da esquerda para a direita. Foto: arquivo pessoal

    O SAMBA CONTINUA?

    Foi de uns quatro anos para cá, segundo Carla Borges, a produtora do grupo, que o samba estremeceu. No dia 7 de julho de 2018, durante um dos inúmeros diálogos do Madeira de Lei com os órgãos públicos — no caso, a subprefeitura da Sé —, a organizadora conheceu um inquérito civil com reclamações sobre a atividade de todas as sextas. Nele, há denúncias de perturbação do sossego, uso de drogas, entre outras ocorrências.

    Carla Borges, produtora do Samba da Treze, minutos antes do batuque começar. Créditos: Patrícia de Matos

    A ação foi produto de um movimento composto pela igreja da Achiropita, a Associação Viva Treze e a Coordenadoria Estadual de Conselhos Comunitários (CONSEG). Esse foi o estopim de um embate de vários capítulos que envolvem o samba, o poder público e os comércios da região. Em um dos episódios, Carla chegou a ser multada em 20 mil reais pela realização do evento. Em outro, a Polícia Militar foi enviada para impedir a realização da festa que já tinha centenas de confirmados no Facebook.

    Há cerca de dois anos, Flávia March, Comandante do 11º Batalhão da Política Militar, começou a participar das reuniões junto ao Ministério Público a fim de, segundo ela, “buscar solução para o conflito, discutir o tema de forma pacífica, pois o diálogo e a mediação são a melhor solução.”

    Em uma das conversas com integrantes do Madeira de Lei, a policial teria advertido sobre “a necessidade de comunicação do organizador do evento junto aos órgãos públicos, no sentido de obter autorizações.” Alega, ainda, que o barulho se perpetua na rua após a apresentação do grupo, causando reclamações devido à “perturbação do sossego público (…), venda de bebidas alcoólicas a menores, uso de entorpecentes, golpes da máquina de cartão, furtos de celulares, entre outros.”

    O Samba da Treze não é a única atividade realizada no famoso quarteirão do Bixiga. Há, também, a festa da paróquia italiana que tem, entre seus patrocinadores, a rede Globo. Durante os dias de festividade, dezenas de barracas se misturam ao público do samba. As ruas são fechadas e as músicas e orações podem ser ouvidas a certa distância através de caixas de som instaladas no alto dos postes de luz.

    A presidente da coordenadoria, Patrícia Navarro, defende que “as duas festas (a da paróquia e a do samba) são distintas, mesmo porque a Achiropita acontece apenas uma vez no ano durante, aproximadamente, 10 dias.” A capitã Flávia diz que “não há qualquer distinção quanto ao tratamento, seja qual for o pleito junto à Polícia Militar. O que ocorre é que a Festa da Achiropita encontra-se no calendário da prefeitura.”

    Descendente de italianos, Namur costumava, ao longo de seus 60 anos de vida, frequentar a igreja da Achiropita, onde também foi batizado. Declara-se favorável à festa, mas questiona que “as barracas ficam na rua o mês inteiro, fecha todo o quarteirão. Aí pode. Não sei se é porque é uma festa italiana e a nossa é negra. A gente começa a pensar, porque a nossa festa é popular, de origem negra e de participação dos menos favorecidos. Aqui não importa se você chega de Mercedes ou de chinelo de dedo.”

    Músicos do grupo Madeira de Lei, no auge da apresentação. Créditos: Patrícia de Matos

    ESCRAVIDÃO, SEDE E FOME NO DNA DO BIXIGA

    Com 75 ruas — onde estão 860 imóveis tombados — e 1,5 quilômetros de diâmetro, o Bixiga é uma cidade interiorana, daquelas que você cruza de uma ponta a outra cumprimentando padeiros e vizinhos. Apesar da moda de prédios cada vez mais altos, uma parte do bairro parece ser uma fotografia de uma São Paulo que, no século 20, foi três — um vilarejo, uma grande cidade e uma metrópole.

    Hoje, o Rio Saracura corre embaixo de uma importante avenida do bairro — a 9 de julho. Em uma de suas extremidades, onde atualmente fica o Anhangabaú, vendiam-se escravos. Apesar de não ver mais o céu, o rio é testemunha dos que fugiam seguindo sua margem até onde fica a região da 14 Bis e da Vai-Vai. O lugar se configurou em um quilombo, pólo da cultura africana que fez do Bixiga uma das poucas zonas da época em que se viam, mais livremente, jogos de capoeira, ritmos africanos e, claro, o samba.

    Em uma São Paulo composta majoritariamente por negros — a cada três pessoas negras, uma era branca — o pano de fundo do projeto racista de branqueamento se conjugou com a nascente indústria que, por sua vez, provocou a substituição da força de trabalho escrava pela dos imigrantes italianos.

    Quem revela essa história é Paulo Santiago, fotógrafo e fundador do Museu do Bixiga. Ele conta que “os italianos começaram a se misturar com os negros, tanto que dos quinze títulos que a Vai-Vai ganhou, sete foram de sambas-enredo compostos pelo Namur, líder do Madeira de Lei e filho de italianos. Essa ligação dos negros com os italianos se deu de cara. São grupos barulhentos, muito musicais, muita coisa de comida.” Depois, vieram os nordestinos, resultando na composição social do bairro que conhecemos hoje. “Os negros fugiam da escravidão, os italianos fugiam da fome e os nordestinos, da seca”, fundamenta.

    Paulo Santiago, fundador do Museu do Bixiga. Créditos: Patrícia de Matos

    Na visão de Santiago, o bairro precisa de união. “A sociedade brasileira está dividida. Qualquer coisa vira uma guerra. Aí entra o MP e piora tudo (…) não adianta criar rivalidades, que não vai levar a nada. Nessa guerra, todos perdem.”

    SAMBA, O PATRIMÔNIO

    Em defesa do Samba da Treze, Namur diz que a festa segue o que a lei manda. “Antes da meia noite,  o samba acaba”, afirma. Neste horário, já estão a postos dezenas de ambulantes, dispostos a saciar a sede de milhares de baladeiros sedentos por diversão. É aí que a festa continua.

    Logo, outros bares, um do lado do outro, recebem o insaciável público do samba recém encerrado. Estes se somam aos que vão chegando de outros lugares e, de repente, a rua Treze de Maio vira um point mais parecido com a configuração de um bloco de carnaval.

    Paulo concorda com Namur. “Esse é um problema do psiu (a lei que determina limite de decibéis de acordo com o horário). Disseram que o psiu só trabalha até 22h porque não tem verba. Bem, eu acho que se tem esse problema, ele é do psiu, não dá para jogar em cima do Madeira de Lei.”

    Em meados de julho deste ano, o grupo deu um passo adiante na luta pela continuidade do show musical. Lançou um abaixo-assinado. Nele, dizem: “nós, moradores, comerciantes e frequentadores do Samba da Treze assinamos o presente abaixo-assinado no sentido de que a manifestação cultural praticada pelo Grupo Madeira de Lei (…) não oferece perturbação do sossego, degradação da rua (…) tão pouco algazarra e brigas, portanto, não nos opomos à continuidade do mesmo.”

    A movimentação política rendeu, entre outras manifestações de apoio, um Projeto de Lei, já em fase final de tramitação na Câmara Municipal de São Paulo, que torna o Samba da Treze Patrimônio Imaterial de capital paulistana. O projeto foi elaborado pelo vereador Toninho Vespoli (PSOL-SP). Em suas palavras, as “manifestações contrárias à festa se demonstraram um tanto preconceituosas.” O parlamentar diz que foi à roda de samba e que vê “o contrário do que afirmam: ali as pessoas transitam. Quando mais gente ocupando os espaços públicos, melhor. Fica muito mais perigoso quando a zona fica morta. O esvaziamento da cidade cria um ambiente propício para o perigo.”

    O vereador quer criar um ambiente de diálogo que estimule o consenso na região e enxerga na proposta, “além da garantia do reconhecimento de uma cultura do samba em São Paulo, que já é patrimônio imaterial do Brasil (…) o fomento ao turismo”. Ele acredita que a ação do Ministério Público foi autoritária, na medida em que “parece que, logo no começo, o MP já tomou um lado. O órgão poderia ser o espaço para esse diálogo, mas infelizmente não senti essa disposição deles.” Para ele, “falta a prefeitura assumir a sua responsabilidade em implementar políticas culturais voltadas para a região.”

    Em um cenário que parece um retrato de um tempo que se foi, as inúmeras disputas a céu aberto na esquina da Treze de Maio com a Conselheiro Carrão não deixam a desejar a nenhum roteiro da mais dramática novela das oito. Uma vez, o padre da igreja, depois de se envolver em brigas com bares vizinhos, chegou a ser ferido com uma faca.

    Ninguém parece querer falar baixo enquanto o samba toca, “sem arredar o pé”, como diz Namur. Camadas de história, afeto e ressentimento podem ser encontradas ali, na mesma esquina de sempre. A vida, naquele lugar, tem ritmo negro e cheiro de focaccia. Enquanto leis tramitam, cantineiros se revoltam e o poder público se contorce diante do nó cultural, oito cadeiras e um som precário são suficientes para puxar os milhares que, todas as sextas-feiras, esperam o início do primeiro batuque para espantar os fantasmas da semana. Namur profetiza: “É tradição, o samba continua.”

  • José Celso faz discurso histórico sobre Lula

    José Celso faz discurso histórico sobre Lula

    O Teatro Oficina Uzyna Uzona estava lotado para presenciar o lançamento do livro “Lula Livre – Lula Livro”, que reúne textos, ensaios, poesia, prosa, charges e fotos de 90 autores, com presenças ilustres como Eduardo Suplicy, Chico César, Alice Ruiz e muitos outros. O primeiro a discursar no evento foi o diretor do teatro e “anfitrião do evento”, José Celso. Seu discurso enfatizou a potência espiritual de Lula, sua alegria, seu talento para a política e a vida e sugeriu que nós devemos incoporar estas qualidades.

    Leia o discurso completo, transcrito a partir da gravação da transmissão ao vivo realizada pela Fundação Perseu Abramo:

    “Livro? Livro?
    Livro!
    Lula Livre! Livre! Livre!

    Realmente depende de cada um de nós esse momento. Cada um de nós livra o Lula. E tem que livrar porque o Lula é um talento extraordinário que surgiu na sociedade brasileira, na política brasileira. É um ator e um político extraordinário, só comparável a Getúlio e a Leonel Brizola. Ele faz parte da grande arte que é a política. E nesse momento, depois que ele conheceu a Sônia Guajajara, que pôs o dedo na cara dele e falou “Você não fez nada por nós”, ele sacou. Ele sacou o que é exatamente a importância das terras pros seres que cuidam da terra, não somente os indígenas. Os indígenas sagram as terras, têm essa sabedoria. Nós aqui do teatro, que vamos fazer 60 anos, também sagramos não só esse teatro, não só o entorno do Bixiga, do Parque-Rio das Artes do Bixiga. O bairro do Bixiga é um bairro sagrado e ele está ameaçado de ser exterminado agora porque houve um acordo entre os candidatos, o candidato a presidente da República Alckmin…

    (vaias)

    Não, não gasta muita energia não! Aquele cara é um chuchu de picolé. Não, calma.

    E o outro lá, o Dória.

    (vaias)

    Isso eu desafio o jornalismo a pesquisar. Saber como é que é o negócio. Porque é o seguinte: O Sílvio Santos sempre quis trocar o terreno dele, desde que foi tombado pelo IPHAN. Ele disse “Não quero empatar o serviço de você, nem quero que você empate o meu.” Ficamos amigos e tal, mas de repente, depois do Golpichmant, ele quer ter o monopólio do bairro do Bixiga para revitalizar o bairro. Revitalizar é a palavra que ele usa, mas a palavra certa é genocídio. Expulsar a população toda!

    A periferia central de São Paulo é um luxo! O Bixiga é a periferia central. Nesse lugar existe povo. O mesmo povo que está nas periferias existe aqui, e perto de teatros, cantinas, de uma vida vivida de uma maneira, que precisava sim de muito incentivo pras pessoas. As pessoas aqui são muito massacradas. Nós inclusive aqui no Teatro Oficina estamos na mesma onda do Lula Livre e do Parque Augusta.

    Isso não para.

    Mas acontece o seguinte: eu acho importante que algum jornalista tenha coragem de estudar o caso. Porque foi uma cessão de um bairro, a começar pelo teatro, pra massacrar um povo. Quer dizer, é uma coisa… Que a gente tá vivendo um momento! Nossa! Imagine arrochar a saúde! A saúde é a gente. É a vida. Arrochar a saúde por 20 anos! É ridículo acima de tudo. Nós não podemos permitir. Todo mundo tem pulsão de vida. Todo mundo quer viver, todo mundo quer viver com alegria. Você vê as ruas cheias de moradores de rua. Essa situação, eu não vou nem falar nela, porque estou nela, estou vivendo, nós todos estamos dentro dela.

    Mas nós temos uma coisa importante. Nós somos num certo sentido o renascimento. Porque o que tá aí é um quadrado morto. É uma fase do capitalismo imobiliário que traz o momento da maior corrupção do mundo que é a desigualdade. Nunca na história da humanidade houve tamanha desigualdade como existe hoje no mundo. Eles estão apavorados. Esses golpes todos, esse endireitamento do mundo é uma reação deles a todo movimento que veio desde… durante a ditadura, teve 68, movimentos subterrâneos, luta armada, a gente nunca permitiu isso, teve a constituição de 1988… E nós tivemos um momento luxuoso com o Lula.

    Imagina, o Lula! O Lula hoje em dia tem uma compreensão, eu chamo muita atenção pra isso porque é muito importante, nesse ato inclusive a gente pratica isso, é a cosmopolítica. Cosmopolítica é o momento em que você liga o social ao cósmico. O que é o cósmico? É o sol, é o ar que você respira, é a terra que você pisa. Não se trata de uma coisa espiritual é concreto. Tudo isso é concreto. E nós que estamos ameaçados, que estamos aqui há 60 anos, nós somos índios, nós sagramos esse lugar em que nós estamos e nós não admitimos isso.

    Então passa a ser uma luta, e o Lula representa uma luta de todos, pela vida!

    Por isso a política tem que ganhar uma coisa, tem que deixar a seriedade. Saber que a vida é trágica mas é cômica, é ridícula, dá pra rir, tem que rir, alegria é a prova dos 9! Sem alegria não se muda nada, com cara feia, cara de militante, isso já era! É verdade.

    (aplausos)

    A gente tem que entrar nas coisas de corpo e alma, inteirinho, a gente tem que se dar. A ideologia é uma coisa morta. Eu não tenho ideologia nenhuma, nem quero saber. Porque idéias, como disse Oswald de Andrade, levam as pessoas a queimar gente em praça pública, por idéias. São as idéias que nos dominam, as idéias abstratas, abstrações desse capitalismo que não nos reconhece como gente, como bicho humano, gente de verdade.

    O Lula realmente é um ser cosmopolítico. Porque é um cara que, como se diz na minha linguagem mais favorita, que sabe das coisas. O Lula sabe das coisas. Sabe.

    (aplausos)

    Ele não é só um político no strictu sensu, ele é, como tem a mulher da vida, a puta, ele é um homem da vida. Um ser da vida. Ele já passou por tudo que tinha pra passar. E agora ele tá passando por um momento fabuloso. Um movimento que se compara ao suicídio do Getúlio. Porque ele prefere ficar preso do que ser libertado e não poder concorrer. Ele tá lutando por uma causa e muita gente não compreende a grandeza dessa causa. Não compreende, não sabe, porque foi numa balela de um judiciário, que felizmente nos EUA não existe, mas um judiciário que atuamente é a ideologia dominante, do grande Moro.

    Moro? Morô? Moro, qualé? Não dá.
    (vaias)

    Nós fizemos uma peça do Artaud que se chama – Esse casaco aqui é de índio do México, Tarahumara, ele dizia – “Pra dar um fim no juízo de Deus”. A gente não precisa de juízo. A gente não precisa de juiz. Nós somos nossos juízes. A gente vive sob a tirania do juízo bíblico, sob a teoria do Freud, do super-ego, isto é, da polícia na cabeça. Não tem polícia nenhuma! Tira! Fica com o ego, o id e o inconsciente que já dá pra tudo. Não precisa ter polícia interna.

    Por isso a política tem que ganhar uma forma de alegria. A gente só vence se conseguir criar toda uma atmosfera de primavera. Se for uma primavera brasileira. É muito sério: a coisa mais desprezada do mundo chama-se teatro, até então. O próprio Oswald de Andrade quando escreveu o Rei da Vela disse: “A esse enjeitado, o teatro brasileiro.” Mas é que nas épocas como esta o teatro surge. Os teatros todos tão maravilhosos. Tão cheios de gente. Ontem eu vi uma peça extraordinária aqui. E há peças extraordinárias em todos os lugares. Ou seja, há um levante da condição humana. Do poder humano, do poder do bicho homem, ligado à natureza evidente, à natureza animal e vegetal. Quer dizer, é o momento de você assumir totalmente que você é um ser terráqueo, que você tem uma coisa chamada desejo e liberdade. São duas coisas que todo ser-humano tem. É uma coisa que tá acima de tudo e abaixo de tudo. Os baixo são muito importantes. A política precisa rebolar.

    Em Portugal a gente cantava: “Criar, criar, poder popular! Criar, criar, poder popular! A revolução faz quem cria com tesão! É debaixo pra cima! Ah! Ah! É de cima pra baixo! Ah! Ah!” E Portugal ia nessa, porque é uma revolução que ninguém conhece. (aqui ele fala sobre o golpe de Estado que aconteceu em Moçambique em 2017) Vai sair um livro que vai se mostrar um momento de democracia. E é um golpe que veio através televisão. De repente havia um movimento dos soldados, os soldados “unidos venceremos”, a televisão era livre, era uma janela aberta, eu tava montando um filme sobre Moçambique lá com o Celso Lucas, e de repente, estava num restaurante e entra uma imagem da Columbia Pictures e uma porção de enlatado brasileiro.

    Foi um golpe dado pela televisão. Uma coisa assim inacreditável. Era uma coisa que o mundo nem sabe disso. E nós tamos com um material todo que a gente tem que soltar porque a gente viveu isso, a gente sabe disso. Tem que virar livro também. Mas enfim.

    O que é mais importante é o que a gente vai recebendo no corpo através dessa revoluções todas. É o corpo humano junto ligado. Por exemplo, eles têm uma coisa muito bonita, por exemplo… Me dá as mãos. Vem cá Suplicy, vem cá chico. Vamos dar as mãos.

    Eles cantam assim. Todo mundo pode cantar, tamo junto.
    Tamo junto quer dizer, em uma das línguas de moçambique…

    E se todo mundo se der as mãos? Isso é teatro. Os corpos têm que estar juntos. Você tem que sentir o calor das pessoas. É isso que dá força. Juntos, o corpo junto e suingando. Olha aqui pra mim, olha a corrente! Corrente! Firma!

    (todos no Teatro Oficina dão as mãos e cantam juntos um canto moçambicano, em que Zé Celso emenda um “Lula Lá, Lula Livre”)

    Olha, o Lula é mais do que se vê nele. O Lula é um Xamã. Tem que ter a coragem de dizer essas coisas, porque é. Ele não tem só o poder de político no nível realista, de conchavo social. Ele é um poder humano.

    (No teatro, cantam “Olê, Olê, Olê, Olá, Lulá, Lulá!”, Zé Celso grita “Alegria!)

    Se o Lula falou que cada um… Mas não é idéia! Cada um é mais que uma idéia! A idéia não tem nada a ver. Aí eu discordo dele. Eu amo ele, acho ele um xamã, mas não é uma idéia, é incorporação, é macumba! Imagina! Se baixasse o talento do Lula em todos nós! Meu deus! E tem que baixar! O que tem que baixar em nós é a qualidade humana dele, a qualidade divina dele. O Lula é sagrado! O Lula é uma entidade muito forte. Eu acho que tem que começar a ver esse lado. Porque só o lado briguento da política às vezes não revela o poder político de uma tendência na sociedade.

    Essa sociedade não deve fazer cara feia, por favor! Você vê nos programas de esquerda, por favor! O programa do Haddad, eu vi ao mesmo tempo em que vi aquele daqueles bostas todos, com algumas exceções, mas era uma coisa que ficou entre o clube do PT. Não pode ser. Tem que ser aberto. Tem que ser aberto como é o Lula.

    Eu vou embora. Mas eu imploro pra que vocês acreditem que alegria é a prova dos 9 e encontrem motivos viscerais pra lutar. Não adianta ter motivos ideológicos. Motivos ideológicos, abstratos, não têm poder mais. O que tem poder é o poder humano, o poder da expressão da vida, da verdade da vida.

    Vida!
    Vida!

    É uma luta de vida e morte. É uma guerra, porque estão querendo nos matar. A gente tem que reagir com vida e tentar passar uma rasteira nessas pessoas. Tentar antropofagizar, comer toda essa porcaria e vomitar ou cagar ou abençoar. Abençoar é melhor.

    (aplausos)

    Olha, eu quis falar naquela hora porque eu queria implorar pra vocês cultivarem o amor, o humor e muito mais. O humor é imprescindível, a dança é imprescindível. O PT vai rebolar, porque o Lula rebola. O Lula tem jogo de cintura, ele vai, o Lula é grande. Então você tem que ter o Lula dentro, o Lula pinguço, com todos os defeitos humanos e todos as qualidades divinas. Então nós temos que observar esse lado e viver como ele. Seguir o exemplo dele no sentido vital. Claro, cada um na sua área, cada um na sua jogada, cada um do seu jeito, mas deixar essa coisa carrancuda da política de lado. Isso já morreu, é resto de stalinismo. Com todo amor, com toda sinceridade, eu acho que a gente tem que rir disso pra poder vencer isso.”

    *José Celso Martinez, diretor do Teatro Oficina, em sua sede, no dia 13 de Agosto de 2018, na ocasião do lançamento do livro Lula Livre – Lula Livro.

  • Com fogo, Doria Jr. manda arrancar 50 famílias do centro de SP

    Com fogo, Doria Jr. manda arrancar 50 famílias do centro de SP

     

     

    A violência e a crueldade do prefeito João Doria não tem limites. Neste sábado, por volta das 5 da manhã, agentes da Guarda Civil Metropolitana, acompanhados pelo pessoal do Rapa, da PM e do Corpo de Bombeiros, levaram a cabo, sem qualquer aviso prévio, o despejo de 50 famílias ou 200 pessoas, muitas das quais mulheres, deficientes físicos, idosos e crianças, que viviam nos baixios do viaduto Julio de Mesquita Filho, no tradicional bairro do Bixiga.

    “Eles não deram tempo nem pra gente pegar o material escolar das crianças. Roupas, documentos, alimentos, cobertores… foi tudo para o lixo”, diz a sem-teto Paula, auxiliar de limpeza e mãe de três crianças, todas matriculadas em escolas da região, há cinco anos vivendo embaixo do viaduto.

    A situação piorou quando se iniciou um incêndio em um dos barracos. Segundo os moradores, foi ateado pelos agentes do Rapa. Iniciou-se uma correria desesperada. De um lado, os moradores tinham de se esquivar da polícia, de outro, fugiam do fogo, enquanto tentavam salvar algumas coisas.

    Ainda segundo os moradores, muitas mães saíram com as crianças pela região com medo de perderem a guarda dos filhos, já que o Conselho Tutelar também apareceu para aterrorizar as famílias. O fogo foi controlado por volta das 8 horas da manhã, mas até as 17h, as famílias ainda estavam sem atendimento algum, jogadas como lixo nas calçadas.

    Sem casa, sem abrigo, sem socorro.

    Isso é a Cidade Linda de João Doria.

    Esse é o prefeito cruel da maior cidade do país!

    Os moradores, agora sem local pra ficar, pedem doações para que pelo menos consigam sobreviver.
    ?Panelas, copos, talheres;
    ?Comida: principalmente não perecíveis;
    ?Móveis: guarda-roupa, cômodas, mesas, cadeiras;
    ?Madeira para a construção de novas casas;
    ?Fraldas tamanho G;
    ?Roupas de criança;
    ?SAPATO DE CRIANÇA de 2 a 9 anos (as crianças estão descalças);
    ?Roupas de adulto;
    ?Sapatos de adulto;
    ?Mantas, colchões.

    PONTOS DE COLETA
    Teatro Oficina: Rua Jaceguai, 520 – Bela Vista, São Paulo – SP
    AL JANIAH . Rua Rui Barbosa, 269 – Bela Vista, São Paulo – SP

     

    Ponto de entrega: 

    Teatro Oficina: rua Jaceguai, 520 – Bela Vista, São Paulo /SP