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  • Desafios dos jornalistas na cobertura do Coronavírus em MT

    Desafios dos jornalistas na cobertura do Coronavírus em MT

    Estudantes de jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso fazem levantamento e análise da cobertura da pandemia de coronavírus em sites jornalísticos no estado
    Por: Beatriz Passos e Marcos Salesse

    Pela televisão, no rádio, celular ou em qualquer outro dispositivo é possível notar um crescimento considerável no número de notícias sobre o novo coronavírus. Desde 31 de dezembro de 2019, dia em que Wuhan, cidade chinesa considerada um dos epicentros da pandemia, registrou o seu primeiro caso todo o mundo voltou os olhos para esse que se tornaria o principal assunto diário.

    Ao passo que o vírus se espalhava rapidamente por diversas partes do globo, jornalistas presenciaram mudanças expressivas nas suas rotinas de trabalho, seja pelos telejornais mais longos, pela impossibilidade de fazer entrevistas presenciais, ou até mesmo nas dificuldades em conseguir informações oficiais precisas.

    Em Mato Grosso esta realidade não ficou distante, com redações menores e uma demanda por informação crescente, foi fácil encontrar relatos de profissionais de imprensa que tiveram dificuldades na hora de começar a cobrir o assunto no estado.

    Apesar do primeiro caso de Covid-19 ser confirmado pela Secretaria de Estado de Saúde (SES) em 20 de março, semanas antes já começavam a circular na imprensa possíveis casos subnotificados, ou seja, pacientes testados positivos, mas sem confirmação dos laboratórios credenciados pela Ministério da Saúde (MS).

    Entre a demora na apuração dos órgãos estaduais e as dificuldades no entendimento das informações extra-oficiais, surgia para o jornalista a dúvida sobre a real situação do estado frente ao avanço da pandemia, e também como isso seria transformado em notícia.

    Completando na próxima semana um mês desde a confirmação do primeiro caso do novo vírus no estado, já foram publicadas mais de mil matéria em quatro dos principais veículos digitais de Cuiabá, capital mato-grossense, dessas aproximadamente 55% refletem a realidade local.

    COBERTURA ONLINE

    Para a cobertura online existiram outros desafios para além da divulgação de informações, como a rapidez das publicações e descobertas das novidades. Por isso, em meio à atmosfera virtual, os jornalistas lidavam com a pressão de entender os dados e divulgá-los ao público no menor tempo possível.

    Segundo João, jornalista de um dos sites que cobrem política e cidadania em Mato Grosso, a necessidade de imediatismo compromete tanto o entendimento de como transmitir a notícia, quanto como as informações serão compreendidas pelo leitor.

    “É interessante fazer o recorte para o contexto do jornalismo online, no sentido de que nesta modalidade tem que se publicar notícias a todo momento. E nesse cenário de pandemia não foi diferente, porém era tudo novo, porque entre os jornalistas, como na população geral, não havia um entendimento muito claro sobre o assunto, o que causava um desencontro de discursos. Como foi o caso da maioria dos sites de Mato Grosso que cometeram alguns erros por falta de tempo de investigação dos dados”, explicou o jornalista.

    OS DESAFIOS DA COBERTURA

    “Vivemos em um paradoxo, se considerarmos totalmente confiáveis as fontes oficiais, corre o risco de sermos induzidos ao erro que eles querem que a gente cometa. Mas também se colocarmos tudo em suspensão, corremos o risco de ficarmos muito no escuro, sem muita base”, revelou Carlos, outro profissional de imprensa entrevistado pelo Com_Texto.

    A fala do jornalista demonstra um sentimento compartilhado por muitos, a incerteza na hora de cobrir um fato até então desconhecido. Em uma realidade distante do eixo sudeste (Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais), onde o fluxo de informações acaba se concentrando, os profissionais mato-grossenses contaram que vivem entre um grande impasse: depender dos dados oficiais das secretarias governamentais ou ir em busca das subnotificações.

    Funcionário de um veículo digital, que faz parte de um grupo que possui também jornal impresso e canal de televisão, o jornalista afirmou que um dos maiores desafios na cobertura do novo coronavírus está na dependência que os profissionais possuem das assessorias de imprensa governamentais, tal fato é conhecido nos meios teóricos como “jornalismo declaratório”, ou seja, aquele que se faz apenas com informações dadas por fontes oficiais.

    Entretanto, outros profissionais analisaram como positiva a proximidade entre a assessoria da SES e os jornalistas, no atual cenário de pandemia.

    “Avaliei como positivas ações como a do Ministério Público, que restringiu a emissão de boletins epidemiológicos pelos hospitais em Mato Grosso. As informações são muito complexas, não sei o quão estamos preparados para acessá-las”, defendeu João.

    Outro ponto positivo levantado pelo jornalista está na organização proposta pela Secretaria, com transmissões ao vivo feitas diariamente nos canais oficiais do Governo do estado nas quais o atual secretário de Saúde, Gilberto Figueiredo, atualiza os números oficiais dos dados em Mato Grosso, e posteriormente abre para as perguntas feitas pelos jornalistas.

    Além disso, também é disponibilizado à imprensa um boletim epidemiológico com a atualização diária, contendo número de casos suspeitos e confirmados.

    “Eu diria que a comunicação do governo está sendo efetiva nesse sentido, não tá dando brecha para a gente ter desinformações e desencontros, eles estão se comportando de maneira muito aberta nesses dias”, concluiu João.

    Já para Carlos, a dinâmica feita pela Secretaria pode limitar o acesso dos profissionais a real situação do estado. Para ele, as transmissões ao vivo também podem ser uma forma de controlar o acesso dos jornalistas aos dados reais.

    “É muito bom para eles, porque nessas lives existe um domínio e filtragem das perguntas por parte da assessoria. Tem perguntas importantes que eles não respondem. Da mesma maneira que o governo federal edita a LAI (Lei de Acesso a Informação) para tornar as informações mais inacessível, o governo de Mato Grosso cria estratégias para enrijecer uma coletiva de imprensa e ao mesmo tempo silenciar alguns repórteres”, rebate.

    Apesar de posicionamentos distintos em relação às medidas adotadas pelos meios de comunicação do governo, os dois jornalistas dividem a mesma posição quando o assunto é a importância em acompanhar e noticiar as subnotificações.

    “Segundo o próprio secretário de Saúde, só serão testadas pessoas que apresentem sintomas graves. Esse tipo de postura coloca o estado em uma situação que foge do que foi implementado nos lugares que têm lidado bem com a doença. Nesse cenário, eu vejo importância sim em conhecer e acompanhar os casos suspeitos”, disse João.

    O PRIMEIRO MÊS DE COBERTURA EM DADOS

    Para esta reportagem foram monitorados quatro sites de notícias veiculados em Mato Grosso, além do portal oficial da SES. No período de 1 a 31 de março, contabilizamos um total de 1.193 publicações que citam a palavra “coronavírus”. Entre notícias próprias, reproduções de outros veículos e colunas de opinião, os sites mato-grossenses apresentaram um primeiro mês de cobertura com posturas similares.

    Dentro dos número levantados, o Com_Texto também observou que em comparação com o contingente de notícias publicadas pelos veículos regionais, mais da metade tratava-se de publicações de outros sites. Assim, no cenário de 1.193 notícias publicadas em um único mês, cerca de 649 tinham como autor um meio diferente daquele que as compartilhavam, trazendo pautas gerais sobre situações de enfoque nacional e cotidiano dos famosos.

    Esse número pode se justificar pela demora na confirmação oficial dos primeiros casos no estado, e também pela dificuldade encontrada pelos jornalistas no início da cobertura.

    “No início estávamos muito perdidos, no sentido de para quem a gente daria atenção. Se seria para o laboratório que emitia diariamente um boletim epidemiológico, se para a Secretária Municipal de Saúde ou se para a Secretária de Estado de Saúde. De todas as formas existiam desencontros de informações”, revelou João.

    As assessorias dos órgãos governamentais tiveram um papel decisivo no fluxo de informações que chegavam até a população durante esse período. E esse panorama fica mais evidente quando analisada a quantidade de releases disponibilizados pela Secretaria de Saúde de Mato Grosso em comparação com o volume de notícias publicadas pelo sites.

    Os dados acima correspondem aos números de postagens da Secretaria de Saúde de Mato Grosso e do site que mais publicou notícias em março. A projeção mostra que na primeira semana, quando o assunto ainda não era a principal pauta do órgão, o site também não produzia notícias relacionadas ao vírus em grande escala. Realidade que sofre mudança no segundo terço do mês, com o anúncio da confirmação do primeiro caso de Covid-19 no estado.

    Segundo Maria, jornalista de um dos principais sites de notícia do estado, sua preocupação com a pauta surgiu logo após a confirmação dos primeiros casos na China, entretanto, não tinha tanta abertura para abordar o tema no trabalho.

    “Foi difícil produzir matérias no início. Fiz uma sobre cancelamento de viagens e um dos entrevistados acusou os jornalistas de serem os causadores da crise, que estávamos superdimensionando o tema. Reconhece esse discurso?”, contou a jornalista.

    Após esse início conturbado de cobertura, os veículos passaram a se movimentar mais diante do assunto que ganhou todos os holofotes nas últimas semanas.

    Com isso, dois sites se destacaram na análise feita pelo Com_Texto, como apresentado no infográfico abaixo:

    De todos os sites analisados ficou na primeira posição do ranking o site I, com 380 matérias publicadas, já o site II ocupou o último lugar, com 170 postagens, por ter sido o que menos compartilhou notícias sobre o tema em março.

    Mesmo com a diferença na quantidade de postagens, as análises demonstram que o comportamento dos portais de notícias possuem algumas semelhanças, como a prioridade por produção de notícias produzidas pelos jornalistas de cada veículo; o uso de formatos variados de textos, nos casos de artigos de opinião e o hábito de replicarem notícias de outros veículos.

    Contudo, a diferença mais expressiva da análise é que o site que menos vezes tratou sobre o tema foi justamente o que mais se dedicou a produção autoral dos conteúdos.

    E mesmo com as diferenças, os desafios diante do avanço rápido da pandemia fizeram com que todos os profissionais de imprensa trilhassem a mesma caminhada, a da informação apurada e precisa. Do primeiro mês desenhado pelas incertezas que o tema impõe, o que ficou foi a necessidade da coletividade.

    “É um trabalho coletivo, porque a visão de credibilidade não depende só de um veículo, depende de todos os jornalistas trabalhando com alguma coerência”, concluiu Carlos.

    Para esta reportagem utilizamos nomes fictícios a fim de preservar os jornalistas entrevistados e também os veículos analisados.

    Reportagem original em: https://com-texto.wixsite.com/comtexto/post/fora-do-eixo-os-desafios-dos-jornalistas-na-cobertura-do-coronav%C3%ADrus-em-mato-grosso

     

  • A pulsão genocida do vídeo do Governo Bolsonaro

    A pulsão genocida do vídeo do Governo Bolsonaro

    O Brasil amanheceu hoje debatendo o vídeo da nova campanha pública do Governo Federal, que defende a retomada de “normalidade” e o fim do isolamento social frente à pandemia COVID-19. A peça publicitária lançada nesta quinta-feira, dia 26 de março, primeiro na rede social do Senador Flávio Bolsonaro, foi produzida em caráter de emergência pela Isobar, agência de publicidade responsável pela área digital da SECOM (Secretaria de Comunicação da Presidência), potencialmente custando mais de 4 milhões de reais aos cofres públicos. O vídeo, concebido pelo “gabinete do ódio” da Presidência, foi aprovado – na ausência de Secretário Fabio Wajngarten, infectado pelo coronavírus –  pelo Vereador Carlos Bolsonaro, o filho “01”, e utiliza indevidamente fotografias obtidas em banco de imagem.

    Por meio de pesquisa reversa de imagens na internet, foi possível identificar a origem de 11 das 18 fotografias utilizadas no vídeo. Todas elas estão disponíveis no banco de imagens Shutter Stock. Segundo os termos de licenciamento dessa empresa, a licença de uso padrão está sujeita a uma série de limitações, dentre elas: não ser veiculada em vídeos com alcance superior a 500 mil pessoas e custo maior que 10 mil dólares. Também está expressamente vedado o uso em materiais com qualquer conexão com política ou ponto de vista político.

    Foram contatados dez fotógrafos autores dessas imagens, e um deles expressou desconforto em ver sua obra sendo usada no vídeo. Mesmo protegendo sua identidade, segue abaixo o seu relato:

    “Realmente eu não tenho controle do material, as fotos estão hospedadas no site e o site vende aos clientes deles e não sei como é feita essa negociação. Há sim um descontrole e um uso indevido da imagem, digamos assim. Ela não foi propícia pra isso. É uma foto de arquivo, o propósito dessa imagem é pra ser usada em campanhas ou direcionamentos ou reportagens que, enfim, reflitam uma certa realidade. Não a invenção desse maluco que a gente diz que é presidente da gente. Mas eu não posso dizer ao site que não venda a foto, que não comercialize a foto. Eu não tenho controle da imagem, mas enfim, fico dividido. Estou vendo que há um mau uso do material que eu produzi.”

     

    O uso indevido de fotografias de bancos de imagens pelo clã Bolsonaro tem precedente. Durante a campanha eleitoral de 2018, Eduardo Bolsonaro, o filho “03”, divulgou um vídeo, supostamente feito por um apoiador, no qual aparece a fotografia de uma mulher negra, depois identificada como uma enfermeira canadense que se manifestou a respeito. O que espanta, para além de ver uma campanha oficial do Governo Federal potencialmente infringir os termos de licenciamento de imagens, é o discurso frio, calculista e irresponsável da família Bolsonaro aplicado sobre os rostos e corpos de pessoas negras, cujas opiniões não foram ouvidas, cujos direitos de personalidade talvez tenham sido desrespeitados e cujas identidades não podem sequer ser creditadas.

    Reprodução

    Do ponto de vista semiótico e discursivo, são essas as pessoas que o Governo Federal quer ver retomarem o trabalho, furando o isolamento social: brasileiros negros e pobres, trabalhadores informais e subalternizados. Brasileiros esses que, caso infectados, justamente encontrarão as maiores dificuldades em obter atendimento médico, sobretudo se a curva do contágio não for achatada, conforme explicam inúmeras pesquisas científicas já publicadas. Razão pela qual esta campanha ganha aspectos “genocidários”, tal como bem observou Ciro Gomes, devendo ter sua veiculação em televisão imediatamente suspensa pela Justiça. O Ex-ministro, em suas redes sociais, disse: “Bolsonaro está preparando uma campanha publicitária para chamar o povo para voltar às ruas! É genocídio!”. E vamos explicar o porquê de Ciro estar certo.

    Peça central da campanha pública governamental, este vídeo, divulgado no perfil de Flávio Bolsonaro, o filho “02”, vem acompanhado de logomarca do Governo Federal e de uma hashtag criada,  dois dias antes, pelo próprio Senador, como resposta à repercussão negativa do pronunciamento do Presidente, seu pai. A hashtag #obrasilnãopodeparar é instrumental na estratégia de comunicação digital oficial da SECOM – apesar de ter desaparecido o post do instagram do Governo Federal – e se provou eficaz na disseminação do vídeo, que rapidamente ganhou as manchetes dos principais veículos de comunicação e as redes sociais, furando a bolha bolsonarista, como também adentrou os grupos de whatsapp, já tendo potencialmente circulado entre milhões de brasileiros.

    Reprodução/ Instagram, perfil do Governo do Brasil

    Diferentemente da campanha publicitária do Banco do Brasil, vetada pelo Presidente em 2019, as pessoas negras protagonistas do vídeo não estão no bar, na piscina, ou dançando, bem-vestidas, nas coberturas dos prédios ou nas boates chiques, exibindo subjetividade, personalidade e poder aquisitivo, afirmando, dentre outras coisas, pertencimento de classe e igualdade racial.

    As pessoas negras, protagonistas da campanha da SECOM, são retratadas em situação de pobreza e vulnerabilidade: sendo atendidas por enfermeiras, deitadas em leitos de maca, ou apinhadas na sala de espera de hospitais. O vídeo também escolhe muito criteriosamente quais trabalhos são ocupados por negros: há um ambulante da praia, uma feirante, um professor da rede publica de ensino, funcionários de fábricas e garis da COMLURB, Companhia Municipal de Lixo Urbano do Rio de Janeiro.

    Contrariando a recorrente falta de representatividade negra na publicidade, nesta peça de propaganda governamental em questão, afrodescendentes são maioria absoluta: das 18 fotografias usadas no vídeo, apenas 2 são de pessoas brancas. Uma senhora loira, cientista, manuseando um microscópio, e o homem, de costas, na imagem final, de cabelo liso e bandeira do brasil nas costas. Poderíamos até achar que essa última fotografia é uma referência ao próprio Bolsonaro, ou alguém à sua imagem e semelhança. Nada disso é mera coincidência.

    Reprodução

    O subliminar do discurso semiótico desse vídeo, cuja pulsão é genocida, opera nos referentes ausentes. Enquanto o vídeo trata de, em nome de um espírito patriótico, retomar a “normalidade” do trabalho, ele oculta quem diretamente se beneficia com essa retomada: empresários ricos, em geral brancos, que vêm fazendo pressão para a reabertura de seus comércios e indústrias. O vídeo também oculta quem, ao retomar o trabalho, assume maior risco de morte: as pessoas pobres, em geral negras neste país. Porém, esses referentes implícitos, genocidas, estão acessíveis por inferência. Ou seja, o vídeo não diz, expressa e explicitamente, para brasileiros negros voltarem às ruas porque este Governo quer que eles morram aos milhões. Mas esse texto está lá, no vídeo.

    Isso se deve justamente ao acúmulo de discursos do clã Bolsonaro, principalmente do Presidente, que nutre no imaginário da população, especialmente do séquito bolsonarista, um discurso racista. Jair Messias Bolsonaro, quem em campanha eleitoral disse que quilombola, medido em arroba, “não serve nem pra procriar”, também disse, nesta semana, que pessoas vão morrer e que o brasileiro precisa ser estudado, “porque mergulha em esgoto e não pega nada”.

    Esse senhor, ocupante do cargo máximo da nação, se dizendo preocupado com a economia do país e apostando, sem nenhum fundamento científico, que o impacto da pandemia COVID-19 será maior se o trabalhador informal não puder se alimentar, em vez de mover as estruturas do Estado para garantir renda básica para a população mais vulnerável e para a massa de trabalhadores autônomos e micro-empresários individuais – tal como aprovado na Câmara dos Deputados ontem – opta por descumprir as medidas sanitárias recomendadas pela Organização Mundial de Saúde e adotadas por praticamente todas as nações.

    Portanto, considerando esse acúmulo de referentes contidos nos discursos pregressos de Bolsonaro, consegue-se ler o discurso subliminar do vídeo: “Morrerão, em quantidade, os negros e pobres. Os brancos, estarão protegidos e ungidos pela radiante e iluminada Pátria Amada”. Tratando-se de uma propaganda de governo, o impulso genocida do Presidente migra para uma política de Estado. Aí mora o perigo de se ver adotada uma política pública de extermínio de negros e pobres no Brasil.

    Reprodução TV

    Muitos pensarão que essa preocupação é histeria. Infelizmente, o genocídio enquanto política de Estado não se anuncia, nem se comprova.  O historiador armênio Marc Nichanian é categórico ao afirmar, em seu livro “A Perversão Historiográfica” (2009), que o genocídio não é um fato, porque é a própria destruição de toda a factualidade desse acontecimento. Os perpetradores de um genocídio se ocupam de mascarar, velar e apagar todos os vestígios que indicam e apontam para a existência mesma do fato. E a consequente ausência de prova documental faz emergirem narrativas, inclusive historiográficas, de cunho negacionista. Razão pela qual muitas pessoas, inclusive ditos historiadores, até os dias de hoje negam os crimes contra a Humanidade cometidos pela Ditadura Civil-Militar brasileira.

    Ao estimular o povo a quebrar o isolamento social, aumentando o risco de contaminação e os efeitos nocivos da pandemia, o Governo Federal implanta uma nem tão invisível estratégia de extermínio de negros e pobres. O discurso semiótico desta propaganda do Governo Federal deixa rastros e vestígios que conservam subliminarmente esse texto de pulsão genocida, que não existe enquanto prova documental, nem como fato. Mas existe, ainda assim. E tem poder de matar, mesmo assim.

    Esse discurso genocida, só não enxerga quem não quer.

    . . .

    Artigo de Raquel Valadares, documentarista e pesquisadora de cinema, especial para os Jornalistas Livres

  • ANÁLISE DO PROGRAMA DE JAIR BOLSONARO

    ANÁLISE DO PROGRAMA DE JAIR BOLSONARO

    Fiz o esforço hoje de ler a íntegra do plano de governo de Bolsonaro. E com toda a honestidade que tentei achar há muito, muito pra criticar.

    Vão abaixo meus comentários, esperando ter ajudado na narrativa da contra-argumentação.

    A integra do documento encontra-se aqui : https://goo.gl/YY2VZP

    • 5 PONTOS PRINCIPAIS
    1. Primeiro, comentar que a maioria das propostas são vagas, sem dados nem metas, falas bonitinhas e sensacionalistas do tipo “vamos resolver todos seus problemas” que são muito perigosas num plano de governo.

    2. Por um governo que pretende acabar com a corrupção não há mais de 4 linhas (p. 35) sobre o tema e a única proposta é seguir o que o Ministério Publico já faz.

    3. Muito lamentável é ver que a principal fonte do programa para descrever o quadro de homicídios no Brasil é ….. um documentário da Globo (😑) (p. 24 em diante) chamado a “Guerra do Brasil”.

    4. O lado neoliberal é plenamente assumido, colocando nas primeiras páginas a defesa da propriedade privada acima de tudo e até mesmo antes dos valores da família (p. 4). As propostas na área da saúde e educação não trazem grandes inovações sendo que serão inevitavelmente afetadas pela redução das despesas públicas. Nada também sobre meio ambiente e (o que era de se esperar) sobre direitos humanos, mulheres, racismo, juventude, etc.

    5. Dramático ver que no novo modelo de gestão pública chamado “Orçamento Base Zero” (p. 13) onde: “Cada gestor terá que justificar suas demandas e não haverá garantias de continuidade de recursos. O montante gasto no passado não justificará os recursos demandados no presente ou no futuro”. Ou seja, o fim da política pública.

    • ALGUNS DETALHES DE PROPOSTAS POR TEMA

     

    • Mídia: contra qualquer forma de regulação (p.7) ==> ou seja, a favor do monopólio dos grupos privados

    Prisão: “Prender e deixar na cadeia” (p. 30) ==> desejo boa sorte para cumprir e pretender bons resultados… já foi comprovado que não funciona e só adia e aumenta o problema.

    • Forças armadas: “Policiais precisam ter certeza que, no exercício de sua atividade profissional, serão protegidos por uma retaguarda jurídica” (p. 32) ==> ou seja impunidade para os policiais.

    • Saúde: (p. 40): interessante notar que Bolsonaro não quer o fim do programa “Mais Médicos” que tanto criticou. Cuba não presta, mas seus médicos sim… estranho!

    • Reforma da previdência (p. 57): defende a transição por um modelo de capitalização (contra o qual o povo do Chile e Argentina lutou tanto) acabando com o atual modelo de repartição.

    • Impostos (p. 58) o programa é dos mais vagos, não traz dados e metas mas afirma a redução da carga tributaria sem falar de proporcionalidade o que é uma das principais injustiças pois muitos não pagam quanto deveriam.

    – Fim da CLT (p. 64) : a nova carteira de trabalho Verde e Amerla generaliza a submissão a acordos individuais com as empresas prevalecendo o negociado sobe o legislado. Mesmo deixando vigente a antiga carteira azul aplicando a CLT, é obvio que a concorrência induzirá os trabalhadores a abrir mão de seus direitos trabalhistas se querem ser contratados.

    • Universidades (p. 46 e 49): “deve focar no avanço técnico, desenvolver novas parcerias com iniciativa privada” ==> fim da autonomia da pesquisa. Nenhum programa destinado a tirar as universidades públicas da carência de recurso. A única orientação é estimular o empreendedorismo.

    • Educação à distância (p. 46): para as áreas rurais…… onde não há nem Internet para se conectar ao Wifi. (enquanto isso, os governos do PT criaram dezenas de universidades federais).

    • Divida pública (p. 56): pretende reduzir com privatizações (discurso clássico do neoliberalismo): não se fala nada de auditoria de uma dívida ilegal contratada desde a ditadura.

    Privatizações (p. 61): argumento para sanar as contas públicas e lutar contra corrupção e incentivar a competição ==> não se preocupa com a qualidade de serviço e o custo remanescente para o cidadão que tera que pagar por um serviço que antes era gratuito.

    • Agricultura (p. 68, 69) : uma minuscula pagina dizendo que todos os serviços terão a mesma porta de entrada e nenhuma proposta para agroecologia e agricultura familiar.

    • Petrobras (p. 74) : sobre os preços do petróleo e as reivindicações dos caminhoneiros “Os preços praticados pela Petrobrás deverão seguir os mercados internacionais, mas as flutuações de curto prazo deverão ser suavizadas com mecanismos de hedge apropriados ». Muito difícil de entender, mas há confirmação de que os preços continuarão a sofrer as flutuações do mercado internacional, descumprindo o compromisso com os caminhoneiros.

    • Relações internacionais (p. 79): sobre as prioridades em termos de parcerias : “Deixaremos de louvar ditaduras assassinas e desprezar ou mesmo atacar democracias importantes como EUA, Israel e Itália ». Os três países onde há governos de extrema direita racistas e xenófobos são os únicos países mencionados na lista o que deixa imaginar o tipo de posicionamento geopolítico que o governo Bolsonaro que ter.

    • Renda Mínima (p. 63). O programa prevê uma proposta de Renda Mínima básica para todos os brasileiros para “garantir uma renda igual ou superior a Bolsa Família”. Isso não é necessariamente ruim e vários partidos de esquerda também defendem a ideia. Mas dependentemente de como é aplicada pode ser uma oportunidade para cortar outros auxílios e reduzir os gastos em assistência social. Ademais nada é dito sobre aumento do salário mínimo e essa medida que custa caro e não há quantificação tem pouca viabilidade na perspectiva da drástica redução de gastos públicos que Bolsonaro pretende fazer.

    • NA CATEGORIA FAKE NEWS, ALGUMAS PEROLAS
    • Mais de UM MILHÃO de brasileiros foram assassinados desde a 1 ª reunião do Foro de São Paulo… » (p. 12): ❗️FAKE❗️. Não ha comprovação que um fato seja ligado com o outro.

    • Epidemia de crack, introduzido no Brasil pelas filiais das FARC » (p. 12): ❗️FAKE❗️. As FARCs não podem ser considerados os únicos autores do trafego de droga no país já que vários políticos foram presos por isso e outras redes de trafego existem (vejam .. Aécio Neves)

    • As FARCS Participam do Foro de São Paulo » (p. 26): ❗️FAKE❗️. Vejam matéria da UOL dizendo que PT se recusou a entrada das FARC’s no FSP em 2008 : https://www1.folha.uol.com.br/…/407374-pt-barrou-as-farc-em…

  • O INVERSO – um artigo para ajudar a entender o que acontece na Venezuela

    O INVERSO – um artigo para ajudar a entender o que acontece na Venezuela

    Um artigo redigido pela professora e pesquisadora venezuelana Pasqualina Curcio, carregado de ironias, questiona as afirmações da oposição venezuelana e da direita da Assembleia Nacional do país, bem como daqueles que no cenário internacional os apoia, como o secretário geral da OEA, Luis Almagro.

    Dentre outras ironias, a autora cita os atos violentos promovidos pela oposição, como o recente incêndio em um Hospital Materno Infantil, do qual foi necessário evacuar recém-nascidos e parturientes. Para Curcio, a ironia é dizer que a “responsabilidade” pelo ocorrido é do governo Maduro por haver controlado a situação e dispersado os manifestantes que atacavam o local.

    O texto, dividido em tópicos, traz ainda números comparativos que ajudam a compreender melhor a situação política da Venezuela e a alegada “crise econômica” pela qual passa o país.

     

     

    O INVERSO

    Por: Pasqualina Curcio

    “Faz cento e trinta anos, depois de visitar o país das maravilhas, que Alice se meteu em um espelho para descobrir o mundo do inverso. Se Alice renascesse em nossos dias [e na Venezuela], não precisaria atravessar nenhum espelho; bastaria-lhe olhar pela janela.” – Eduardo Galeano

     

     

     

    A Venezuela é um dos poucos países, se não o único, com um regime ditatorial cujo ditador exerce a tirania depois de ter abandonado o cargo. Mas, além disso, sendo ditador, dá-se um auto-golpe: em janeiro de 2017 a Assembleia Nacional, em votação da representação majoritariamente opositora ao Governo Nacional, decidiu que o presidente Nicolás Maduro tinha “abandonado o cargo”; um mês mais tarde, os mesmos representantes deputados, incorporaram em seu discurso que estávamos diante de uma “ditadura” encabeçada pelo Presidente da República (o mesmo que abandonou o cargo um mês antes). E um mês mais tarde, já sendo “ditador”, e segundo os mesmos representantes, o próprio presidente deu um “golpe de estado”.

    2. Entre 1958 e 1998, ou seja, em 40 anos realizaram-se 24 processos eleitorais, uma média de 1 eleição a cada 2 anos. Depois de 1999, em 18 anos, realizaram-se 25 comícios, incluindo referendos revogatórios e constitucionais, ou seja, uma média de quase duas eleições anuais. Houve 3 eleições nos últimos 4 anos, desde 2013. Mas segundo os elementos que atualmente fazem oposição ao governo nacional, a partir de 1999 os venezuelanos estiveram submetidos a um regime ditatorial, cada vez mais tirano, sobretudo depois de 2013 (ano das últimas eleições presidenciais).

    3. Das mais de 1.000 emissoras de rádio e televisão às quais o governo outorgou permissões para operar no espectro eletromagnético, 67% são privadas, 28% estão em mãos das comunidades e 5% são de propriedade estatal. Dos 108 jornais que existem no país, 97 são privados e 11 públicos. Cerca de 67% da população venezuelana tem acesso à internet. Mas segundo os elementos políticos que fazem oposição ao governo nacional, “na Venezuela não há liberdade de expressão”.

    4. O Presidente da República, em pleno exercício de suas funções, no marco do período presidencial de 6 anos, ante os atos de violência de parte de elementos locais que procuram a desestabilização econômica, social e política, convocou setores da oposição à um diálogo pela paz. Mas a oposição não compareceu ao chamado, preferiu promover atos de violência nas ruas. Ou seja, o Presidente é um “tirano e ditador”, os “democratas” são os da oposição.

    5. Todas as organizações políticas (os partidos) encontram-se em um processo de renovação através da Convocatória realizada por um dos cinco poderes públicos, o Conselho Nacional Eleitoral. Todos compareceram ao chamado de renovação. Estão neste momento às portas das eleições regionais e municipais. Mas enquanto isso, dirigentes e seguidores desses elementos de oposição, vociferam: “Estamos em uma ditadura”!

    6. Na Venezuela “se está violando todos os direitos humanos, terão que lhe aplicar a Carta Democrática Interamericana”. É o que afirmava em Washington, Luis Almagro, secretário geral da Organização de Estados Americanos. Simultaneamente, em Genebra, a Organização das Nações Unidas, aprovava de maneira absoluta o ‘Exame Periódico Universal’ apresentado pela Venezuela. Exame que tem como objeto fiscalizar a situação dos direitos humanos em cada um dos 193 países membros desta organização.

    7. A ultradireita, que faz oposição ao governo nacional, financia e promove ações de violência e terrorismo: bloqueia ruas, avenidas e principais trechos; atenta contra escolas e estabelecimentos de saúde; em um ato fascista, terrorista e demencial se valem de mercenários para assediar e incendiar o Hospital Materno Infantil “Hugo Chávez Frias”, do qual foi necessário evacuar 58 recém-nascidos e parturientes asfixiados pela fumaça. Mas segundo estes elementos políticos de oposição, a responsabilidade é do governo nacional por haver controlado a situação, dispersado os mercenários e evacuado do local, mulheres e crianças.

    8. Há escassez de alguns alimentos, medicamentos e produtos de higiene. As empresas encarregadas de sua produção, importação e distribuição, as grandes transnacionais, receberam do governo nacional divisas com taxa preferencial; receberam ainda a matéria-prima a preço subsidiado; tiveram um ajuste do preço dos produtos de quase 4.000% em menos de um ano (2016); mas o povo venezuelano faz largas filas para adquirir estes produtos e os bens seguem sem aparecer nas prateleiras. Ou seja, na Venezuela isto não é ineficiência da empresa privada, é o “fracasso do modelo socialista”.

    9. Apesar de ter aumentado seu preço em 3.700% (passou de 19,00 bolívares em março de 2016 a 700,00 bolívares em dezembro), cifra muito superior à inflação anual, centenas de clientes fazem largas filas para adquirir a farinha de milho pré-cozida para a “arepa” (o pão dos venezuelanos). Os donos das empresas, ao ver todos esses clientes fazendo largas filas para adquirir sua marca, responderam, não reduzindo seu preço, mas diminuindo em 80% a produção da farinha.

    10. Escuta-se nos programas de opinião das rádios, sobretudo aquelas com uma linha editorial expressamente contrária ao governo nacional: “Estamos na pior crise econômica, requeremos ajuda humanitária, estamos morrendo de fome, não há comida, exigimos que se abra um canal humanitário”. E em seguida se escuta: “E agora nossa publicidade… convidamos você a visitar o Restaurant “X”, ali poderão degustar variedades em carnes e pescados, deliciosas sobremesas, leve toda sua família neste fim de semana”… ou ainda “Querido amigo, querida amiga, vai aproveitar este feriado de Semana Santa?, não deixe de passar pelo supermercado “E”, ali você vai encontrar tudo o que precisa, variedade e frescura a bons preços para desfrutar do feriado e descansar como você merece”. Final da publicidade: “Retornamos com nosso convidado de hoje, perito em economia, e seguimos conversando a respeito da necessidade urgente de abrir o canal humanitário na Venezuela pela falta de alimentos”.

    11. Nos últimos 4 anos os camponeses abasteceram de frutas, verduras e hortaliças o povo venezuelano. São pequenos produtores do campo, sem muita capacidade financeira para resistir à situações econômicas e financeiras difíceis. Isso porque as grandes empresas nacionais e transnacionais do agronegócio, grandes monopólios e oligopólios com capacidade de cartelizar-se, e sem dúvida com grande capacidade financeira, não abasteceram o povo apesar de receberem [incentivos como] matéria-prima subsidiada e divisas em taxa preferencial.

    12. Entre 1980 e 1998, no marco do sistema capitalista neoliberal, a pobreza aumentava ao mesmo tempo que o crescimento econômico. Em 1999, com a aprovação popular de uma nova Constituição, troca-se o modelo econômico e social por um de justiça social. Desde esse ano os aumentos na produção implicam em diminuição da pobreza. Mas para alguns venezuelanos “fracassou o modelo socialista”, aprovado em 1999.

    13. A principal empresa do Estado venezuelano, ‘Petróleos da Venezuela’, provê CERCA DE 95% das divisas do país, os outros 4% correspondem a outras empresas do Estado. As empresas privadas geram o 1% restante. Mas na Venezuela, as empresas privadas são eficientes e bem-sucedidas, e as do Estado são “ineficientes”.

    14. Na Venezuela, o valor da moeda no mercado ilegal é o marcador dos preços internos da economia. Quando são manipulados intencional e desproporcionalmente esses valores nos mercados ilegais induzem a inflação. O governo, ante a inflação induzida, e para proteger o poder aquisitivo da classe trabalhadora, decreta aumento de salários. Mas, claro, o responsável pela inflação é o governo por ter aumentado os salários e não os terroristas da economia que vem manipulando 38.732% desse tipo de câmbio ilegal desde 2013 até esta data.

    15. A produção nacional per capita na Venezuela nos últimos 4 anos é, em média, 9% maior que a dos últimos 30 anos. A taxa de desocupação, é historicamente a mais baixa em 30 anos, 6,6%. Mas a Venezuela está “na pior das crises” e no “caos econômico”.

    16. As principais indústrias do setor farmacêutico, as que importam, produzem e distribuem mais de 90% dos medicamentos e material médico-cirúrgico na Venezuela, receberam por parte do governo nacional, e a taxa preferencial, US$ 1.660 milhões em 2008 para importar os bens. Em 2015 receberam US$ 1.789 milhões (mais que em 2008). Em 2008 não havia escassez de remédios, em 2015 sim. Mas o responsável por não haver remédios é o governo.

    17. A República pagou mais de US$ 60 bilhões pelo compromisso de dívida externa durante os últimos 4 anos. Fez de maneira completa e pontual. Mas a Venezuela é qualificada como o país com o “maior índice de risco financeiro no mundo”.

    18. O Citibank decidiu de maneira repentina fechar as contas bancárias do governo nacional onde se realizavam os pagamentos e transferências para cumprir com os compromissos financeiros e comerciais no exterior. A razão foi que o Estado venezuelano é “muito arriscado”. Mas o Citibank não fechou as contas dos clientes privados. Possivelmente porque o Estado venezuelano é muito arriscado já que conta com a principal reserva de petróleo em nível mundial, a segunda de gás, de água doce, de minério coltán, diamantes, ouro, e outros recursos mais. Tal condição deve implicar em “alto risco” para o Citibank.

    19. No Salão Ayacucho do Palácio de Miraflores, sede do Poder Executivo, em 12 de abril de 2002, se autonomeava como “Presidente da República” Pedro Carmona Estanga, logo depois de dar um golpe de estado contra o Presidente Hugo Chávez. No evento de autonomeação, leu-se o seguinte decreto: “suspendem-se de seus cargos os deputados principais e suplentes da Assembleia Nacional, destituem-se de seus cargos o presidente e demais magistrados do Tribunal Supremo de Justiça, assim como o fiscal geral da República, O controlador geral da República, o ministério público, e os membros do Conselho Nacional Eleitoral”. Os presentes neste ato, no que se dissolveram todos os poderes públicos, mediante um decreto que constitui a maior ofensa à Constituição Nacional, gritavam emocionados: “liberdade e democracia!”.

    20. Os mesmos que gritavam “liberdade e democracia!”, naquele 12 de abril de 2002 no Salão Ayacucho, aprovam hoje o suposto “abandono do cargo” do Presidente da República. E são os mesmos que hoje gritam “abaixo o ditador!”, referindo-se ao presidente constitucionalmente eleito com a maioria dos votos do povo venezuelano. Ante os olhos de alguns, esses são os “democratas”.

    21. Escuta-se de alguns venezuelanos, possivelmente confundidos ou mal informados: “Tomara que o Comando Sul dos Estados Unidos tome logo a decisão de nos invadir, assim acaba com este modelo fracassado, e o país pode prosperar”. Bem, o Iraque, a Líbia e a Síria, para mencionar alguns países bombardeados e invadidos pelos Estados Unidos, encontram-se em guerra, não prosperaram e estão destruídos. Esses que dizem isso, teriam algum exemplo de país invadido pelos Estados Unidos que tenha prosperado?

    22. A Venezuela é uma “ameaça extraordinária e incomum” para os Estados Unidos. Isso decretou o ex-mandatário Barack Obama, então presidente do império e grande potência militar mundial, responsável por invasões e guerras.

    Nós, venezuelanos patriotas, povo de paz, insistimos que é o inverso.

     

    Tradução e edição: Juliana Medeiros

  • O RESULTADO DA VOTAÇÃO ESTÁ EM ABERTO – A RUA DECIDE!

    O RESULTADO DA VOTAÇÃO ESTÁ EM ABERTO – A RUA DECIDE!

    Estudo exclusivo de da socióloga Thais Moya para os Jornalistas Livres. Ela é pós-doutorada pela Unicamp e ficou conhecida por seu estudo e cruzamentos que desnudaram a Planilha da Odebrecht, revelando que a direita e Eduardo Cunha eram os grandes protagonistas do esquema da empreiteira. O estudo de Thais aponta: há 337 deputados favoráveis ao golpe, 145 contrários e de fato apenas 5 indecisos (ela estima 26 ausentes). A  intuição de Thais: 340 golpistas e 146 democratas. Se for isso mesmo, o golpe não passa. Leia o estudo.


     

    Neste domingo, a Câmara dos deputados decidirá pela abertura ou não do processo de impeachment. Para que o processo seja aberto é necessário que dois terços dos deputados votem favoravelmente, o que corresponde a 342 votos. Essa quantidade de votos é necessária independentemente da quantidade de votos contrários e também das abstenções e ausências no dia. Ou seja, ou conseguem 342 votos, ou não aprovam a continuidade do processo de impeachment de Dilma.

    O senador Roberto Requião, PMDB/PR, anunciou, na manhã de ontem, sábado (16), que deputados estavam deixando Brasília com intuito de não participarem da votação.

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    Até 22h de sábado, 488 deputados registraram presença na sessão que começou as 18h58, o que demonstra que 25 deputados não estão na Câmara a poucas horas da votação. Destes 25, mais de 80% não registraram presença nas três sessões anteriores do mesmo dia.

    Em 1992, na votação do impeachment de Collor, houve 23 ausências e abstenções, ou seja, em torno de 5% da Casa. Não seria surpreendente se a mesma parcela se ausentasse nesse domingo.

    Dos 25 deputados que não registraram presença, onze se manifestaram favoráveis ao impeachment, dez contrários ao processo e quatro se dizem indecisos. Arrolados nos partidos PEN, PMDB, PP, PR, PROS, PSB, PT, PTB, PT do B, PTN, PV e SD.

    Se essas projeções de ausências se concretizarem na votação, os dois lados poderão perder em torno de dez votos já contabilizados, o que colocaria o grupo favorável ao impeachment numa margem ligeiramente inferior aos 342 de votos necessários.

    Esta margem aumenta se cruzarmos os dados dos mapeamentos realizados por movimentos favoráveis e contrários ao impeachment (Vemprarua.net e mapadademocracia.org.br), pois a relação de indecisos não são compatíveis, o que revela um cenário ainda mais imprevisível para votação.

    O “mapa da democracia”, realizado por movimentos contrários ao impeachment, contabiliza 20 nomes entre os indecisos, já o “mapa do impeachment”, do movimento golpista, contabiliza 27 deputados indecisos. Além dos números não baterem, os nomes dos indecisos variam muito em cada mapa. Apenas 8 deputados estão nas duas listas, ou seja, há uma variação de mais 15 nomes entre contrários e favoráveis.

     

    Indecisos nos dois mapas
    Aníbal Gomes – PMDB/CE
    Brunny – PR/MG
    Hissa Abrahão – PDT/AM
    José Priante – PMDB/PA
    José Reinaldo – PSB/MA
    Marcio Alvino – PR/SP
    Paes Landim – PTB/PI
    Tiririca – PR/SP

    Quando se faz a conferência dos nomes incompatíveis, se percebe que há 17 nomes que o “mapa do impeachment” coloca como indecisos, porém, no “mapa da democracia” aparecem como contrários. No lado inverso, havia 8 nomes como indecisos no “mapa da democracia” que aparecem como contrários no “mapa do impeachment”. Fora isso, há 4 nomes que o “mapa do impeachment” coloca como contrários que o “mapa da democracia” considera como indecisos.

    mapa-votacao-analise

     

    Portanto, entre 40 indecisos presentes nas duas relações, 21 são potencialmente contrários ao impeachment. Dos 19 restantes, 9 são potencialmente favoráveis, restando 10 totalmente imprevisíveis.

    Usando a projeção dos mapas teríamos um placar de 155 contrários, 10 indecisos e 348 favoráveis.

    Subtraindo as possíveis ausências, seria um placar aproximado de 145 deputados contra o impeachment e 337 golpista, restando em torno de 5 indecisos que podem fazer toda diferença (para o total de 513 faltam 26, que devem ausentar-se mantida a proporção de 1992).

    A pressão popular será decisiva. Todos contra o golpe!

  • Para as Marias que vão com as outras

    Para as Marias que vão com as outras

    Por Fernando Castilho*, do Blog Análise e Opinião, colaboração para os Jornalistas Livres


    As pessoas que defendem a defenestração de Dilma Rousseff do Palácio do Planalto, a prisão de Lula e o fim do PT, não o fazem por causa da corrupção, está claro.

    Sobre a honestidade da presidenta não pairam dúvidas, fato reconhecido até por FHC.

    Sobre Lula, a mídia e a oposição tentaram criminalizar o lícito de apresentar empresas para obras no exterior e de receber doações dessas mesmas empreiteiras, mas esbarraram nas corretas prestações de contas do Instituto Lula e também na coincidência de que naquele exato momento Obama levava empresas americanas para Cuba. Além disso, FHC também recebe doações para seu instituto. Então não deu.

    Eduardo Cunha até agora é o único político que pode ser preso com provas (esqueçam o tesoureiro do PT, Vaccari que está preso sem nenhuma prova, já que não haveria como saber se as doações para campanhas eram dinheiro de propinas ou não, certo?), mas nem por isso alguém saiu às ruas para protestar contra ele.

    Aécio Neves, além do aeroporto construído em terras de seu tio-avô, tem agora contra si a divulgação feita pela Folha a pedido, possivelmente de José Serra ou de Geraldo Alckmin, de que fez 124 viagens ao Rio de Janeiro em finais de semana com jatinho oficial. E ninguém bateu uma mísera panelinha que fosse. Talvez só Serra ou Alckmin.

    Portanto, não é pela corrupção.

    E se o motivo não é esse, qual seria?

    O PT em 12 anos de governo foi exitoso em tirar o Brasil do mapa da fome, além de criar inúmeros programas sociais, o que acabou por criar uma nova classe social, a daqueles que deixaram de ser pobres passando a possuir poder de consumo.

    Então está claro que a revolta contra o PT passa pela velha luta de classes de quem não aceita que outros ascendam socialmente. É só isso. Mais nada, certo? Mas é claro que há gente que está sendo iludida por uma mídia que a dirige em direção ao golpe. Mostra somente o lado ruim do governo. Omite suas realizações. E as Marias acabam por ir com as outras. Os Mários também.

    Pois bem, caso consigam seu intento, após o golpe contra Dilma, como vai ser o dia seguinte?

    Primeiramente é preciso que demonstremos que ainda não há uma crise econômica instalada no país. Pelo menos com as cores que estão pintando.

    As reservas internacionais estão na casa de US$ 371 bilhões ou R$ 1,47 trilhão de reais, enquanto na época de FHC, em 2002, eram de apenas US$ 37,8 bi (R$ 150 bilhões de reais).

    A inflação projetada para 2015 está em cerca de 5,95%, enquanto que em 2002 chegou a 12,53%.

    O desemprego está por volta de 8,3%. No governo FHC chegou a 12,6%.

    O salário mínimo está em 200 dólares enquanto que em 2002 estava em apenas 50 dólares.

    Seguem agora vários gráficos comparativos do governo Dilma com governos passados.

    Divirtam-se, como eu me diverti.

    Fonte: Banco Mundial

    Fonte: Banco Central do Brasil

    Fonte: ONU

    Fontes: Banco Central e ABECIP

    Fonte: FMI

    Fonte: Banco Central

    Fonte: Banco Central

    Fonte: Petrobras

    Entendem agora? Já está desenhado. Lógico que nesses gráficos não se incluem os avanços sociais, afinal quem se dá ao trabalho de confeccioná-los? Eles que deveriam ser os mais importantes? As coisas estão maravilhosas no Brasil? Claro que não, afinal há uma crise internacional e o Brasil não escapa. Até a China acusa problemas na economia.

    Mas entendem no que é que a oposição quer por a mão? A dica está nesse gráfico verde aí em cima.

    A oposição precisa derrubar Dilma para que as investigações cessem e não atinjam políticos que estão sendo delatados. Só assim as coisas poderão continuar com dantes no quartel de Abrantes.

    Enquanto ficamos hipocritamente protestando contra uma CPMF de 0,2%, os ratos fazem a festa na nossa frente, com o nosso apoio.

    Derrubada a presidenta, em menos de três meses, com outro presidente, as notícias na mídia serão todas otimistas. E então dirão que para por ordem na casa será necessário privatizar a Petrobras e entregar o Pré-sal para os americanos.

    E todos, Marias que vamos com as outras nesta Internet, exultantes e felizes com a queda daquela dentuça encheremos o peito e suspiraremos: que bom, agora o Brasil vai pra frente!


    *Fernando Castilho é arquiteto urbanista, professor e blogueiro. Analisa e comenta fatos importantes da vida política no país, fora da lente da grande mídia.