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  • A fé que move o povo: Tradição, (re)existência e vivência cultural do Çairé de Alter do Chão (PA)

    A fé que move o povo: Tradição, (re)existência e vivência cultural do Çairé de Alter do Chão (PA)

    Por Tainá Aragão, Fotos: Leonardo Milano Jornalistas Livres

    “Salve a criança que está dentro de ti”, esse é um dos significados da palavra Çairé, que nomeia a festa tradicional de mais de 300 anos no Oeste do Pará, especificamente, Alter do Chão, Vila do município de Santarém. O grande festejo se inicia com a procissão fluvial, que percorre o rio Tapajós até o Lago Verde, pela busca de dois mastros, troncos de madeira que sustentam, do início ao fim, o sentido estruturante da festa: distribuir abundância para toda comunidade.

    Geralmente, o Çairé abrange cinco intensos dias com festejos que se mesclam entre o divino e profano, neste ano, devido à pandemia, a festa se concentrou em dois dias, entre 17 e 18 de setembro, focada principalmente no rito religioso. Com a adaptação da festa para o atual contexto, a comunidade conseguiu reforçar o significado real da celebração, que está atrelado à fé e sincretismo luso-indígena. O grupo comunitário que organiza a festa, conhecido por “Corte do Çairé”, é formado pelos seguintes componentes: Juiz, Juíza (“donos da festa”), os mordomos e mordomas, procuradores, rezadeiras, o grupo de Folia – Espanta Cão e a Saraipora: que carrega o símbolo do Çairé.

    Osmar Vieira, jovem juiz do Çairé deste ano e já nomeado para o festejo de 2021, herdou a tradição da festa pelos seus avós, e explica que o Çairé realizado durante essa pandemia, apesar de todas as dificuldades financeiras e boa parte da programação ser inviabilizada, se aproximou como poucas vezes, da festa celebrada antigamente.

    “Essa festa religiosa é que realmente tem mais 300 anos, o lado profano que é representado pelos Botos é mais recente, começou após 1996. Esse ano tivemos a oportunidade de mostrar o que realmente é o rito religioso. O rito religioso é muito grande, é a fé o que faz o Çairé acontecer. Como eu aprendi vivendo o Çairé pelos meus avós, digo que é fundamental termos feito essa festa, porque não se trata de somente preservar, nós estamos vivendo. Viver não é apresentar uma festa, é assumir o cargo e lutar pela tradição”, explica.

    Cada momento, da busca à derrubada no mastro, representa um convite ao encontro coletivo para atrair e agradecer a abundância tanto material quanto imaterial da comunidade. Os elementos e símbolos que compõe a festa representam uma espécie de louvor ao Divino Espírito Santo e a Santíssima Trindade. Apesar da forte presença da matriz religiosa-cristã, a festa ficou proibida por parte da Igreja Católica por 30 anos, a partir de 1943, e só voltou a ser celebrada pela grande insistência das mestras\es do Çairé.

    Mesmo com a reconciliação da Igreja com a festa, o Çairé não deixou de preservar suas matrizes indígenas Borari. Os elementos indígenas aparecem, principalmente, através das danças tradicionais: quebra-macaxeira, desfeiteira e o macucauá e com a distribuição do Tarubá, bebida indígena produzida através da fermentação da mandioca, momento no qual a Corte do Çairé e todos os visitantes brindam o fechamento de mais um ciclo de celebração.

    Espanta Cão

    Espanta-Cão é a folia do Çairé composta por oito homens de Alter do Chão, o grupo musical é responsável por conduzir o ritmo da festa, da alvorada ao encerramento. Diariamente, a festa começa com um cântico de madrugada: “Alvorada é Alvorada, de manhã ou de madrugada”, cantada na penumbra das 5h da manhã no barracão de palha tecido pelos comunitários especialmente para a festa.

    O nome do grupo se deve a forma de tocar a rabeca, que reproduz o gestual de uma cruz. Acredita-se que com essa forma de tocar o instrumento, o grupo possui o poder de afastar as coisas ruins que rondam a festa. “Espantar o cão” e trazer a alegria são as principais obrigações dos músicos. O grupo transita entre o divino e profano do Çairé, como explica o mais jovem folião, Hermes Caldeira.

    “O Espanta-cão foi montado nos anos 70 com a retomada do Çairé, somos músicos de ouvido, não estudamos, aprendemos com os mestres e tocamos em todos os momentos da festa. No rito religioso, acompanhamos as ladainhas do Divino e da Santíssima Trindade, cantadas em latim, no momento profano, que encerra a festa, tocamos o lundu, macucauá, o quebra-macaxeira, nesse momento, somos a folia.”

    (Re)existir

    A ressignificação da festa de 2020 trouxe uma espécie de apropriação comunitária mais integral do Çairé, que nos anos anteriores contava com forte apoio comercial da Secretaria de Cultura de Santarém. Neste ano, com a falta do apoio financeiro, a participação de jovens que nunca haviam se interessado diretamente pela preservação do rito religioso, foi essencial para a festa acontecer. A jovem Maria Eulália, que compôs a comissão organizadora deste ano, explica a importância de ter feito parte da construção do Çairé 2020.

    “Foi muito emocionante, principalmente para nós jovens, pois é a nossa história, é em defesa do nosso povo, não é uma festa qualquer. Por isso, o tema deste ano foi “A fé que move o povo”, nada melhor que contar a nossa história com essa palavra: a fé. Mais uma vez a fé veio e se estabeleceu na comunidade. Independente da crença, é uma só fé”, diz Eulália.

    Em meio a uma pandemia, na qual a desesperança mareja os dias de luto intermitente que o país vivencia, o resgate da fé popular é capaz de reavivar as esperanças de uma comunidade. As ruas e as casas de Alter do Chão se enfeitaram com fitas de cetim, bandeirinhas e símbolos para receber com beleza e abundância esse sentimento unificador: a fé no povo.

  • Çairé 2020: beleza, sincretismo e o “novo normal”

    Çairé 2020: beleza, sincretismo e o “novo normal”

    Por: Leonardo Milano, em parceria com O Boto

    Com mais de 300 anos de tradição e comemorado no mês de setembro, o Festival Çairé é uma grande manifestação folclórico-religiosa, de encontro entre a cultura indígena amazônica e a religião católica, introduzida com a chegada dos jesuítas. De origem indígena, a festa foi sendo modificada pelos portugueses ao longo dos anos e, hoje, todos os ritos e ladainhas são cantados em latim. Em 2005, a prefeitura de Santarém determinou que a palavra Çairé passasse a ser escrita com “s”, para se adequar à língua dos colonizadores.

    Devido à Covid-19, o Çairé desde ano acontece de forma reduzida, para evitar aglomerações. Na última quinta-feira (10), o festival iniciou sua programação, com a Missa em Ação de Graça, seguida da Procissão Fluvial e da Carreata pelas ruas de Alter do Chão. Com o “novo normal”, trazido pela pandemia, as máscaras de contenção passaram a fazer parte do figurino dos participantes. 

    A programação do Çairé de 2020 segue no dia 17 e se encerra no dia 19/09, com distribuição de Tarubá – bebida típica indígena – e a apresentação do grupo Espanta Cão. Confira a programação completa do Çairé deste ano, e as fotografias do primeiro dia do festival. 

    Saiba mais em Sairé: a verdadeira resistência

  • Investigação da PF descarta participação de brigadistas em incêndio em Alter do Chão, Pará

    Investigação da PF descarta participação de brigadistas em incêndio em Alter do Chão, Pará

    • Ocorrido em setembro do ano passado, as investigações foram conduzidas paralelamente pela Polícia Civil Paraense e pela Polícia Federal, a pedido do Ministério Público Federal
    • Sem provas e sem perícia, a Polícia Civil deduziu que quatro brigadistas atearam fogo na região, para conseguir doações para a Brigada de Alter
    • Inquérito da PF concluiu não ser possível identificar a autoria do incêndio, e a análise das imagens de satélite mostram que o fogo não começou onde a polícia civil diz ter começado
    • Brigadistas seguem com restrição de liberdades

    Diferentemente do inquérito cheio de lacunas e sem elementos de perícia, conduzido pela Polícia Civil do Estado do Pará e que levou à absurda prisão de quatro brigadistas que dedicavam e arriscavam suas vidas para combater incêndios num dos mais conhecidos destinos da região Norte do país, as investigações conduzidas pela Polícia Federal concluiu não ser possível apontar culpados pelos incêndios que devastaram a região em setembro do ano passado.

    Após analisar imagens de satélite, a investigação sigilosa conduzida pela PF descobriu que os dois locais onde o fogo começou se encontram fora da região conhecida como Capadócia. Sem apresentar laudos periciais à época, a Polícia Civil paraense concluiu que os quatro brigadistas haviam ateado fogo nessa região, com o objetivo de arrecadar doações para a Brigada de Alter. As acusações foram feitas a partir em boatos e trechos descontextualizados de ligações telefônicas interceptadas pela polícia.

    Foto: Brigada de Alter

    “Considerando que foram feitos diversos estudos técnico-científicos e levantamentos e que apesar de todos os esforços empreendidos, nenhum resultou em uma definição significativamente clara de autoria, e que efetivamente não existe nenhum elemento que comprove a ação de algum dos investigados para a ocorrência do incêndio”, conclui o relatório da PF.

    Constrangidos e expostos ao julgamento público, os quatro brigadistas tiveram suas cabeças raspadas, e foram tratados pela polícia civil e  pela justiça do Pará como condenados, apesar de terem sido presos preventivamente. Na época, a prisão ocorreu na véspera de uma visita de Jair Bolsonaro à região; o presidente da república acabou usando politicamente a prisão dos brigadistas para dar respaldo à sua narrativa de que ONGs seriam responsáveis por desmatar e queimar a Amazônia. Bolsonaro também insinuou que o ator Leonardo DiCaprio seria um dos financiadores dessas ONGs, o que foi desmentido pela imprensa mundial.

    O pedido de prisão dos jovens foi feito pelo Juiz Alexandre Rizzi, cuja a família é dona de uma madeira no Pará. Apesar de terem sido soltos três dias após sua prisão, e apesar da conclusão do inquérito conduzido pela PF, os quatro brigadistas seguem com suas liberdades restringidas: usando tornozeleiras eletrônicas, com passaportes apreendidos e tendo que ficar em casa durante os período que não estiverem trabalhando, são vítimas do autoritarismo bolsonarismo que tomou conta do país, que persegue, e às vezes mata, ambientalistas e integrantes de movimentos sociais.

    ((o))eco apurou que edificações estão sendo feitas, atualmente, por residentes nos locais das queimadas.

    Foto: Brigada de Alter
  • Sem provas, polícia civil do Pará indicia brigadistas de Alter do Chão

    Sem provas, polícia civil do Pará indicia brigadistas de Alter do Chão

    Num inquérito fraco, cheio de lacunas, a polícia civil do Pará resolveu indiciar, na última quarta-feira (18), os quatro brigadistas que arriscaram suas vidas para apagar os fortes incêndios que destruíram parte da vegetação do balneário de Alter do Chão (Santarém-PA) em novembro deste ano.

    Numa acusação claramente política e persecutória, os brigadistas responderão por danos a unidades de conservação e áreas de proteção ambiental, concurso de pessoas e associação criminosa. Enquanto isso, grileiros e desmatadores que agem há  muito tempo na região foram descartados como suspeitos de terem iniciado os incêndios.

    Em nota de hoje (20), o Projeto Aliança (que defende gratuitamente pessoas que tiveram seus direitos fundamentais violados), redes de advogados e defensores públicos, e organizações da sociedade civil condenaram a ação arbitrária da polícia. Segue a nota:

    “A notícia do indiciamento dos integrantes da Brigada de Alter do Chão surpreende a Defesa e representa uma enorme injustiça. O indiciamento é fruto de ilegalidades e, infelizmente, indica direcionamento da investigação.

    Encerraram-se as investigações de maneira atropelada, sem a realização de perícia técnica, ainda em curso na Policia Federal, para apurar em que circunstâncias efetivamente ocorreu o incêndio. Ignorou-se também pedido para que fossem ouvidas testemunhas indicadas pelos advogados dos brigadistas à autoridade policial há mais de duas semanas. Esta precipitação atenta contra a apuração correta dos fatos.

    O indiciamento foi baseado em ilações extraídas de depoimentos meramente especulativos sem nenhuma prova atacando aqueles que dedicaram as suas vidas a combater incêndios voluntariamente na região amazônica.”

    Saiba mais sobre o caso:

    Para prefeito , grileiro e policial militar podem ter causado incêndio em Alter do Chão

    Nota de esclarecimento da Brigada de Alter do Chão

    MPF no PA requisita inquérito que acusa brigadistas por incêndio em Alter do Chão

    Família do Juiz que determinou prisão de brigadistas já foi multada por crime ambiental

     

     

     

  • Para prefeito , grileiro e policial militar podem ter causado incêndio em Alter do Chão

    Para prefeito , grileiro e policial militar podem ter causado incêndio em Alter do Chão

    Em entrevista ao Brasil de Fato,  Nélio Aguiar (DEM), prefeito de Santarém,  diz que a região do Lago Verde, também conhecida como Capadócia, é alvo de grilagem há mais de uma década, e que a versão mais citada entre os moradores Alter do Chão é a de que o incêndio ocorrido em setembro teria sido causado pelo grileiro Silas da Silva Soares, que está foragido, e seu filho, que atua como policial militar.

    MPF-PA e PF investigam há meses a região, e até o momento não encontraram indícios do envolvimento de ONGs ou ambientalistas nos incêndios que ocorreram em setembro. Entenda o caso:

    No dia 26 de novembro, os brigadistas Daniel Gutierrez, Gustavo Fernandes, Marcelo Aron e João Victor Romano foram presos pela Polícia Civil do Pará, apontados como principais suspeitos de terem iniciado o fogo em Alter do Chão, com o objetivo de arrecadar fundos para a brigada voluntária em que eles atuam.  O caso teve repercussão mundial e após ser constatada a fragilidade das acusações da polícia, os brigadistas foram liberados no fim da tarde de 28 de novembro pelo mesmo juiz que havia autorizado as prisões, Alexandre Rossi.

    Após a repercussão do caso, o governador Helder Barbalho (MDB-PA) determinou a substituição  do delegado responsável.

    O grileiro Silas da Silva Soares e seu filho policial militar:

    “O Silas é pai de um militar. O filho dele é da Polícia Militar. Por isso que as pessoas comentavam que tinha policial envolvido. Ele [pai] sumiu de Santarém. Ninguém mais sabe o paradeiro dele. Ele é um foragido da Justiça, e ele que era o líder lá”, relata Aguiar. “As pessoas comentavam que o incêndio provavelmente era criminoso e que talvez ele, de onde ele estivesse foragido, pudesse ter ordenado, articulado algum tipo de ação ali para aumentar mais a venda de lotes próximo ao lago de Alter do Chão”, explicou o prefeito à reportagem do Brasil de Fato.

    Para o prefeito de Santarém, Silas teria ateado fogo em dois terrenos grilados por ele, para limpar a área, fazer loteamentos e vender.

    Entenda o caso em: https://www.brasildefato.com.br/2019/12/03/grileiro-e-filho-pm-causaram-incendio-atribuido-a-brigadistas-no-para-diz-prefeito/

     

  • URGENTE: MPF no PA requisita inquérito que acusa brigadistas por incêndio em Alter do Chão

    URGENTE: MPF no PA requisita inquérito que acusa brigadistas por incêndio em Alter do Chão

    Os quatro brigadistas tiveram suas cabeças raspadas, e estão sendo tratados pela polícia civil e  pela justiça do Pará como condenados, apesar de estarem em prisão preventiva, numa investigação controversa e cheias de inconsistências. Os jovens também têm sido expostos na mídia tradicional que, como de praxe, não fez seu trabalho de apuração jornalística.

    Mas uma pequena luz se acende para um caso que, ao que tudo indica, se trata de mais uma armação político-judicial-policial para atacar ONGs, movimentos sociais e ambientalistas, prática que vem crescendo com o bolsonarismo.

    O Ministério Público do Pará enviou ofício, no final da tarde de hoje (27), à Polícia Civil do Pará, requisitando acesso integral ao inquérito que acusa brigadistas por incêndios florestais em área de proteção ambiental em Alter do Chão. Segundo o MPF-PA, a Polícia Federal vinha desde setembro investigando os incêndios ocorridos na região e, até o momento, não encontrou indícios do envolvimento de brigadistas ou de ONGs.

    Veja nota do MPF-PA:

    O Ministério Público Federal (MPF) em Santarém (PA) enviou ofício à Polícia Civil do Pará requisitando acesso integral ao inquérito que acusa brigadistas por incêndios florestais em área de proteção ambiental em Alter do Chão.
    Desde setembro, já estava em andamento na Polícia Federal um inquérito com o mesmo tema.  Na investigação federal, nenhum elemento apontava para a participação de brigadistas ou organizações da sociedade civil.
    Ao contrário, a linha das investigações federais, que vem sendo seguida desde 2015, aponta para o assédio de grileiros, ocupação desordenada e para a especulação imobiliária como causas da degradação ambiental em Alter.
    Por se tratar de um dos balneários mais famosos do país, a região é objeto de cobiça das indústrias turística e imobiliária e sofre pressão de invasores de terras públicas.
    Ministério Público Federal no Pará
    Assessoria de Comunicação