Jornalistas Livres

Categoria: Violência Policial

  • Memórias do Cárcere na Ditadura Temer

    Memórias do Cárcere na Ditadura Temer

     

    Sérgio Andrade e Deborah Fabri perderam um olho. Fernando Fernandes perdeu um dente. Tive a sorte de não perder mais do que minha câmera. Cobria o quarto ato “Fora Temer” em São Paulo, pelos Jornalistas Livres, desde a concentração em frente ao MASP. Força policial maciça, a postos em cada esquina das transversais de lado a lado e em frente ao museu, helicóptero no ar. Força policial não apenas desproporcional ao número de manifestantes (sou de humanas, basta dizer que estes ocupavam quase toda a extensão do quarteirão) como completamente desorganizada. Ou propositalmente. Manifestantes eram orientados a seguir por determinado caminho e se deparavam com uma barreira policial pronta pra atacar. O jornalista foi se informar. “Não recebemos ordem nenhuma”. Entrou em cena o advogado.

    Com OAB recém-reativada, por há muito já temer o pior, tentava intervir sempre que a chapa esquentava, questionando majores, tenentes, soldados, os próprios manifestantes (em sua maioria jovens e adolescentes). Assim acompanhei o ato até a 9 de Julho: ora imprensa, ora direitos humanos. Encontrava-me entre o batalhão e o povo no momento em que um dos manifestantes soltou um rojão pro alto e de imediato a PM respondeu como de hábito descomedida com balas de borracha e bombas de gás.

    O que se seguiu daí em diante, há de ficar guardado na memória. Após a esperada dispersão, com o celular descarregado e perto de casa, resolvi fazer um pit stop pra recarregar a(s) bateria(s) e mandar notícias à base (modo avião desde o Aeroporto Internacional de Brasília, onde cobria a consumação do golpe, incomunicável desde horas antes). Não durou cinco minutos. O tempo de olhar pela janela e dar de cara com cerca de cinquenta homens da Tropa de Choque atravessando a Roosevelt.

    Deixei o celular pra trás, catei uma Sony Cyber-shot e saí correndo de casa, escadas, praça e Nestor Pestana abaixo, rumo que o batalhão tinha tomado. Câmera ligada e gravando. No caminho, um senhor de paletó e gravata, bigodão caminhoneiro, tipão funcionário público no fim do expediente, proibido de atravessar a rua em direção ao bar. Portava copo cheio pela metade e garrafa vazia de cerveja. Alcancei a consolação esbaforido e me posicionei diante da tropa formada.

    Coisa de meio minuto depois, um policial aponta pra alguém às minhas costas e grita: “Pega esse filho da puta, é manifestante, pega, pega”. Virei e dei de cara com um companheiro Jornalista Livre, quem transmitia tudo ao vivo desde o começo. Minha única reação ao ver dois ou três policiais partindo pra cima do moleque: sair correndo em seu socorro, identificando-o como imprensa. Caí na arapuca. Uma escopeta apontada pra minha cabeça. Tratei de erguer as mãos e também me identificar, recuando. Jornalista, advogado, cidadão, o diabo. E mais policiais chegando. Disparavam tantos palavrões que provavelmente nem me escutaram.

    Antes que tivesse a chance de mais argumentar, fui atropelado na calçada por uma motocicleta. Obviamente conduzida por um PM não identificado. Com a moto ainda avançando, pulei de lado e nova investida. Encurralado, acabei imobilizado por quatro ou cinco policiais e colocado de joelhos com alguns chutes. Tudo filmado. Tomaram minha câmera e me empurraram de cara pro chão. Ao virar o rosto, vi minha câmera sendo estraçalhada por vários coturnos. “Ainda bem que deixei o celular em casa”, pensei na hora. Algemado.

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    Levantaram-me praticamente pelas algemas e, com uma chave de braço, fui orientado por um dedo no meio da cara a baixar a cabeça e andar depressa. A cabeça não deu pra manter erguida, o peso da mão foi maior. Minhas forças concentrei em resistir contra quem me empurrava e diminuir o passo até por detrás da formação. Procedimento padrão. “Senta, fica sentado, cala a boca, cadê a coragem agora?” Sorri pra foto e, em seguida, uma filmadora. Identifiquei-me novamente e perguntei ao cinegrafista da corporação do que estava sendo acusado. Ao que um dos policiais presentes e não identificados tratou de responder: “A gente arruma uns trinta enquadramentos, pode deixar”. Opa. Como que ensaiado, uma bomba de gás explodiu mais adiante. Sentado e algemado, não me restou outra escolha senão lacrimejar. Ao ver fotógrafos se aproximando, gritei o bom e velho bordão: “Chama os Livres”. Com novo dedo na cara e mais berros, fui convidado a me acomodar no porta-malas da viatura. Sirene e máquina de lavar acionadas. Sacolejei por todo o percurso do rally até a 78a DP. Quatro motos na escolta. Até me senti com certa importância.

    Após meia hora de espera dentro do porta-malas em frente à delegacia, documentos checados, versão alternativa dos fatos confabulada, resolveram me tirar. Dois policiais civis nos recepcionaram ainda na rua e tentei novamente me identificar como jornalista e advogado. Irritar os milicos assim pra quê? Devo ter merecido a chave de braço que quase deslocou meu ombro em seguida, capaz. Uma vez na delegacia, “de cara pra parede”. Desobediente que só eu, olhei pro lado e me apareceu feito uma miragem: uma integrante dos Advogados Ativistas, batendo o tradicional ponto na DP após as passeatas. Enfim alguém me escutava.

    A advogada assumiu meu caso de imediato e entrou em contato com os Livres. Enquanto ela corria com os procedimentos, a também outra advogada ativista, como um Cristo em pleno Lava-pés, prontamente se pôs a cuidar dos meus ferimentos: escoriações nos cotovelos, a queimadura no calcanhar causada pelo pneu da moto. As duas sempre argumentando: “Não há a necessidade de deixá-lo algemado, meu cliente não representa ameaça alguma”. Mãos inchadas, pulsos arranhados. Tivemos todos que nos contentar com um “mas apresentou”. Os Livres chegaram logo em seguida. Depressa me levaram de lá.

    Conduzido por um policial civil, fui orientado a retirar o cinto e os cadarços do tênis após enfim me ver livre das algemas. “Detesto PM”, confessou-me. Então, fui encarcerado. Todo o horizonte de uma parede de corredor por trás das grades. Cela padrão, como vemos na tevê, a não ser pelo fato de eu estar só: dois catres, uma retrete turca, sem iluminação, paredes e parte do teto rabiscados. Nada muito diferente do que um banheiro masculino. Putaria, autoajuda, Marias e Joãos. Uma mensagem dedicada ao PT e aos comunistas. Frio e fedor de suor mofado com limo e tédio insuportáveis. Quase durmo, não fosse a movimentação.

    Nessa ordem: um policial civil, um PM, o delegado, a escrivã. Todos me ouviram na cela. Só então, a advogada. Depois, um representante da OAB. Por fim, um rapaz de seus vinte e tantos anos, camisa de futebol número 110, que levou uma eternidade pra se identificar. Cinco anos em Guarulhos I recém-completos. Acusado de assaltar um bêbado. Sem provas do crime. Desesperado, chorando, passou a se debater na cela ao lado, dando com a cabeça (suponho) contra a parede. Acalmou quando comecei a assobiar canções do Chico. A Banda, Apesar de Você, Construção, todo o repertório de um disco inteiro até alguém aparecer pra me liberar. No caminho à sala da escrivã, os PM’s me encararam, visivelmente preocupados. Vislumbrei uma das integrantes dos Advogados Ativistas me aguardando na sala de espera. A outra advogada me acompanhando de perto.

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    Ao me sentar diante da escrivã, deparei-me com duas pedras do tamanho de 2666 e uma long neck vazia de Stella Artois, tudo muito bem embalado pra viagem em sacos plásticos. Stella Artois. Peço encarecidamente que, da próxima vez, arrumem algo mais forte. Tenho uma reputação a zelar. Acusado de desacato e agressão, a escrivã quase não nos deixa ler o TCO, coagindo-me a assiná-lo sob ameaça de voltar pra cela. A advogada interveio e o Delegado entrou em cena, visivelmente contrariado e se desculpando. “Ela não é minha funcionária, tá de plantão”. TCO reescrito pelo Delegado de acordo com meu depoimento, assinei e fui liberado com o compromisso de comparecer em juízo pra resolver o “caso”.  Os PM’s já tinham batido em retirada havia muito. Voltei pra casa na condição de autor e vítima, com o requerimento do Corpo de Delito em mãos.

     

    Abaixo, a versão de tão honrados servidores públicos cuja condição de policiais militares lhes confere o benefício da fé pública:

     

    BO

     

     

    Agora, os fatos como de fato ocorreram:

     

     

    Vítima da PM? Que a corporação me desculpe, porém: tanto mais me reconforto no papel de algoz. Não, ao contrário dos senhores, ninguém aqui quer olho por olho, dente por dente, lente por lente. Só justiça. E se possível, sim, o fim da polícia militar. Uma instituição comprovadamente corrompida em suas entranhas, que se vale sem a menor vergonha na cara da mesma narrativa forjada vez atrás da outra contra quem, no fim das contas, está lutando também por seus direitos. Muito embora sobretudo pela perda de certos privilégios que um policial civil ou qualquer outro cidadão não tem. Estejam certos disso: os senhores não passarão.

  • Hell de Janeiro, uma bomba-relógio

    Hell de Janeiro, uma bomba-relógio

    O texto é grande
    porque a dor é
    imensa.

    Hell de Janeiro,
    uma bomba-relógio.

    Ontem [10/8/2016] 3 militares da Força Nacional entraram desorientados-desavisados na Vila do João, na Maré.
    O resultado, cês sabem: medalha de chumbo para os milicos (todos gravemente feridos).
    Nesse momento, qualquer morador consciente projeta: amanhã o chicote vai estralar, vão escaldar a gente. E não deu outra. Pela manhã [11/8], as forças militares do mundo com direito a helicóptero-caveirão-e-muitas-balas-encontradas, entraram sem café.

    Aí, cê que mora no asfalto reflete a seguinte genialidade:

    “ah… mas esperavam o quê? Os caras fuzilaram a polícia, pediram para que fizessem operação, agora ‘aguenta’.”

    Claríssimo pensamento antipático de quem, muito provavelmente, desconhece a realidade-sobrevivência do periférico. Mas eu explico aos desconectados com o mundo real: no meio da guerra, entre a polícia e o bandido (muitas vezes a mesma fita), estão os moradores. Surpresa.

    Vale o lembrete então: moradores não possuem peito de aço, não dispõem de coletes a prova de balas, não andam armados, não circulam dentro de caveirões blindados e nossas casas não possuem passagens secretas e não são revestidas como as do Batman. Surpreendente, né?.

    Ao contrário do imaginário, quando a bala come e o bicho pega, a gente se joga no chão, literalmente. Se esconde nos escombros e até em meios aos corpos mortos, sim,

    c-o-r-p-o-s-m-o-r-t-o-s.

    Falta ao trabalho, a escola fecha, o compromisso será perdido, mesmo que o mais importante do mundo-vida e se alguém estiver chegando em casa, naquela hora, volta… fica por aí… e aí cê fica onde? Sim, na rua. E se alguém estiver morrendo? “Aguenta aí, vai ter que esperar.”
    Mesmo assim, são muitas as mães levando seus filhos, no meio do quebra-pau, para a UPA, para a emergência, porque pais desesperados com seus filhos enfrentam tudo e a necessidade grita, filhão.

    “MAS por que não denunciam então? Vocês são cúmplices da ‘bandidagem’”.

    Esse talvez seja o pensamento-questionamento mais antipático e alienado do universo, mesmo assim, sério, olha aqui, olho no olho, face to face. Cê acha mesmo, na moral, que denunciar bandido– para bandido –resolve alguma coisa, e mais, aprende a brincar antes de descer ao play, a roda parou de girar há séculos para a realidade à margem e a culpa-responsabilidade é do morador… Jura?

    Vamos considerar, por um breve momento, o seguinte: o sistema de segurança sabe quem é quem dentro de uma favela, quem manda, quem desmanda, quem vende, quem recebe. Quem é quem, parceiro.
    Essa é a primeira– e única –verdade que você aprende em qualquer filme asqueroso a respeito da guerra as drogas.

    Contudo, o que “Os Caras” fazem?

    Bola um roteiro cinematográfico, enche a periferia de fardados, esculacham os moradores, ganham o aval da sociedade para entrar e fazerem o que bem entenderem e, no fim, prende alguém?
    Agora é a hora do show: você não é inocente, olha aqui no olho novamente, o que eles prendem, depois de matar um ou outro, são… buchas. E bucha é o que não falta, até morador, se estiver na reta do cano, vira bucha, parceiro.

    Amarildo virou bucha e corpo sem vida em 10 minutos.
    Já se esqueceu do Amarildo, né?

    Esqueceu do Rafael Braga também?
    Esse está vivo e com acusações até o pescoço por coisas que nunca fez.

    E o presídio todo está lotado de malucos que nada fizeram, papo de quem trampou no sistema e que trocou ideia com todo tipo de gente nessa vida. Essa é a fita, meu caro.
    Colocar no peito do morador a responsabilidade pela segurança pública é moleza, mas enfrentar as consequências ninguém quer. E a gente, à margem, está pagando dia-e-noite pelas cagadas de uns fardados, mas principalmente, pelas cagadas de uns engravatados.
    O show de horror é patrocinado por gigantes de todos os tipos de indústrias, políticos de todas as estirpes, gente de altíssimo calibre que precisa manter o caos do jeitinho que ele é.
    E os caras matam policiais, também, irmão.
    Matar faz a roda girar, é o jogo.

    Mas isso deve parecer conspiratório demais para a sua cabecinha…

    Pois saiba que não é, parceiro. A guerra as drogas é a obra ficcional mais bem roteirizada-produzida-dirigida da história. O projeto de empreendedorismo mais criativo pensado até hoje e, por tudo isso… fuzila morador e depois justifica… COLOCA NA CONTA DO PAPA.

    E tem um plus para o texto gigante, com direito a exercício final, reflete uma outra parada aí, sobre essa tal “olimpíada”. Por aqui, no Hell, a violência, segundo os jornais, não existe mais.
    Duas semanas atrás, todos os dias, a periferia estava na telinha. Agora, ninguém mais ouve falar. A gente está até ganhando medalha, porra. Quando noticiam alguma operação, “… trabalho de rotina em comunidades”.
    Nada nunca mais aconteceu, moradores nunca mais foram entrevistados e casa nenhuma fotografada, mas eu te mostro, o que mais tem é carro-casa-criança-perfurada.
    Para gringo-e-turista andar tranquilamente, os caras fizeram a seguinte paradinha daora: ocuparam todas as comunidades, esculacharam quem precisava. Agora, a gente está indo para casa mais cedo e com medo de chegar tarde, ninguém mais quer dar rolé para longe com medo de não voltar.

    BINGO!
    Para quem acertou que a higienização foi um sucesso.

    Exercício de casa:

    Rio de Janeiro 2016 para quem?
    Olimpíada para quem?
    Mobilidade para quem?
    Segurança para quem?
    Lazer para quem?
    … Legado para quem?

    Respostinha de orientação:

    somente hoje, 11 de agosto de 2016, para quem ler depois, 5 morreram na cidade olímpica.

    Foram 4 na comunidade Bandeira 2, em Del Castilho e outro 1, na Maré.

    #‎Olimpíada  /  #‎Rio2016  /  #‎JogosOlimpícos  /  #‎JogosDaExclusão

    #‎SomosMarginais  – Marginal

     


    Jota Marques, educador social, é escritor-observador das periferias, morador da Cidade de Deus, no Rio de Janeiro. Em constante luta, carrega como bandeira a resistência da própria vida e o combate à exclusão e genocídio dos historicamente marginalizados: os mais pobres.

    Este texto foi publicado originalmente na página Marginal Oficial do facebook:

    https://www.facebook.com/marginaloficial/?fref=ts

     

     

     

  • Black Lives Matter

    Black Lives Matter

    A violência policial contra a população negra tem sido motivo de protestos em muitas cidades norte-americanas. Ontem, sexta 15, foi em Reno, Nevada.
    Cerca de 500 manifestantes gritavam: “Black lives matter” (As vidas dos negros têm importância) e “No justice, no peace!” (Sem justiça não há paz!).
    As lideranças do protesto em Reno eram muito jovens: nenhum dos que tomaram a palavra tinha mais de 30 anos.
    Um menino que gritava, insistente e solitariamente, o nome de Donald Trump, teve seu grito abafado por dezenas de vozes bradando: “Black lives matter”.
    À pergunta: “What do we want?”(O que queremos?), todos respondiam: “Justice!” (Justiça). Outra pergunta se seguia: “When do we want it? (Quando a queremos?). “Now!” (Já!), respondiam os manifestantes.

     

     

  • JOSELITA MORREU DE TRISTEZA

    JOSELITA MORREU DE TRISTEZA

    Quando a Chacina de Costa Barros aconteceu, em janeiro do ano passado, os familiares dos cinco jovens mortos souberam do ocorrido pelo WhatsApp. Nas favelas do RJ, o App se tornou ferramenta de sobrevivência, mas também o portador das más notícias, estas, conforme afirmou, na ocasião, Mônica, a mãe de Cleiton (18), um dos jovens assassinados, são cotidianas:

    “Não é possível tanto sofrimento na vida de uma mãe. Aqui todo o dia morre gente e nunca sai na imprensa, quem garante que esses policiais não vão vir na minha casa e fuzilar todo mundo?”.

    A impossibilidade de tal sofrimento, dita por Mônica, foi o que consumiu o emocional de Joselita de Souza, mãe de Roberto, o Betinho, de 16 anos. Ela foi internada por parada cardiorrespiratória, logo depois descobriram que ela também estava com pneumonia e anemia, mas não foi isso que a matou, para os seus familiares e amigos, ela morreu de tristeza. Na quinta feira, dia 7, como afirmou seu filho mais velho, Vinicius: “dignamente, ela se entregou”.

    O remédio que era necessário para amenizar a sua dor se chama Justiça, algo que nos últimos meses ela passou a não acreditar mais, e se agudizou com a soltura dos policiais Antonio Carlos Gonçalves Filho, Thiago Resende Viana Barbosa, Marcio Darcy Alves dos Santos e Fabio Pizza Oliveira da Silva, acusados pelo assassinato de seu filho. Todos retornaram ao trabalho, agora, atuando administrativamente, sem prazo para o processo interno de exclusão, segundo a PM do RJ.

    A mola propulsora da tristeza de Joselita, não foi apenas a morte do filho, a angústia da mulher se fez forte pela injustiça. O Estado matou Roberto e, em seguida, deu o golpe de misericórdia em sua mãe. A Chacina de Costa Barros carrega mais uma morte, Joselita é a sexta vítima. A mulher não morreu a tiros, mas o que a rasgou por dentro foi a omissão das autoridades responsáveis pelo caso.

    No ano passado, estive no Complexo do Alemão e conversei com o Sr. Carlos, marido de Elisabeth Alves de Moura Francisco, que também foi morta pela Policia. Para ele, o coração de quem mora na favela é um coração amputado. E, nessa cirurgia, o cirurgião é o Estado, e o procedimento, sem anestesia, mata aos poucos, dói. Em sua última noite com o filho mais velho, Vinicius, em uma conversa franca entre eles, Joselita chorou. Era sobre o “Betinho” que eles conversavam e sobre ela não se entregar à tristeza, mas ela já havia decidido, enfim, descansar. A dor da amputação já não lhe cabia mais.

    Joselita e os dois filhos dois filhos, vinicius e betinho. Foto Arquivo Pessoal.
    Joselita e os dois filhos, vinicius e betinho. Foto Arquivo Pessoal.

    Vá em paz, Joselita! No que depender nós, clamaremos por Justiça.