Jornalistas Livres

Categoria: Reforma Trabalhista

  • LULA ERROU

    LULA ERROU

    Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia

    Não dá mais pra tampar o sol com peneira, negar o óbvio, defender o indefensável: Lula errou, errou feio e vai pagar por isso. Cansei de ficar fazendo malabarismo retórico na internet, defendendo quem tá errado.

    Paciência é aquele tipo de coisa que tem limite. Errou tem que pagar. Simples assim.

    Não é fácil admitir. Conto quase 32 anos. Votei pela primeira vez aos 16, em Lula. É óbvio!

    Durante a metade desses 32 anos de vida, olhei para o governo federal e vi o partido dos trabalhadores lá, tocando o projeto político que me formou.

    É que sou da geração REUNI, entendem? Me formei como professor e intelectual, da graduação ao doutorado, na universidade pública administrada pelos governos petistas. Todo aquele papo que vocês já conhecem: primeiro universitário da família, e blá, blá blá.

    Trabalhei e estudei muito, muito mesmo. Mas tenho certeza, absoluta certeza, de que não chegaria aqui sem as políticas públicas petistas. Sou um entusiasta da ideia de mérito, pois uma sociedade que não se fundamenta no mérito acaba se transformando no império dos privilégios.

    Não podemos entregar a ideia de “mérito” numa bandeja de prata para a direita. Precisamos disputar essa narrativa, e reconhecer que toda a ascensão social da última década se explica pelo encontro virtuoso entre mérito e política pública.

    Não foi só mérito. Não foi só política pública. É o encontro entre os dois.

    Confesso que é muito difícil pensar o governo federal brasileiro sem o Partido dos Trabalhadores, sem as inaugurações das unidades do Minha Casa Minha Vida. É triste.

    Mas o tempo passa, e na medida em que os governos petistas vão cada vez mais se transformando em ausência, vou conseguindo ter uma leitura mais sóbria disso tudo.

    E como a sobriedade é o terreno da crítica, cá está a minha crítica ao PT e a Lula. O grande erro do PT foi o grande erro de Lula, pois já há algum tempo, Lula é maior que o PT.

    Foi um erro conceitual. Foi um erro de percepção de mundo, de compreensão do que é o Brasil. Justo Lula, tão sagaz, tão sensível para o entendimento da realidade brasileira. Ele errou e errou feio.

    Explico.

    É que algumas ideias circulam como o ar, entendem?

    Algumas ideias estão em todos os lugares, configurando nossos sentidos, mediando nossa relação com o mundo. Se quiserem, podem chamar isso de “senso comum”. A gente nem sabe de onde a ideia veio e por que pensa assim. Mas pensa. É algo tão profundo que se torna quase uma natureza.

    O erro de Lula tá aí. Talvez nem dê pra chamar de erro.

    Não! Vou chamar de erro sim! Não vou aliviar o sapo barbudo. Não dessa vez! Tô nem aí. Chega! Perdi a paciência! Lula é culpado!

    Lula naturalizou uma das principais narrativas de fundação do Brasil, exatamente aquela que define nossas elites como “cordiais”, “paternais”.

    Nossos senhores de escravo seriam mais generosos. Por aqui, o racismo teria sido mais brando. Nossos patrões seriam mais bondosos. Nossa Casa Grande seria a morada não apenas da opressão, mas também do cuidado, da proteção.

    O mito da cordialidade senhorial brasileira é tão forte, mas tão forte, que, de alguma forma, ele se faz presente em todos nós, prefigura a forma como olhamos e a realidade e interpretamos o Brasil.

    O mito da cordialidade senhorial estava em Lula, estimulando sua ação política, a sua interpretação do Brasil.

    “Lula gosta de vida boa e cachacinha. Faz tudo pelos pobres, mas nunca quis incomodar os de cima”, disse Marcelo Odebrecht, em delação premiada.

    Essa frase merecia mesmo um prêmio, um Oscar! O aforismo define Lula com perfeição: Lula se convenceu de que seria possível melhorar a vida dos pobres sem incomodar os de cima. Lula comprou mito da cordialidade senhorial.

    Lula, meus amigos, superestimou as elites brasileiras, achou que essas pessoas fossem capazes de serem melhores do que são. Lula não imaginou que essas pessoas pudessem ser tão baixas, tão ruins.

    Lula pensou: “Porra, é só Bolsa Família. Três refeições por dia. O dinheiro vai pro mercadinho, movimenta a economia. Ninguém vai se incomodar com isso”.

    Lula pensou: “Qual o problema do pobre estudando na universidade? Quanto mais gente estudando, melhor pra todo mundo, mais educada fica a sociedade”.

    Lula pensou: “Quanto mais gente andando de avião, mais as passagens ficam baratas. Melhor pra todo mundo”.

    Lula errou, errou feio, errou rude. Lula não imaginava que as elites brasileiras pudessem ser tão mesquinhas.

    Lula estava convencido de que dava pra melhorar a vida dos pobres sem incomodar os de cima. Afinal, uma coisa não necessariamente resulta na outra.

    Certo?

    Não, não e não.

    Não porque o cálculo dessa gente não é objetivo. Nossas elites não são racionais. Nossas elites são de tipo antigo, estão atravessadas pela noção de privilégio.

    A madame de Copacabana, viúva de militar, pensionista, não quer saber se é melhor, racionalmente falando, viver em um país onde as pessoas comam três vezes por dia. O simples fato de o pobre “ganhar” alguma coisa, uma merrequinha que seja, incomoda a rentista, a parasita que não trabalha, que não produz nada pra ninguém.

    O jornalista do Leblon não quer saber se o aquecimento do consumo é algo positivo pra economia do país. O simples fato de descer do prédio e ver as Tvs expostas nas vitrines das Casas Bahia tocando brega, funk e sertanejo lhe enoja. É isso: ele sente nojo, asco daquela estética, daquele tipo de gente.

    A professora universitária não quer saber se a passagem de avião tá mais barata. Ela olha pro lado e vê o mestiço ali, de bermuda e chinelo, quase encostando nela. Tá muito perto, tá igualado pela posição de consumidor.

    É outra lógica da luta de classes, entendem? É a luta de classes materializada na forma de convívio nos espaços de consumo, de gozo.

    Nossa elite não consegue aceitar o gozo do pobre. Para as nossas elites, o pobre só deve gemer de dor. O prazer é monopólio, é privilégio. Nossas elites são sádicas.

    É com esse tipo de gente que Lula achou que dava pra governar. Lula achou que eles seriam capazes de ceder um pouco, só um pouquinho.

    Lula vacilou, vacilou muito.

    Lula achou que não precisava barbarizar, achou que dava pra todo mundo conviver em harmonia.

    Lula não quis ser caudilho. Não quis cultivar um dispositivo militar. Não quis fechar a Globo. Não quis fazer culto à imagem. Não quis botar um busto de bronze em cada buraco desse país. Não quis um terceiro mandato. Não quis rasgar a Constituição.

    Lula não quis aparelhar o Judiciário.

    Em algum momento, Lula achou que o problema do Brasil estava resolvido, e que era hora de sair de cena. Lula chegou a pensar em abandonar a política, e se tornar uma liderança mundial no combate à fome; um líder identificado com uma agenda humanista, suprapartidária.

    Tolo!

    Lula brincou de republicanismo na terra dos coronéis. Lula errou muito.

    Lula achou que nossas elites o perdoariam, o deixariam em paz.

    Lula achou que essa gente perdoaria sua ousadia.

    Lula achou que poderia se sentar à mesma com eles. Beber o mesmo vinho.

    Eles não engolem, eles não aceitam esse peão cachaceiro, insolente. Analfabeto.

    Lula errou em se deixar levar pelo mito da cordialidade senhorial, e pagou caro, muito caro.

    Pagou com a infelicidade dos filhos e netos, com a morte da companheira de uma vida. Lula sofrerá até o último momento de sua vida.

    Lula será odiado por essa gente mesmo depois de morto. O corpo morto de Lula precisará de escolta, de proteção. Eles vão querer mutilar o defunto, arrancar-lhe as vísceras, salgar o terreno onde será cavada a cova, para que nada mais ali brote. Da cova do operário que ousou ser presidente da República fundada pelos bacharéis, do país forjado no escravismo, nada pode brotar.

    Lula errou, e errou feio e por isso foi condenado.

    O julgamento do dia 24 de janeiro nada teve a ver com o Triplex que não foi comprado. Lula foi julgado e condenado porque superestimou o Brasil.

    Lula achou que o Brasil fosse melhor do que é; achou que o Brasil pudesse ser o que jamais foi, o que jamais será. Quanta pretensão, quanta ousadia! Que todos os juízes do Brasil condenem o criminoso!

     

    Foto Ricardo Stuckert

  • O QUE FALTA ACONTECER?

    O QUE FALTA ACONTECER?

    Por Chico Malfitani*, especial para os Jornalistas Livres

     

    O que falta acontecer no Brasil pós-golpe?

    Que direitos mais faltam tirar dos trabalhadores?

    Que cortes no orçamento das áreas sociais falta Temer fazer?

    Que retrocessos na luta contra a escandalosa desigualdade social faltam acontecer?

    Que riquezas e empresas nacionais faltam esse governo entregar para os estrangeiros?

    Que ataques à liberdade artística e de gênero faltam os fascistas realizarem?

    O que falta o governo Temer fazer para trazer mais recessão e desemprego para o nosso povo?

    O que falta mais acontecer para muitos promotores, policiais federais, juízes e membros do Supremo continuarem desrespeitando a Constituição?

    O que falta mais entregar para a maioria dos deputados da desmoralizada Câmara Federal continuar apoiando esse governo corrupto e entreguista de Temer?l

    O que falta mais acontecer para todos tomarem consciência que a violência crescente no Brasil é fruto do desemprego, da recessão, do desânimo e da absoluta falta de credibilidade de instituições e governos do país depois do golpe?

    O que falta acontecer para se enxergar que a corrupção hoje no governo Temer atingiu níveis nunca vistos no Brasil?

    Que fala de general falta acontecer para se constatar que um retorno à ditadura militar ronda os lares dos brasileiros?

    E agora vem o mais grave de tudo:

    O QUE FALTA ACONTECER NO BRASIL PARA OS DEMOCRATAS, OS PROGRESSISTAS, AS ESQUERDAS E O CENTRO SE UNIREM?

    O que falta acontecer para que os que defendem a justiça, a democracia, a igualdade social, o desenvolvimento econômico para todos, as riquezas e o patrimônio nacional se unirem?

    O que falta para as lideranças de partidos, de movimentos sociais, de organizações de classe, de entidades, se unirem em uma só voz em defesa do BRASIL PARA OS BRASILEIROS?

    O que falta hoje acontecer para que se deixem de lado projetos pessoais, partidários ou econômicos e todos esses segmentos se unam em defesa da nação?

    E que mostrem aos 94% dos brasileiros que não aprovam o que Temer e seus aliados fizeram com o País que um outro  Brasil é possível?

    O que falta para estarem juntos num mesmo projeto num mesmo evento, integrantes e lideranças do PT, PCdoB, PDT, PSOL, PSB, PCO, dissidentes do PMDB e REDE, UNE, CNBB, CUT e outras centrais sindicais, associações de engenheiros, professores, advogados, jornalistas, artistas, intelectuais, blogueiros de redes sociais progressistas, empresários nacionalistas, etc, etc?

    O que falta acontecer no Brasil, para que todas as importantes iniciativas de combate a esse retrocesso nunca visto na nossa história se unam em torno do bem comum?

    Juntos por um BRASIL  PARA OS BRASILIEROS, Lula, Ciro Gomes, Haddad, Jaques Wagner, Roberto Requião, Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias, Manuela d’Ávila, Flávio Dino, Stédile, Boulos, Suplicy, Erundina, Jean Willys, Alessandro Molon, Bresser Pereira, Celso Amorim, Katia Abreu, Randolfe Rodrigues, Pedro Celestino,  presidentes da UNE, OAB, CUT, CNBB, juristas, jornalistas, artistas, brasileiros enfim que desejam um Brasil Justo para todos.

    O que falta para todos esse partidos, movimentos sociais e entidades de classe afirmarem em um ato conjunto que um outro Brasil é possível. E não esse que estamos –infelizmente– vivendo?

    O que falta para deixarem as pequenas diferenças de lado e estarem juntos em tudo que os une e que não é pouco: um Brasil que tenha desenvolvimento econômico, justiça social, defesa das nossas riquezas, democracia e liberdade para todos?!

    UM BRASIL PARA OS BRASILEIROS!

    E que em 2018, aconteça o que acontecer, estarão todos defendo esse projeto.

    A esmagadora maioria do nosso povo espera  ansioso por esse ato de força e grandeza!

    O que falta para isso  acontecer ?

     

    Chico Malfitani é jornalista e publicitário com mais de 30 anos de trabalho no marketing político. Comandou campanhas vitoriosas, como as que elegeram Luiza Erundina, prefeita de São Paulo; Eduardo Suplicy, senador do PT; Aldo Tinoco, prefeito de Natal (RN); Wilma de Faria, prefeita de Natal e governadora do Rio Grande do Norte; Willian Dib, prefeito de São Bernardo do Campo (SP) e João Paulo Kleinubing, prefeito do Blumenau (SC). Como jornalista, trabalhou em grandes veículos de comunicação como Veja, Jornal da República, TV Globo, TV Bandeirantes, TV Record, revista Placar e jornal Folha de S.Paulo. Fundador da Gaviões da Fiel, maior e mais tradicional torcida organizada do Corinthians, é um dos idealizadores e responsáveis pela campanha “Um Brasil justo pra todos e pra Lula”.

     

  • Quando a modernização representa tempos de escravidão

    Quando a modernização representa tempos de escravidão

    Quem imaginaria que, após tanta nova tecnologia, teríamos que expor a mulheres, fetos e crianças a ambientes de trabalho prejudiciais à saúde?

    A Lei 13.287/2016, promulgada no governo Dilma e antes do golpe de Estado, alterava a CLT para prever que:

    Art. 394-A. A empregada gestante ou lactante será afastada, enquanto durar a gestação e a lactação, de quaisquer atividades, operações ou locais insalubres, devendo exercer suas atividades em local salubre”.

    Perceba que uma das maiores mentiras dos defensores da reforma trabalhista cai por terra em poucas linhas. A CLT nasceu em 1943, mas, de lá para cá, foi sempre alterada, inclusive imediatamente antes do golpe de Estado bancado pelos proprietários de empresas, latifúndios e meios de comunicação.

    Se a Lei 13.287/2016 protegia as mulheres, fetos e crianças – em verdade, a toda a população que trabalha, pois ninguém quer ver alguém da família desenvolvendo doença grave simplesmente para assegurar um lucro maior de um patrão – a reforma trabalhista nos leva de volta a tempos de escravidão, em que tudo pode vir a acontecer:

    Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:

    I – atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação;

    II – atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação;

    III – atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação”.

    Ao permitir o direito de mulheres afastarem-se de atividades insalubres caso apresentem atestado médico, a reforma cumpre, de maneira sutil, o papel oposto: permitir que mulheres em estado de gravidez trabalhem em atividades insalubres de grau baixo e médio, bem como, em período de amamentação, trabalhem em atividades insalubres de até grau máximo – exceto se toparem arcar com o ônus de apresentar atestado médico à empresa e todas as conseqüências de ir de encontro aos interesses de seus patrões.

    Mas tem mais, cara trabalhadora, trabalhador ou parente de trabalhadora: a reforma trabalhista diz que acordos e convenções coletivas prevalecerão sobre a lei quando se tratar, dentre vários outros temas, de enquadramento do grau de insalubridade:

    Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: […] XII – enquadramento do grau de insalubridade”

    Em 2016 avançamos quanto à proteção da mulher – e de toda a sociedade que vive do seu próprio trabalho. Mas, agora, este governo ilegítimo e os parlamentares que o apóiam querem uma escravidão modernizada; um país de pessoas doentes – uma sociedade doente – e, para completar, sem seguridade social para resguardá-las. É claro que estas previsões – e outras mais que veremos nos próximos textos – são inconstitucionais; mas, apenas a organização, consciência de classe e mobilização de trabalhadores e trabalhadoras farão as elites brasileiras recuarem.

     

     

     

     

     

     

     

     

     

    Nota

    1 Trata-se do primeiro texto de uma série voltada a popularizar as alterações provocadas pela reforma trabalhista, a partir dos interesses de trabalhadores e trabalhadoras, e contribuir para a campanha da CUT de anulação dessa medida nefasta às trabalhadoras e trabalhadores brasileiros em geral.


     

     

    * Daniel Araújo Valença, professor de Direito da Universidade Federal Rural do Semi-árido, colaborador dos Jornalistas Livres.

     

  • QUE O SUICÍDIO SEJA UM DESPERTADOR PARA O BRASIL

    QUE O SUICÍDIO SEJA UM DESPERTADOR PARA O BRASIL

    Por Tiago Peregrino dos Jornalistas Livres

    O início do processo político que estamos vivendo se deu em junho 2013 quando foi deflagrado o levante popular em todas as capitais do país de forma desordenada, espontânea e até agressiva. Com diversos atores sociais envolvidos, as pautas mesmo que difusas pelo caráter horizontal do movimento, representavam uma clara coerência com os pleitos reconhecidamente à esquerda do espectro político-ideológico. Um povo cansado e espremido entre um Estado ineficiente e uma iniciativa privada voraz, clamava por proteção e direitos. Pedia um Estado maior e mais eficaz, que entregasse o que estava previsto na Constituição: saúde, educação, transporte e segurança. Se tornou um verdadeiro cavalo sem sela que ninguém conseguiria prever onde poderia dar.

    As elites previram e agiram rápido. A Lava-Jato surgiu para aplacar a sede de sangue e pintar com mais precisão os objetivos dessa massa frustrada. Se o erro de 2013 era não ter liderança política e nem alvo bem definido, agora com o apoio da Globo tudo estava resolvido e reconfigurado: Moro, representado na figura do Aécio e com esse apoio da mídia, vaticinou o extermínio do PT do mapa. Com tudo devidamente encaixado ficou fácil controlar as rédeas desse cavalo. Com o domínio da narrativa por parte desses novos atores, as pautas agora estavam à direita do espectro político-ideológico. Menos Estado e menos políticas sociais se escoravam no Fora PT e no Viva Sérgio Moro. Seria questão de tempo para tudo se resolver, e no caso era previsto que se resolvesse logo na eleição daquele ano de 2014, mas a coisa desandou e mais lenha teve que ser jogada na fogueira.

    Os métodos da Operação foram cada vez mais à margem da Constituição, uma caçada em nome da moralidade transformou a democracia em obstáculo. Fez-se de tudo para mostrar que com ela nada iria mudar, a eleição passou a ser um problema e a soberania popular foi esquecida. A partir daí virou terra de ninguém. O STF negociava aumento pro judiciário enquanto autorizava Cunha a tocar o processo de impeachment. O juiz de primeira instância estava com carta branca para cometer os crimes necessários para cumprir o objetivo. Renan deu uma banana pra Suprema Corte enquanto Jucá combinava o pacto com Sergio Machado. O que se dizia a sociedade era: agora vale-tudo. O justiçamento promovido por Moro se espalhou dentro e fora do meio jurídico, a derrocada da democracia criou a atmosfera para que cada cidadão se sentisse no direito de fazer justiça com as próprias mãos. Começaram a amarrar pivete em poste, a endeusar figuras messiânicas como Bolsonaro, a radicalizar o discurso de moralização pela família brasileira, a pedir pela cura gay, e assim abriu-se o terreno para a penetração cada vez mais forte da igreja nas casas legislativas e até nos museus. O Bispo Macedo agradece, Crivella idem.

    O poder não deixa vácuo, se tem alguém perdendo, tem alguém ganhando. Com a saída do PT e a demonização das pautas progressistas, Michel Temer surgiu como instrumento para executar uma política diametralmente oposta àquela clamada pelas ruas em 2013: cortou os gastos com os serviços públicos, os direitos trabalhistas e protegeu a iniciativa privada, diminuindo o poder do Estado e favorecendo os especuladores internacionais. A nova narrativa venceu e o país ficou de quatro.

    Foto: Jair Quint/Agecom

    Velório do reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier, suicidado após um processo de linchamento sem defesa

    Essa semana o reitor da UFSC tirou a própria vida após ser preso e jogado nu em uma cela sob a absurda acusação de obstrução de justiça. A imprensa, os justiceiros do judiciário e os incautos, o condenaram previamente como é característico do Estado Punitivista que estamos. O reitor que dedicou sua vida à universidade usou uma tragédia para mostrar outra ainda maior. Quem não se choca com isso jamais poderia se chocar com o vazamento de um grampo ilegal da presidência. O terreno para o fascismo está adubado, Bolsonaro cresce nas pesquisas. O ano de 2018 está gravemente ameaçado e 2017 já é uma desgraça. Se a Lava-Jato recuperou R$ Bilhões até agora, Temer gastou 4 só pra enterrar a primeira denúncia. É preciso acordar novamente o tal gigante. Que o suicídio do reitor Luiz Carlos Cancellier sirva de despertador.

  • Os 100 anos da Greve Geral devem nos inspirar para a luta que vem aí!

    Os 100 anos da Greve Geral devem nos inspirar para a luta que vem aí!

    Por Bloco Fluvial do Peixe Seco, Coletivo Atos da Mooca e Fanfarra Clandestina, especial para os Jornalistas Livres

    Há 100 anos os direitos dos trabalhadores não estavam garantidos e regulamentados no Brasil, recém saído de quase 400 anos de escravidão. Era comum crianças de 10 anos trabalhando, jornadas de trabalho gigantescas, pagamento de salários de miséria frequentemente atrasados, mulheres recebendo menos do que os homens para a mesma jornada de trabalho e a ausência de fiscalização para proteger o trabalhador.

    Nesse contexto, as mulheres trabalhadoras de diversas tecelagens iniciaram paralisações nos bairros fabris da Mooca e do Brás, em São Paulo. As paralisações se espalharam a partir da organização de luta do movimento anarquista. A classe trabalhadora, não aceitando mais passivamente esse cenário, construiu através de organizações livres e autônomas, espalhadas pelos bairros operários, a histórica greve geral de 1917. Desafiaram o governo, a polícia e os empresários: VENCERAM! VENCEMOS!

    A greve garantiu a conquista de um primeiro conjunto de direitos trabalhistas, muito importante para toda a população até hoje. Foi um marco importante, no Brasil, de uma luta que atravessa os séculos pelo mundo.

    Agora, os direitos conquistados através de muita luta desde 1917 até hoje estão sob ataque, na forma de uma reforma trabalhista que nos levará a uma situação muito parecida com a de 100 anos atrás. E nós, como parte desse movimento agora já centenário, estamos nas ruas para defender as conquistas históricas e os nossos direitos.

    No próximo sábado, 15.07.17, convidamos a todas e todos para celebrar, relembrar e LUTAR conosco no cortejo de 100 anos da greve geral de 1917, uma homenagem à história de todas as pessoas que se ergueram em defesa de uma vida mais digna e pela construção da história dos trabalhadores e de outra sociedade.

    O cortejo acontecerá a partir das 14 horas, com concentração na estação Brás do Metrô/CPTM, na saída para o Largo da Concórdia. No trajeto, ao som do Bloco Fluvial do Peixe Seco e da Fanfarra Clandestina, passaremos em frente ao prédio da Tecelagem Mariangela, local onde o sapateiro José Martinez, de 21 anos, foi assassinado durante uma manifestação em 1917. Seguiremos então para o local onde morava Martinez (ponto inicial do cortejo fúnebre que levou seu corpo ao cemitério do Araçá em 1917) e partiremos rumo à praça da Sé. Ao longo do percurso, diversas intervenções artísticas serão realizadas pelos grupos Madeirite Rosa, Coletivo Território B e Companhia 3×4 + Boneca Operária Gigante de Mônica Estela e Claudia Silva. Ao término, na praça da Sé, será exibido o curta-metragem “Ressuscita-me: A luta vive”, do Coletivo Atos da Mooca.

    O cortejo encerra um conjunto de atividades deste #JulhoCentenário, construido autonomamente ao longo dos últimos meses pelos coletivos Bloco Fluvial do Peixe Seco, Fanfarra Clandestina, Rosanegra Ação Direta e Futebol, União Lapa Foot Ball Club, Corote e Molotov, Biblioteca Terra Livre, Sangue nas Tetas e CMI.

    O filme: “A luta vive”

     

    SINOPSE:
    São Paulo, julho de 1917. Durante os prelúdios da primeira grande greve operária da cidade, trabalhadores que protestavam na porta de uma fábrica no Brás são atacados pela polícia, resultando na morte do jovem sapateiro espanhol José Martinez. O filme mostra de forma onírica o cortejo fúnebre de Martinez em uma erma rua operária. Em algum momento da procissão, o espectro de Martinez desperta e vaga por ruínas de vilas operárias até chegar, por uma fresta no tempo, ao ano de 2017.

    Em fevereiro de 2017, o Coletivo Atos da Mooca, formado por professores(as) de audiovisual, começou a construção de um novo filme, “Ressuscita-me: A Luta Vive”, inspirado também pelo cortejo de carnaval criado pelo Bloco Fluvial do Peixe Seco, que no ano de 2017 homenageou o Rio Cassandoca (hoje canalizado e escondido), assim como o centenário histórico da Greve, nas menções ao operário José Martinez e as operárias da Mooca e do Brás.

    Diante deste contexto, o Atos da Mooca iniciou seu processo coletivo, envolvendo professores, alunos, com gravações no Largo da Batata, Praça da Sé, Mooca, Brás e Vila Maria Zéila (histórica Vila Operária, construída no ano de 1917).

    Em sua investigação de linguagem, o coletivo propôs um recorte alegórico a propósito dos acontecimentos da greve, tendo como ênfase sobretudo o fatídico assassinato do operário anarquista espanhol José Martinez, pela Polícia Militar do Estado de São Paulo. Este episódio de nossa história, propositalmente tão pouco lembrado, entretanto, é comemorado no brasão desta mesma polícia, cuja 10ª estrela do brasão alude à “Repressão à Greve Geral Operária de 1917”. Embora as fotos de época mostrem e privilegiem sobretudo a participação masculina na greve e no cortejo do operário Martinez, é fundamental a lembrança de que a greve fora principiada pelas operárias, fatigadas do assédio cotidiano sofrido no chão das fábricas. Assim, em “Ressuscita-me: A Luta Vive”, são as operárias que carregam o caixão de José Martinez. A captação do filme fora feita em suporte super8, e privilegiou a tomada única, isto é, obedecendo à própria sequência filmada, em que cada plano corresponde a um plano, de fato, no filme final, sem montagens posteriores. Nos termos de Vertov, a “montagem durante a rodagem”.

    O tratamento alegórico confere ao filme elipses temporais que perpassam, de forma poética e crítica, a luta trabalhadora. O personagem de José Martinez vagueia pelo tempo. Em 1917, as opressões contra a classe trabalhadora motivaram a união e a luta e assim conquistas fundamentais foram alcançadas ao longo do século XX, ao custo de muito suor e sangue operário. Em 2017, novas opressões contra a classe trabalhadora empreendidas sobretudo por um legislativo e executivo corruptos e favoráveis ao balcão de negócios tocados pelos patrões e por uma imprensa oportunista, sonegadora e descompromissada dos interesses populares, repercutem nas propostas da Reforma da Previdência e da Reforma Trabalhista. Coletivos organizados vão às praças e às ruas e manifestam-se terminantemente contra essas medidas. Cem anos depois, por uma fresta do tempo, Martinez está no Largo da Batata, encontrando xs trabalhadorxs que continuam sua luta.

    O filme estreou no último Festival Super Off, IV Festival Internacional do Cinema Super8 de São Paulo, e durante a exibição seu som foi executado ao vivo, uma vez também que o super8 utilizado no filme não permite o registro síncrono do som. No sábado, 15/07, o filme será novamente apresentado na Praça da Sé, desta vez no contexto das comemorações do Julho Centenário, em homenagem à histórica Greve. O som, desta vez, será executado ao vivo pelo Bloco Fluvial do Peixe Seco e pela Fanfarra Clandestina.

     

    Link para o evento: www.facebook.com/events/1175122145949060?__mref=mb

    Equipe Atos da Mooca e colaboradores afetivos do projeto: Renato Coelho, Caio Lazaneo, Ivan Ferrer Maia, Ricardo Matsuzawa, Felipe Bonfim, Thomaz Pedro, Alexandre Marino, Felipe Merker Castellani, Carolina Berger, Francis Vogner Dos Reis, Sheila Schvarzman, Carlos Camargo, Juan Manuel Tellategui, Joviniano Borges da Cunha, Anderson Gonçalves, Jennifer Glass, Bruno Botas, Grazi Ferracciolli, Deco Zido, Rodolfo Valente, Vitor Kisil Miskalo, Ludmila Daher, Guilherme Soares, Priscyla Bettim, Nivaldo Ferraz, Mariana Poli, Cecília Lazaneo, Veronica Monachini, Vanessa Carina, Tami Hirata, Felipe Moraes, Gustavo Carvalho, Willian Young, Valéria de Oliveira Mota, Thales Barbalho, Samuel Kassapian, Jorge Cassapiam, Fátima Cassapiam, Gladis Cassapiam Barbosa, Laura Cassapiam, Leticia Tomé, Renata Furlan, Guilherme Gila, Gabriel Fonseca, Mariana Prado, Catherine Nikole da Cruz, Stefani Raquel Angelo Formes, Carlos Grabrieal Pegoraro Paiva, Laysla Ribeiro Brigatto, Lucas Sanches dos Anjos, Thais Leister Barcellos, Gabriela Lourenzeto Guarda, Fabiola Rizzo Sanches, Bruno Henrique Bragante, Carol Tomasulo, Camila Luz, Tamires de Moraes Hirato, Vanessa Karina de Oliveira, Veronica Monachini, Julia Bianda Consolaro, Bruna Brito, Thiago Domingues Rollo, Cesar Dinola, Sara Borges, Matheus Mendes, Raquel Borges, Mariela Cantú e Bruno De Angelis.