Jornalistas Livres

Categoria: Previdência

  • A PM e a Reforma da Previdência

    A PM e a Reforma da Previdência

    Por Carlos Wagner, especial para os Jornalistas Livres

     
    Como sinais emitidos por um sismógrafo que acaba de captar um grande terremoto sendo gerado no interior da Terra. Assim devem ser entendidas as razões que levaram à greve do mês passado dos policiais militares capixabas, que teve seu foco maior em Vitória (ES). Eles fazem parte de um contingente de 450 mil PMs espalhados pelos 26 Estados e mais o Distrito Federal. São homens e mulheres armados, equipados, mal treinados e, miseravelmente, remunerados – com exceção do DF.

     

    De todo o aparato policial brasileiro, do qual fazem parte também as polícias civis e Federal, são os PMs os mais exigidos pela população, por fazerem o chamado patrulhamento ostensivo, responsável por conter aqueles tipos de crimes que mais atormentam a população como assalto a pedestre, latrocínios (roubo com morte), furto e roubo de veículos e arrombamentos. Esses crimes são praticados por quadrilhas cada vez mais audaciosas e perigosas. Muitas deles se organizam em forma de facções, que têm como seus expoentes o Primeiro Comando da Capital (PCC), de São Paulo, e o Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro.

     

    Com pequenos retoques, é esse o quadro entre os 450 mil policiais militares, responsáveis pela segurança nas 5,5 mil cidades do país. Usando o jargão dos repórteres para descrever a situação das polícias militares, pode-se dizer que é um barril de pólvora com um pavio curto aceso. E o fogo que consome o pavio é o projeto de reforma da previdência do governo federal. Muito embora PMs e bombeiros tenham sido deixados de fora do projeto pelo presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), indiretamente eles serão atingidos.

     

    Temer retirou-os da reforma usando o argumento de que eles são pagos pelos Estados, cabendo, portanto, aos governadores lidarem com a questão. O que o presidente não disse, e é isso que as entidades de classe dos PMs estão alertando, é que os Estados, para terem acesso ao socorro financeiro do governo federal, precisam dar em troca contrapartidas – ou seja, cortar gastos. E um dos maiores gastos é a previdência social. Portanto, os PMs e os bombeiros serão atingidos por reformas. No Rio Grande do Sul, há projetos em andamento na Assembleia Legislativa que mexem com a aposentadoria dos brigadianos – como são chamados os policiais militares gaúchos.

     

    Se o barril de pólvora explodir, como acreditam várias lideranças sindicais, a parte visível da explosão será a greve, temida pela população, principalmente das cidades grandes, por se tratar da polícia ostensiva. Embora proibidas, por ser a PM um braço das Forças Armadas, as greves acontecem. A maior de todas, que se espalhou por todo o país, foi em 1997, em Belo Horizonte (MG), quando um cabo foi morto por uma bala perdida.

     

    A parte invisível desta explosão já está acontecendo. É a busca da renda extra pelo policial militar, na forma do “bico” como segurança privado. No Brasil, de Norte a Sul e de Leste a Oeste, a maior ocupação dos policiais militares é trabalhar na segurança do pequeno comércio varejista. Aliás, há estatísticas mostrando que a maioria das mortes e dos ferimentos entre os PMs ocorre em confrontos com bandidos enquanto eles fazem “bico”.

     

    Outro problema é o envolvimento de policiais militares em agressões e até mortes de pessoas, que, por algum motivo, frequentam o comércio que é protegido por eles. A maioria dessas agressões acontece em casas noturnas, onde eles são contratados como “leões de chácara”.

     

    Um tipo de ocupação que vem crescendo entre os PMs do Brasil e tem sido detectado por várias corregedorias das polícias militares é o recrutamento pelas quadrilhas. No Rio de Janeiro, nasceram entre os PMs as milícias que substituíram os traficantes em várias favelas. Nos Estados do Norte e do Nordeste, investigações que apontam o envolvimento com os bandos, que usavam as táticas do cangaço – um grupo bem armado ocupa uma cidadezinha – para assaltar bancos nas cidades do interior. No Oeste, há o envolvimento com contrabandistas e traficantes dos países vizinhos, principalmente do Paraguai. No Sul, além trabalharem no comércio varejista, eles também formam seguranças clandestinas de residências em ruas e avenidas.

     

    A insatisfação nas polícias militares é explosiva. Não por acaso, é justamente neste ambiente que prosperam discursos comprometidos com o retrocesso político, como se viu durante a greve dos PMs capixabas, em que o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e seus assessores tiveram um papel muito ativo. Imaginem o que aconteceria em um movimento como o de 1997. (Veja neste vídeo aqui quem são os heróis de Bolsonaro e pense se é isso o que vc deseja para o país).

     

    Durante a ditadura militar (1964 a 1985), as polícias militares fizeram parte do serviço sujo para as Forças Armadas – reprimindo as passeatas e prendendo e torturando em seus quartéis. Claro, os oficiais que faziam a ligação entre as tropas federais e as PMs não estão mais na ativa. Mas muitos deles estão vivos e gozam de boa saúde. Bolsonaro pode ser o fósforo que irá acender o pavio do barril de pólvora. Quem duvida?

  • Prefeito de Florianópolis marca rodada de negociação com municipários e não comparece

    Prefeito de Florianópolis marca rodada de negociação com municipários e não comparece

    por Raquel Wandelli, especial para os Jornalistas Livres

    O prefeito de Florianópolis, Jean Loureiro (PMDB), propôs uma rodada de negociação com os municipários em greve, depois de uma forte manifestação realizada pela categoria no Centro de Florianópolis ontem (20), no final da tarde. Cerca de sete mil servidores públicos municipais estão em greve há 36 dias contra um pacote de medidas que retira todos os direitos dos trabalhadores, além de desmontar o sistema de saúde do município, que é um modelo para o país desde a implantação do SUS. A rodada começou no final da tarde, logo após a passeata, sem apresentação de nenhuma proposta, mas a reunião de fato, que deveria ter prosseguido hoje pela manhã, na Prefeitura, não aconteceu. O prefeito preferiu judicializar a conversa, convocando uma reunião para amanhã (23), às 9 horas, no Tribunal de Justiça, internediada pela desembargadora que decretou a ilegalidade da greve, Vera Lúcia Cepetti.

    Aprovada na última assembleia da categoria, a proposta apresentada pelo Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Municipal de Florianópolis (Sintrasem) solicita que o executivo encaminhe Projeto de Lei à Câmara de Vereadores restabelecendo todos os direitos suprimidos pela aprovação do PL 1591, de  janeiro deste ano que, entre outras alterações estruturais, determina o fim do plano de carreira do servidor e cortes superiores a 50% nas futuras aposentadorias. O PL faz parte de um conjunto de projetos de cortes nas verbas públicas apresentado em caráter de urgência pelo executivo à Câmara de Vereadores, no mesmo estilo do que fizeram os prefeitos de São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. É considerado o piloto municipal do pacote neoliberal de desmonte do serviço público impetrado por Temer no país, conforme o presidente do Sindicato, Alex dos Santos. “Estão esfriando a negociação para apostar num refluxo da categoria, mas estão enganados: o movimento está cada vez mais forte e não vai arredar”, avalia Renê Munaro, farmacêutico e membro do Comando de greve, que considera a convoção da reunião para o TJ como uma tentativa de judicialização das negociações e criminalização do movimento. Servidores e entidades apoiadoras da luta farão uma manifestação em frente ao Tribunal pela manhã, durante a audiência.

    Com adesão inédita dos médicos, dos assistentes sociais, de várias outras categorias, e 100% de paralisação das escolas, os servidores tiveram uma reação forte e persistente, mantendo uma greve inédita na história. Desde o dia 17, a creche Matheus de Barros, no bairro Monte Cristo, está ocupada pelos pais e servidores para impedir o seu fechamento pelos cortes de verbas. Uma rua lateral à creche foi fechada pelos próprios moradores para que ninguém entre enquanto não houver garantia de creche para todos com a derrubada do pacotão de Gean. Enquanto desenvolvem atividades políticas e educativas dentro da creche ocupada, pais e crianças ouvem as sirenes da polícia do lado de fora. Amanhã (22) às 8h30min, um ato será realizado no bairro em apoio à greve, informa Camila Boff, integrante do Comando de Greve, grávida de oito meses, que estava na manifestação do Centro. Grande maioria dos pais e alunos da rede municipal apoia a paralisação e participa com os professores das atividades de rua da categoria.

    No dia 17 de março, o secretário Filipe Mello declarou em programa de rádio que a prefeitura havia encaminhado projeto atendendo algumas revindicações e propondo o fim da greve. A categoria, contudo, entendeu que não havia nenhum recuo do prefeito e votou pela continuidade do movimento, respondendo com uma proposta que pede a revogação do chamado “pacote de maldades” de Gean Loureiro, Gean Loureiro que se elegeu com a promessa de valorização do serviço público e dos aposentados. O presidente do sindicato da categoria, Alex Santos, reclama principalmente do “atropelamento e autoritarismo na imposição das medidas, que foram votadas e aprovadas no período de recesso, por apenas um voto e sem a necessária discussão com a sociedade civil organizada e nem mesmo com os vereadores, que nem tiveram tempo de apreciar medidas tão complexas e impactantes para o futuro da população”.

    Durante a manifestação de ontem, que foi acompanhada por forte aparato policial cercando as ruas e a entrada dos prédios da prefeitura, o sindicato distribuiu um material que apresenta de forma bem didática o pacote de Gean Loureiro para facilitar o acompanhamento das ações e ajudar a população a compreender as repercussões negativas do pacote. Ao mesmo tempo em que avança com as ofensivas contra os direitos, o prefeito impinge sanções aos trabalhadores em greve, o que só tem fortalecido o movimento, conforme o médico Renato Figueiredo, diretor do Sindicato dos Médicos de Santa Catarina e membro do Comando de greve do Sintrasem, que considera a iniciativa de Gean como uma forma de desestruturação do Sistema Único de Saúde, ao tirar a perspectiva de carreira do médico e reduzir a carga horária dos agentes comunitários. Entidades sindicais de todo o Brasil e de vários países se manifestaram contra as ameaças de prisão dos sindicalistas, quando, há duas semanas, o procurador geral de Florianópolis entrou no Tribunal de Justiça com pedido de intervenção no sindicato e prisão de todos os diretores da entidade, que não estariam cumprindo a ordem judicial de retomar o trabalho. O pedido não foi aprovado pela desembargadora responsável.

     

    Por volta das 17:30 de hoje, o grupo, formado por professores, trabalhadores do posto de saúde, demais servidores e representantes da comunidade, saiu da E.B. Dilma Lúcia dos Santos rumo ao centro do bairro próximo à praia. No caminho, foi buscado o diálogo com a comunidade, explicando sobre a situação e falando palavras de ordem contra o prefeito Gean Loureiro – chamado de “Inimigo da Cidade” por alguns cartazes – e o projeto de lei 597/17, conhecido como Pacote de Maldades, por retirar direitos dos servidores públicos. Na marcha, houve momentos também de crítica à cobertura midiática da RBS sobre a greve. A greve caminha para ser a de mais longa duração na história da categoria, contabilizando até hoje 36 dias. Fotos: Giovanni Velozo.
  • Trabalhar até morrer? Não!

    Trabalhar até morrer? Não!

    Representantes de sindicatos, movimentos sociais, coletivos, partidos, centrais sindicais, docentes, técnicos administrativos e estudantes decidiram se reunir em um Comitê oficializado nessa quinta 16 de fevereiro. O objetivo é lutar, juntos e em unidade, contra a reforma da previdência social proposta pelo governo Temer, que tramita no Congresso Nacional como PEC 287/2016. O lançamento do Comitê Regional Contra a Reforma da Previdência ocorreu do lado de fora da Câmara Municipal de Uberlândia, no Triângulo Mineiro. O local do evento foi escolhido para representar o apoio do grupo aos professores e professoras da educação básica do município, que ocupam há dias o plenário da casa legislativa em protesto por salários e benefícios atrasados desde dezembro de 2016.

    Membros de entidades que representam trabalhadores e estudantes compõe a mesa durante o lançamento do Comitê 

    A atividade contou ainda com a participação de cerca de 200 membros do Movimento dos Sem Teto do Brasil, moradores do assentamento Élisson Prieto (Glória). Eles faziam parte de um grupo maior que havia se manifestado na reitoria da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e depois se dirigiram para o lançamento, de modo a mostrar apoio tanto ao Comitê quanto aos servidores que ocupam a Câmara.

    Segundo os organizadores, o intuito da iniciativa é apresentar um núcleo de resistência e enfrentamento à retirada de direitos, desumanidades e retrocessos reunidas sob o título de “Reforma da Previdência”. O Comitê está organizado, ainda, para fornecer esclarecimentos e informações atualizadas e especializadas para a população de Uberlândia e região por meio de palestras, mesas redondas, materiais informativos e visitas a universidades e outras instituições. Na programação de atividades do Comitê estão, ainda, atos públicos, artísticos e outras manifestações educativas políticas e sociais contrárias às mudanças na seguridade social. A primeira ação a ser realizada será o Ato Contra a Reforma da Previdência, no próximo dia 23 de fevereiro, quinta-feira, às 16 horas na Praça Tubal Vilela, centro de Uberlândia.

    O professor Ricardo Takayuki, um dos fundadores do grupo, afirma que o comitê é um instrumento necessário de luta contra os retrocessos que a PEC 287 representa para os direitos das trabalhadoras e trabalhadores. “Nossa organização é norteada pelos princípios democráticos, respeitando a pluralidade de ideias e está aberta para todas e todos que queiram somar esforços nessa luta”, explica Takayuki.

    De acordo com a presidenta do Sindicato dos Docentes da UFU – ADUFU, Jorgetânia Ferreira, uma das fundadoras do Comitê, a Reforma da Previdência é injusta porque penaliza principalmente os pobres, as mulheres, professores da educação básica e os trabalhadores e trabalhadoras rurais. Eleva a idade mínima de homens e mulheres para 65 sem considerar que as mulheres geralmente têm múltiplas jornadas de trabalho. Por exemplo, com tarefas domésticas e cuidados com crianças, idosos, familiares enfermos e pessoas com deficiência.

    Nem a chuva leve que caiu impediu os moradores da Ocupação do Glória de somarem à luta

    Esta sobrecarga histórica foi reconhecida pela Constituição Federal de 1988 que estabeleceu cinco anos menos na idade das mulheres aposentarem, em relação aos homens. O redutor de cinco anos também se aplica aos trabalhadores e trabalhadoras rurais e aos professores e professoras da educação básica, por reconhecer as especificidades e dificuldades inerentes à essas profissões. “Entendemos que é um momento difícil e que a gente precisa enfrentar essa Reforma da Previdência. Ela eleva a idade para aposentar e também traz um novo cálculo para o benefício da aposentadoria. Atualmente a legislação estabelece 15 anos de contribuição para ter acesso a aposentadoria. Se a Reforma passar serão necessários pelo menos 25 anos de contribuição para uma aposentadoria parcial. Para ter acesso a sua aposentadoria integral seriam necessários 49 anos de contribuição”, explica Ferreira.

    Servidores ocupam plenário da Câmara Municipal de Uberlândia à luz de velas. Prédio teve energia, água e internet cortados.

    A presidenta resume o conjunto de mudanças previdenciárias com a seguinte afirmação: “Isso significa, na prática, que a população brasileira não se aposentará porque morrerá em serviço. Sabemos que na dinâmica do nosso mercado de trabalho é quase impossível entrar em um emprego aos 16 e ir até os 65 anos sem interrupções. E a gente sabe que a partir de uma determinada idade o mercado não absorve os/as trabalhadores/as. Assim as pessoas ficarão fora do mercado de trabalho e não se aposentarão”. Outra crueldade prevista na reforma é a mudança nas pensões por morte. Se o texto for aprovado como está, o valor pago à viúva ou ao viúvo passará a ser de 50% do valor do benefício recebido pelo contribuinte que morreu, com um adicional de 10% para cada dependente do casal. Assim, as pensões poderão ser menores que o salário mínimo.

    O Comitê Regional Contra a Reforma da Previdência está aberto a adesões de entidades que queiram somar forças para a luta. Segue abaixo a lista das entidades que compõem o grupo até o momento:

    • Sindicato dos Trabalhadores Técnico – Administrativos em Instituições Federais de Ensino Superior de Uberlândia – SINTET-UFU
    • Associação dos Docentes da Universidade Federal de Uberlândia – ADUFU-SS
    • Central Única dos Trabalhadores – CUT
    • Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB
    • Central Sindical e Popular – CSP-Conlutas
    • Sindicato dos Empregados no Comércio de Uberlândia e Araguari– SECUA
    • Sindicato dos Professores de Minas Gerais – SINPRO
    • Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Uberlândia – STRU
    • Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais – SindUte-MG
    • Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica – SINASEFE
    • Sindicato dos Ceramistas de Monte Carmelo
    • Vamos à Luta!
    • Enegrecer
    • Kizomba
    • Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
    • Mais
    • Direito e(m) Movimento
    • Movimento Popular pela Reforma Agrária (MPRA)
    • MTST
    • Coletivo Juntos
    • Sindicato dos Servidores de Monte Carmelo e Região

     

     

     

     

  • 30 e nada mais até depois dos 65

    30 e nada mais até depois dos 65

    *com ilustrações de Carolina Itzá

    O toque do celular, o beijo, a noite de ontem, o preço da cerveja que já chegou aos 12 e antes não passava de 7. Lembra de dois anos atrás? Quanta coisa foi e quanta é agora na baldeação entre a linha amarela e verde perto das 16h. Os pelos da axila, os odores, os psiu, os fiu fiu ou o ai não aguento mais isso. Com emprego, sem emprego nessa coisa de não passar dos 30 e ter acabado de chegar aos 20 e poucos. Quem se importa se o berço ainda me embala, se as fábricas me esperam. Produzir e consumir. Consumir eu já sei, só não quero produzir. Nhé nhé nhé nhé nhé. O bebê sem touca está chorando abandonado pelas grandes mães do sentido. O leite que saia daquelas tetas fazia mais sentido do que o mundo agora. Desejo a bonança, mas para chegar lá preciso subir até o último andar de escada. Largar o convencional, o elevador, o sistema, o conforto aveludado. Assim eu choro de novo. Buá buá buá. Chegamos aqui. Talvez seja a hora de pegarmos um voo que sobrevoe as cabeças do mundo enquanto sopramos a verdade da nova era, já que, ninguém entende o nosso chorinho de botequim. Verdade seja dita. Alguns de nós queremos mudar essa casa velha. Encontrar outra saída para essa rua que aparenta ter tantas direções.

    Qual será a minha ainda não sei, mas cansei de chorar e parei de soluçar. Vou-me embora deste berço na inconsequência dos meus 20 e poucos. As máquinas ainda aguardam pacientemente. Seus operantes, ou operados (sabe-se lá) já me convocam avidamente a graxa nas mãos, os sonhos na gaveta do escritório, as férias, os trinta dias, o restante, os enquadramentos, a vida que não sobra. Tem muito boi morrendo, árvore caindo, gente explodindo, dinheiro jorrando. Não é por aí, mas vem por aqui, dizem-me alguns. Não, não vou, não. Vou por ali. Vou para onde possa viver trinta dias e mais trinta e depois outros trinta e, se reclamar, trintão de novo. Um seguido do outro, um sentindo o outro. Vou por ali construir uma narrativa. Soltar outras letras, brigar com palavras que me esperam nas curvas que faço. Quais serão elas não sei ainda, mas é imprescindível consultar o dicionário. Parece-me necessário o afastamento de algumas coisas para chegar a outras no tempo que corre nos relógios de nossas veias. Esse tempo acumulado entope artérias quando ficamos mais velhas e os remorsos e rancores que no coração se alojam não saem mais com trinta dias de férias.

    Passaram-se alguns anos.

    Aliás, o tempo. Liguei a televisão na inocência dos desavisados sobre as grandes tragédias e ouvi que ele não vai sobrar nunca. Só depois dos 65, só depois que o próprio tempo já não mais existir para mim e muitos de meus amigos. O mundo tem passado espantosamente rápido quando olho para o horizonte, sentada no ponto de ônibus da Rebouças com a Avenida Brasil e me recordo das tantas pilhas de papel a serem assinadas, revisadas e arquivadas com o brilho nos olhos de quem quer o mundo todo, todo tempo, toda a experiência, toda vida que transborda e jamais será plenamente sentida enquanto me sento aqui e cheiro a fumaça de máquinas que já se foram quando os meus olhos alcançam qualquer uma delas. Minha avó se sentava na porta de casa e olhava para o tempo. Quando eu era criança nunca entendi o que ela ficava fazendo lá parada. Naquela época eu era o tempo agora. Agora, o vejo passar e me escapar. Ela o encarava. Olhava cara a cara. Acho que ali ela entendia muita coisa e se conciliava com o mundo, o céu, a história dela e dos pais, dos avós, com o nosso vir a ser. Olhar para lata, prédio, teto, outdoor, prateleira, vidro, luz neon, logomarca, banco, cartão, vitrine, telefone, computador, livro ou estante modular não pega nada. Quando a gente amadurece olha para o tempo porque sabe que não demora nada, nada chega a morte. O tempo é mais como um treinamento. Ele cura e abre feridas para o susto não ser grande quando a última visita chegar. Tenho medo de não encarar o tempo. Tenho medo de a vida terminar antes que eu cumpra as horas de vida que devo, antes de bater o cartão da firma e acabar morrendo de velha pensando nos papéis que deixei de assinar e carimbar e pedir para protocolar no nono andar.

    Ilustração de Carolina Itzá
  • Reforma da Previdência para jovens: trabalhar até 79 anos ou mais

    Reforma da Previdência para jovens: trabalhar até 79 anos ou mais

    O que um jovem de 18 anos pode esperar com a reforma da previdência de Temer? A resposta óbvia seria que ele deve trabalhar até 65 anos, agora tanto homem como mulher. Nessa hipótese, trabalharia por 47 anos para ter o direito à aposentadoria.

    A resposta óbvia está equivocada visto que o artigo 201 da Constituição Federal receberá uma alteração, se aprovada a proposta do governo Temer (PEC 287), de que se a expectativa de vida subir em um ano, este jovem teria que trabalhar mais um ano, como se vê abaixo:

    “§ 15. Sempre que verificado o incremento mínimo de um ano inteiro na média nacional única correspondente à expectativa de sobrevida da população brasileira aos sessenta e cinco anos, para ambos os sexos, em comparação à média apurada no ano de promulgação desta Emenda, nos termos da lei, a idade prevista no § 7o será majorada em números inteiros.”

    Em 1991, a expectativa de vida, de acordo com o IBGE, era de 66,9 anos, em 2000 foi de 69,8 anos, e em 2010 chegou a 73,9 anos. Ou seja, a expectativa de vida tem subido entre de 3 a 4 anos por década.

    Se tomarmos o crescimento da expectativa de vida em três anos por década, nestes próximos 47 anos, este jovem teria de trabalhar mais 14 anos para chegar à idade mínima e se aposentaria aos 79 anos.

    Em dezembro de 2015, o IBGE divulgou que a expectativa de vida do brasileiro seria de 75,5 anos, mas devemos lembrar que se trata de uma média, visto que em Santa Catarina foi de 78,7 anos, seguida de Espírito Santo foi de 77,9 anos e em São Paulo 77,8 anos. Por outro lado, o Piauí tem uma expectativa de vida de 70,9 anos e o Maranhão de apenas 70,3 anos. E mesmo dentro de cada Estado brasileiro há grandes variações.

    Resulta que os moradores das regiões mais pobres usufruirão muito pouco do direito de se aposentar e os de regiões mais ricas seriam menos prejudicados, deste modo a reforma da previdência não cria nenhum mecanismo para minorar a desigualdade regional.

    Notas

    1 Para quem quer aprofundar mais sobre a reforma da previdência:

    Emílio Rodriguez: O pulo do gato para privatizar a previdência dos funcionários públicos de todo o País e o mercado ter acesso a bilhões de reais: http://www.viomundo.com.br/denuncias/emilio-rodriguez-o-pulo-do-gato-para-privatizar-a-previdencia-dos-funcionarios-publicos-de-todo-o-pais.html

    2 Comunicado do IBGE revelando a expectativa de vida em 2015: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias.html?view=noticia&id=1&idnoticia=3324&busca=1&t=2015-esperanca-vida-nascer-era-75-5-anos

  • As relações perigosas do Secretário de Previdência

    As relações perigosas do Secretário de Previdência

    Recebemos pelas redes do amigo Arthur Scavone

    No Brasil as coisas óbvias precisam ser ditas.

    Com a angústia de quem descobriu que trabalhará até 80 anos caso a Reforma da Previdência seja aprovada, passei a noite pesquisando o que havia feito o Secretário de Previdência, Marcelo Caetano, o homem por trás da reforma, desde que o governo Termer assumiu. Pois bem, encontrei algumas coincidências:

    29/07/16 – Reunião com representantes da Gap Asset Management

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    http://www.gapasset.com.br/pt/empresa
    01/08/16 – Reunião com representante do Banco BBM
    05/08/16 – Reunião com confederações patronais
    08/08/16 – Reunião com representantes da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNseg)

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    http://www.cnseg.org.br/cnseg/confederacao/o-que-e-a-cnseg/
    12/08/16 – Reunião Ordinária do Conselho Nacional dos Dirigentes de Regimes Próprios de Previdência Social (Conaprev)
    18/08/16 – Reunião Ordinária do Conselho Nacional dos Dirigentes de Regimes Próprios de Previdência Social (Conaprev); Reunião com representantes da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

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    -previdencia-beneficiara-toda-sociedade-diz-gerente-da-cni.html
    30/08/16 – Reunião com representantes do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC)
    31/08/16 – Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC)
    01/09/16 – Reunião do Conselho de Administração da Brasilprev

     

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    http://www2.brasilprev.com.br/Empresa/Paginas/default.aspx
    06/09/16 – Reunião com representantes do Bradesco

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    http://www.bradescoseguros.com.br/wps/portal/TransforDigital/Site/SobreaBradescoSeguros/
    13/09/16 – Reunião com representantes da JP Morgan Private Bank
    20/09/16 – Reunião com representantes da Fitch Ratings
    21/09/16 – Reunião com representantes do Banco Santander
    22/09/16 – Reunião com representantes do Fundo Monetário Internacional (FMI)
    27/09/16 – Reunião com representantes do Fórum das Empresas Transnacionais (FET); Reunião com representantes do Bradesco e da Wellington Management
    29/09/16 – Reunião com investidores da PIMCO

    PAUSA PARA A BIZARRICE

    ——> 06/10/16 – Reunião com representantes do MBL <——

    21/10/16 – Reunião com representantes da Fiesp; Teleconferência com representantes do Bradesco BBI
    25/10/16 – Reunião com representantes da Standard & Poor’s
    23/11/16 – Reunião com representantes XP Investimentos
    30/11/16 – Reunião com representantes do JP Morgan Private Bank

    ——— UM DIA ANTES ———

    05/12/16 – Debate sobre Reforma da Previdência com representantes das Centrais Sindicais

     

    Acho que deu pra entender né?

    A Reforma da Previdência NÃO VEIO pra sanar as contas públicas.

    Ela veio prá que você se veja OBRIGADO a contratar uma previdência privada…

    Fonte: http://fazenda.gov.br/assuntos/agenda/secretario-de-previdencia/2016-12-07?month:int=12&year:int=2016

     

    Saiba por que esta reforma é desnecessária ao país:

    https://jornalistaslivres.org/2016/02/o-superavit-da-previdencia-social/