Jornalistas Livres

Categoria: Lula

  • Antígona e o direito universal de enterrar nossos mortos

    Antígona e o direito universal de enterrar nossos mortos

    Neste nosso momento, com este nosso presidente eleito, há uma significativa parcela da população que saliva por sangue. Gente que, em outros tempos, embarcaria com convicção nas cruzadas contra os mouros (ou, covardemente, apoiaria os templários da santa paz de suas casas). Essa gente, que é parte do mesmo povo brasileiro do qual faço parte, tomou ódio dos “direitos humanos”. Suponho que essa gente esteja acompanhando as notícias do dia de hoje com a mesma disposição de quem acompanha um capítulo de novela, cheio de revira-voltas. Afinal, hoje a justiça brasileira teve de decidir se Lula poderia acompanhar o enterro do irmão. Gostem de spoilers ou não, o fato é que Lula conseguiu a autorização já tarde demais, quando seu irmão já havia sido sepultado. Como se sentiu essa gente com esse desfecho?

    Posso imaginar o júbilo de grande parte dessa gente. Mas tenho fé de que muitos antipetistas, e mesmo probolsonaristas, vacilaram hoje. Há algo de profundo nos eventos desta quarta-feira, 30 de janeiro de 2019. Algo que diz respeito aos direitos humanos e que é capaz, como em toda dramaturgia clássica, transmitir ensinamentos preciosos. Diante disso, afirmo: o dia de hoje, às custas da dor de um cocidadão, generosamente explica o humano no direito.

    Sepultar um irmão é um direito tão, mas tão antigo, que o dramaturgo Sófocles escreveu, no século V antes de Cristo, uma tragédia, intitulada “Antígona”, inteira sobre esse tema. No caso, a personagem Antígona contraria as ordens do rei e sepulta seu irmão, condenado a jazer insepulto. Um corpo insepulto é a maior das desonras. Não por acaso as famílias de desaparecidos clamam pelos seus mortos. Somos humanos porque temos humanidade. E se há, nas culturas comparadas, alguns pontos convergentes, esse é um deles: mesmo os indignos têm direito à sepultura. E seus parentes têm o direito (e o dever) de enterrá-los. Por isso que nossas leis garantem aos presidiários, os criminosos condenados popularmente chamados de “bandidos”, o direito de sepultarem seus familiares mais próximos. Um irmão, por exemplo. Esse direito foi negado ao Lula.

    Antipetistas e probolsonaristas podem vibrar com a justiça brasileira ter julgado, condenado e preso um ex-presidente (certamente não compartilham da minha visão de que Lula é um preso político). Podem, inclusive, perder a compostura e rejeitar o tratamento honrado que cabe a ex-presidentes. Porém, diante dos fatos ocorridos hoje, tenho certeza de que somente os mais inumanos e crueis dos homens não empatizem com Lula. Tenho certeza de que a justiça dos homens falhou aqui e que o povo compreende isso. Porque lá dentro, em nós, há um humano compassivo que sabe que esse nosso direito soberano e universal de enterrar nossos mortos vale pra todos. Um direito que, se nos fosse negado por um Moro-Creonte, nos levaria à desobediência civil. Afinal, somos todas Antígona. Se eu fosse Lula e pudesse fugir para enterrar meu irmão, eu o faria.

    *Por Raquel Valadares, documentarista, especial para os Jornalistas Livres.

  • Leia a íntegra do primeiro discurso de Lula em Davos, em 2003

    Leia a íntegra do primeiro discurso de Lula em Davos, em 2003

    “Boa tarde.

    Estou chegando, como vocês sabem, diretamente de Porto Alegre, onde participei do Fórum Social Mundial, e falei a dezenas de milhares de pessoas sobre os mesmos assuntos de que pretendo tratar aqui.

    A Reunião Anual do Fórum Econômico Mundial tem como tema central a construção da confiança. Sinto-me muito à vontade com esse tema. Sou depositário da confiança do povo brasileiro, que me atribuiu a responsabilidade de conduzir um país de 175 milhões de habitantes, uma das maiores economias industriais do planeta. Mas, um país que convive, também, com enormes desigualdades sociais.

    Trago a Davos o sentimento de esperança que tomou conta de toda a sociedade brasileira. O Brasil se reencontrou consigo mesmo, e esse reencontro se expressa no entusiasmo da sociedade e na mobilização nacional para enfrentar os enormes problemas que temos pela frente.

    Aqui, em Davos, convencionou-se dizer que hoje existe um único Deus: o mercado. Mas a liberdade de mercado pressupõe, antes de tudo, a liberdade e a segurança dos cidadãos.

    Respondi, de forma serena e madura, aos que desconfiaram dos nossos compromissos, durante a campanha eleitoral. Na Carta ao Povo Brasileiro, reafirmei a disposição de realizar reformas econômicas, sociais e políticas muito profundas, respeitando contratos e assegurando o equilíbrio econômico.

    O Brasil trabalha para reduzir as disparidades econômicas e sociais, aprofundar a democracia política, garantir as liberdades públicas e promover, ativamente, os direitos humanos.

    A face mais visível dessas disparidades são os mais de 45 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza. O seu lado mais dramático é a fome, que atinge dezenas de milhões de irmãos e irmãs brasileiras.

    Por essa razão, fizemos do combate à fome nossa prioridade. Não me cansarei de repetir o compromisso de assegurar que os brasileiros possam, todo dia, tomar café, almoçar e jantar.

    Combater a fome não é apenas tarefa do Governo, mas de toda a sociedade. A erradicação da fome pressupõe transformações estruturais, exige a criação de empregos dignos, mais e melhores investimentos, aumento substancial da poupança interna, expansão dos mercados no país e no exterior, saúde e educação de qualidade, desenvolvimento cultural, científico e tecnológico.

    Urge que o Brasil promova a reforma agrária e retome o crescimento econômico, de modo a distribuir renda. Estabelecemos regras econômicas claras, estáveis e transparentes. E estamos combatendo, implacavelmente, a corrupção. Nossa infra-estrutura deverá ser ampliada, inclusive com a participação de capitais estrangeiros.

    Somos um país acolhedor. A tolerância e a solidariedade são características do povo brasileiro. Temos uma força de trabalho qualificada, apta para os grandes desafios da produção neste novo século.

    A retomada do desenvolvimento requer a superação dos constrangimentos externos. O Brasil tem que sair desse círculo vicioso de contrair novos empréstimos para pagar os anteriores. É necessário realizar um extraordinário esforço de expansão do nosso comércio internacional, em particular das nossas exportações, diversificando produtos e mercados, agregando valor àquilo que produzimos.

    Todo o esforço que estamos fazendo para recuperar, responsavelmente, a economia brasileira, no entanto, não atingirá plenamente seus objetivos sem mudanças importantes na ordem econômica mundial. Queremos o livre comércio, mas um livre comércio que se caracterize pela reciprocidade. De nada valerá o esforço exportador que venhamos a desenvolver se os países ricos continuarem a pregar o livre comércio e a praticar o protecionismo.

    As mudanças da ordem econômica mundial devem passar, também, por uma maior disciplina no fluxo de capitais, que se deslocam pelo mundo, ao sabor de boatos e de especulações subjetivas e sem fundamento na realidade.

    É necessário que a comunidade internacional dê sua contribuição para impedir a evasão ilegal de recursos, que buscam refúgios em paraísos fiscais. Maior disciplina nessa área é fundamental para o decisivo combate ao terrorismo e à delinqüência internacionais, que se alimentam da lavagem de dinheiro.

    A construção de uma nova ordem econômica internacional, mais justa e democrática, não é somente um ato de generosidade, mas, também, e principalmente, uma atitude de inteligência política.

    Mais de dez anos após a derrubada do Muro de Berlim, ainda persistem “muros” que separam os que comem dos famintos, os que têm trabalho dos desempregados, os que moram dignamente dos que vivem na rua ou em miseráveis favelas, os que têm acesso à educação e ao acervo cultural da humanidade dos que vivem mergulhados no analfabetismo e na mais absoluta alienação.

    É necessário, também, uma nova ética. Não basta que os valores do humanismo sejam proclamados, é preciso que eles prevaleçam nas relações entre os países e os povos.

    Nossa política externa está firmemente orientada pela busca da paz, da solução negociada dos conflitos internacionais e pela defesa intransigente dos nossos interesses nacionais.

    A paz não é só um objetivo moral. É, também, um imperativo de racionalidade. Por isso, defendemos que as controvérsias sejam solucionadas por vias pacíficas e sob a égide das Nações Unidas. É necessário admitir que, muitas vezes, a pobreza, a fome e a miséria são o caldo de cultura onde se desenvolvem o fanatismo e a intolerância.

    A preservação dos interesses nacionais não é incompatível com a cooperação e a solidariedade. Nosso projeto nacional não é xenófobo e, sim, universalista. Queremos aprofundar nossas relações com os países da América do Sul, desenvolvendo com eles uma integração econômica, comercial, social e política.

    Queremos negociar cada vez mais positivamente com os Estados Unidos, a União Européia e os países asiáticos. Teremos, na condição de país que possui a segunda maior população negra do mundo, um olhar especial para o continente africano, com o qual temos laços étnicos e culturais profundos.

    Quero convidar a todos os que aqui se encontram, nessa montanha mágica de Davos, a olhar o mundo com outros olhos. É absolutamente necessário reconstruir a ordem econômica mundial para atender aos anseios de milhões de pessoas que vivem à margem dos extraordinários progressos científicos e tecnológicos que um ser humano foi capaz de produzir.

    Não fiquem indefinidamente esperando sinais para mudarem de atitude em relação ao meu país e aos países em desenvolvimento. Os povos, como os indivíduos, precisam de oportunidades. Os países ricos de hoje só o são porque tiveram as suas oportunidades históricas.

    Se querem ser coerentes com a sua experiência vitoriosa, não podem e não devem obstruir o caminho dos países em via de desenvolvimento. Ao contrário, podem e devem construir conosco uma nova agenda de desenvolvimento global compartilhado.

    Tenham certeza de que o Brasil já começou a mudar. Nossa determinação é resultado não somente de compromissos que assumimos há muitos anos, mas decorre, também, da esperança que mobiliza o nosso país. Sei que no debate contemporâneo há divergências, visões de mundo distintas, até mesmo antagônicas.

    Sou o Presidente de todo o povo brasileiro e não apenas daqueles que votaram em mim. Estamos construindo um novo contrato social, em que todas as forças da sociedade brasileira estejam representadas e sejam ouvidas.

    Assim, busco a interlocução com todos os setores que serão reunidos no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Vou buscar contatos e pontos de apoio para os nossos projetos de mudar a sociedade brasileira, onde quer que eles estejam.

    A mudança que buscamos não é para um grupo social, político ou ideológico. Ela beneficiará mais os desprotegidos, os humilhados, os ofendidos e os que, agora, vêem com esperança a possibilidade de redenção pessoal e coletiva. Esta é uma causa de todos. Ela é universal por excelência.

    Como o mais extenso e o mais industrializado país do hemisfério sul, o Brasil se sente no direito e no dever de dirigir aos participantes do Fórum de Davos um apelo ao bom senso. Queremos fazer um apelo para que as descobertas científicas sejam universalizadas para que possam ser aproveitadas em todos os países do mundo.

    Na mesma linha, proponho a formação de um fundo internacional para o combate à miséria e à fome nos países do terceiro mundo, constituído pelos países do G-7 e estimulado pelos grandes investidores internacionais. Isso porque é longo o caminho para a construção de um mundo mais justo e a fome não pode esperar.

    Meu maior desejo é que a esperança que venceu o medo, no meu país, também contribua para vencê-lo em todo o mundo. Precisamos, urgentemente, nos unir em torno de um pacto mundial pela paz e contra a fome.

    E, fiquem certos, o Brasil fará a sua parte.

    Muito obrigado”.

  • OS BACHARÉIS DA RESISTÊNCIA

    OS BACHARÉIS DA RESISTÊNCIA

     

    Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História da Universidade Federal da Bahia, com ilustração de Duke

     

    O ano de 2005 é chave para a compreensão da crise brasileira contemporânea. Foi aí, no chamado “mensalão”, que se desenhou pela primeira vez aquela que, na minha percepção, é a característica mais importante da crise: o ativismo político dos profissionais da lei.

    Desde 2005 que juízes, desembargadores, ministros dos tribunais superiores e procuradores são personagens recorrentes na crônica política. Depois de 2014, a Operação Lava Jato se tornou palco para a fama desses profissionais. Mais do que nunca, o Brasil é a República dos Bacharéis.

    Os marqueteiros da Operação Lava Jato afirmam que pela primeira vez na história do Brasil os empresários milionários sentiram na pele o peso da lei. É uma meia verdade. Se é meia verdade, por consequência lógica, é meia mentira também.

    Os empresários presos atuavam no ramo da construção civil e de obras de infraestrutura. Os agentes econômicos envolvidos com atividades financeiras e especulativas não foram incomodados. Somente os mais ingênuos são capazes de acreditar que Marcelo Odebrecht ou Léo Pinheiro são mais corruptos que os executivos do Itaú ou do Santander, que também financiavam campanhas eleitorais, que também estabeleciam relações nada republicanas com a classe política.

    Por que uns foram presos, enquanto os outros estão aí, lucrando bilhões todos os anos?

    A seletividade da Operação Lava Jato é óbvia e salta aos olhos de qualquer um que queira enxergar a realidade. A narrativa do combate à corrupção está sendo utilizada como pretexto para o desmanche do Estado e dos investimentos públicos em infraestrutura, o que favorece os interesses ligados ao capital financeiro nacional e internacional. A comunidade jurídica brasileira colaborou com esse projeto, ajudou a desmontar parques industriais, levando empresas nacionais à falência, sempre com o pretexto do “combate à corrupção”.

    Como bem disse Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, a Justiça brasileira “prometeu acabar com os cupins, mas acabou ateando fogo à casa”.

    Porém, seria um erro dizer que a comunidade jurídica é um bloco homogêneo, que todos os seus integrantes se movem na mesma direção. Alguns momentos na cronologia da crise mostram que o cenário não é tão simples, que há bacharéis dispostos a confrontar a hegemonia daqueles que entregaram seus serviços aos interesses do capital financeiro internacional.

    Destaco aqui três nomes: Rodrigo Janot, Rogério Favreto e Marco Aurélio de Mello.

    Em algum momento da crise, os três contrariaram interesses hegemônicos. Meu objetivo aqui é relembrar esses episódios e sugerir que a resistência democrática não pode abrir mão da institucionalidade. Ir às ruas e disputar o imaginário das pessoas não significa deixar de operar por dentro das instituições burguesas, explorando suas contradições. Uma coisa não exclui a outra. Uma coisa complementa a outra.

     

    Rodrigo Janot

    Rodrigo Janot foi empossado pela presidenta Dilma Rousseff como procurador geral da República em 2013, sendo reconduzido ao cargo, também por Dilma, em 2015. Janot foi personagem protagonista em alguns dos momentos mais agudos da crise brasileira, no período que compreendeu a derrubada de Dilma Rousseff e a ascensão de Michel Temer.

    Sinceramente, não sou capaz de definir a identidade ideológica de Rodrigo Janot, de dizer se ele é de esquerda ou de direita. Talvez ele não pense a realidade nesses termos. Antes de se tornar procurador geral da República, Janot tinha atuação engajada na defesa dos direitos da população carcerária. No segundo turno das eleições presidenciais de 2018, Janot se manifestou a favor da candidatura de Fernando Haddad.

    26 de agosto de 2015. Sabatina de recondução de Janot à chefia da Procuradoria Geral da República. Senado Federal. A crise institucional se aprofundava e começava a se desenhar no horizonte o golpe parlamentar que meses depois derrubaria Dilma Rousseff.

    A oposição, liderada por senadores do PSDB e do DEM, colocou Janot contra a parede. Ana Amélia, Aécio Neves, Aloísio Nunes, Antonio Anastasia exigiam que a PGR denunciasse a presidenta Dilma Rousseff. Foram quase 12 horas de uma sabatina tensa e atravessada pelo partidarismo político. Por inúmeras vezes, Janot disse que não havia indícios suficientes para fundamentar uma denúncia contra a presidenta da República.

    Janot não denunciou Dilma enquanto ela estava no exercício do mandato.

    Já com Temer, o comportamento de Rodrigo Janot foi completamente diferente. Foram duas denúncias, em pleno exercício do mandato. A primeira denúncia foi apresentada em junho de 2017. A segunda veio três meses depois, em setembro.

    Michel Temer precisou acionar suas bases na Câmara dos Deputados para barrar as duas denúncias. Precisou liberar verbas para os deputados aliados. Precisou gastar capital político. Acabou lhe faltando fôlego político para aprovar a Reforma da Previdência, que era a grande agenda do seu governo. Capital político tem limite, igual a peça de queijo: diminui um pouco a cada fatia retirada.

    Se Temer não conseguiu aprovar a Reforma da Previdência, parte da derrota pode ser explicada pelas flechas disparadas por Rodrigo Janot, que acabou colaborando para defender os direitos previdenciários dos trabalhadores brasileiros do ataque do capital especulativo.

    Qual era o seu objetivo? Comprometimento com uma agenda social-democrata? Um republicanismo genuíno que parte do princípio de que não pode existir seletividade na aplicação da lei? As duas coisas juntas?

    Não dá pra saber. Fato mesmo é que ao desestabilizar Michel Temer, Janot contrariou os interesses do rentismo.

     

    Rogério Favreto

    Quem acompanha a trama da crise brasileira lembra bem do dia 8 de julho de 2018. Era manhã de domingo e o país foi sacudido pela notícia que dividiu a sociedade, deixando metade da população em estado de graça e a outra metade babando de ódio.

    “Lula vai ser solto!”. Assim, estampado em letras garrafais em todos os veículos da imprensa.

    Rogério Favreto, desembargador do Tribunal da 4° Região em diálogo direto com lideranças petistas, autorizou um habeas corpus de urgência, determinando a soltura imediata de Lula.

    Todos os envolvidos sabiam que Lula não seria solto. Lula nem fez as malas. O objetivo ali era tático: levar as instituições burguesas a extrapolar os limites da própria legalidade.

    Sérgio Moro despachou estando de férias e negou o habeas corpus, o que ele não poderia fazer. Moro contrariou a ordem de um superior, subvertendo a hierarquia do Poder Judiciário.

    Thompson Flores, presidente do Tribunal da 4° Região, cassou a decisão de Favreto, o que somente poderia ser feito pelo colegiado dos desembargadores.

    Em um ato de resistência, Rogério Favreto deixou claro para o mundo que Lula é um preso político que a todo momento inspira atos de exceção.

     

    Marco Aurélio Mello

    Marco Aurélio Mello, tendo mais coragem que juízo, vem sendo a voz da resistência no Supremo Tribunal Federal. Eu poderia dar vários exemplos de ações de Marco Aurélio em defesa da Constituição, da legalidade democrática e da soberania nacional. Fico apenas com dois.

    1°) Em 19 de dezembro de 2018, na véspera do recesso do Judiciário, Marco Aurélio soltou um bomba: em decisão autocrática determinou que a Constituição fosse respeitada, ordenando a libertação de todos os presos condenados em segunda instância, o que beneficiaria o presidente Lula.

    É que a Constituição é clara. Só pode prender depois do trânsito em julgado. Se está errado ou não é outra discussão. Constituição não se questiona, a não ser para fazer outra Constituição.

    Liminar pra cá, liminar pra lá. Procuradores da Lava Jato convocando entrevista coletiva para dizer como STF deveria agir. Mais uma vez a sociedade dividida. Novamente, Lula nem fez as malas, pois experimentado que é, sabia muito bem que não seria solto.

    Dias Toffoli, presidente do STF, derrubou a decisão de Marco Aurélio, contrariando o regimento interno da Casa, que diz que somente a plenária do colegiado é legítima para anular ato autocrático de um ministro.

    Se Lula não estivesse preso, o regimento seria respeitado. Lula não é um preso comum.

    2°) Na última semana, vimos outro embate entre Marco Aurélio e Dias Toffoli. Dessa vez, o motivo foi a venda dos ativos da Petrobras. Marco Aurélio, outra vez em decisão autocrática, proibiu a venda, num ato de defesa da soberania nacional. Dias Toffoli autorizou a venda, se alinhando aos interesses privados e internacionais.

    Apresentei três exemplos, de três profissionais da lei que em algum momento da crise contrariaram os interesses que hoje ditam os rumos da política brasileira. Não existiu nenhuma articulação entre eles. Os exemplos mostram apenas que as instituições burguesas não são homogêneas, que existem contradições que devem ser exploradas.

    A resistência democrática, portanto, precisa se equilibrar sobre dois pés. Um nas ruas, agitando e apresentando soluções para o nosso povo, que já vai começar a sentir na pele as consequências de um governo ultraliberal, autoritário e entreguista. O outro pé deve estar bem fincado nos corredores palacianos, onde se desenrolam as tramas institucionais.

    Precisamos, sim, de líderes populares, de líderes que saibam falar ao coração do povo, que entendam as angústias da nossa gente. Precisamos também de articuladores, de conhecedores da lei e dos regimentos, de lideranças versadas no jogo jogado nos bastidores. Resistência democrática é trabalho de equipe.

     

  • Lula X Bolsonaro, uma comparação necessária

    Lula X Bolsonaro, uma comparação necessária

    Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia, com ilustração de Al Margen

     

    Hoje, no Brasil, o sistema político está polarizado por duas lideranças carismáticas capazes de despertar na sociedade afetos tão opostos como o amor e o ódio. É claro que estou falando de Lula e Bolsonaro, do lulismo e do bolsonarismo. Nesses 30 anos de “Nova República”, com a exceção desses dois, nenhuma outra liderança política brasileira teve um “ismo” para chamar de seu.

    Qualquer esforço de compreensão da história politica brasileira contemporânea passa pela comparação entre Lula e Bolsonaro. É isso que faço aqui. Começo pelas circunstâncias eleitorais que pavimentaram as vitórias eleitorais dos dois personagens.

    A vitória eleitoral de Lula era um projeto da sociedade civil organizada que datava do final da década de 1970. Ao ser eleito em 2002, Lula era velho conhecido de todos os brasileiros. As eleições de 2002 aconteceram na perfeita normalidade democrática. Lula enfrentou José Serra, o ungido de Fernando Henrique Cardoso, que na época terminavam seu segundo mandato. A população brasileira teve todas as condições de comparar os dois projetos em disputa. PSDB X PT. Lula foi a todos os debates.

    Bolsonaro foi eleito em um processo eleitoral confuso e marcado pela interferência direta do poder Judiciário na corrida presidencial. Todos sabemos que Lula foi impedido de concorrer, foi impossibilitado até de participar da campanha por Sérgio Moro, que hoje é ministro de Estado nomeado por Jair Bolsonaro.

    As eleições de 2018 aconteceram sem debates. Protegido por um atentado que até hoje não foi devidamente explicado, Jair Bolsonaro não foi aos debates, não falou sobre seu plano de governo.

    Nos discursos de posse, tanto Lula como Bolsonaro se apresentaram como o resultado de um desejo coletivo de mudança. Os dois falaram da necessidade de reformas estruturais no Estado brasileiro.

    Dezesseis anos separam 2003 de 2019. Muita coisa mudou. Existem também algumas semelhanças. Eram momentos de transição, de virada na página da história. Com Lula, o Brasil mudou do ensaio neoliberal para a social democracia. Com Bolsonaro, o Brasil está transitando da social democracia para algo que ainda não tem nome, mas que é assustador.

    “Hoje, começamos um trabalho árduo para que o Brasil inicie um novo capítulo de sua história”, disse Bolsonaro.

    “Hoje, estamos realizando um sonho que não é só meu, mas um sonho do povo deste país, que queria mudança”, disse Lula.

    Os dois presidentes eram alvo de grande desconfiança no momento da posse. A diferença fundamental está na forma como essa desconfiança foi enfrentada.

    Em Junho de 2002, ainda durante a campanha, Lula publicou a sua “Carta ao Povo Brasileiro”. Naquela altura, a vitória eleitoral de Lula era favas contadas e o candidato entendeu rapidamente que precisava começar a se comportar como um estadista, como presidente de uma das maiores democracias do mundo.

    Lula entendeu rápido que o cargo exigia concessões, e que ele precisava deixar de ser o metalúrgico, líder sindicalista, para se tornar o Presidente da nação. Lula desceu do palanque antes de subir a rampa do Palácio do Planalto.

    No documento, Lula falava em respeito à propriedade, aos contratos estabelecidos. A conciliação teve como preço o desgaste com suas bases históricas. Lula foi chamado de traidor por companheiros de longa data. O tom do discurso de posse seguiu a tendência da “Carta ao Povo Brasileiro”. Lula não mencionou seus adversários políticos, não falou em conflito. Somente um inimigo foi nomeado: a fome. No seu discurso de posse, Lula declarou guerra contra a fome.

    “E quero propor isso a vocês: amanhã, estaremos começando a primeira campanha contra a fome neste país. É o primeiro dia de combate à fome. E tenho fé em Deus que a gente vai garantir que todo brasileiro e brasileira possa, todo santo dia, tomar café, almoçar e jantar, porque isso não está escrito no meu programa. Isso está escrito na Constituição brasileira, está escrito na Bíblia e está escrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos. E isso nós vamos fazer juntos.”

    O comportamento de Jair Bolsonaro foi completamente diferente. No auge da campanha eleitoral, quando sua vitória era dada como certa por todos os institutos de pesquisa, Bolsonaro falou em videoconferência aos seus eleitores, que estavam reunidos na Avenida Paulista, em São Paulo.

    Bolsonaro não sinalizou para a conciliação. Pelo contrário, sob os aplausos e gritos de seus apoiadores, ele prometeu servir a cabeça dos adversários em uma bandeja de prata.

    O discurso de posse seguiu a mesma tendência.

    “A construção de uma nação mais justa e desenvolvida requer a ruptura com práticas que se mostraram nefastas para todos nós, maculando a classe política e atrasando o progresso. A irresponsabilidade nos conduziu à maior crise ética, moral e econômica de nossa história.”

    Quilombolas, feministas, comunidade LGBT, professores, petistas, imigrantes. Segundo o presidente da República, são esses os responsáveis pelo atraso, são esses os inimigos da nação.

    Bolsonaro não conseguiu apresentar agendas propositivas. Todo o discurso é atravessado pela destruição, pela construção de um inimigo que precisa ser combatido, derrotado, aniquilado.

    É certo que entre Lula e Bolsonaro há semelhanças também. Ambos se tornaram objetos de um tipo de culto cívico que diz muito sobre a cultura política brasileira. Somos um país de tradição republicana frágil, de mentalidade cristã arraigada, o que nos torna sensíveis a toda sorte de messianismos. Entre nós, a representação política mais genuína acontece através da projeção de afetos, de idolatria aos líderes carismáticos. Parte da sociedade brasileira se sente representada por Lula. A outra parte se sente representada por Bolsonaro. Uma lástima não termos tido a possibilidade de ver um embate franco e direto entre os dois.

    Entretanto, seria um equívoco acreditar que o lulismo e o bolsonarismo são iguais. Não são. As energias afetivas que os impulsiona são bastante diferentes.

    O lulismo foi alimentado por anos de militância e pela combinação entre experiência e esperança. Lula representava o nordestino, o pobre, o trabalhador sem curso superior que pela primeira vez comandava a República fundada pelos bacharéis. Lula, com todas as contradições que marcaram seu governo, teve sucesso no combate à fome e à miséria. Lula venceu a sua guerra.

    O sertanejo que idolatra Lula tem a experiência como fundamento do seu afeto. Com Lula, a água chegou na torneira, a energia elétrica na tomada, o pão na mesa.

    O bolsonarismo está sendo alimentado pela sensação do apocalipse político. Até pouco tempo, Bolsonaro era um deputado inexpressivo e desconhecido no cenário nacional. Sua liderança é impulsionada pelo medo, pela desilusão.

    Porque se alimentava de esperança, Lula conseguiu falar como estadista quando ainda era candidato. Porque se alimenta do medo, Bolsonaro não consegue deixar de falar como candidato, mesmo depois de eleito e empossado.

    Em 2003, teve início uma era de prosperidade geral, de conciliação nacional. Nenhum grupo social perdeu com o governo Lula. É certo que uns ganharam mais que outros, como acontece em toda sociedade capitalista. Nunca é demais lembrar que Lula jamais arranhou as estruturas do capitalismo periférico brasileiro. Do socialismo, o presidente Lula não chegou nem perto.

    O ano 2019 começa sob os efeitos de uma grave crise política e econômica que está longe de terminar. Bolsonaro não pode abandonar o virulência característica do palanque eleitoral, não pode tentar se reconciliar com aqueles que não votaram nele. Isso seria o seu fim, seu desaparecimento político. Bolsonaro não existe sem seus inimigos, sejam eles reais ou inventados.

    Bolsonaro será sempre o presidente do conflito, do ódio.

    A necessária comparação entre Lula e Bolsonaro se dá muito mais pelas diferenças do que pelas semelhanças.

     

  • Jornalistas e fotógrafos golpistas agora pedem respeito?

    Jornalistas e fotógrafos golpistas agora pedem respeito?

    Fotos e textos: Lula Marques

    • 1 – Achei que vocês começariam a fazer jornalismo depois do cárcere privado e da ameaça de levar tiro se não respeitassem as regras impostas pelo governo ditador no dia da posse, além da falta de respeito dos amadores que assumiram a comunicação do Palácio do Planalto.

    • 2 – Um bando de despreparados e arrogantes com discurso de que uma nova era começava. Mais de uma semana de governo e o que vemos é o jornalismo “copia-e-cola” reproduzindo as mídias sociais dos novos donos do poder e o jornalismo declaratório sem matérias investigativas.

    • 3 – Vocês sabiam que a democracia não sobreviveria sem uma mídia isenta e comprometida com a verdade. Perdemos para os fake news graças a vocês. Bolsonaro foi eleito porque vocês nunca se dedicaram a desmentir a mamadeira de piroca, o kit-gay e as milhões de mentiras que a direita produziu nos últimos anos. E nessa conta entra também o ódio plantado contra a esquerda ao longo de décadas na grande mídia.

    • 4 – Não fizeram o que deveriam ter feito, apurar e escrever a verdade. Agora, que moral vocês têm para pedir respeito e liberdade de imprensa? Que moral vocês têm para pedir desse governo algum respeito às liberdades fundamentais, sabendo que vocês os ajudaram a chegar ao poder?

    • 5 – Sei muito bem quem vai vestir a carapuça e sei também quem continua lutando para fazer jornalismo. Quero que vocês reflitam sobre tudo que NÃO fizeram para defender a democracia de um grupo fascista como o que governa o país hoje. E, se tiverem um pouco de consciência, deitem nos seus travesseiros imundos e cheios de mentiras e traição ao povo desse país e tentem dormir.

    • 6 – Acho que consciência só tem quem tem compromisso com a verdade, tem compaixão, respeito ao próximo e principalmente ética. Vocês traíram a essência do jornalismo: falar a verdade, doa a quem doer. Vocês se venderam para o sistema tentando manter os seus empregos ou se aliando a esses corruptos que todos sabemos quem são.
    • 7 – A mídia já foi considerada o quarto poder. Boa parte dos jornalistas da grande mídia apoiou o golpe contra Dilma e a condenação sem provas e posterior exclusão de Lula. Hoje estão aí quase todos acovardados diante dos verdadeiros donos do poder, que voltaram a governar o Brasil.

     

    • 8 – Todos vocês ajudaram a jogar o Brasil no lixo. Globo, Estadão e Folha, entre outros, sempre tiveram influência, apesar de sabermos que apoiaram os golpes de 1964 e 2016. Sou de uma geração na qual fazíamos jornalismo e éramos respeitados pelas “autoridades” desse país. Sabíamos de todo o jogo político e do interesse comercial da grande mídia, mas furávamos as censuras internas com jornalismo sério e a verdade sempre prevalecia. Sei de muita negociação de dono de jornal com certos políticos para que certas denúncias fossem arquivadas, mas o que estava em jogo era a verdade. Eles, os donos dos jornalões, sabiam que se o seu jornal não publicasse uma matéria com uma denúncia grave, com certeza ela estaria no dia seguinte no concorrente. E com isso perderiam leitores e assinantes. Fazíamos jornalismo e derrubamos muitos políticos corruptos e até um presidente da República comprovadamente corrupto.

    • 9 – Hoje o que mais temos é jornalista com medo, com caráter fraco e submisso aos chefes e aos editores preocupados em agradar ao dono do jornal e garantir seus empregos. Olhem onde chegamos por vocês aceitarem tão passivamente fazer o jogo dos patrões.

    • 10 – Eu sou de uma época em que dedicávamos toda nossa energia, inclusive organizando forças-tarefas especiais para desvendar a verdade em casos emblemáticos como são a facada no coiso e o Queiroz, centro do laranjal da famiglia.

    • 11 – Vocês pedem respeito. Que respeito? Se não se dão ao respeito puxando o saco dos que estão no poder? Vocês perderam a dignidade e destruíram a dignidade do jornalismo. Que vistam a carapuça de covardes, golpistas, vendidos e traidores. Qual a diferença entre jornalistas que apoiaram (e trabalharam com suas matérias para viabilizar) o golpe e os parlamentares e demais “autoridades” golpistas e fascistas? Nenhuma! Ou melhor: enquanto eles vão entregar as nossas riquezas para multinacionais e governos estrangeiros, ficando apenas com as migalhas que os gringos deixarem, vocês estão com os seus empregos ameaçados porque o projeto de país que os fascistas estão construindo não precisa de jornalismo, não precisa de meios de comunicação.

    • 12 – Espero que quando vocês olharem um brasileiro morando embaixo de uma ponte, pegando resto de comida nos contêineres de lixo, ou lerem sobre pessoas assassinadas nas periferias das grandes cidades ou no campo, em defesa da Amazônia, dos nossos povos indígenas ou da reforma agrária, vocês jornalistas golpistas tenham noção de que são responsáveis por terem sido coniventes com o golpe e depois ficarem calados com todas as mazelas do governo fascista que vocês ajudaram a eleger.

    • 13 – Vocês acusaram o PT de ser o maior partido corrupto desse país, esquecendo que foram os governos do PT que acabaram com a fome, que deram dignidade para milhões de brasileiros e que, aliás, fortaleceram as instituições para tentar consolidar a democracia. Vocês se calaram diante dos verdadeiros corruptos como Aécio, Temer, Cunha, Jucá e tantos outros que têm denúncias comprovadas com fartura de provas.

    • 14 – Vocês ajudaram a colocar o maior líder político latino-americano do século XXI atrás das grades com as mentiras contadas por procuradores-militantes do Ministério Público e por um juizeco que virou ministro desse desgoverno que vai levar o país de vez para o buraco.

    • 15 – Quem quiser que vista a carapuça. A história já tem reservado para vocês um lugar especial na lata de lixo. O sangue de cada brasileiro morto nesse país pela horda de fanáticos que se espelha no presidente fascista e sua famiglia estará nas mãos de vocês.

    • 16 – Não tenho raiva, tenho desprezo pelo papel que vocês cumpriram. Hoje a cobertura de veículos internacionais envergonha todos vocês, que deveriam pensar duas vezes antes de se chamarem de jornalistas. Canalhas, canalhas e canalhas. Muitos profissionais amamos o que fazemos e temos ética e um compromisso sólido com a a democracia e liberdade. Mesmo com todas as dificuldades financeiras, vamos continuar mostrando a verdade, doa a quem doer. Temos alguns jornalistas experientes e outros novos que ainda acreditam que a melhor maneira de manter uma democracia é com uma imprensa livre e forte. Não vão nos calar. Já plantamos sementes e o legado de quem sempre fez jornalismo não será apagado da história desse país. Bons exemplos servem para inspirar e aprendemos com os verdadeiros jornalistas desse país a defender a democracia. A verdade sempre vencerá.

    Lula Marques
    Brasília, 11 de janeiro de 2019

  • “Haverá muita luta e resistência”, diz José Dirceu sobre governo Bolsonaro

    “Haverá muita luta e resistência”, diz José Dirceu sobre governo Bolsonaro

    José Dirceu dispensa apresentações. Um dos mais conhecidos ativistas da esquerda brasileira desde a década de 1960, passou de líder estudantil secundarista a guerrilheiro, de preso político a exilado, de clandestino no Brasil a fundador do Partido dos Trabalhadores, de Ministro Chefe da Casa Civil a condenado sem provas no chamado “Mensalão”. Nem seus mais de 70 anos, uma virose “braba” que exigiu uma “bomba” de antibiótico, uma viagem de carro de Campo Grande a Cuiabá (“estou evitando viajar de avião”) e uma queda que lhe luxou uma das costelas foram o suficiente para se negar a uma maratona de compromissos na capital mato-grossense acima de 36 graus. Reunião com a Juventude do PT pela manhã, entrevistas à tarde, palestra para cerca de 200 pessoas no início da noite e autógrafos no seu novo livro, Zé Dirceu – Memórias, Volume 1 (Geração Editorial, 2018. De sua infância à cassação do mandato parlamentar), até as 23:00 provam que ele segue sendo uma potência política e uma voz fundamental na conjuntura atual.

    Em meio a tudo isso, pontualmente às 17:00 Dirceu atendeu por mais de 40 minutos os Jornalistas Livres. Veja abaixo, os principais trechos da entrevista (que pode ser ouvida na íntegra aqui). A autógrafos podem ser vistos aqui (o PT e a classe trabalhadora), aqui  (Preparação para a resistência e a necessidade do salto para a agroecologia), Aqui (Lula e a inserção do Brasil no Mundo e na América Latina), aqui (As riquezas do Brasil e as conquistas populares e sociais) e aqui (DIrceu, Guerreiro, do Povo Brasileiro).

    Áudio, fotos e vídeos: www.mediaquatro.com   Edição de Vídeos: Anna Clara Natividade

    Sobre a Ação Penal 470, o chamado “Mensalão”, e o ativismo jurídico:

    “O domínio de fato foi precedido por uma série de medidas que já demonstravam o ativismo político e a submissão à chamada ‘pressão popular’, ou seja, da mídia, no meu caso. Eu não poderia ser cassado porque eu era deputado licenciado e a jurisprudência do Supremo rezava que não podia. Então, por sete a quatro, o Supremo mudou, durante o meu indiciamento na Câmara, o entendimento e reviu a sua jurisprudência. Isso foi em 2005 ainda. Aí construíram a tese de que o parlamentar ‘carrega’ o decoro com ele, ‘carrega’ o mandato com ele. Depois o Supremo me condenou sem provas, mas o Congresso me cassou sem provas, na verdade, dizendo que cassou o Roberto Jefferson porque ele não provou que havia o ‘mensalão’, então ele tinha atacado a honra da Câmara, e me cassaram porque eu era o ‘chefe do mensalão’.

    […] O domínio de fato não tem nenhuma relação com a minha situação, porque o próprio jurista que definiu isso disse à Folha de São Paulo que na verdade essa instituição foi criada na Alemanha para diferenciar os autores de crimes de guerra, os participantes daqueles que tinham o domínio do fato, depois de condenados para diferenciar as sentenças. Não era base para condenação. A base para a condenação eram as provas materiais. O domínio de fato foi criado para diferenciar a pena de morte da prisão perpétua, da pena de 25 anos, de 15 anos, para os demais participantes do crime. […] aqui no Brasil foi usado pra dizer que eu tinha obrigação de saber o que estava acontecendo, porque antes exigia um ‘ato de ofício’. E mais, um ministro dizia que o ônus da prova cabia a mim, o Fux, e a Rosa Weber falou, está nos anais do Supremo, que não tinha prova mas a literatura jurídica permitia. Isso teve consequências graves, abriu caminho para tudo o que assistimos depois na Lava Jato. Infelizmente nós não aprendemos a lição e ainda votamos uma legislação na Câmara que tem sido utilizada de maneira abusiva além do que o texto dos artigos permitisse, como a Lei da Delação, a Lei da Organização Criminosa, Lavagem de Dinheiro, a Lei Antiterrorista… São legislações que têm de ser cercadas de cuidados para que não sejam usada politicamente. Por exemplo, como é que alguém pode ficar preso quatro anos e depois delatar? Como é que alguém pode delatar preso? Os procuradores dizendo na imprensa que iam condenar a 100 anos, prendendo familiares, bloqueando bens, processando familiares… Como é que essa delação pode ser digna, espontânea, à vontade própria? Então houve muita pressão psicológica, na família. […]

    Depois nós assistimos às ilegalidades, algumas que o Supremo já deteve, como é o caso das conduções coercitivas sem a recusa do investigado ou réu de se apresentar em juízo quando é intimado pela autoridade competente. Isso agora está proibido. As prisões preventivas, eu fiquei preso um ano e nove meses sem ser julgado na segunda instância. As antecipações de pena… E a situação está se agravando. Hoje não há sigilo bancário, fiscal, telemático, nenhum. O Ministério Público tem o poder de fazer investigações sigilosas, dizem que são administrativas, mas foi o Supremo que deu aquilo que a Constituinte negou. A Constituinte negou que o Ministério Público Federal, Estadual, fosse a polícia judiciária na União e nos Estados. O Supremo em 2016 deu o poder de investigação ao Ministério Público: quem investiga, acusa. Então nós estamos tendo não só o ativismo judicial”

     

     

    Foto: www.mediaquatro.com

    Sobre a Lei Antiterrorismo e os Movimentos Sociais

    “O mais grave é a tentativa de usar Lei Antiterrorismo contra os Movimentos Sociais como ele (Jair Bolsonaro) ameaçou, de classificar o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto de terroristas. Isso é gravíssimo! […] Os movimentos têm de atuar dentro da lei, defender a lei, recorrer à lei, ao Ministério Público, ao judiciário. Eles que fiquem com o ônus de compactuar (com as ilegalidades). Como foi o caso da cassação da candidatura do Lula. Nós não podíamos retirar a candidatura do Lula, o Lula desistir, indicar outro. O Lula tinha de ser registrado como candidato porque assim a Constituição reza, porque não foi condenado em última instância.

    Evidentemente que, no caso concreto, os movimentos têm todas as condições jurídicas de atuar dentro da lei. E nós temos que lutar para mudar as leis que nós consideramos injustas, faz parte. Lei é produto da sociedade, do movimento da sociedade, das lutas sociais, das lutas políticas, das transformações econômicas e sociais de um país”.

     

     

    Sobre seu papel hoje e o governo Bolsonaro

    “Fazer o que estou fazendo. Andar pelo país, ouvir, aprender, reler o país, que mudou muito nos últimos 15 anos, desde que o Lula foi eleito presidente, nos cinco anos em que eu estive ausente. Falar, contar a minha história, a história da minha geração. Defender o PT, defender o legado de Lula. Defender aquilo que mas propostas que estão sendo apresentadas pelo novo governo com relação a várias questões importantes para o país. Primeiro, a democracia. Realmente a defesa radical da democracia, das liberdades, das garantias individuais, que ele vive ameaçando. Fala em desconstituir os direitos difusos, do consumidor, da mulher, do negro, do índio, do meio-ambiente. Em outros momentos mistura Estado com religião, e isso é gravíssimo, só olhar os conflitos no mundo. Ameaça usar a violência contra os adversários, várias vezes, reiteradas vezes, ou antinacional, apesar de falar de Brasil, Brasil, Brasil. Mas as propostas dele, econômicas, essa submissão dele à política econômica externa do Trump, essa coisa quase inacreditável de colocar o Brasil nessa posição de satélite dos EUA. E principalmente a política econômica, a austeridade, corte de gastos, desconstituição de direitos sociais…

    Economia pelo lado do trabalhador, da saúde, da educação, da previdência, não do lado dos juros e da reforma tributária. Não da propriedade, da riqueza e da renda daqueles 10% de brasileiros que têm a metade da renda nacional. E sim dos 50% de brasileiros, 100 milhões, que só tem 10% (da renda). Muito menos do que aqueles 0,1% que têm quase 30% da renda nacional e que deviam pagar imposto sobre grandes fortunas, heranças, doações. Como aconteceu na Franca, agora, quando o clamor nacional foi taxar as grandes fortunas e não a gasolina”.

     

     

     

    E a conjuntura nacional em relação à internacional?

    “Vejam o que está acontecendo agora na França, na Argentina, na Hungria. Haverá resistência, haverá oposição, haverá luta. Haverá muita oposição às futuras medidas. Eu espero que o futuro governo se mantenha dentro da democracia e aceite as regras do jogo democrático, como nós aceitamos quando eles ocupavam as ruas do país, paravam o país, protestava, ocupavam Brasília, até chegar ao ponto de derrubar a presidenta através de um impeachment que todos nós sabemos que foi forjado. Uma inverdade de pedaladas, de uso de transferências de recursos complementares sem autorização constitucional, enquanto nós sabemos que nada disso era crime de responsabilidade”.

     

     

     

     

     

     

    A oposição terá poder para propor mudanças nas leis e resistir ao retrocesso político?

    “Nós temos experiência acumulada no Brasil para apresentar propostas de reforma da previdência, tributária, contrapondo a dele (Bolsonaro). Também de sistema bancário e de reforma política. E temos também como enfrentar. Porque o futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, e os procuradores que estão em torno dele, podem apresentar uma série de propostas de reforma do Código de Processo Penal que, na verdade, como a prisão em segunda instância, são outra invasão da atribuição constitucional. Isso só o Congresso pode mudar a Constituição onde diz que alguém só pode ser considerado culpado quando o último recurso tramita julgado no Supremo ou no STJ. Tanto é que os procuradores tinham proposto fazer essas mudanças constitucionais, o Ministro Peluzzo, enquanto Presidente do Supremo, enviou uma proposta de PEC pro Congresso, mas não passou.

    Então acredito que nós temos condições, sim, de por exemplo debatermos mudanças no regime penal. O que quer o presidente eleito? Terminar com as progressões de penais, agravar as penas… Agora, com essa estrutura penitenciária que nós temos no país, enquanto toda a tendência no mundo é cada vez menos regime fechado, cada vez mais multas pecuniárias, perda de direitos e funções, trabalho alternativo, em último caso exigir regime fechado. Se você não dá condições para o preso trabalhar e estudar, se não dá pra ele condições mínimas de vida, lógico que ele não só reincide no crime, como passa a participar das organizações criminosas como o PCC porque eles têm estrutura para dar apoio e cobertura pra família dele e para ele, às vezes pra fugir, inclusive”.

     

     

    Como tem sido o cumprimento das sentenças de cadeia por você e pelo Presidente Lula?

    “Bom, falando sobre o Presidente Lula, muito bem, com altivez, dignidade, trabalhando, lendo, escrevendo, se relacionando com os companheiros e companheiras todos dos partidos, as lideranças, recebendo visitas. E ele está se defendendo através de seus advogados nas instâncias da justiça e denunciando quando há decisões que nós consideramos que atingem as garantias de direitos individuais e do devido processo legal, o contraditório, que o ônus da prova cabe ao acusador e mesmo quando determinados institutos jurídicos são deformados e utilizados contra nós.

    No meu caso, eu fiquei preso um ano e nove meses, já tinha ficado preso sete mesmo no fechado no chamado ‘mensalão’ e quatro meses no semiaberto e dez no aberto. Então eu cumpri a pena e fui indultado, o que é uma verdadeira mancha na história do Supremo Tribunal Federal. […] Eu cumpria pena e transformei um ano e oito meses que eu fiquei preso no Centro Médico Penitenciário de Pinhais no Paraná numa luta. Cuidei de uma biblioteca, reorganizei para atender os presos, sábado e domingo escrevi esse livro que agora estou divulgando pelo Brasil, cuidei da minha família e sou muito grato pela solidariedade e apoio que tive por todo o país.”

     

     

    Sobre as disputas com a Direita:

    “Nós temos que nos acostumar, porque até é um direito, que o MBL, ou as igrejas evangélicas, ou pastores, façam a disputa política conosco, seja pelos bairros das cidades, seja nas universidades e nos sindicatos, porque eles vão acabar trazendo a pluralidade sindical. Nós temos que lutar, porque nós temos do nosso lado os direitos dos trabalhadores e teremos apoio deles. É só olhar a Argentina, a França a Hungria e você vê isso.

    Haverá luta no Brasil, haverá resistência na tentativa de retirar direitos. Tem de tirar privilégios, isso nós vamos apoiar! Fazer Reforma da Previdência começa com militares e judiciário, não pelos trabalhadores rurais e pelos trabalhadores da iniciativa privada, que esses contribuem, empregado e empregado, em meio trilhão de reais na Previdência do INSS. Agora, os militares contribuem com R$ 2 bilhões e custam R$ 34, o funcionalismo público, principalmente o judiciário, não contribui nem com 20% dos benefícios que recebe. Então, haverá luta. A ditadura já tentou criar os Diretórios Acadêmicos pelegos, proibiu a UNE, os DCEs. Mas nós sobrevivemos. Em 1976, 77 a UNE já estava reconstruída. E nós mesmos enfrentamos a ditadura e reabrimos todos os centros acadêmicos ainda na década de 60. Agora, é preciso mudar os métodos de atuação dos partidos, do movimento social, das centrais sindicais, que já estão se reunindo para criar seminários e construir um Congresso das Classes Trabalhadoras para enfrentar as medidas do Bolsonaro”.

     

     

    E quanto às Comunicações?

    “O que nós assistimos na campanha foi que foi feita uma reforma eleitoral que deu direito ao candidato de autofinanciar sua campanha. Isso liberou o poder econômico, porque o Meirelles gasta R$ 40 milhões, mas os candidatos do PT, nenhum tinha mais de um milhão pra gastar e assim mesmo do fundo partidário. Segundo, eles diminuíram o tempo de rádio e televisão, nos dias e horários. Aís as televisões, os jornais e as rádios é que faziam a campanha. Terceiro, e é mais grave ainda, eles não combateram Fake News, não combateram o uso ilegal das redes, entendeu? E mais, não combateram a compra de votos! Porque houve uma compra de votos no país imensa. Nós temos que ter, já podíamos ter tido desde 2008, capacidade de responder nas redes. Porque em 2008, na eleição do Obama, já ficou evidente a importância das redes, e na do Trump nem se diga, dando até numa crise internacional. O problema do Brasil é que se precisa aplicar a Constituição. É isso! Porque agora eles começam a ter concorrência pela primeira vez, a Globo, a Record, SBT, Bandeirantes, a Folha de S. Paulo, O Estado de São Paulo, porque o El País tem um jornal na internet e a internet não exige capital nacional, onde só permite 33% de capital estrangeiro, então vão ao Supremo tentar impedir que o El País tenha uma página, um jornal aqui. Mas eles não têm como impedir que as plataformas da Amazon, Netflix, Fox, Warner, Disney, entrem no país. Uma coisa é taxar o Google, taxar os grandes grupos econômicos, grandes monopólios, agora, não tem como impedir que eles disputem publicidade. Então eles (a Grande Mídia nacional) vão ficar cada vez mais dependentes do sistema bancário, da indústria automobilística, farmacêutica, imobiliária e mais dependentes do governo, da publicidade governamental, que é uma grande força principalmente para as oligarquias políticas que dominam rádio e televisão nos estados, onde duas ou três famílias de políticos dominam o cenário. Nós para nos opormos a isso hoje, não precisamos de jornal impresso, nem de televisão, basta utilizar as redes. E o Bolsonaro mostrou isso na campanha. Lógico que isso desequilibra a luta democrática: poder econômico e oligarquias midiáticas fazendo campanha abertamente pra políticos tentando controlar a opinião pública nos estados.

    Hoje não há diversidade e pluralismo na Rede Globo, por exemplo, nem na GloboNews. E não há informação, há ‘formação’. Todo o tempo querendo convencer o país de um determinado rumo. É um direito deles fazer isso no editorial. Mas os debates, entrevistas, têm de ser plurais e diversificados porque a Constituição exige. Então o que nós precisamos fazer e não fizemos é aplicar a Constituição”.

     

    Patriotismo, religião e sexo:

    “Essa tentativa do Bolsonaro é a mais perigosa. A manipulação da fé do povo. Na verdade, ele usa o nacionalismo, a pátria, religião e a família, como aliás os militares usavam em 64. Era a Marcha da Família, com Deus pela Liberdade, como se o Brasil estivesse ameaçado pelo comunismo, pela União Soviética. Agora é a Venezuela, o PT, são os vermelhos. Há uma manipulação muito grande. E há uma intenção clara de reprimir a diversidade, o pluralismo, as diferentes orientações sexuais. Há um preconceito muito grande contra o pobre, o negro.

    Mas ele, até porque não foi tratado pela mídia como deveria ter sido tratado, a mídia foi conivente muitas vezes e omissa com as declarações que ele fazia como ‘matar 30 mil’, ‘vamos metralhar os petistas’, deixando claro o preconceito racial, no caso dos quilombolas, deixando claro o machismo dele, exacerbado, com relação às mulheres, quando acha natural que as mulheres ganhem um salário desigual ao dos homens, que a mulher seja do lar, recatada, essa história que a função da mulher é ser mãe, e tudo isso a humanidade, inclusive o país que ele usa como referência, os EUA, já superou. É um direito das pessoas não concordarem com isso, temos de respeitar. Agora, o governo tentar fazer disso uma escola sem partido? Daqui a pouco vai fazer teatro sem partido, música sem partido, literatura sem partido, imprensa sem partido, igreja sem partido, ou seja, uma coisa totalitária e isso nós temo de combater”.

     

    A questão das disputas e talvez conflitos na América Latina e no mundo.

    “Os EUA são um império em decadência e a China em ascensão. Não existe império que entra em decadência sem lutar. O Trump já é a expressão disso: uma tentativa de defender a América em primeiro lugar, de defender a economia e o emprego nos Estados Unidos. Tudo o contrário que o Bolsonaro está pregando no Brasil. O Bolsonaro devia aprender com o Trump a defesa dos interesses nacionais, do emprego brasileiro, da indústria brasileira, da tecnologia brasileira. A China, por outro lado, será a maior potência do mundo nos próximos anos. A questão da guerra comercial, no fundo, é uma cortina de fumaça pra isso. Na verdade, o Trump está esperneando para tentar evitar a decadência dos EUA.

    Com relação à América Latina, o Lopes Obrador acabou de ganhar a eleição no México. O Macri hoje perderia a eleição na Argentina. É verdade que o Piñera voltou ao poder, mas ele já perdeu pra Michele Bachelet e surgiu um partido novo forte agora no Chile. Então, são altos e baixos e luta da política e social. A Frente Farabundo Martí governa duas vezes El Salvador. Daniel Ortega já está há dois mandatos na Nicarágua. No Panamá é bem provável que vença uma frente progressista. Na República Dominicana tem um governo progressista. Em Honduras houve um golpe para interromper o governo Zelada. No Equador o Rafael Correa fez seu sucessor mas foi traído, mas ele continua com o respaldo que num plebiscito completamente manipulado ele teve 36% de votos. E o próprio Peronismo resiste, sobrevive e pode vencer novamente na Argentina.

    Sobre intervenção militar, conflito regional, se os americanos decidem fazer uma intervenção na Venezuela é evidente que haverá um conflito regional porque imediatamente 500 mil venezuelanos irão imigrar para o Brasil e um milhão para a Colômbia. E muitos colombianos irão imigrar para o Equador, como aconteceu em outros momentos. Vai ser uma desagregação da Amazônia e Colômbia, Equador e Brasil se verão envolvidos nesse conflito. Não adianta falar que não acontecerá. Tem de se opor à intervenção nos assuntos internos da Venezuela. […] Os militares brasileiros, a elite brasileira ficam sonhando com o guarda chuva americano, isso é uma ilusão”.

     

    Como está o Brasil hoje?

    “As riquezas que o Brasil tem, o pré-sal que estão entregando, a Amazônia, a água, as terras, o sol… O Brasil é o país mais rico do mundo, porque não tem inverno. Outros são ricos como o Brasil mas têm inverno, como a China, a Rússia, o Canadá. E o Brasil é o sexto país do mundo, quinto território, oitava economia… Industrializado, rico, mas tem desigualdade e pobreza. O principal problema do Brasil é a desigualdade, não é o déficit público, não é o problema do sem-terra ocupar terra, ou o sem-teto ocupar áreas abandonadas nas cidades.

    O problema do Brasil é a profunda desigualdade e o profundo egoísmo das elites e a vocação delas para o autoritarismo. A história do Brasil prova isso. Quando há ascensão social, cultural, política, de amplas massas do povo trabalhador, eles vêm e dão o golpe e colocam um governo de direita, muitas vezes com apoio de parcelas dos trabalhadores. Mas a verdade esse é o ciclo da vida histórica do Brasil”.