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Categoria: LGBT

  • Criminalização da homofobia volta à pauta do STF. Bancada evangélica se mobiliza

    Criminalização da homofobia volta à pauta do STF. Bancada evangélica se mobiliza

    AGORA VAI?

    Da rede Brasil Atual

    São Paulo – O Supremo Tribunal Federal (STF) deve analisar nesta quarta-feira (13) duas ações que buscam a criminalização dos atos de ódio contra a comunidade LGBTI – sigla para Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgêneros e Intersexuais – chamados genericamente de homofobiahomotransfobia ou LGBTfobia.

    Um dos pedidos é um mandado de injunção, impetrado pela Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo (APOLGBT), para que o STF defina o crime de homofobia, garantindo os direitos constitucionais desse segmento da população. No entanto, é considerado frágil, pois pode ser entendido como ingerência do Supremo sobre o Congresso Nacional, o que já motivou um pedido de adiamento de julgamento.

    O outro é uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO), impetrada pela Partido Popular Socialista (PPS), que determinaria ao Legislativo o dever de elaborar uma legislação nesse sentido. É o tipo de ação que se faz quando o Congresso não age para regulamentar um tipo de garantia e de direito expressos na Constituição Federal. A ADO foi proposta em 2013. O PPS alega que o Congresso Nacional tem se recusado a votar o projeto de lei que visa efetivar tal criminalização.

    “O legislador não aprova, mas também não rejeita, deixando este e todos os outros temas relativos à população LGBT em um verdadeiro limbo deliberativo”, diz a petição inicial. Na ação, o partido pede a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, especialmente as ofensas individuais e coletivas, os homicídios, as agressões e as discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou identidade de gênero – real ou suposta – da vítima. A Procuradoria-Geral da República (PGR) já se manifestou favoravelmente ao pedido.

    A Constituição proíbe qualquer tipo de discriminação, mas não fala expressamente em orientação sexual ou identidade de gênero, que acaba incluída em “outras discriminações”.

    “O que se está pedindo é que o STF declare que a Constituição obriga a proteção da cidadania e dos direitos da população LGBTI”, afirma o professor de Direito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e ativista de direitos humanos Renan Quinalha. “Normalmente para se criminalizar uma conduta é preciso uma lei, no sentido formal. É o Legislativo quem faz isso e não o Judiciário. Então se pede que o STF faça o que ele já fez no passado, em um processo conhecido como Caso Ellwanger, no Rio Grande do Sul”, explica.

    O Caso Ellwanger é uma referência ao livreiro que publicava obras com conteúdo antissemita, no Rio Grande do Sul. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou-o por racismo, com base na legislação de 1989, e o STF negou-lhe um pedido de habeas corpus. O Supremo entendeu que o racismo é um conceito político social mais amplo, não só para questão de raça, cor de pele, mas que se enquadra em qualquer tipo de inferiorização de um grupo por outro, por um atributo que o grupo tenha. Assim, foram incluídos judeus nesse grupo. E agora se pede a inclusão da comunidade LGBTI na Lei Federal 7716/89 – Lei Antirracismo.

    Bancada evangélica não quer lei

    A Frente Parlamentar Evangélica já se movimenta para tentar adiar o julgamento. O grupo, de cerca de 200 deputados federais, reuniu-se com o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, para pedir a retirada do tema da pauta.

    Alguns ministros também estariam considerando que o julgamento pode afetar a relação com o Congresso Nacional e o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Esse grupo entende que não há necessidade de criminalizar a homofobia e que isso pode afetar a liberdade de expressão dos religiosos.

    O advogado constitucionalista Paulo Iotti, que representa o PPS, destaca que não se trata apenas de crimes comuns. “A homotransfobia precisa ser criminalizada porque vivemos verdadeira banalidade do mal, no sentido de muitas pessoas se acharem detentoras de um pseudo ‘direito’ de ofender, discriminar e até mesmo agredir e matar pessoas LGBTI por sua mera orientação sexual ou identidade de gênero”, critica. “O Código Penal é insuficiente para a proteção eficiente da população LGBTI porque as condutas que mais a assolam, de discursos de ódio e de discriminação, não são criminalizadas por ele, mas apenas pela Lei Antirracismo. É um grave equívoco dizer que o Código Penal seria suficiente para proteger a população LGBTI.”

    Hoje existem, ao menos, dois projetos que propõem a criminalização da homofobia. O Projeto de Lei da Câmara (PLC) 122, de 2006, proposto pela ex-deputada federal Iara Bernardi (PT-SP), está arquivado no Senado. Em 2014, a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) apresentou o PL 7.582, com a mesma proposta, que está parado na Câmara.

    Para a coordenadora nacional do Movimento Mães pela Diversidade, Majú Giotti, a importância desse julgamento é imensa. “A gente só vai inibir o preconceito, a discriminação e a violência com a lei. E todos os preconceitos já estão equiparados ao racismo, inclusive o preconceito religioso. Menos a LGBTfobia”, compara. “Meu filho já sofreu todo o tipo de violência e eu espero que o STF finalmente faça justiça e livre a população LGBT e suas famílias das políticas persecutórias desse Congresso omisso. E nos retire da condição de cidadãos de segunda categoria.”

    O movimento vai realizar uma vigília pela paz nesta quarta, no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp), a partir das 16h, para acompanhar o julgamento.

    GIULIANO GOMES/PR PRESS/FOLHAPRESS Comunidade LGBT aguarda há cinco anos pelo julgamento das ações e torce por vitória contra a discriminação e a violência
  • Censura ao filme “Boy Erased” tem a ver com homofobia institucional

    Censura ao filme “Boy Erased” tem a ver com homofobia institucional

    Por Rodrigo Veloso

    Nas últimas semanas quem aguardava o lançamento no Brasil do filme indicado ao Globo de Ouro “Boy Erased: Uma verdade anulada“, teve uma ingrata notícia. O longa, que trata da história de vida de Gerrard Conley e sua juventude perturbada por terapias de reversão da sexualidade, teve o lançamento cancelado pela sua distribuidora, a Universal Pictures.

    A empresa alega que o desempenho projetado para bilheteria não compensaria os custos de sua distribuição nos cinemas, e por isso, “única e exclusivamente”, diz sua nota oficial, o lançamento inicialmente previsto para o dia 1 de fevereiro foi cancelado, com promessa de distribuição para pay per view.

    Pessoas que aguardavam pelo filme ou que já o assistiram no exterior usaram as redes sociais para reclamar.

    Um dos primeiros a questionar se o motivo real não seria outro, bem menos defensável, foi o ator Kevin McHale, conhecido pelo seu trabalho na série Glee. Em uma mensagem em inglês pelo Twitter, ele disse: “Começa assim. Boy Erased foi banido no Brasil. Bolsonaro é perigoso e uma ameaça para a comunidade gay no Brasil. Censurar um filme sobre os riscos da terapia de conversão é apenas o início.”

    E sua denúncia circulou muito pela imprensa americana e os círculos ativistas. Até o presidente Jair Bolsonaro se viu obrigado a respondê-lo [usando sua tradicional linguagem truculenta para assuntos que envolvem as minorias]. Ele disse simplesmente que teria mais o que fazer.

    A denúncia de McHale, contudo, não deve ser lida como se ele acreditasse que Bolsonaro tem diretamente o poder de censurar filmes. O que ele diz, e tem razão, é que o contexto político do “novo Brasil” influencia decisões como esta, baseadas em preconceitos.

    Em 2012, parlamentares da Frente Parlamentar Evangélica decidiram impulsionar no Congresso um projeto de lei do deputado João Campos que regulamentaria as instituições que ganham dinheiro prometendo cura gay, e tiveram veemente apoio do hoje presidente Bolsonaro nas audiências públicas. Em uma delas, ele disse que os então deputados Jean Wyllys e Erika Kokay estavam contra porque também seriam gays.

    Em 2017, quando já se imaginava que a matéria estava definitivamente encerrada, um juiz da 14ª vara da justiça federal de Brasília deu autorização para que as “curas” fossem realizadas, e novamente não faltaram aqueles que vieram a público defender a sentença, enquanto o Conselho Federal de Psicologia dizia que o procedimento era errado, prejudicial aos que eram submetidos a ele e que ainda poderia agravar quadros de depressão.

    E a atual ministra dos direitos humanos, a quem caberia cuidar das minorias, não só acredita nesse charlatanismo como passou boa parte dos seus últimos anos viajando pelos estados brasileiros prometendo aos pais de crianças e adolescentes LGBTs que este poderia ser um caminho para melhorar suas vidas.

    O ator americano hoje vê Bolsonaro presidente do país e um filme aclamado retirado de uma programação que já estava pronta como quem só está acostumado a ver filmes de Hollywood banidos pelas cenas gays em país ditatoriais e extremamente conservadores. Não faltam razões para associar as duas coisas.

    No melhor dos mundos, o que é muito difícil de acreditar com tantos membros do governo divulgando fake news e difamações sobre pessoas gays, a política não teria tido qualquer peso e a empresa estaria pensando “apenas” em seus lucros, mas até aí haveria homofobia a ser questionada.

    Pois, quando um filme de tamanha repercussão é avaliado como de difícil aceitação, parte, pode-se creditar à homofobia que estruturalmente apaga os talentos de pessoas LGBT e enclausura-as em rótulos. É muito comum. Muitos filmes já enfrentaram no circuito nacional situações semelhantes. E vez ou outra algum diretor diz que teve dificuldade de captar recursos ou distribuir um novo filme por conta de cenas de amor entre seus personagens. Até o longa sobre Freddie Mercury, que está indicado ao Oscar e é um sucesso mundial de bilheteria, sofreu com reações violentas.

    Se alguém tem dúvida de que o afeto entre pessoas LGBT ainda motiva o ódio e que este público pouco tem o direito de se ver retratado nos cinemas, faça um teste rápido e consulte quantos romances em cartaz no cinema mais próximo têm esse perfil. E mais ainda, imagine-se pertencente a uma comunidade com milhões de pessoas, como parte de um público que sempre vai ao cinema, e que mesmo assim não é contabilizado nas projeções medíocres que as empresas fazem sobre o sucesso de um filme.

    É assim que nos sentimos sobre Boy Erased. Ofendidos por um governo que torce para nos varrer até dos filmes; apagados por uma empresa que não nos contabiliza; e negligenciados na dor por uma imprensa que nem sempre aborda a dimensão completa do problema.

  • Ato em homenagem para Jean Willys destaca sua partida

    Ato em homenagem para Jean Willys destaca sua partida

    Por Bárbara Louzada e Gabriel de Nani

    Ontem foi celebrado um ato no Largo São Francisco, região central de São Paulo, em homenagem e apoio ao deputado Jean Willys (PSOL-RJ) que depois de sofrer seguidas ameaças decidiu abandonar o mandato e sair do país.

    Jean lutou, durante dois mandatos, na Câmara  dos Deputados pelos direitos LGBTs e de todas as minorias oprimidas. Sua vida pública foi marcada por campanhas de difamação e mentiras. Sua atuação incomodava fanáticos apoiadores de Jair Bolsonaro que, além de inventarem mentiras absurdas sobre ele, ameaçaram de morte sua mãe e seus irmãos. Um dos episódios marcantes da trajetória de Willys pelo congresso foi o cuspe em Jair Messias Bolsonaro durante a votação do Impeachment da presidenta Dilma, após o deputado Bolsonaro homenagear o torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra.  Fernando Haddad, Manuela D’Ávila, Guilherme Boulos, Criolo, a deputada estadual ,Erica Malunguinho, o deputado estadual, Carlos Giannazi, Eduardo Suplicy, Ivan Valente, o presidente do PSOL, Juliano Medeiros, e centenas de militantes e políticos estavam lá juntos para lutar pela democracia e por Jean.

    O ato ocorreu no salão nobre da Faculdade de Direito da USP, que fica no largo. Ao longo da noite várias falas foram realizadas pelos que estavam presentes, seja para relembrar momentos e vitórias de Jean como deputado ou para lamentar e ponderar sobre a decisão que ele foi obrigado a tomar.

    Veja abaixo falas de alguns dos presentes.

    Manuela D’Avila (ex-cadidata à vice-presidência do Brasil pelo PT)

    “Trago um recado de Jean: ele disse que nunca, mesmo diante de tanto medo e de tanta adversidade que fizeram com que ele tomasse essa decisão, ele nunca teve tanta esperança pela onda de solidariedade que ele recebeu. Pediu que eu dissesse a vocês que mesmo doído, ele está bem.” “Eu acho que o exilio do Jean, diz muito sobre o que o Brasil vive, sobre o que viveu nos últimos anos e também sobre o que nós podemos viver nos próximos dias, nos próximos meses, no próximo período.”

    “Nós precisamos dizer que a onda de fake News e as redes de ódio são responsáveis pelo exilio de Jean. “
    “A mera existência de um homem gay político, gera ódio. A verdade. O homem gay, político, poderoso, subvertendo as estruturas de poder. Isso gera ódio. Por isso é fake News e ódio. E são muitos os anos que Jean sofre com isso. São muitos os anos. E não é por acaso. É porque ele é porta voz de um conjunto de ideias que causam medo. A mudança. A transformação. O tirar o poder das mãos dos mesmos que tem sempre o poder: os homens brancos heterossexuais.”
    “Nós queremos uma democracia viva. Com o direito a debater todas as coisas e não queremos ser odiados. E nem sermos absolutamente destruídos porque defendemos o que quer que seja.”
    “É preciso falar: o fascismo, o ódio, a desumanização. A ideia de que o outro é o inimigo, o inimigo único a ser combatido. Que façam com que venham aqui, que vão aos enterros, que vão aos hospitais, tentarem fazer escrachos com os que lutam pela democracia. O fascismo no Brasil se constrói a partir do ódio, das fake News financiadas por dinheiro sujo na internet. “
    “Nós temos a obrigação de acolhermos as decisões das nossas companheiras e dos nossos companheiros sobre a melhor forma de resguardarem as suas vidas e a sua sanidade mental. “

    Fernando Haddad (ex-cadidato à presidência do Brasil pelo PT)

    “Primeiro dizer pra vocês todos que eu estou, desde sempre, mas a partir de hoje com mais vontade, eu estou disponível, eu estou disposto, eu estou animado, para reconstruir as condições para o Jean voltar para o Brasil amanhã, se ele quiser.”

    Guilherme Boulos (ex-cadidato à presidência do Brasil pelo PSoL)

    “Estao construindo esse ambiente, tão semeando o ódio, tão estimulando a violência, e a responsabilidade política das ameaças ao Jean, inclusive pela forma como reagiu, essa responsabilidade é do Bolsonaro e do seu governo e é ele que deve ser cobrado.”

     

    “A decisão do Jean é um grito, um grito de basta, de que não dá mais. E é importante a gente ouvir esse grito e transformar esse grito em disposição de luta, em unidade, em mobilização, para que a gente possa começar a virar esse jogo. Virar esse jogo para construir um Brasil onde alguém como Jean Wyllys seja valorizado e seja respeitado. Para construir um Brasil onde todas as formas de amor sejam valorizadas e sejam respeitadas. Para construir um Brasil onde o lucro não esteja acima da vida.“

    Monica Benício (ex-mulher de Marielle Franco e militante do PSoL)

    “Eu tenho um desacordo quando as pessoas dizem que o Jean teve que abandonar o seu mandato. Eu acho que ele foi obrigado a abandonar o seu mandato por essas pessoas.”

    Ivan Valente (deputado federal pelo PSoL-SP)

    “Bolsonaro na cadeia já, e não é só pelas transações tenebrosas, não é só pelos depósitos do Queiros, é porque a ligação direta com as milícias no Rio de Janeiro, lá no Escritório do Crime, em Rio das Pedras, e no globo de hoje esta muito claro, nos discursos de Bolsonaro em Brasília e do Flavio, na homenagem que ele faz, que nós podemos ter uma grande surpresa, Monica, fechando o circuito. Talvez a mão assassina que atirou em Marielle passe exatamente por ai, nesse que esta ai clandestino agora, neste que está foragido e que é homenageado. Miliciano homenageado. Nós não vamos permitir isso. Nós vamos dizer: Bolsonaro é ligado as milícias. Fora Bolsonaro”

     

  • 18 anos do Bloco “Banda do Fuxico”, o primeiro bloco LGBTIQ+ no Estado de São Paulo

    18 anos do Bloco “Banda do Fuxico”, o primeiro bloco LGBTIQ+ no Estado de São Paulo

    Nesta entrevista exclusiva e especial, Roberto Mafra (44 anos),Presidente na Associação Recreativa e Cultural – ONG Banda do Fuxico e gerente-geral na FLASH CLUB, analisa a conjuntura real que vivemos na esfera política e pública, além das situações negativas que vem ocorrendo com a falta de patrocinador no Carnaval de Rua em SP. Ex-diretor artístico da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo – APOGLBT entre os anos de 2016 e 2017, Mafra atuou também como Property Master no Grêmio Recreativo Cultural Social Escola de Samba Vai-Vai e foi Coreógrafo no Grêmio Recreativo Social Cultural Escola de Samba Pérola Negra.

    Neste Carnaval, as responsabilidades são enormes devido à 18ª realização do Trio Elétrico “Banda do Fuxico”, bloco fundado em 2001, sendo o primeiro bloco LGBTIQ+ no Estado de São Paulo. A ONG é registrada pela Associação das Bandas Carnavalescas da Cidade de São Paulo (ABASP). Hoje, possui mais de 60 ONGs parceiras em diversos segmentos, apenas na cidade de São Paulo, levando a eles toda forma de apoio e inclusão.

    O desfile este ano ocorrerá no pré-carnaval (24/2) no Largo do Arouche, região central de São Paulo, com o título “MULHERES EMPODERADAS DA BANDA DO FUXICO, SOMOS A VOZ DA FOLIA”. Estima-se em mais de 40 mil pessoas seguindo o bloco em seus percursos pelas ruas do centro.

    HUMBERTO MERATTI – Mafra, como é encarar essa responsabilidade de dar voz e levar a alegria através do Carnaval, ao seu público em específico, que vem nos últimos tempos passando por tantas desigualdades frente às questões de diversidade e gênero?

    ROBERTO MAFRA – Humberto, somos o primeiro bloco assumidamente LGBTIQ+ na cidade de São Paulo. Quando surgimos no dia 29/01/2001, não existia essa gama gigantesca de blocos de rua na cidade. Só existiam os blocos da ABASP à qual nosso bloco é associado. Hoje, somos mais de 600 blocos e bandas de rua. Acredito que 30% desses blocos tenha temática LGBTIQ+ e os outros alternativos. É lógico, que as coisas ficaram mais difíceis aos órgãos públicos sobre a questão de logística, para essa quantidade de blocos, mas acredito também que atraímos mais cultura dentro do Carnaval de Rua, colocando nas ruas um grito de liberdade através de temas que trazem essa linguagem LGBTIQ+ e acredito que o carnaval é uma manifestação popular onde podemos esbanjar nossa alegria através da folia. Não é fácil fazer carnaval, principalmente hoje, quando os poucos patrocinadores escolhem os blocos e fazem questão de investir nos blocos de grandes artistas que chegam de fora para somar no nosso carnaval com os seus megablocos. Isso só tende em crescer.

    “Estamos lutando para resguardar nossas tradições de blocos que começaram há mais de 20 anos e que sejamos reconhecidos pela prefeitura e por cada gestão nova que chega a cada quatro anos e não conhece nossa historia, pois só queremos levar alegria para o povo desse País lindo e festivo que é o Brasil.”

    HUMBERTO MERATTI – Mafra, você também acredita que os movimentos artísticos e culturais da comunidade LGBTIQ+ estão chegando pra valer nos Carnavais de Rua pra ficar e não sair mais, ocupando assim seus lugares de direito?

    ROBERTO MAFRA – Com certeza Humberto, isso foi mais uma forma de expressar nossa cultura e gritar por nossos direitos. Através da cultura popular estamos cada vez mais nos fortalecendo e assumindo nossos gêneros e orientações sexuais.

    Foto: Roberto Mafra

    HUMBERTO MERATTI – Em relação ao dia de desfile do Bloco Bando do Fuxico, qual será a mensagem que vocês pretendem passar ao público presente, sabendo-se que hoje o Carnaval de Rua em SP é tão misto, que reúne em diversos blocos LGBTIQ+, uma quantidade altíssima de aliados ao movimento.

    ROBERTO MAFRA – Primeiro que o nosso tema será “MULHERES EMPODERADAS DA BANDA DO FUXICO, SOMOS A VOZ DA FOLIA”, e precisamos além da alegria e da folia, conscientizar as pessoas sobre os direitos para/e cada gênero, além de promover campanhas contra a homofobia e o machismo, e principalmente campanhas de uso do preservativo, para combate a doenças sexualmente transmissíveis, através da distribuição de insumos.

    “Mas o nosso maior objetivo é que todos sejam felizes nessa festa popular, assegurando inclusive o respeito”.

    HUMBERTO MERATTI – Vivemos em um cenário político completamente conturbado, onde pessoas no poder todo dia noticiam frases ingratas ou inoportunas, além das mensagens de ódio, principalmente, sobre a comunidade LGBTIQ+ e com isso, muitos replicam. Para o bloco, como é visualizado este cenário político e público atual?

    Foto: Roberto Mafra

    ROBERTO MAFRA – Um país onde se mata um LGBTIQ+ a cada 19 horas por homofobia e ódio, e olha que isso acontecia antes do atual cenário político de vitória da direita. Agora, com essa nova gestão presidencial, que tem um governo assumidamente homofóbico, machista, racista e que prega o ódio escancaradamente, infelizmente só tende a piorar. Acompanhamos diariamente as notícias sobre as mortes dos nossos LGBTIQ+ em nosso Brasil.

    “Infelizmente a maioria dos brasileiros também são assim, homofóbicos e racistas, tanto é, que elegeram o Bolsonaro. Acredito que a luta continua e não iremos desistir de nos defender e defender nossa população, somos todos iguais independente da raça, cor, religião e etnia.”

     

    *Humberto Meratti é especialista em políticas públicas culturais e gestor cultural

  • É preciso cortar todas as cabeças do monstro

    É preciso cortar todas as cabeças do monstro

    Julian Rodrigues*- ESPECIAL PARA O JORNALISTA LIVRES

    A polêmica se estabeleceu entre o ativismo progressista nos últimos dias.
    Há os que acham que falas como as da Ministra bolsonarista Damares Alves (“meninas de rosa e meninos de azul) fazem parte de uma tática do tipo “cortina de fumaça” para nos distrair enquanto o governo entrega nosso petróleo, destrói o meio-ambiente, acaba com os direitos trabalhistas e privatiza todo o patrimônio público. Outros, entre os quais me incluo, entendem que, embora certas falas podem, em determinados momentos terem um aspecto mais provocativo ou meramente diversionista, todas as medidas retrógadas do governo devem ser enfrentadas.

    Tudo ao mesmo tempo agora. O governo Bolsonaro se estrutura em duas vertentes principais. Um braço ultraliberal (comandado por Paulo Guedes) que pretende desmontar o Estado, privatizando as empresas estatais; terminando com a Previdência como a conhecemos hoje implementando o regime de capitalização; entregando as riquezas naturais – petróleo, minério, florestas ao capital internacional. A outra vertente é o braço hiper-conservador, reacionário, fundamentalista religioso, obscurantista, neofascista: trata-se da destruição das conquistas civilizatórias, do pluralismo político, dos direitos das mulheres, da população negra, das LGBTI, dos indígenas, da educação emancipatória, do pensamento crítico.

    As duas vertentes se complementam. A vitória de Bolsonaro se deve, entre outros fatores, ao sucesso que obteve ao amalgamar diferentes setores sociais e diferentes agendas conservadoras: do fundamentalismo evangélico, passando pelo núcleo duro do fascismo até chegar às elites neoliberais. Seu governo, executará, na medida da correlação de forças concreta, o conjunto do seu programa – com todas as contradições, avanços, recuos e balões de ensaio que estamos já vivenciando.

    Bolsonaro disse que o país era melhor há 50 anos e vai trabalhar para que os valores daquela época voltem a prevalecer. Eu diria que é pior que isso, quer nos levar mesmo é de volta ao século 19. De qualquer maneira, é preciso entender que não se trata, portanto, de escolher qual das linhas de atuação do novo governo são mais nocivas ao povo. Não há “cortina de fumaça”, porque tudo o que dizem ou anunciam é prejudicial a milhões de pessoas.

    A classe trabalhadora é diversa. Classe, raça, gênero, liberdade de orientação sexual estão interligadas. O racismo estrutural e a herança escravista estruturam as relações entre as classes no Brasil, assim como o machismo não só estimula a violência doméstica como faz com que as mulheres trabalhadoras ganhem menos que os homens. Questões sociais, econômicas e culturais formam um todo, um mesmo sistema de opressão. Aliás, não dá pra admitir ou agir politicamente como se a dor de uns fosse mais importante que a dor de outros.

    Outra coisa importante. À esquerda e à direita, muitos se referem à pauta feminista, antirracista e pela liberdade sexual e de gênero como algo situado no campo dos “costumes” ou das “questões morais”. Não se trata disso. E nem, como já dissemos, de uma mera “cortina de fumaça”. Todo o debate tem a ver com DIREITOS. Do que fala é de direitos civis, de direitos humanos, da igualdade entre mulheres e homens, de igualdade racial, de liberdades democráticas, reconhecimento da diversidade, autonomia, liberdade sexual, direitos sexuais e reprodutivos, pluralidade, dignidade, respeito.

    Cada vez que algum ou alguma expoente bolsonarista – ou o próprio – diz uma aparente “bobagem irrelevante” , do tipo “meninos de azul e meninas de rosa”, estamos diante mesmo é de um MOVIMENTO poderoso de legitimação da violência simbólica e física, da violência concreta contra as mulheres, contra a população LGBTI. Uma espécie de “liberou geral” para o bullying homofóbico, machista, transfóbico. Pior: uma autorização tácita para violência doméstica, para o feminícidio e para o assassinato de pessoas LGBTI.

    Para os marxistas e que todos que se referenciam nessa tradição, vale lembrar uma de suas frases “as ideias tornam-se força material quando penetram nas massas”.

    Vamos ter que tentar cortar todas as cabeças ao mesmo tempo. Não vai dar para escolher uma ou outra, pela simples razão de que o monstro é um só.


    *Julian Rodrigues, professor e jornalista, é ativista de DH e do movimento LGBTI; pesquisador na área de gênero e sexualidade

     

     

  • Casal de mulheres é agredido com chutes e socos em ataque LGBTfóbico em Natal

    Casal de mulheres é agredido com chutes e socos em ataque LGBTfóbico em Natal

    Um casal de mulheres foi vítima de LGBTfobia no condomínio Village Planalto, no bairro Planalto, Zona Oeste de Natal. Vanessa Macambira, 40, e Glícia Brandão, 26, são casadas e sofreram agressão verbal e física após interpelar um jovem de 17 anos, lutador de artes marciais, acusado de agredir o filho delas, de apenas 9 anos de idade. O crime aconteceu dia 27 de dezembro de 2018.

    Vanessa teve o braço quebrado em duas partes e foi levada para o hospital Walfredo Gurgel, unidade de urgência e emergência na capital potiguar. O local da fratura foi imobilizado e ela ainda aguarda cirurgia pelo SUS. Ao tentar defender a esposa, Glícia levou um soco no rosto e sofreu corte na testa. A criança não presenciou o ataque.

    O agressor, menor de 18 anos, vinha hostilizando o filho de Vanessa e Glícia há alguns meses em razão da homossexualidade do casal. Nas redes sociais, o jovem aparece numa das fotos com o logotipo do presidente Jair Bolsonaro. Ele é filho do aposentado Nilo Ferreira Lima, que também mora no condomínio.

    Vanessa Macambira quebrou o braço em dois lugares

    Segundo Vanessa, ao ser avisada pelo filho de que havia sido agredido, ela desceu para falar com o garoto e foi ameaçada. Da janela, Glícia viu e desceu para conversar. Vanessa subiu para o apartamento e deixou o filho, antes de voltar para o local onde estavam. No retorno, Vanessa lembra que viu Glícia sendo empurrada, apressou o passo e foi agarrada por trás e atirada no chão. Foi então que o jovem começou a desferir chutes na vítima. Ao tentar impedir, Glícia levou um soco no rosto e perdeu os óculos:

    – Quando eu vi, o rapaz empurrou a Glícia e fui tentar separar a briga. Ao chegar, o pai do menino me segurou e me derrubou. Quando eu vi já estava no chão e senti o garoto me chutando. E num dos chutes senti que meu braço havia quebrado. Glícia tentou fazer o garoto parar e levou um soco no rosto, o óculos voou. Ela ainda pegou britas no chão e tentou acertá-lo.

    No momento da agressão nenhum dos moradores que presenciou o ataque prestou socorro. O porteiro do condomínio chegou a empurrar Glícia para apartar a briga e outro morador reclamou que uma das vítimas acertou uma pedra em seu automóvel. A síndica se recusou a informar a relação de moradores do prédio, não prestou socorro e também não apurou o caso.

    Vanessa e Glícia só conseguiram registrar o Boletim de Ocorrência uma semana depois da agressão em razão da greve dos policiais civis no Estado. Uma advogada soube do caso pelas redes sociais e se ofereceu para defender o casal. O recesso do Judiciário também impediu que as vítimas processassem o agressor e o pai logo após o ocorrido.

    A lei estadual que reconhece a homofobia como crime existe desde 2007 no Rio Grande do Norte, mas nunca foi regulamentada pelo Governo do Estado.

    Morando juntas há sete anos, Vanessa e Glícia contaram que já foram vítimas de agressões verbais, mas nunca imaginaram que fossem entrar para as estatísticas homofobia da forma como o caso aconteceu:

    – As pessoas chamam a gente de sapatão na rua e há também o preconceito velado na escolas. Nosso filho tem 9 anos, foi adotado com cinco dias de nascido, e é como se o tempo todo você estivesse sendo observada e julgada por ser uma boa mãe. Tem sempre que provar. Mas nunca imaginamos ser agredidas dessa forma. É homofobia porque começou com agressões ao meu filho, chamado de ‘fresco’, ‘viado’, ‘baitola’ por ser filho de duas mulheres lésbicas”, conta Vanessa.

    Luiz Felipe tem 9 anos de idade e foi adotado com cinco dias de vida

    Histórico

    Segundo a mãe, Luiz Felipe vem sendo vítima de bullyng há alguns meses dentro do condomínio. Glícia já chegou a reunir as crianças e adolescentes do prédio para pedir que não ofendessem mais o filho, além de explicar que há diversidade de pensamento e de orientação sexual entre as pessoas. O garoto chega em casa ora chorando ou chateado:

    – Eu cheguei a ir no apartamento do Nilo porque o filho mais novo dele era uma das crianças que xingava meu filho. Nem conhecia o mais velho, que foi quem nos agrediu.

    Vanessa e Glícia são reservadas, não costumam andar juntas pelo condomínio e não possuem relações próximas com os demais vizinhos. Após a agressão, que ocorreu por volta das 20h, a família dormiu na casa da mãe da Glícia, em Lagoa Nova, local adotado como ponto de apoio. Vanessa só aceitou voltar para o condomínio após o irmão conversar com o pai do agressor:

    – “Ele disse para o meu irmão que tinha passado mal, teve pressão alta e que poderíamos voltar sem problemas, mas ainda estamos traumatizadas. Não me sinto segura, mas voltamos depois dessa conversa do meu irmão com ele. O garoto que nos agrediu está passando férias numa casa de praia. Comprei esse apartamento financiado pela Caixa Econômica ainda na planta. Não quero ir embora”, conta Vanessa Macambira, funcionária estadual e municipal

    A eleição de um presidente da República homofóbico, como Jair Bolsonaro, é um agravante, avaliam as vítimas. Emocionada, Glícia acredita que os crimes de ódio contra homossexuais devem aumentar:

    – As eleições nos deixou totalmente fragilizadas. Sabíamos que perderíamos nossos direitos e que as pessoas que concordam com o discurso de ódio dele (Jair Bolsonaro) iam sair do armário. E a maioria dessas pessoas é homem e mais fortes que nós. Eles nos querem mortos só pelo fato de existirmos. A eleição de Jair Bolsonaro dá uma espécie de aval, é como se agora isso fosse permitido.

    Uma das primeiras medidas tomadas pelo presidente Jair Bolsonaro, através de Medida Provisória, foi excluir a população LGBT da lista de políticas e diretrizes destinadas à promoção dos Direitos Humanos

    Luiz Felipe e as duas mães, Vanessa e Glícia

    Campanha

    Glícia Brandão é atriz e está desempregada. Já Vanessa Macambira é formada em Psicologia e é ex-policial Militar. Ela deixou a PM depois de passar em dois concursos para a área de Saúde do Estado e do município. Trabalha com crianças e jovens. As dificuldades financeiras do casal aumentaram após a agressão. O último salario do município veio com um desconto de mais de R$ 700 em razão dos dias descontados da paralisação dos servidores da saúde. No Estado, a situação é ainda pior. Vanessa está com três folhas atrasadas, incluindo o 13º de 2017.

    Diante dos problemas e dos gastos extras com combustível e remédios, as duas resolveram fazer uma campanha de arrecadação. Segundo Vanessa e Glícia, os valores arrecadados serão anexados ao processo:

    Banco do Brasil:

    Ag: 1668-3
    Cc: 15416-4
    Variação: 51
    CPF: 028.205.684-08
    Vanessa Macambira dos Santos