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  • ‘O RISCO TÁ BEM PAGO RS’: Deltan foi estrela de encontro com bancos e investidores organizado pela XP ‘com compromisso de confidencialidade’

    ‘O RISCO TÁ BEM PAGO RS’: Deltan foi estrela de encontro com bancos e investidores organizado pela XP ‘com compromisso de confidencialidade’

    Do Intercept Brasil
    Parte 13

    Banqueiros de J.P. Morgan, Goldman Sachs e Deutsche Bank foram convidados para conversar com Deltan – e Fux – em eventos secretos

    O procurador Deltan Dallagnol foi o destaque de um evento secreto com representantes dos bancos e investidores mais influentes do Brasil e do exterior. O encontro foi organizado pela XP Investimentos em junho de 2018. A representante da XP que contactou o coordenador da força-tarefa da Lava Jato prometeu que o bate-papo seria “privado, com compromisso de confidencialidade”, e destacou que já havia feito um evento parecido com o ministro do Supremo Luiz Fux: “não saiu nenhuma nota na imprensa”, garantiu.

    Dallagnol aceitou e pediu que a XP conversasse com a agência que organiza os eventos pagos do procurador, a Star Palestras, que acabou coordenando a contratação. O Intercept já revelou, com base nos chats secretos da Lava Jato, que Deltan Dallagnol disse ter faturado quase R$ 400 mil com palestras e livros em 2018. Entre as empresas que pagaram pela presença do procurador, está uma investigada pela própria Lava Jato. No caso da XP, não está claro se a ida do procurador foi remunerada.

    Dallagnol e seus colegas discutiram, no Telegram, o potencial risco para suas imagens ao se sentarem com banqueiros, mas acabaram decidindo que valia a pena. “Achamos que há risco sim, mas que o risco tá bem pago rs”, escreveu Dallagnol em um chat privado com seu colega na força-tarefa, o procurador Roberson Pozzobon, em fevereiro de 2018. Pozzobon pediu um tempo: “Mas de fato é nessa questao dos bancos que a coisa é mais sensível mesmo. Vamos conversar com calma depois”.

    Reuniões secretas com banqueiros já provocaram polêmicas com vários políticos e funcionários públicos em outros países. Nos EUA, por exemplo, a recusa de Hillary Clinton em publicar transcrições de seus discursosremunerados para bancos de investimento de Wall Street — e o timing de doações feitas a sua fundação filantrópica — se tornou uma linha de ataque forte e recorrente contra sua campanha fracassada pela presidência em 2016. Eventualmente, algumas das transcrições foram vazadas e publicadas pelo WikiLeaks. A prática de palestras remuneradas é vedada por entidades como o Departamento de Justiça dos EUA e o Tribunal Penal Internacional.

    Os detalhes sobre o evento com Dallagnol, realizado no dia 13 de junho de 2018 no escritório da XP, em São Paulo, são relatados em conversas privadas que fazem parte do pacote de mensagens que começamos a revelar no último dia 9 de junho. O material reúne conversas mantidas pelos procuradores da Lava Jato em vários grupos do aplicativo Telegram desde 2014.

    Intercept, junto com a Folha de S.Paulo, revelou este mês um plano de Dallagnol para lucrar com palestras junto com Roberson Pozzobon, contando com a ajuda de suas esposas. “Vamos organizar congressos e eventos e lucrar, ok? É um bom jeito de aproveitar nosso networking e visibilidade”, falou Dallagnol em um chat com sua esposa.

    ‘NÃO SAIU NENHUMA NOTA NA IMPRENSA’

    Deltan Dallagnol e Roberson Pozzobon em audiência pública na Assembleia Legislativa do Paraná em 24 de outubro de 2016.

    Deltan Dallagnol e Roberson Pozzobon em audiência pública na Assembleia Legislativa do Paraná em 24 de outubro de 2016.

    Foto: Pedro de Oliveira/Alep

    O CONVITE DA XP INVESTIMENTOS chegou a Dallagnol via Débora Santos, que se apresenta como “consultora/ analista de política e Judiciário” da empresa. No começo da conversa, ela diz que é esposa de Eduardo Pelella, que era o chefe de gabinete e braço direito de Rodrigo Janot quando Procurador-Geral da República. Antes de trabalhar na XP, Santos era assessora particular do Ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF.

    “Queria te convidar para um bate papo com investidores brasileiros e estrangeiros aqui em SP”, escreveu Santos. Dallagnol explicou que já tinha um evento agendado com a XP e pediu para Santos entrar em contato com sua secretária, mas mostrou mais interesse após a consultora explicar a natureza do evento. “Seria um público mais seleto. CEOs e tesoureiros dos grandes bancos brasileiros e internacionais”, ela detalhou. “Me passa uma lista de quem são?”, pediu Dallagnol.

    17 de maio de 2018 – Chat privado

    Débora Santos – 18:04:57 – JP Morgan Morgan Stanley Barclays Nomura Goldman Sachs Merrill Lynch Cresit Suisse Deutsche Bank Citibank BNP Paribas Natixis Societe Generale Standard Chartered State Street Macquarie Capital UBS Toronto Dominion Bank Royal Bank of Scotland Itaú Bradesco Verde Santander
    Santos – 18:06:17 – Esses seriam os convidados. Nem todos comparecem.
    Santos – 18:06:36 – Você deve estar agendado para o Expert, uma conferência grande que realizamos em setembro.
    Santos – 18:07:42 – Esse bate-papo é privado, com compromisso de confidencialidade, onde o convidado fica à vontade para fazer análises e emitir pareceres sobre os temas em um ambiente mais controlado.
    Santos – 18:08:17 – Semana passada recebemos o presidente do TSE, ministro Fux, por exemplo e não saiu nenhuma nota na imprensa.
    Santos – 18:09:25 – Nem sobre a presença dele na XP.
    Santos – 18:09:43 – Assim, já aconteceu com vários personagens importantes do cenário nacional, como você.

     

    XP e Dallagnol não confirmaram os participantes do evento para o Intercept, mas na lista de convidados havia bancos que já foram investigados pela Lava Jato. Depois da explicação do evento, os dois discutiram a logística e a data:

    17 de maio de 2018 – Chat privado

    Deltan Dallagnol – 23:06:04 – Mas me esclarece melhor: Vcs têm encontros regulares sem data definida? Ou querem fazer um encontro específico com alguma pauta? O ideal seria eu participar de um encontro que já exista…
    18 de maio de 2018 – Chat privado

    Débora Santos – 10:33:53 – Fazemos econtros regulares com atores do mercado para fazer análises conjunturis sobre temas da atualidade. Estamos na fase de ciclo de encontros sobre Lava Jato e Eleições, por isso estivemos com o ministro Fux, na semana passada, e estamos negociando data com os ministros Barroso e Alexandre de Morais tb.
    Santos – 10:34:49 – Além de integrantes do Judiciário, estivemos nas últimas semanas com algumas lideranças políticas e cientistas políticos.
    Santos – 10:35:33 – A reunião com vc se coloca nesse contexto do ciclo de debates sobre eleições, lava jato e conjuntura política em 2018.
    Santos – 11:24:14 – A principal diferença entre a conferencia que vc fará em setembro e dessa reunião privada é o tipo de público. Na conferencia ampliada, é um público heteregeneo que compreende o cenário mais amplo, sem aprofundamentos, meio que o que já está nos jornais. O público dessas reuniões privadas é mais qualificado, se aprofunda em conceitos de debates.

     

    O ministro Fux não respondeu ao Intercept. Já os ministros Barroso e Moraes negaram ter participado em eventos do tipo.

    Quatro dias depois, Dallagnol perguntou sobre um possível cachê.

    22 de maio de 2018 – Chat privado

    Deltan Dallagnol – 23:08:33 – Débora, a ida dos Ministros é remunerada como palestra?
    Dallagnol – 23:09:01 – Os encontros são convocados então tendo em vista um convidado específico, certo?
    Débora Santos – 23:42:49 – Sim, fazem parte de um projeto que vem sendo desenvolvido ao longo do ano, mas são convocadas rodadas para cada convidado
    Santos – 23:44:40 – Temos como hábito respeitar a privacidade dos nossos convidados
    Dallagnol – 23:55:23 – Opa entendo perfeitamente.
    Dallagnol – 23:55:44 – Debora vou pedir para a SUPRIMIDOque me ajuda com essas palestras para falar com Vc.
    23 de maio de 2018 – Chat privado

    Débora Santos – 00:01:15 – Tudo bem.

     

    Àquela altura, o procurador já sabia muito bem seu valor no mercado de palestras. Em várias conversas anteriores, Dallagnol discutiu a remuneração de outras figuras públicas – ele queria estabelecer seu próprio preço. Em um documento intitulado “Projeto palestras.docx”, criado em dezembro de 2015 e editado pela última vez em fevereiro de 2016, Dallagnol anotou três conversas relevantes:

    Sobre as palestras pagas:
    – SUPRIMIDO do Markets Group: Com certeza, Dr Dallagnol. Na verdade, quase todas as autoridades cobram para dar palestra. O Joaquim Barbosa, por exemplo, cobra 70 mil reais por palestra. O FHC, 360 mil. Se eles cobram, é porque tem quem pague. Pedro Malan, Mailson da Nobrega… Por ai vai. Empresas como a minha não pagam palestrantes, pois organizar conferências é a nossa atividade-fim. Mas sei que investment banks costumam trazer palestrantes de peso para falar para investidores e costumam pagar por isso.
    – SUPRIMIDO da Star: FHC cobraria cento e poucos mil; Joaquim Barbosa, 99 mil. Ricardo Amorim, 34.600. Uma iniciante que está com ela, 6 mil.
    – Orlando: colega do MP que participou do CDC viajou fazendo muitas palestras, cobrando por isso.

    A XP se recusou a confirmar a existência do evento secreto ou de pagamentos a Dallagnol por sua participação. A Star Palestras, que agencia os eventos do procurador, respondeu que os dados sobre clientes são privados e “por isso não fornecemos informações”. Ainda afirmou que “se conduz em sua atividade segundo a lei e a ética”.

    Mas é certo que o evento secreto aconteceu. Com a aprovação da XP, Dallagnol levou um integrante da Transparência Internacional. A organização, que se descreve como “dedicada à luta contra a corrupção”, juntou-se aos procuradores da força-tarefa para criar as “Novas Medidas contra a Corrupção”, e confirmou que Guilherme Donega, consultor do Programa de Integridade em Mercados Emergentes, esteve presente e falou sobre a iniciativa.

    Perguntado sobre o conflito ético de reuniões privadas de procuradores – possivelmente remuneradas – com bancos, a Transparência Internacional respondeu que “devem ser evitadas atividades de qualquer tipo – mesmo as privadas – que possam comprometer a integridade, equidade e imparcialidade necessárias à função que exercem”. “Em caso de dúvida, recomenda-se que esta seja levada a um órgão competente para um parecer prévio”, acrescentou a entidade, que informou ainda que Donega não foi remunerado por sua participação.

    ‘LULA NÃO PODE DAR PALESTRA, PROCURADOR QUE GANHA SUPER SALÁRIO PODE. . .’

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    GIF: Reprodução/YouTube

    Um ano antes do encontro secreto com grandes investidores, Dallagnol já tinha dado uma palestra numa conferência da XP Investimentos. Ele recebeu R$ 33.250. O evento aconteceu quando as palestras do procurador já eram foco de muito escrutínio da imprensa e do próprio Ministério Público.

    A preocupação, à época, era tanta que um assessor sugeriu que seria uma boa ideia barrar a imprensa dos eventos em São Paulo e no Rio:

    15 de junho de 2017 – Chat privado

    Assessor 1 – 00:21:06 – na verdade, não sei se é uma boa ideia a imprensa cobrir estas palestras em SP ou no Rio. acho que vale a pena qdo é em cidades cuja imprensa não costuma ter acesso a vcs. mas em SP e Rio o risco de uma cobertura mais “crítica” é maior.
    Assessor 1 – 00:21:24 – não achei ruim, mas não foi tão positivo assim.
    Deltan Dallagnol – 00:21:25 – pois é, a ideia era não ter
    Dallagnol – 00:21:32 – acho que eles se infiltraram
    Dallagnol – 00:21:49 – alguém até perguntou: como conseguiram credenciais?
    Dallagnol – 00:21:59 – na XP, na próxima semana, deve ter o mesmo problema
    Assessor 1 – 00:22:12 – uai… Assessor 2 disse que a imprensa ia cobrir, entendi que tinha sido combinado com a assessoria do evento.
    Assessor 1 – 00:24:19 – a assessoria deles pode barrar, se quiser. mas eles capitalizam os eventos com vc, então é difícil. um congresso como o de hj não teria espaço na Folha, no Globo e no Valor se vc não tivesse participado.

     

    Dias depois, a corregedoria do Ministério Público abriu uma investigação após a imprensa descobrir que uma agência estava pedindo até R$ 40 mil por palestras do procurador. Ele afirmou que recebeu R$ 219 mil por eventos no ano anterior. A Associação Nacional de Procuradores da República soltou uma nota em defesa de Dallagnol.

    O que não se sabia, até agora, e que os chats da Vaza Jato revelam, é que o próprio Dallagnol editou e aprovou a nota em apoio a si mesmo antes da publicação. O procurador debateu o texto em conversas privadas com a procuradora e diretora cultural da ANPR, Lívia Tinoco. Além de mandar a nota para aprovação de Deltan, Tinoco repassou informações de bastidores para o procurador, antecipando o resultado da investigação contra ele: “não vai dar em nada”.

    23 de junho de 2017 – Chat privado

    Lívia Tinoco – 15:56:21 – Deltan
    Tinoco – 15:56:43 – Ja recebeu a nota da ANPR sobre a questão das palestras remuneradas ?
    Tinoco – 15:56:51 – Aprova aí pra gente soltar
    Tinoco – 15:57:40 – Peço sigilo a vc, mas a ANPR conversou com Hindemburgoque concorda não haver qualquer problema com as palestras remuneradas
    Deltan Dallagnol – 15:57:51 – NÃO VI
    Tinoco – 15:57:56 – Com certeza a coisa vai bater na corregedoria do MPF
    Dallagnol – 15:57:58 – ótimo, boa notícia
    Dallagnol – 15:58:05 – CNMP mandou pra corregedoria
    Tinoco – 15:58:05 – E não vai dar em nada
    Tinoco – 15:58:09 – Ele vai arquivar
    Tinoco – 15:58:19 – Por favor, não comente isso
    Dallagnol – 15:58:26 – claro, obrigado
    Tinoco – 15:58:27 – Só para te tranquilizar
    Dallagnol – 15:58:32 – obrigado Livia
    Tinoco – 15:58:33 – Vou mandar a nota agora
    Tinoco – 15:58:36 – Espere aí

     

    Tinoco estava certa: a investigação sobre a comercialização das palestras de Dallagnol foi arquivada menos de dois meses depois.

    A ANPR e a corregedoria não comentaram esta reportagem.

    LEGENDA (via AP)

    Ilustração: João Brizzi e Rodrigo Bento/The Intercept Brasil; Marcos Bizzotto/AGIF via AP

    XP, A CLIENTE FIEL. ‘NÃO É SHOW???’

    À época, Dallagnol passou várias horas conversando com seus assessores de comunicação para tentar conter os danos públicos à sua reputação causados pelas palestras. Ele queria criar uma estratégia para responder aos jornalistas, mas parecia não entender exatamente os riscos da decisão.

    Os assessores conseguiram convencê-lo a não responder aos críticos nas redes. O procurador queria postar uma mensagem em que deixava claro que fazia “o que quiser com o dinheiro das minhas palestras”. Indignado com o que chamou de “acusações absurdas”, Dallagnol desafiava os políticos críticos a ele a mostrar que doavam “para a sociedade seu dinheiro”, como ele afirmava fazer, em vez de “drenar recursos públicos”. Terminou: “Então, podemos começar a conversar”.

    20 de junho de 2017 – Chat DD-Assessor2-Assessor1

    Deltan Dallagnol – 12:33:07 – Mas por que a polêmica sobre isso é ruim?
    Dallagnol – 12:33:26 – Vai reforçar coisa boa
    Assessor 1 – 12:34:20 – não vai, esse é que é o problema. o que chama a atenção é o negativo, não o positivo.
    Assessor 1 – 12:34:56 – Lula não pode dar palestra, procurador que ganha super salário pode…
    Assessor 1 – 12:35:32 – procurador fatura e ainda tenta posar de bom moço…

     

    Em nenhum momento nos chats Dallagnol cogitou parar de receber para palestrar. Apesar das críticas, da investigação na corregedoria, das matérias jornalísticas e do risco à sua reputação relatado pela assessoria, Dallagnol e seus colegas continuavam empolgados com a perspectiva de novas palestras remuneradas. Em fevereiro de 2018, – depois da palestra pública na XP e antes do encontro secreto com os bancos – o procurador relatou a Roberson Pozzobon um novo convite da XP e pareceu se importar pouco com as considerações éticas e as consequências para sua imagem.

    8 de fevereiro de 2018 – Chat privado

    Deltan Dallagnol – 15:51:25 – Robito, recebemos o seguinte convite: A XP Investimentos quer você de novo este ano mas quer fazer uma painel com você, Dr. Carlos FernandoDiogoe Robinho. Querem os 4. Alguém da XP irá fazer perguntas. Não é show??? Vocês fariam isso, certo? Eu fiquei super animada, acho que vai ser o melhor painel EVER! Temos que ver uma data entre 20 e 22 de setembro. Me fala o que vc acha, por favor? Pra Vc ofereceram 25.000. Tem risco de imagem, mas CF e eu achamos que dá pra irmos, apesar do risco.
    Roberson Pozzobon – 16:28:37 – Castor também achou que nao há risco, Delta?
    Dallagnol – 16:58:41 – castor respondeu: “vou ficar rico”
    Dallagnol – 16:58:54 – Achamos que há risco sim, mas que o risco tá bem pago rs.
    Dallagnol – 16:59:16 – Cara, olho o quanto apanho publicamente. Uma a mais não vai fazer diferença rs.
    Dallagnol – 16:59:21 – (pra mim)
    Dallagnol – 16:59:30 – Não sendo nada errado…
    Dallagnol – 17:02:41 – Ah, CF acha que tem mais risco no caso de Vc e Júlio, que estão sentando com os bancos
    Dallagnol – 17:02:58 – Podemos conversar sobre isso depois, se quiser, mas gostaria de dar resposta, se possível, até amanhã
    Pozzobon – 17:37:15 – kkkkkkk
    Pozzobon – 17:37:34 – Beleza!
    Pozzobon – 17:37:48 – Vamos conversar sim
    Pozzobon – 17:39:09 – Não vejo diferença, pois o procedimento é da FT
    Pozzobon – 17:40:03 – Mas de fato é nessa questao dos bancos que a coisa é mais sensível mesmo. Vamos conversar com calma depois

     

    Pozzobon e Dallagnol aceitaram o convite e participaram do evento ao lado dos colegas Carlos Fernando dos Santos Lima e Diogo Castor de Mattos.

    A força-tarefa da Lava Jato não comentou o conteúdo da reportagem e enviou sua resposta padrão: “não reconhece as mensagens que têm sido atribuídas a seus integrantes”, que “pautam sua conduta pela lei e pela ética”.

    ‘É QUE FIZ PALESTRA PRA ELES.’

    UNAFISCO Seminar

    Foto: Suamy Beydoun/AGIF via AP

    Ironicamente, palestras remuneradas constituíram uma peça central no argumento da força-tarefa, sob o comando de Dallagnol, para a quebra de sigilo fiscal e bancário do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na sua decisão autorizando a quebra, o então juiz Sergio Moro escreveu que os valores altos — mesmo sem indício de crime — eram suficientes para criar “dúvidas” e justificar a investigação: “Não se pode concluir pela ilicitude dessas transferências, mas é forçoso reconhecer que tratam-se de valores vultosos para doações e palestras, o que, no contexto do esquema criminoso da Petrobras, gera dúvidas sobre a generosidade das aludidas empresas e autoriza pelo menos o aprofundamento das investigações.” As palestras de Lula também geraram bastante atenção da imprensa.

    O código de ética do Ministério Público brasileiro é mais ameno do que o de muitos de seus pares estrangeiros. O Gabinete do Procurador do Tribunal Penal Internacional, por exemplo, veda a seus membros “aceitar remuneração de qualquer fonte externa para qualquer publicação, palestra externa ou outro ato que esteja relacionado aos propósitos, atividades ou interesses da Corte, como taxa de palestras, honorário ou outro abono”. O Departamento de Justiça dos EUA também proíbe este tipo de atuação por parte de seus procuradores e outros funcionários:

    “Geralmente, um funcionário não pode ser [financeiramente] recompensado por falas ou textos que se relacionem com seus deveres oficiais. Um assunto se relaciona com as funções oficiais de um funcionário se uma parte significativa trata de um tema que foi atribuído ao empregado atualmente designado ou no último ano; qualquer política, programa ou operação em curso ou anunciada do Departamento…”

    O Departamento de Justiça também estipula que “um funcionário é proibido de participar de qualquer assunto em que tenha interesse financeiro”. Na sua primeira palestra para a XP sobre “ética e Lava Jato”, Dallagnol brincou abertamente sobre o fato de possuir ações da Petrobras e do BTG Pactual na Bolsa.

    ‘Se não estiver, vou fazer, como fizemos tb na XP… agora se estiver no radar, não’

    Essas regulações internacionais existem não apenas para diminuir o risco de corrupção nas entidades, mas — de igual importância — para evitar a possibilidade de percepção de corrupção. “A percepção pública da ética dos funcionários públicos é extremamente importante”, explica um livro didático sobre corrupção global endossado pela ONU e pela Transparência Internacional. “Se o público acreditar, mesmo que erroneamente, que os funcionários públicos são antiéticos, as instituições democráticas sofrerão com a erosão da confiança pública.”

    A ombudsman do Banco Central da Europa pediu no ano passado que os líderes da instituição parassem de participar de encontros fechados com grandes bancos privados. Ela argumentou que a nova medida “inegavelmente ajudaria a reforçar a confiança do público no BCE”.

    Ao criar regras rígidas, as instituições evitam situações em que seus funcionários possam ser tentados a flexibilizar normas éticas, mesmo que violações flagrantes não ocorram. Além disso, tentam impedir que a população enxergue funcionários públicos como pessoas de valores “flexíveis”, a depender do pagamento.

    Em alguns casos, Dallagnol e sua equipe claramente se mostraram cientes de potenciais armadilhas éticas em trabalhos remunerados por terceiros e tentaram evitar aceitar dinheiro de entidades que estavam sob investigação da Lava Jato.

    26 de março de 2019 – Chat Incendiários ROJ

    Deltan Dallagnol – 01:10:37 – Caros, imagino que não esteja no radar pq nca ouvi falar, mas melhor garantir. O Banco Pan está no radar pra algo? Eles entraram em contato com a Fernanda da Star pedindo palestra pra semana de compliance deles
    Dallagnol – 01:11:30 – Se não estiver, vou fazer, como fizemos tb na XP… agora se estiver no radar, não
    Júlio Noronha – 05:29:04 – Não está no radar. Mande ver

     

    Mas o conceito de “influência” pode ser mais difuso. Em novembro de 2017, um assessor de comunicação de Dallagnol avisou que havia chegado “um pedido da Federação Nacional dos Combustíveis para fazer uma entrevista”, mas acrescentou que a publicação era pequena: “Não tem repercussão, seria mais para “ganhar ? ? pontos com o pessoal do setor, se interessar.” Dallagnol respondeu: “to na dúvida se vale a pena falar algo”, e continuou: “É que fiz palestra pra eles. Eles mandaram uma lista enorme de perguntas. Pedi pra mandarem 3 ou 4 que respondo rs”. A entrevista, aparentemente, não aconteceu.

    Após a palestra secreta na XP Investimentos, seu contato com a empresa, Débora Santos, enviou uma série de perguntas em off para Dallagnol, aproveitando o relacionamento estreitado no encontro. “Olá, Deltan. Uma ajuda. Em off total, como vc avalia a decisão do Supremo de proibir as conduções coercitivas?”, perguntou Santos em 14 de junho de 2018. Deltan respondeu, cauteloso: “postei no tt de madrugada até… atacando pilares da LJ… como Fachin colocou, esse papo de garantias individuais é um discurso pra proteger oligarquias. Coisa de capitalismo de compadrio”. Em fevereiro de 2019, a contratante fez uma outra pergunta no Telegram: “Oi Deltan. Tudo bom. Em off, quais as impressões de vcs sobre o novo juiz da LJ? Pode embarreirar os trabalhos? Vcs já se conheciam?” A XP parecia querer cobrar a conta, buscando acesso privilegiado junto ao procurador. Dallagnol, desta vez, não respondeu.

    No mesmo documento em que anotara, anos atrás, os valores de palestras cobrados por figurões da República, Dallagnol mapeou os “próximos passos” de sua carreira de palestrante e escreveu uma nota para si mesmo. Ele registrou: “Acho que onde eu posso agregar hoje é treinamento em setor de compliance e eventualmente ética empresarial, mas precisaria estudar mais ética… complicado.” O estudo não teria feito mal.

    Ilustração: João Brizzi e Rodrigo Bento/The Intercept Brasil; Marcos Bizzotto/AGIF via AP
  • OAB requer admissão no inquérito da Operação Spoofing e pede medida cautelar para impedir destruição de provas

    OAB requer admissão no inquérito da Operação Spoofing e pede medida cautelar para impedir destruição de provas

    Comunicado da OAB, nesta sexta-feira, após Sérgio Moro dizer a autoridades que os diálogos encontrados com os supostos hackers seriam destruídos.
    sexta-feira, 26 de julho de 2019 às 18h10

    O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil requereu hoje (26), ao juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª. Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Distrito Federal, sua admissão como assistente no inquérito da Operação Spoofing, instalado para apurar os ataques nas contas de Telegram de diversas autoridades. O objetivo, segundo a Ordem, é “postular a adoção de todas as medidas necessárias para a proteção da cadeia de custódia das informações e para garantia de amplo acesso dos advogados aos elementos e prova”.

    Na petição, a OAB também requer que “sejam expedidas ordens judiciais para que as autoridades policiais, o Exmo. Ministro da Justiça e os demais interessados nas investigações se abstenham da tomada de quaisquer medidas que possam levar ao comprometimento da integridade do material probatório coligido na Operação Spoofing.”

    Nas justificativas, a Ordem lembra que o Ministro da Justiça Sérgio Moro teria informado a autoridades também atingidas pela invasão que o material capturado pelo suposto grupo de hackers seria destruído, sob argumento de preservação da identidade das vítimas – fato que teria sido confirmado pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro João Otávio Noronha, como amplamente divulgado pela imprensa. E aponta a impropriedade de tal intromissão:

    “Qualquer intromissão do Ministro da Justiça é manifestamente imprópria diante da exclusiva competência do Poder Judiciário para decidir sobre o destino dos materiais coletados, mormente em procedimento investigativo que corre em segredo de justiça. É certo que, se o inquérito é mantido sob sigilo, não cabe ao Ministro da Justiça ter acesso aos dados, quanto menos interferir na sua utilização e destino.

    Por fim, a indicação do Ministro da Justiça de destruição dos elementos de prova também parece atentar contra a competência do Supremo Tribunal Federal, que pode eventualmente ser chamado a apreciar os fatos, uma vez que há possíveis autoridades atingidas pela invasão sujeitas a prerrogativa de foro, como no caso de ministro do Superior Tribunal de Justiça.

    Trata-se, portanto, de inaceitável intromissão de órgão do Poder Executivo na esfera de competência do Poder Judiciário, em direta afronta à administração da justiça e ao pleno exercício do direito de defesa. Não é demais lembrar que a preservação da autoridade do Poder Judiciário constitui exigência do postulado do Estado de Direito, que não sobrevive sem a garantia de independência e autonomia judicial no exercício de suas funções precípuas.”

  • ‘ISSO É UM PEPINO PRA MIM’: Deltan Dallagnol deu palestra remunerada para empresa investigada na Lava Jato

    ‘ISSO É UM PEPINO PRA MIM’: Deltan Dallagnol deu palestra remunerada para empresa investigada na Lava Jato

    DA INTERCEPT BRASIL

    Ilustração: João Brizzi e Rodrigo Bento/The Intercept Brasil; Marcos Bizzotto/AGIF via AP

    Em colaboração com

    Parte 12

    Coordenador da operação também fez aproximação entre representantes da firma e procuradores para emplacar produto da companhia em trabalhos da força-tarefa.

    1. O procurador Deltan Dallagnol foi pago para dar uma palestra para uma empresa investigada por corrupção pela Lava Jato, operação que ele comanda em Curitiba. Dallagnol recebeu R$ 33 mil da Neoway, uma companhia de tecnologia, quando ela já estava citada numa delação que tem como personagem central Cândido Vaccarezza, ex-líder de governos petistas na Câmara que foi preso em 2017, e em negociatas na BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras privatizada na terça-feira.

    Não ficou só na palestra, realizada em março de 2018. Deltan também aproximou a Neoway de outros procuradores com a intenção de comprar produtos para uso da Lava Jato. Ele chegou a gravar um vídeo para a empresa, enaltecendo o uso de produtos de tecnologia em investigações – a Neoway vende softwares de análise de dados.

    Cópia do recibo entregue por Deltan Dallagnol à Neoway pelo pagamento da palestra.

    Quando finalmente percebeu que havia recebido dinheiro e feito propaganda grátis para uma empresa investigada pela operação que comanda no Paraná, o procurador confessou a colegas: “Isso é um pepino para mim”. Mas só escreveu à corregedoria do Ministério Público Federal para prestar “informações sobre declaração de suspeição por motivo de foro íntimo” quase um ano depois, quando o processo foi desmembrado no STF e uma parte foi remetida à Lava Jato de Curitiba.

    Os diálogos fazem parte de um pacote de mensagens que o Interceptcomeçou a revelar em 9 de junho na série #VazaJato. Os arquivos reúnem chats, fotos, áudios e documentos de procuradores da Lava Jato compartilhados em vários grupos e chats privados do aplicativo Telegram. A declaração conjunta dos editores do The Intercept e do Intercept Brasil (clique para ler o texto completo) explica os critérios editoriais usados para publicar esses materiais.

    ‘PODEMOS IR PRA CIMA EM CWB?’

    Legenda.

    Foto: Suamy Beydoun/AGIF (via AP)

    A PRIMEIRA CITAÇÃO à Neoway nos chats secretos da Lava Jato aconteceu dois anos antes da palestra de Deltan, em 22 de março de 2016, em um grupo no Telegram chamado Acordo Jorge Luz. O grupo fora criado para que os procuradores da Lava Jato discutissem os termos de delação de Jorge Antonio da Silva Luz, um operador do MDB que tentava negociar uma delação com a força-tarefa. Dallagnol participava ativamente do grupo.

    Naquele dia, o procurador Paulo Galvão mandou um documento que trazia a primeira versão do que viria a ser o depoimento de Luz sobre diversas empresas, entre elas a Neoway. No documento, o candidato a delator narrava: “Lembro-me ainda de um projeto de tecnologia para Petrobras com a empresa Neoway que recorri ao VanderVaccarezza para me ajudarem agendando uma reunião na BR Distribuidora. Houve esta reunião e recebi valores por esta apresentação e destas repassei parte para eles. Posteriormente a tecnologia foi contratada sem minha interferência ou dos deputados”.

    Deltan já estava no grupo quando os documentos foram enviados. Foi ele quem enviou os primeiros depoimentos prestados por Luz, que haviam sido rejeitados anteriormente e ajudariam a embasar uma nova rodada de negociações.

    O coordenador da Lava Jato voltou a se manifestar no chat em 6 de julho de 2016. “Caros, confirmam que negociações com Luz foram encerradas? Se é isso mesmo, alguém disse para o Luz que as negociações foram encerradas? Isso precisa ficar bem claro com os advs antes de retomarmos ações. Podemos ir pra cima em CWB?”, disse.

    Meses depois, em 24 de abril de 2017, no mesmo grupo do Telegram, Galvão enviou um novo documento, que continha novas delações da proposta de colaboração do lobista. O arquivo, intitulado “Novos anexos e complementações.docx”, segundo os metadadosfoi escrito pelos advogados de Luz. O documento trazia detalhes inéditos sobre negócios envolvendo a Neoway em um esquema de corrupção.

    Neles, Jorge Luz afirmava: “Paguei ao Vaccarezza para arrumar o negócio. Não me recordo o ano, mas será fácil verificar pela conferência de dados financeiros acessíveis a época que checarmos nossa contabilidade, uma vez que tudo relativo a Neoway foi feito com contratos executados no Brasil por empresas brasileiras, mas creio que seja por volta do ano de 2011/2012”.

    Em abril de 2019, o ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin determinou que os trechos da delação de Luz relativos à Neoway dessem origem a um processo específico na corte superior. Ele está sob sigilo, mas estava anexado às conversas obtidas pelo Intercept e pode ser lido aqui.

    Trecho da proposta de delação premiada do lobista Jorge Luz

    ‘ISSO É UM PEPINO PRA MIM’

    Aparentemente, Deltan e seus colegas de Curitiba se esqueceram da investigação sobre a Neoway quando, em 5 de março de 2018, o chefe da força-tarefa foi contratado para fazer a palestra para a empresa e comemorou enviando uma mensagem no grupo Incendiários ROJ, que reunia procuradores da Lava Jato. O procurador demonstrou entusiasmo e mencionou o dono da firma, Jaime de Paula – que também é citado pelo delator Jorge Luz.

    “Olhem que legal. Sexta vou dar palestra para a Neoway, do Jaime de Paula. Vejam a história dele: https://endeavor.org.br/empreendedores-endeavor/jaime-de-paula/. A neoway é empresa de soluções de big data que atende 500 grandes empresas, incluindo grandes bancos etc.”

    O procurador da República Júlio Noronha, também integrante da Lava Jato, então sugeriu que Deltan buscasse marcar uma reunião com o dono da Neoway para tratar de produtos para um projeto da Procuradoria chamado de Laboratório de Investigação Anticorrupção, o LInA. “Top Delta!!! De repente, se conseguir um espaço para conversarmos com ele e tentarmos algo para trazer uma solução para agregar ao LInA, seria massa tb!”, disse Noronha.

    Deltan concordou e afirmou que iria procurar agradar o empresário. “Exatamente. Isso em que estava no meu plano. Vou até citar ele na palestra pra ver se sensibilizo kkkk”.

    Deltan descobriu que a Neoway era investigada em julho de 2018. Mas só avisou a corregedoria em junho de 2019.

    Quatro dias depois, Deltan fez a palestra para a Neoway num evento chamado Data Driven Business, realizado no Costão do Santinho, um badalado – e caro – resort em Florianópolis. A estratégia traçada por ele funcionou: no fim daquela mesma noite, ele procurou os colegas noutro grupo, chamado LInA – Coordenação, para marcar a reunião com os representantes da empresa. “Caros podem receber a Neoway de bigdata na segunda para apresentar os produtos???? Ou quarta?”

    O procurador afirmou que a companhia cogitava fornecer produtos gratuitamente. “Como fiz um contato bom aqui valeria estar junto. Eles estão considerando fazer de graça. O MP-MG está contratando com inexigibilidade”.

    Houve impasse quanto à data da reunião, e Deltan disse que eles deveriam ser rápidos para não perder a oportunidade. “Minha única preocupação é perdermos o timing da boa vontade deles rs. Mas entendo. Marcamos dia 20 então?” Noronha concordou e emendou: “Kkkk a gente ganha eles de novo qdo encontrarmos!”

    Os diálogos e documentos analisados pelo Intercept e pela Folha de S.Paulo indicam que a reunião foi realizada, e a ideia de integrar a Neoway ao projeto de sistema de dados da Procuradoria ganhou força internamente.

    Foi só quatro meses após ter vendido sua palestra para a Neoway – e já em meio às negociações para a aquisição de produtos da empresa – que Deltan abriu o Telegram e disse aos procuradores que havia descoberto a citação à empresa na colaboração premiada do lobista Jorge Luz apenas naquele momento. “Isso é um pepino pra mim”, afirmou, então. Era 21 de julho de 2018.

    Apesar disso, foi só em 4 de junho de 2019 – quase 11 meses depois – que Dallagnol enviou um ofício ao corregedor do Ministério Público Federal, Oswaldo José Barbosa Silva. Nele, confessava que em 3 de março de 2018 (ou seja, havia um ano e três meses) “participei de congresso anual da empresa Neoway, que oferece solucções de bancos de dados e softwares, inclusive para fins de compliance e investigações internas, realizando palestra remunerada por valor de mercado, sobre combate à corrupção e ética nos negócios”.

    “Na data da palestra, a empresa não era investigada no âmbito desta força-tarefa da Lava Jato e eu desconhecia que a empresa seria mencionada no futuro em colaboração premiada a qual seria firmada pela procuradoria-geral da República, em Brasília. No sistema que contém informações sobre delações da Lava Jato e em sua base de dados, não constava qualquer menção à existência de delação ou investigação sobre a empresa que pudesse indicar a existência de potencial conflito de interesses”, prosseguiu Deltan.

    Mas a Neoway já havia aparecido em documentos oficiais em duas ocasiões. A primeira vez foi no rascunho da proposta de delação de Luz, cujo documento foi criado em março de 2016, de acordo com os metadados. A segunda noutro documento, criado em abril de 2017, que continha novos depoimentos do lobista. Ambos foram enviados ao grupo de Telegram do qual Dallagnol fazia parte. Além disso, convenientemente o procurador deixou de mencionar ao corregedor que nos grupos de Telegram, que não eram uma ferramenta oficial do MPF, ela apareceu pela primeira vez em 22 de março de 2016 – ou seja, quase dois anos antes da palestra. Há ainda outro intervalo de tempo que vale a pena notarmos: Deltan enviou sua confissão voluntária à corregedoria apenas cinco dias antes do Intercept começar a publicar as reportagens sobre os chats da Lava Jato no Telegram, em 9 de junho passado. Na declaração editorialpublicada naquele mesmo dia, dissemos que trabalhávamos com o material havia diversas semanas.

    21 de julho de 2018 – Chat privado

    Deltan Dallagnol – 11:04:20 –  Qto isso é ruim? Legalmente não vejo qualquer problema, mas já estou sofrendo por antecipação com as críticas.
    Dallagnol – 11:04:20 –  Dando uma passada de olhos nos anexos do Luz, vejam o que achei
    Dallagnol – 11:04:20 –  (pdf ou link perdido)
    Dallagnol – 11:04:20 –  Empresa de TI que veio apresentar produtos de TI para LJ
    Dallagnol – 11:04:20 –  Isso é um pepino pra mim. É uma brecha que pode ser usada para me atacar (e a LJ), porque dei palestra remunerada para a Neoway, que vende tecnologia para compliance e due diligence, jamais imaginando que poderia aparecer ou estaria em alguma delação sendo negociada. Quero conversar com Vcs na segunda para ver o que fazer, acho que é o caso de me declarar suspeito e não sei até que ponto isso afeta o trabalho de todos (prov tem que ser redistribuído para colega da PRPR e dai designar todos menos eu para assinar). Pensando rapidamente o que provavelmente poderia fazer
    ou informar: -Não tinha conhecimento, não participei da negociação -assim que tomei, me declarei suspeito e me afastei -a palestra remunerada é autorizada pelo CNMP e se deu em contexto de mercado (lançamento de produto de compliance) e por valor de mercado -já recusei palestra por conflito de interesses, mas nesse caso não foi identificado -como voltará à baila a questão das palestras, a maior parte das palestras é gratuita e grande parte do valor é doado

     

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    GIF: Reprodução/YouTube

    ‘DELTA NAO QUER. . . PROBLEMA DA NEOWAY’

    Em agosto de 2018, os procuradores iniciaram a conversa sobre quem iria trabalhar nos casos relativos a Jorge Luz e a Neoway voltou à tona quando o procurador Paulo Galvão indagou aos colegas: “vcs nao preferem ficar de fora do luz [processos de Jorge Luz]?”

    Laura Tessler, então, sugeriu que todos os procuradores da equipe entrassem no caso, mas Galvão lembrou do episódio da palestra de Deltan. “Delta nao quer… problema da neoway, laurinha”, disse Galvão à colega.

    Em seguida, Deltan mostrou estar incomodado com a situação. “Quero distância rs Acho que Robito e Júlio tb não queriam”, postou o procurador. Por fim, a procuradora Jerusa Viecili indicou os nomes de apenas sete procuradores para trabalhar nos processos de Luz e arrematou: “Melhor deixar fora quem teve contato com a neoway”.

    O vídeo gravado por Deltan à pedido da Neoway no evento da empresa em março de 2018 – no qual o procurador discorreu sobre a importância do uso de sistemas de dados em investigações – também gerou debate nos chats.

    “A tecnologia é essencial para nós podermos avançar contra a corrupção em investigações como a Lava Jato, por exemplo. Hoje, nós lidamos com uma imensa massa de dados, uma imensa massa de dados em investigações, uma imensa massa de dados que podem ser usados para avaliar potenciais fornecedores ou clientes, e fazer due diligence. Isso nos faz precisar, se nós queremos investigar melhor, tanto no âmbito público como no privado, a usar sistemas de big data”, disse Deltan no vídeo.

    Na semana seguinte ao evento, ele recebeu a gravação feita pela empresa e pediu que um assessor de imprensa da Procuradoria avaliasse sua fala. A ele, o procurador se disse preocupado em parecer um garoto-propaganda da Neoway, apesar de não ter citado a empresa expressamente no vídeo.

    “Fiquei um pouco preocupado porque ficou parecendo que estou vendendo os produtos deles rsrsrs, mas não foi proposital. Dei respostas sinceras às perguntas, mas encaixa perfeitamente com o que eles vendem, que é sistemas de big data rs”, disse Deltan. O assessor da Procuradoria não fez críticas ao conteúdo do vídeo, publicado na página da Neoway no Youtube.

    OUTRO LADO

    Segundo os artigos 104 e 258 do Código de Processo Penal e o artigo 145 do Código de Processo Civil, procuradores, assim como os juízes, devem se declarar suspeitos e se afastar de processos em que sua atuação pode ser questionada – como ter tido contrato de trabalho ou relação de parentesco com alguma das partes. A declaração de suspeição deve ser registrada no processo.

    Como o inquérito 5028472-59.2019.4.04.7000, que envolve o caso da Neoway em Curitiba, é sigiloso, não foi possível apurar se Deltan e outros procuradores de fato registraram suas suspeições no caso.

    Deltan Dallagnol pediu um prazo adicional de 24 horas para responder aos fatos apresentados nesta reportagem – ela estava programada para ser publicada ontem, quinta-feira –, se comprometendo a falar com os repórteres. Nós aceitamos o pedido dele. Em seguida, ele mudou de ideia e se recusou a conversar com os profissionais do Intercept, aceitando apenas responder às perguntas da Folha. A declaração a seguir, assim, foi feita ao repórter Flávio Ferreira.

    “Não reconheço a autenticidade e a integridade dessas mensagens, mas o que posso afirmar, e é fato, é que eu participava de centenas de grupos de mensagens, assim como estou incluído em mais [de] mil processos da Lava Jato. Esse fato não me faz conhecer o teor de cada um desses processos. Se, por acaso, por hipótese, eu tivesse feito parte [do grupo no qual a Neoway apareceu em documentos], certamente não tomei conhecimento. Se soubesse não teria feito, e, sabendo, me afastei”, disse.

    Nós também procuramos a Neoway. Em nota, a empresa confirmou que presta serviços para a BR Distribuidora. Os contratos foram firmados em janeiro de 2012, novembro de 2014, março de 2017 e março de 2019 – este último ainda está vigente, com duração até março de 2020, no valor de R$ 3.385.140, e foi fechado com inexigibilidade de licitação.

    Ainda em nota, a Neoway diz que a contratação de Dallagnol para a palestra realizada em março de 2018 “foi remunerada em valores compatíveis com o mercado para atividades dessa natureza, com total observância às leis”. A empresa também informa que não prestou serviços para o projeto LInA, do MPF, e para o MP-MG, e “desconhece a menção a seu nome em depoimentos de terceiros”.

    A defesa do ex-deputado Cândido Vaccarezza informou que Jorge Luz mente a seu respeito, e que ele “nunca sugeriu, pediu, aceitou, recebeu ou autorizou quem quer que seja a receber em seu nome vantagem, pagamento, benefício ou dinheiro de forma ilícita”. Vander Loubet disse que “desconhece os termos” em que foi citado e que “suas relações sempre foram institucionais”.

    A defesa de Jorge e Bruno Luz “assevera que seus clientes estão à disposição das autoridades públicas para prestar todos os esclarecimentos, no momento oportuno e nos autos dos eventuais processos”.

  • Deltan Dallagnol sugeriu, em chats privados, que Moro protegeria Flávio Bolsonaro para não desagradar  ao presidente

    Deltan Dallagnol sugeriu, em chats privados, que Moro protegeria Flávio Bolsonaro para não desagradar ao presidente

    Via The Intercept Brasil

    Novos vazamentos revelam que Dallagnol e procuradores achavam que Sérgio Moro poderia tentar proteger o Senador Flávio Bolsonaro, nas investigações do caso Queiroz e as movimentações atípicas de dinheiro em sua conta.

    Leia a matéria completa: https://theintercept.com/2019/07/21/deltan-dallagnol-sergio-moro-flavio-bolsonaro-queiroz/

     

    8 de dezembro de 2018 – grupo Filhos do Januario 3

    Deltan Dallagnol – 00:56:50 –https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2018/12/07/bolsonaro-diz-que-ex-assessor-tinha-divida-com-ele-e-pagou-a-primeira-dama.htm
    Dallagnol – 00:58:15 – [imagem não encontrada]
    Dallagnol – 00:58:15 – [imagem não encontrada]
    Dallagnol – 00:58:38 – COAF com Moro
    Dallagnol – 00:58:40 – Aiaiai
    Julio Noronha – 00:59:34 – 
    Dallagnol – 01:04:40 – [imagem não encontrada]
    Januário Paludo – 07:01:20 – Isso lembr
    Paludo – 07:01:48 – Lembra algo Deltan?
    Paludo – 07:03:08 – Aiaiai
    Jerusa Viecilli – 07:05:24 – Falo nada … Só observo 
    Dallagnol – 08:47:52 – Kkk
    Dallagnol – 08:52:01 – É óbvio o q aconteceu… E agora, José?
    Dallagnol – 08:53:37 – Moro deve aguardar a apuração e ver quem será implicado. Filho certamente. O problema é: o pai vai deixar? Ou pior, e se o pai estiver implicado, o que pode indicar o rolo dos empréstimos?
    Dallagnol – 08:54:21 – Seja como for, presidente não vai afastar o filho. E se isso tudo acontecer antes de aparecer vaga no supremo?
    Dallagnol – 08:58:11 – Agora, Bolso terá algum interesse em aparelhar a PGR, embora o Flávio tenha foro no TJRJ. Última saída seria dar um ministério e blindar ele na PGR. Pra isso, teria que achar um colega bem trampa
    Athayde Ribeiro Costa – 08:59:41 – É so copiar e colar a ultima denuncia do Geddel
    Roberson Pozzobon – 09:02:52 – Acho que Moro já devia contar com a possibilidade de que algo do gênero acontecesse
    Pozzobon – 09:03:19 – A questão é quanto ele estará disposto a ficar no cargo com isso ou se mais disso vir
    Dallagnol – 09:04:38 – Em entrevistas, certamente vão me perguntar sobre isso. Não vejo como desviar da pergunta, mas posso ir até diferentes graus de profundidade. 1) é algo que precisa ser investigado; 2) tem toda a cara de esquema de devolução de parte dos salários como o da Aline Correa que denunciamos ou, pior até, de fantasmas.
    Dallagnol – 09:05:54 – Agora, o quanto ele vai bancar a pauta Moro Anticorrupcao se o filho dele vai sentir a pauta na pele?
    Andrey Borges de Mendonça – 09:21:16 – Uma vez pedi no caso da custo brasil e o pt alegou q era impenhorável segundo a lei eleitoral. O juiz acabou desbloqueando sem ouvir a gente. Mas confesso q nao sei se procede.
    Paludo – 09:37:52 – Tem que investigar. E isso que ele sempre diz. Na pior das hipóteses, Podem ir os anéis (filho e mulher), mas ficam os dedos. Seria muito traumático o general assumir no lugar dele.
    Viecilli – 10:06:32 – [imagem não encontrada]
    Viecilli – 10:06:51 – 
    Dallagnol – 10:22:31 – Rsrsrs
    Dallagnol – 10:39:47 – [imagem não encontrada]
    Dallagnol – 10:41:04 – [imagem não encontrada]
    Antonio Carlos Welter – 10:52:11 – O $$ termina na conta da esposa. Vao argumentar que alimentou a campanha. Periga terminar em AIME
  • Órgão do MP Federal aponta que investigação não pode se confundir com uma cruzada moral ou ser um instrumento de perseguição

    Órgão do MP Federal aponta que investigação não pode se confundir com uma cruzada moral ou ser um instrumento de perseguição

    Da PFDC/MPF via coletivo transforma MP.

    Órgão do MP Federal se manifesta em nota sobre as denúncias do Intercept sobre ilegalidades atribuídas a Lava Jato.

    PFDC: COMBATE À CORRUPÇÃO DEVE SER COM O RESPEITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL E À LIBERDADE DE IMPRENSA

    “A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal (MPF) responsável pela defesa de direitos humanos, lançou uma nota pública acerca da revelação pela imprensa de diálogos relacionados à Operação Lava Jato. Para a PFDC, a questão reforça a necessidade de compreensão das diversas dimensões dos direitos humanos e de promoção conjunta do enfrentamento à corrupção, do devido processo legal, do direito à informação e da liberdade de imprensa.

    Em seu posicionamento, a Procuradoria aponta que a prevenção e o combate intransigente à corrupção são legítimos quando se articulam com o respeito ao direito dos investigados e acusados de responderem a um processo justo, bem como com a liberdade de manifestação jornalística e de garantia do direito coletivo de receber e buscar informação.

    Ao analisar o quadro normativo que incide sobre esse cenário, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão destaca que a corrupção é um grave obstáculo para a afirmação do Estado Democrático de Direito. “Ela reduz a capacidade dos governos de prover serviços fundamentais, amplia desigualdades e injustiças e compromete a legitimidade de instituições e processos democráticos”.

    O órgão do Ministério Público Federal ressalta que tanto países ricos quanto pobres sofrem com a corrupção e seus efeitos, nas esferas públicas e privadas, independentemente de seus sistemas políticos ou econômicos e do grau de desenvolvimento. Porém, são sempre as populações mais desfavorecidas e menos representadas nos espaços democráticos que suportam o maior ônus. “Em sociedades extremamente desiguais, como a brasileira, a corrupção contamina na raiz o cumprimento do objetivo fundamental, fixado na Constituição, de construir um país livre, justo e solidário”.

    A nota pública esclarece que o enfrentamento à corrupção, como a qualquer outra violação aos direitos humanos, deve respeitar integralmente todos os direitos fundamentais ou humanos fixados na Constituição e no direito internacional. Do contrário, suprimir-se-ia a legitimidade do próprio esforço de combatê-la. “É inadmissível que o Estado, para reprimir um crime, por mais grave que seja, se transforme, ele mesmo, em um agente violador de direitos fundamentais”, ressalta a PFDC.

    Para a Procuradoria, a investigação, acusação e punição de crimes em situação alguma podem se confundir com uma cruzada moral ou se transformar num instrumento de perseguição de qualquer natureza. Nessa perspectiva, um dos elementos essenciais do devido processo legal reside no direito a um julgamento perante juízes competentes, independentes e imparciais, no qual o réu e seus advogados são tratados com igualdade de armas em relação ao acusador. “É, portanto, vedado ao magistrado participar da definição de estratégias da acusação, aconselhar o acusador ou interferir para dificultar ou criar animosidade com a defesa”.

    Em igual sentido se orientam o direito internacional dos direitos humanos e o direito penal internacional, os quais determinam que, em qualquer sistema jurídico-penal, seja acusatório ou inquisitorial, os acusados têm direito a um julgamento justo. “No caso brasileiro, tomando em consideração que a Constituição de 1988 adotou o sistema acusatório como estrutural do sistema penal, um julgamento justo somente ocorrerá quando estritamente observada a separação do papel do Estado-acusador (Ministério Público) em relação ao Estado-julgador (juiz ou tribunal). Portanto, o réu tem direito a ser processado e julgado por juízes neutros e equidistantes das partes. O processo no qual juízes, mesmo sem dolo, ajam, direta ou indiretamente, na promoção do interesse de uma das partes em detrimento da outra estará comprometido”.

    Devido processo legal – Na nota pública, a Procuradoria aponta que a dinâmica de processos complexos muitas vezes culmina em conversas, fora dos autos, entre o juiz, os advogados das partes e os membros do Ministério Público. “Embora seja aconselhável que esses diálogos ocorram com a presença da parte adversa, não se pode rotular de ilícita essa espécie de contato. A prática está arraigada no Judiciário brasileiro e, inclusive, foi definida como um direito da parte no Estatuto dos Advogados. Seu propósito é permitir que os representantes das partes possam expor suas teses aos magistrados. O magistrado deve escutar o advogado ou membro do Ministério Público, podendo fazer indagações”.

    A PFDC ressalta que não é permitido ao magistrado, porém, emitir juízos prévios sobre a situação concreta e, muito menos, aconselhar as partes, recomendar-lhes iniciativas ou transmitir-lhes informações privilegiadas. De acordo com o órgão, não bastasse a Constituição e os tratados internacionais, o Código de Processo Penal e o Código de Processo Civil definem essas condutas como suspeitas, dando ensejo ao afastamento do juiz do caso e à nulidade dos atos por ele praticados.

    “Essas regras do devido processo legal e do julgamento justo são de observância obrigatória. Não se pode cogitar que o combate à corrupção, ou a qualquer outro crime grave, justifique a tolerância com a quebra desses princípios, a um só tempo de ordem constitucional e internacional. Os custos de uma argumentação em favor de resultados, apesar dos meios utilizados, são demasiado altos para o Estado Democrático de Direito”, destaca a PFDC.

    Liberdade de imprensa – Em seu posicionamento, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão aponta que a liberdade de expressão e o direito de acessar, buscar e receber informação são alicerces da democracia – dada a sua importância para a concretização da liberdade de opinião e de manifestação do pensamento, a transparência pública e a organização social.Para a PFDC, esses direitos se fortalecem com a liberdade de informação jornalística ou liberdade de imprensa, ferramenta indispensável para a projeção coletiva e difusa da informação e da manifestação.

    O documento relembra que o Supremo Tribunal Federal, ao interpretar a Constituição brasileira na matéria, decidiu que a liberdade de imprensa não pode ser constrangida por censura em nenhuma hipótese e, apenas por via reparatória, posteriormente à publicação, a responsabilidade do meio de imprensa poderá ser sancionada.. Assim, não é possível censura prévia a qualquer publicação jornalística, ainda que ela incorra em ilegalidades ou abusos, inclusive no que diz respeito ao direito de privacidade.

    O órgão do MPF aponta que a ilegalidade na obtenção das mensagens também não obstrui o direito de publicação. “Eventual responsabilidade pela invasão indevida de privacidade deve ser investigada de modo autônomo e, se comprovada, sancionada, sem, contudo, interferir na liberdade de publicação dos conteúdos”. De acordo com a PFDC, a vedação constitucional à censura e o regime de proteção à liberdade de informação tornam ilícita qualquer tentativa de represália aos meios de comunicação que participam das publicações. Nesse sentido, iniciativas desse tipo podem, inclusive, ser consideradas crime de responsabilidade e improbidade administrativa.

    A nota ressalta, ainda, que o Estado deve informar se pende alguma investigação em face de jornalistas ou meios de comunicação que estejam envolvidos com a publicação de informações jornalísticas de potencial desagrado de autoridades – de modo a assegurar a garantia da transparência e da liberdade de imprensa.”

     

  • Deltan Dallagnol se vale das arbitrariedades da Lava Jato e da prisão injusta de Lula para enriquecer

    Deltan Dallagnol se vale das arbitrariedades da Lava Jato e da prisão injusta de Lula para enriquecer

    Informação da coluna de Mônica Bergamo publicada  em agosto do ano passado aponta que “em 2016, o procurador recebeu R$ 219 mil por 12 palestras numa média de R$ 18 mil por evento” e que cobrava “R$ 35 mil por palestra”.

    Segundo a matéria, Chats privados mostram que procurador debateu com colega a criação de empresa no nome de familiares.Isto era para que ele pudesse ser sócio oculto? Neste caso, não seria o mesmo procedimento usado pelo senador cassado Demóstenes Torres  que foi acusado a época de ser sócio oculto da Delta?A lei é realmente para todos?

    Veja a integra da matéria:

    Ilustração: João Brizzi e Rodrigo Bento/The Intercept Brasil; Suamy Beydoun/AGIF (via AP)

    Em parceria com

    O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato, montou um plano de negócios para lucrar com eventos e palestras na esteira da fama e dos contatos conseguidos durante a operação, mostram mensagens obtidas pelo Intercept e analisadas em conjunto com a equipe da Folha de S.Paulo.

    Em um chat sobre o tema criado no fim de 2018, Dallagnol e um colega da Lava Jato discutiram a constituição de uma empresa na qual eles não apareceriam formalmente como sócios, para evitar questionamentos legais e críticas. A ideia era usar familiares.

    Os procuradores também cogitaram a criação de um instituto sem fins lucrativos para pagar altos cachês a eles mesmos, além de uma parceria com uma firma organizadora de formaturas para alavancar os ganhos do projeto.

    A lei não proíbe que procuradores sejam sócios, investidores ou acionistas, desde que não tenham poderes de administração ou gestão da empresa. Os chats examinados pela Folha e pelo Intercept indicam que Dallagnol ocupou os serviços de duas funcionárias da Procuradoria em Curitiba para organizar sua atividade pessoal de palestrante no decorrer da Lava Jato.

    As conversas mostram ainda que o procurador incentivava outras autoridades ligadas ao caso a realizar palestras remuneradas, entre eles o ex-juiz e atual ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot e outros procuradores que atuaram no escândalo de corrupção.

    Pouco antes do primeiro aniversário da Lava Jato, em fevereiro de 2015, a dedicação de Dallagnol ao trabalho de palestrante já gerava descontentamento entre os colegas da Procuradoria em Curitiba. Em um chat com o procurador Carlos Fernando Santos Lima, no aplicativo Telegram, Dallagnol buscou justificar sua atividade, dizendo que ela compensava um prejuízo financeiro decorrente da Lava Jato.

    ‘Estou a favor de maior autonomia, mas não me encham o saco, pra usar sua expressão, a respeito de como uso meu tempo’

    Estou a favor de maior autonomia, mas não me encham o saco, pra usar sua expressão, a respeito de como uso meu tempo. To me ferrando de trabalhar e ta parecendo a fábula do velho, do menino e do burro. Uns acham que devo atender menos a SECOM, outros que é importante. Uns acham que devo acompanhar cada um, outros acham que os grupos devem ter mais liberdade. E chega de reclamar dos meus cursos ou viagens. Evito dormir nos voos pra render. To até agora resolvendo e-mails etc”, desabafou Dallagnol.

    “Essas viagens são o que compensa a perda financeira do caso, pq fora eu fazia itinerancias e agora faria substituições. Enfim, acho bem justo e se reclamar quero discutir isso porque acho errado reclamar disso”, continuou Dallagnol no mesmo chat.

    Dallagnol se refere a dois tipos de trabalho no Ministério Público que podem engordar o contracheque. A itinerância é quando um procurador substitui as funções de outro, geralmente em outras cidades, com recebimento de diárias. Como integrante de uma força-tarefa que exige dedicação exclusiva, ele foi impedido de ocupar posições fora de Curitiba. Já no caso das substituições, o membro do MP assume o cargo de outro – como alguma função de chefia –, mas de forma mais modesta.

    “Acho que o crescimento é via de mão dupla. Não estamos em 100 metros livres. Esse caso já virou maratona. Devemos ter bom senso e respeitar o bom senso alheio”, completou o procurador.

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    Em julho de 2015, Dallagnol dá palestra sobre projeto de lei anticorrupção em igreja Batista no Rio de Janeiro.

    Foto: Ricardo Borges/Folhapress

    ‘VAMOS ORGANIZAR CONGRESSOS E EVENTOS E LUCRAR, OK?’

    A IDEIA DE CRIAR uma empresa de eventos para aproveitar a repercussão da Lava Jato foi manifestada por Dallagnol nos chats em dezembro passado. “Vamos organizar congressos e eventos e lucrar, ok? É um bom jeito de aproveitar nosso networking e visibilidade”, afirmou em conversa com a esposa. No mesmo mês, o procurador e seu colega na força-tarefa da Lava Jato Roberson Pozzobon criaram um chat específico para discutir o tema, com a participação das mulheres de ambos.

    “Antes de darmos passos para abrir empresa, teríamos que ter um plano de negócios e ter claras as expectativas em relação a cada um. Para ter plano de negócios, seria bom ver os últimos eventos e preço”, afirmou Dallagnol no chat.

    Pozzobon respondeu: “Temos que ver se o evento que vale mais a pena é: i) Mais gente, mais barato ii) Menos gente, mais caro. E um formato não exclui o outro”.

    Após a troca de várias mensagens sobre formatos do negócio, em 14 de fevereiro deste ano Dallagnol propôs que a empresa fosse aberta em nome das esposas, e que a organização dos eventos ficasse a cargo da firma Star Palestras e Eventos.

    14 de fevereiro de 2019 – chat Empresas palestras

    Deltan Dallagnol – 21:41:10 – Caros, se formos tocar nós mesmos, não vai funcionar. E se eu passar pra SUPRIMIDO da Star organizar isso e combinar que dividiremos os lucros? Se tivermos a empresa em nome de SUPRIMIDO e SUPRIMIDO, jogamos pra ela organizar tudo e dividimos por 3 o resultado, sendo 1/3 pra SUPRIMIDO da Star. Estão de acordo?
    Dallagnol – 21:42:03 – Se estiverem de acordo passo pra ela a ideia e começamos fazendo na Unicuritiba e talvez 1 em SP inserindo um professor como SUPRIMIDO, e enquanto isso as meninas abrem a empresa.
    Roberson Pozzobon – 21:42:13 – Gostei da ideia, Delta!

     

    Dallagnol detalhou então como seria a organização formal da empresa. “Só vamos ter que separar as tratativas de coordenação pedagógica do curso que podem ser minhas e do Robito e as tratativas gerenciais que precisam ser de Vcs duas, por questão legal”.

    Em seguida, o procurador alertou para a possibilidade de a estratégia levantar suspeitas. “É bem possível que um dia ela seja ouvida sobre isso pra nos pegarem por gerenciarmos empresa”.

    ‘Se fizéssemos algo sem fins lucrativos e pagássemos valores altos de palestras pra nós, escaparíamos das críticas’

    Roberson então comentou, em tom jocoso: “Se chegarem nesse grau de verificação é pq o negócio ficou lucrativo mesmo rsrsrs. Que veeeenham”.

    No dia seguinte, Dallagnol levou para o grupo a sugestão de também estabelecer uma parceria com uma empresa de eventos e formaturas de um tio dele.

    Eles podem oferecer comissão pra aluno da comissão de formatura pelo número de vendas de ingressos que ele fizer. Isso alavancaria total o negócio. E nós faríamos contatos com os palestrantes pra convidar. Eles cuidariam de preparação e promoção, nós do conteúdo pedagógico e dividiríamos os lucros”, afirmou Dallagnol.

    No último dia 3 de março, Dallagnol postou no chat detalhes sobre um evento organizado por uma entidade que se apresentava como um instituto. Ele comentou que esse formato jurídico também poderia servir para evitar questionamentos jurídicos e a repercussão negativa quanto à atividade deles.

    “Deu o nome de instituto, que dá uma ideia de conhecimento… não me surpreenderia se não tiver fins lucrativos e pagar seu administrador via valor da palestra. Se fizéssemos algo sem fins lucrativos e pagássemos valores altos de palestras pra nós, escaparíamos das críticas, mas teria que ver o quanto perderíamos em termos monetários”.

    Dallagnol durante coletiva da Força Tarefa da Lava Jato que denunciou formalmente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2016.

    Dallagnol durante coletiva da Força Tarefa da Lava Jato que denunciou formalmente o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2016.

    Foto: Rodolfo Buhrer/La Imagem/Fotoarena/Folhapress

    ‘400K’

    OS DIÁLOGOS ANALISADOS pela Folha e pelo Intercept fazem parte de um pacote de mensagens que o site começou a revelar no último dia 9 de junho. O material reúne conversas mantidas pelos procuradores da Lava Jato em vários grupos do aplicativo Telegram desde 2014.

    O vazamento das mensagens expôs a proximidade entre Moro e a força-tarefa e pôs em dúvida sua imparcialidade como juiz na condução dos processos da Lava Jato, obrigando-o a ir até comissões do Senado e da Câmara dos Deputados para se explicar.

    As conversas no Telegram também mostram a intenção de Deltan e Pozzobon de tocar o projeto mesmo sem que a empresa de eventos e palestras estivesse formalizada.

    “Podemos tentar alguma coisa agora em maio tvz. Ou fim de abril. Nem que o primeiro evento a empresa não esteja 100% fechada”, afirmou Pozzobon.

    A reportagem pesquisou registros na Junta Comercial do Paraná e em cartórios de Curitiba, e as buscas indicaram que não ocorreu a constituição de empresa de palestras em nome das mulheres dos procuradores ou de um instituto em nome deles.

    ‘As palestras e aulas já tabeladas neste ano estão dando líquido 232k. Ótimo…’

    Em dezenas de conversas analisadas pela Folha e pelo Intercept, Dallagnol mostrou grande interesse quanto ao valor de cada palestra. Em um dos chats, Dallagnol somou os lucros da atividade apurados em setembro de 2018. “As palestras e aulas já tabeladas neste ano estão dando líquido 232k. Ótimo… 23 aulas/palestras. Dá uma média de 10k limpo”, afirmou.

    No mês seguinte, o procurador manifestou a expectativa para o fechamento de 2018. “Se tudo der certo nas palestras, vai entrar ainda uns 100k limpos até o fim do ano. Total líquido das palestras e livros daria uns 400k. Total de 40 aulas/palestras. Média de 10k limpo”, disse o procurador. Em 2016, Dallagnol havia faturado R$ 219 mil com as palestras.

    Como procurador, o coordenador da força-tarefa recebe um salário bruto de R$ 33.689,11 por mês, conforme o portal de transparência do MPF –  um total que pode superar R$ 430 mil neste ano. Em 2018, ele recebeu cerca de R$ 300 mil em rendimentos líquidos, sem considerar valores de indenizações.

    Há chats que revelam ainda que Dallagnol usou os serviços de duas funcionárias da Procuradoria para organizar sua vida de palestrante. As mensagens contêm pedidos de registro de recibos e contratos relativos aos eventos, além da administração do fluxo de convites que ele recebia.

    18 de agosto de 2016 – chat privado com funcionária da procuradoria

    Deltan Dallagnol – 20:36:38 – Oi SUPRIMIDO, tarefinha pra volta: quanto às palestras pagas, Vc faria o favor de preencher a tabela anexa e me passar os documentos comprobatórios conjuntamente (contrato e comprovantes de depósitos)? Quero controlar conforme forem acontecendo, mas não consigo tempo para fazer o conttrole direitinho

     

    Nas conversas mantidas com autoridades, muitas vezes Dallagnol encorajou os interlocutores a também realizar palestras remuneradas.

    Em abril de 2017, o procurador antecipou um convite ao então juiz responsável pela Lava Jato, Sergio Moro, para participar de um evento em São Paulo, e contou ao atual ministro da Justiça como estava cobrando pela atividade.

    “Caro, o SUPRIMIDO vai te convidar nesta semana pra um curso interessante em agosto. Eles pagam para o palestrante 3 mil. Pedi 5 mil reais para dar aulas lá ou palestra, porque assim compenso um pouco o tempo que a família perde (esses valores menores recebo pra mim… é diferente das palestras pra grandes eventos que pagam cachê alto, caso em que estava doando e agora estou reservando contratualmente para custos decorrentes da Lava Jato ou destinação a entidades anticorrupção – explico melhor depois)…”, escreveu Dallagnol a Moro.

    ‘Vc poderia pedir bem mais se quisesse, evidentemente, e aposto que pagam’

    O procurador completou: “Achei bom te deixar saber para caso queira pedir algo mais, se achar que é o caso (Vc poderia pedir bem mais se quisesse, evidentemente, e aposto que pagam)”.

    A princípio, Moro disse que já estava com a agenda cheia, mas posteriormente aceitou o convite e participou com Dallagnol em agosto de 2017 do 1º Congresso Brasileiro da Escola de Altos Estudos Criminais em São Paulo.

    Em junho do ano passado, o chefe da Lava Jato em Curitiba tentou convencer Rodrigo Janot a participar de um evento em São Paulo. Fazia quase seis meses que eles não se falavam pelo Telegram, segundo o histórico de mensagens. Depois de abordar o evento, ele emendou: “Tava aqui gerenciando msgs e vi que fui direto ao ponto kkkk Tudo bem com Vc? Espero que esteja aproveitando bastante, tomando muita água de coco e dormindo o sono dos justos rs Agora, vou te dizer, Vc faz uma faaaaaaaltaaaaa”.

    “Oi amigo kkkkkk”, respondeu Janot. “Considero sim mas teremos que falar sobre cache . Grato pela lembra”. Dallagnol perguntou se o cachê oficial do ex-chefe era de R$ 30 mil e sinalizou que faculdades normalmente “não pagam esse valor… mas se pedir uns 15k, acho que pagam”.

    Em julho de 2016, Deltan trocou mensagens com a procuradora da República em São Paulo Thaméa Danelon sobre uma operação que ela estava coordenando contra o superfaturamento na aquisição de equipamentos para implante em doentes com Mal de Parkinson.

    Após comentar sobre a melhor forma de divulgar a operação, Dallagnol sugeriu que a procuradora aproveitasse o tema de fraude na área da saúde para montar uma palestra para a empresa de planos de saúde Unimed.

    “Vc podia até fazer palestra sobre esse caso mais tarde em unimeds. Eles fazem palestras remuneradas até”, disse Dallagnol à procuradora – Danelon informou à reportagem que “jamais realizou palestra” para a empresa.

    O mesmo parecer do Conselho Nacional do MP de 2017 que o liberou para seguir dando palestras dizia que só haveria irregularidade se o procurador fosse caracterizado como empresário, assumindo os riscos de lucro ou prejuízo do negócio – exatamente o que ele planejou ao tentar envolver familiares meses depois.

    No início da Lava Jato, Dallagnol declarava que doava a remuneração das palestras para um hospital oncológico de Curitiba. Depois, passou a informar que uma parte dos valores ia para um fundo para cobrir “despesas ou custos decorrentes da atuação de servidores públicos em operações de combate à corrupção”.

    Um recibo de pagamento não assinado que faz parte do lote de arquivos recebidos pelo Intercept indica que Dallagnol recebeu R$ 23 mil líquidos da Unimed de Porto Alegre em uma palestra realizada em 2 de agosto de 2018.

    Recibo-Dallagnol-Unimed1 page

     

    PIROTECNIA E MOTIVAÇÃO

    NO CHAT SOBRE a empresa de palestras e eventos, os procuradores da Lava Jato discutiram também maneiras de sair da linha tradicional do ensino jurídico para conseguir clientes jovens e interessados em cursos motivacionais.

    No dia 27 de dezembro passado, Dallagnol postou no chat: “Curiosidade não basta, até porque a maior parte dos jovens não têm interesse em Lava Jato. Para o modelo dar certo, teria que incluir coisas que envolvam como lucrar, como crescer na vida, como desenvolver habilidades de que precisa e não são ensinadas na faculdade. Exatamente na linha da Conquer”.

    A firma Conquer mencionada pelo procurador organiza palestras na linha motivacional e se apresenta como uma escola “aceleradora de pessoas”. À época, Dallagnol já havia ministrado palestras em eventos da Conquer.

    O procurador então sugeriu o desenvolvimento de um curso com o título “Turbine Sua Vida Profissional com Ferramentas Indispensáveis”, com os temas “Empreendedorismo e governança: seja dono do seu negócio e saiba como governá-lo”, “Negociação: domine essa habilidade ou ela vai dominar Você”, “Liderança: influencie e leve seu time ao topo”, “Ética nos Negócios e Lava Jato: prepare-se para o mundo que te espera lá fora”.

    SP - Sao Paulo - 01/08/2018 - UNAFISCO Seminar - Deltan Dallagnol Attorney at the seminar of the National Association of Tax Auditors of the Federal Revenue of Brazil, UNAFISCO, on the afternoon of Wednesday 1, with the theme, The Challenges of the next Government, the seminar that will take place at the Maksoud Plaza Hotel in Sao Paulo between the 1st and 2nd of this month, intends to discuss fiscal justice and fight against corruption and corruption in the country. Photo: Suamy Beydoun / AGIF (via AP)

    Deltan Dallagnol fala durante seminário da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil. Agosto de 2018.

    Foto: Suamy Beydoun/AGIF via AP

    Dallagnol propôs ainda que o curso tivesse “uma pegada de pirotecnia” e servisse como ponte para faturar com outros eventos da Conquer. “Todas as palestras deixariam um gostinho de quero mais (tempo limitado) e direcionariam pra Conquer, com retorno de percentual sobre cada aluno que se inscrever no curso da Conquer nos 4 meses seguintes”.

    Um mês depois, Pozzobon voltou ao assunto propondo um curso jurídico mais tradicional sobre ética e combate à corrupção, com o objetivo de atrair clientes de alta renda. “Curso de sexta a noite e sábado de manhã. E poderíamos cobrar bem. Tipo uns 3 ou 5 mil. Público alvo: empresários, advs e altos executivos.”

    A intensa atividade de Deltan como palestrante chamou a atenção da imprensa e levou os deputados federais Wadih Damous e Paulo Pimenta, ambos do PT, a pedirem abertura de um procedimento disciplinar no Conselho Nacional do Ministério Público em junho de 2017. O requerimento, porém, foi arquivado definitivamente quatro meses depoispois o órgão entendeu à época que as palestras se enquadravam como “atividade docente”, o que é permitido por lei, e ressaltou que grande parte dos recursos era destinada a instituições filantrópicas.

    Nós procuramos Deltan Dallagnol e a força-tarefa em Curitiba. Os procuradores dizem que “não reconhecem as mensagem que têm sido atribuídas a eles” e que o material “não pôde ter seu contexto e veracidade comprovado”. “Os procuradores não têm empresa ou instituto de palestras em nome próprio nem de seus familiares. Tampouco eles atuam como administradores de empresas. É lícito a qualquer procurador, como já decidido pelas corregedorias do Ministério Público Federal e do Conselho Nacional do Ministério Público, aceitar convites para ministrar cursos e palestras gratuitos ou remunerados. Palestras remuneradas são prática comum no meio jurídico por parte de autoridades públicas e em outras profissões”, diz o texto.

    Continua a nota: “O procurador Deltan Dallagnol realiza palestras para promover a cidadania e o combate à corrupção de modo sempre compatível com o trabalho. A maior parte delas é gratuita e, quando são remuneradas, são declaradas em imposto de renda e ele doa parte dos valores para fins beneficentes. A secretaria da força-tarefa cuida da agenda do procurador quando há eventos gratuitos relacionados a pautas de interesse institucional. Convites para palestras com remuneração ao procurador, quando recebidos pela secretaria, são redirecionados para pessoa de fora dos quadros do Ministério Público, a qual se encarrega de fazer a interlocução com os organizadores do evento”, escreveu a assessoria ignorando que Dallagnol trocava mensagens com uma funcionário do MPF sobre o assunto, como mostra a reportagem.

    O ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, que se aposentou e hoje atua como advogado, informou via assessoria de imprensa que “prefere não comentar o conteúdo da conversa com o procurador Dallagnol”. Moro foi procurado, mas não respondeu.

    A procuradora da República Thaméa Danelon repetiu o argumento da força-tarefa de Curitiba e disse que não reconhece o conteúdo das mensagens e por isso não optou por não comentá-las. A Star Palestras disse que não iria se manifestar sobre o tema, mas enfatizou que a empresa atua “observando a lei e os princípios éticos”.