“As Comissões de Direitos Humanos, da Mulher Advogada, da Igualdade Racial e da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo, vêm manifestar-se nos seguintes termos:
Tramita perante a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, em regime de urgência, o Projeto de Lei 435/2019 que traz, em sua curta redação, dispositivos que induzem o entendimento de que o parto cesárea consistiria na melhor e mais segura prática médica, tornando-o como regra.
Preliminarmente, entendemos que o Projeto de Lei 435/2019 não atende às disposições do artigo 219 da Constituição do Estado de São Paulo, bem como, do artigo 196, da Constituição Federal. Além disto, fere o princípio constitucional da economicidade que deve nortear todos os atos da Administração Pública, pois, embora conste na sua exposição de motivos que não haverá aumento de despesas, isto não corresponde à verdade, uma vez que é indiscutível que a cesariana, como procedimento cirúrgico, mesmo sem intercorrências, é mais onerosa para o Estado, tendo em vista que implica em maior tempo de internação e prescrição de medicamentos.
Observe-se, também, que a matéria abordada no Projeto de Lei em apreço já está disciplinada pela Lei Estadual 15.759/15, que exaustivamente dispõe sobre o parto humanizado e expressamente sobre a oportunidade de escolha dos métodos natais por parte da parturiente.
Por outro lado, no mérito, também consideramos que o projeto não pode prosperar.
Ressalte-se que o Brasil é um dos campeões mundiais de cesarianas, o que afronta todas as recomendações nacionais e internacionais e que mais da metade das crianças brasileiras vêm ao mundo por meio do parto cesárea, de modo que é incompreensível que se pretenda legislar para estimular mais o que já é a regra entre nós.
O grande fundamento utilizado pela autora do Projeto de Lei 435/2019, na sua exposição de motivos, é o princípio da autonomia. Destaque-se, entretanto, que o exercício da autonomia pela parturiente prescinde de liberdade de escolha, ou seja, só existe autonomia, com informação e ciência prévias sobre todas as opções existentes que comporão a decisão. No entanto, é perceptível, com a simples leitura do artigo 3º, que não é intenção do projeto apresentar opções para escolhas, vez que limita a divulgação por placas nas maternidades de uma única opção de parto, a cesariana.
Além disto, entendemos que somente haverá autonomia se todas as mulheres tiverem acesso às informações necessárias sobre as várias possibilidades de parto, o que se conseguirá, não com a simples edição de uma nova lei ou com colocação de placas nas paredes de hospitais, mas com políticas públicas tendentes ao parto humanizado, nos termos da Lei Estadual 15.759/15 e à prestação de um serviço de saúde universal, de qualidade tal qual previsto na Constituição Federal.
Assim, pelas razões acima expostas, vêm, as Comissões de Direitos Humanos, da Mulher Advogada e da Igualdade Racial da OAB/SP, solicitar a rejeição do Projeto de Lei 435/2019.
Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP
Comissão da Mulher Advogada da OAB/SP
Comissão da Igualdade Racial da OAB/SP
Comissão da Diversidade Sexual da OAB/SP”
Marcha do #EleNão em Florianópolis. Foto: Alice Simas
Duas integrantes do grupo Mulheres Unidas Contra Bolsonaro, também conhecido como #EleNão, estão em Genebra desde a véspera do Dia Internacional da Mulher para entregar à Comissão de Direitos Humanos da ONU um Dossiê com denúncias sobre os atentados à vida das minorias no atual governo. Em 67 páginas, o documento expõe relatos sobre a violação de direitos das comunidades indígenas, negra, quilombola, sem terra, sem moradia e atingidos por barragens. Aponta os retrocessos impostos às conquistas constitucionais das mulheres e grupos LGBTQI+ e mostra o aumento acentuado da violência de gênero com os discursos de ódio promovidos por políticos e governantes. Reforça o assassinato impune de Marielle Franco com o envolvimento de filhos do presidente em milícias apontadas como responsáveis pela execução da vereadora. Salienta a violação à democracia com as ameaças de morte a intelectuais, artistas, ativistas e parlamentares da oposição, a exemplo do deputado federal Jean Wyllys, cuja renúncia ao mandato foi comemorada por Bolsonaro. Cita ainda o caso da antropóloga da UnB, Débora Diniz, que teve de deixar o país por ser vítima de linchamento virtual e ameaças de morte por defender a descriminalização do direito ao aborto. O pacote anticrime do ministro Sérgio Moro é denunciado como uma licença para matar que vai agravar o extermínio dos jovens negros. No dia 14 de março, a líder do movimento, Ludimilla Teixeira, fará uma palestra no painel do Festival Internacional de Cinema e Fórum de Direitos Humanos, a convite da direção do evento, ao lado de duas outras líderes feministas da Itália e Filipinas.
Ludimilla Teixeira, líder do MUCB: união internacional das mulheres para derrotar o fascismo
Elas conseguiram mobilizar quatro milhões de mulheres criando nas redes sociais uma comunidade feminista unificada pelo grito do “Ele Não!”. Surgido espontaneamente no dia 31 de agosto, da ânsia de barrar o candidato que incentivava a violência machista e o ataque aos direitos das minorias, o grupo Mulheres Unidas Contra Bolsonaro (MUCB) provocou uma onda gigantesca de levantes nas ruas do Brasil e de vários países do mundo. Não conseguiu evitar a tragédia temida por todo o mundo defensor dos direitos humanos, mas seu grito continua ecoando país afora. Na véspera do Dia Internacional das Mulheres, Ludmilla Teixeira, a líder negra e nordestina do MUCB e sua assessora de comunicação, Gisele Figueiredo, chegaram à Genebra com um Dossiê de Denúncias sobre os atentados à vida de mulheres e outros grupos vulneráveis pelo governo Bolsonaro que será protocolado na Comissão de Direitos Humanos da ONU, onde têm reunião no dia 12 de março, durante sua estada na Suíça. Por conta da repercussão do movimento que liderou no Brasil, Ludmilla foi convidada a participar como palestrante de uma mesa-redonda do 17º Festival Internacional do Cinema e Fórum dos Direitos Humanos (FIFDH), mais importante evento mundial dedicado ao tema, que acontece paralelamente ao Conselho dos Direitos Humanos da ONU.
Convite enaltece a repercussão da luta das mulheres contra a eleição de Bolsonaro
De 8 a 17 de março, a brasileira participa em Genebra de um fórum de discussão sobre os desafios geopolíticos planetários, onde são denunciados os atentados à dignidade humana e saudados os trabalhos dos que lutam contra essas violações. Ela terá um momento de fala no dia 14 de março, quando a partir das 20 horas, na Grande Salle do Espace Pitoëff, integra o painel com o instigante título “Para o povo, contra o populismo”. Nesse painel que abre com a exibição de um filme, debaterá sobre a ascensão dos regimes populistas e os ataques às instituições democráticas, ao lado da filipina Ninotchka Rosca, escritora, romancista e ativista social e da italiana Annalisa Camilli, jornalista investigativa, especializada em migração e direitos humanos. Elas farão uma leitura feminista desse populismo liderado por “homens fortes” que se alinham pelos retrocessos no campo democrático e ataques às mulheres e minorias. Moderada pelo professor do Instituto de Ciências Políticas de Paris (Sciences-Po), Bertrand Badie, a mesa tem a tarefa de debater sobre como esses regimes prosperaram no século XXI e buscar possibilidades de responder à onda de ódio e medo que eles alavancam.
Natural da Bahia, publicitária, feminista, servidora previdenciária da APS de Itapuã, 36 anos, Ludimilla é reconhecida na carta-convite por seu compromisso pessoal com a promoção dos direitos humanos no Brasil a partir do lançamento do #EleNão durante a campanha eleitoral, que fez dela “uma figura emblemática da resistência ao populismo do novo presidente brasileiro”. Assinada pela diretora geral, Isabel Grattiker e pela produtora do Fórum, Carolina Abu Sa’da, a carta enfatiza que no evento a brasileira terá a oportunidade de compartilhar a sua experiência como liderança deste movimento, fazer suas análises sobre a situação do Brasil e apontar perspectivas de luta pelos direitos humanos. “Não podemos pensar em uma representante melhor para esta discussão”, referendam as anfitriãs em nome das instituições estrangeiras que cobrem todas as despesas da viagem, hospedagem e subsistência das brasileiras. O Festival é apoiado pela Anistia Internacional, Human Rights Watch e Médicos sem Fronteiras, Ministério das Relações Exteriores da Suíça, entre muitos outros defensores dos direitos humanos da sociedade civil.
Ludimilla e Gisele chegaram em Genebra na véspera do Dia Internacional da Mulher
Elas participaram de painel sobre a busca da paz no Sudão do Sul
Ludmilla fará palestra no dia 14, em mesa do Fórum Internacional de Direitos Humanos
Público do mais importante evento na área do mundo
POPULISTA DE DIREITA PARA OS DOMINANTES, FASCISTA PARA AS MINORIAS
Recebido pelo grupo com muita vibração, o convite foi visto como uma forma de reconhecimento ao seu trabalho de mobilização contra o fascismo, que segue com 2,5 milhões de mulheres, mesmo após o resultado das urnas. Ativista pelos direitos humanos e animais, ela conta que ao ler a proposta do evento teve dificuldade de entender a relação entre o governo Bolsonaro e o tema da ascensão mundial do populismo. Em entrevista de vídeo para os Jornalistas Livres produzida pela jornalista Gisele Figueiredo logo ao chegar em Genebra, Ludmilla relata que precisou estudar a literatura internacional na área de ciências políticas para entender que os europeus associam o populismo a governos da nova direita e não aos governos de esquerda ou centro-esquerda, que exploram medidas econômicas de caráter mais assistencial para manter o carisma popular, como a mídia brasileira propagou durante os governos Lula e Dilma.
Populistas são políticos como Trump (EUA), Viktor Orbán (Hungria), Mateus Morawieck (Polônia), Sebastian Kurz (Áustria), Conte e Salvini (Itália), Duterte (Filipinas) e Erdogan (Turquia), que mobilizam a população mais conservadora com apelos moralistas contra os direitos das minorias, sobretudo dos imigrantes, para obter o seu apoio em medidas econômicas antipopulares. “Então entendi que nessa visão europeia, Bolsonaro seria um populista, mas não para as minorias, ele tenta se tornar popular para os que estão no poder, que são na maioria homens brancos, heterossexuais, de classe média ou alta para quem ele oferta um pensamento conservador e preconceituoso, mas para nós, as minorias étnicas, ele não é populista, eu o consideraria um fascista”, afirma, com a ressalva de que na Europa o conceito de fascismo é menos aplicado do que na América Latina.
DOSSIÊ DENUNCIA VIOLAÇÕES DE DIREITOS HUMANOS EM DOIS MESES DE GOVERNO
Aceito o convite, começou a mobilização para elaborar coletivamente o Dossiê de Denúncias que será protocolado na próxima semana na Comissão de Direitos Humanos da ONU. Em 67 páginas, o documento traz um diagnóstico dos ataques às conquistas feministas, das minorias de gênero, do crescimento da violência contra a mulher e do atentado à vida das comunidades indígenas, negros, quilombolas, militantes sociais, sem-terras, sem-teto e atingidos por barragens, com os crimes de Mariana e Brumadinho. Está organizado em seis tópicos principais: 1. Questão indígena e ambiental; 2. O caso das mineradoras; 3. Questão LGBTQI+; 4. Violência contra ativistas e a lei antiterrorismo; 5. Feminicídio, estatuto do nascituro e proibição de anticoncepcionais e 6. Racismo, violência contra quilombolas e assentados.
Embora o #EleNão tenha sido o único coletivo feminista convidado para o evento, elas fizeram questão de envolver outros movimentos sociais na elaboração do Dossiê, como o Movimento Atingidos por Barragens, Comunidade Indígena dos Tupinambá da Serra do Padeiro, Comunidade LGBTQI+ Brasileira, Movimento Negro, Shayana Busson, mestre em Sociologia e ativista do parto humanizado. O tópico referente à violência contra ativistas, por exemplo, foi elaborado com a contribuição de militantes do 8M SC em Florianópolis. Nessa questão, o próprio MUCB se inscreve como vítima das milícias digitais, que ao ver a potência de mobilização do grupo, começaram a atacar a página, chamando as administradoras de “putas” e “vagabundas” e acusando-as de fazer campanha para candidatos de esquerda. No auge da sua repercussão, em 14 de setembro de 2018, a página do Facebook foi hackeada por eleitores antifeministas que a renomearam para Mulheres Unidas com Bolsonaro, obrigando a organização antifascista a mudar de endereço. Muitos comentários incitavam a violência, afirmando que as integrantes deveriam ser espancadas e estupradas. Temendo por sua vida, a administradora do grupo chegou a desativar sua conta no Facebook. Por conta da lei antiterrorismo, o grupo também está sendo obrigado a mudar seu nome oficial para Mulheres Unidas com o Brasil, embora na prática preserve a definição original da sigla.
Na entrevista, a militante afirma que o grupo continuará se mobilizando, articulado a outros coletivos feministas e movimentos sociais na luta pelos direitos das mulheres e das minorias. Ela considera prioridade a luta para deter o extermínio da população indígena e negra, e para manter os avanços das conquistas feministas, a democracia, os direitos trabalhistas e previdenciários. Defende o caráter apartidário do movimento como forma de alcançar a unidade das mulheres para derrotar o fascismo que pode se estender como rastilho de pólvora, sobretudo a unidade internacional. “Estamos representando uma população tratada como minoria, mas se juntarmos todas essas minorias elas se tornarão maioria e irão derrotar este governo que está indo contra nossa própria existência”.
TRECHOS DA APRESENTAÇÃO DO DOSSIÊ DE DENÚNCIA À ONU
“É triste constatar que a ascensão de governos como o de Bolsonaro só estimula o avanço do discurso do ódio contra as minorias e ataques aos direitos humanos, o que gera concordância com sua analogia a governos fascistas de outrora. A liberdade é questionada e o autoritarismo avança, gerando sinal vermelho para aqueles que lutam na defesa da democracia e na Proteção do Estado Democrático de Direito.”
“O repúdio ao machismo, à misoginia, ao racismo, à xenofobia e a todos os outros tipos de preconceitos se tornou a principal pauta de reivindicação da sociedade brasileira, assim como a luta por liberdade, feminismo, demarcação de terras indígenas, reforma agrária, direito à moradia e reforma urbana”.
Prefácio do Dossiê que será protocolado no Conselho de Direitos Humanos da ONU
Perfil atualizado do movimento, conhecido como #EleNão
Estamos diante de um momento histórico importante, que tem seu ponto mais crítico no segundo turno das eleições dia 28.
Diversos apoiadores do candidato que está a frente nas pesquisas que são da classe médica têm se declarado abertamente contra o PARTO HUMANIZADO. Um ginecologista que atualmente compõe a diretoria do CREMERJ – Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro, além de ser parte da SGORJ (Associação de Ginecologia e Obstetrícia do Estado do Rio de Janeiro), por exemplo, manifesta abertamente seu apoio a esse candidato e recentemente manifestou-se que espera apenas uma coisa do novo presidente:
– Retirar todas as esquerdistas que estão na saúde da mulher do Ministério da Saúde há anos.
Sabe o que significa isso? As tais “esquerdistas” são as profissionais e os profissionais que conduziram, nos últimos anos, a maior parte das ações que levaram a conquistas importantíssimas para o movimento do parto humanizado no país. Quer saber algumas delas?
construção, reforma e manutenção de centros de parto normal em hospitais, em todo o país (incluindo aí equipamentos, materiais, salários etc.);
construção, reforma e manutenção de casas de parto, os chamados CPNs (Centros de Parto Normal) extra-hospitalares ou peri-hospitalares;
criação das residências em enfermagem obstétrica que espalharam parteiras profissionais por todos os cantos do Brasil, incluindo o pagamento das bolsas mensais para que elas estudem e se formem;
atualização das diretrizes de assistência ao parto normal que propõe a assistência humanizada ao parto, reforçando a necessidade de reduzir intervenções;
publicação de diretrizes para assistência humanizada ao recém-nascido, que oficializa que se deve aguardar o cordão parar de pulsar, colocar o bebê em contato pele a pele etc;
as ações via ANS (Agência Nacional de Saúde) para reduzir cesáreas e estimular o parto normal nos planos de saúde, incluindo medidas como a que obriga os planos a fornecerem a taxa de cesárea dos médicos e o Projeto Parto Adequado.
Sabe o que isso significa?
Que sem as tais “esquerdistas” à frente da área de saúde da Mulher do Ministério da Saúde nos últimos 5, 10 anos, muitas de nós aqui não teríamos a opção de parir no SUS, em casa de parto, não teríamos uma enfermeira obstetra para nos atender gratuitamente e mesmo para contratar (em muitos lugares elas nem existiam em número suficiente para dar conta da demanda).
Quem é enfermeira obstetra e está por aqui, talvez não tivesse seu emprego ou nem tivesse conseguido se formar, sem as vagas e as bolsas de residência. Acho que todo mundo que está nessa área há mais tempo sabe que houve uma explosão do número de vagas para parteiras profissionais, de maternidades e CPNs pelo país em razão da Rede Cegonha, planejada, organizada e tocada pelas tais “esquerdistas”.
E sabe o que é pior? Esses médicos, como o tal que disse isso, eles têm poder, têm contatos. Não custa nada que um deles assuma um cargo em um eventual Ministério do candidato Bolsonaro e acabe de fato com tudo isso. Sabe por que? Porque ele, como outros médicos que fazem o mesmo tipo de coisa e dão o mesmo tipo de declaração, são CONTRA O PARTO HUMANIZADO, são CONTRA ENFERMEIRAS OBSTETRAS E OBSTETRIZES atendendo parto.
E são contra também o parto domiciliar. O CREMERJ, instituição desse mesmo médico que já citamos, entrou recentemente com uma ação na justiça para proibir que enfermeiras obstetras atendam partos em casa. Sabe o que isso significa? Que com poder essas pessoas podem tornar de fato o PD (Parto Domiciliar) ilegal.
Se estamos aqui em nome de uma causa comum, o parto respeitoso, trabalhando para que ele chegue a cada vez mais gente, que as pessoas não precisem pagar, precisamos nos posicionar nessas eleições.
Porque temos de um lado um candidato (Haddad) com uma proposta específica de programa para incentivo ao parto humanizado e que é do partido dos governos que têm, na última década pelo menos, levado a frente conquistas importantíssimas para o parto humanizado no país. Podemos ter muitas críticas ao partido, todas temos, mas a verdade é que para a política pública de incentivo ao parto humanizado, nunca se avançou tanto em tão pouco tempo.
E de outro, temos um candidato que não tem nenhuma proposta para a humanização do parto e tem, entre seus apoiadores, médicos com poder para destruir tudo que temos construído. O que não falta são exemplos de profissionais de ginecologia e obstetrícia apoiando o candidato que está na frente e ao mesmo tempo atacando o parto humanizado e defendendo propostas para acabar com ele.
Vamos prestar atenção nisso, porque estamos aí há quase 20 anos lutando muito para conseguir conquistas para o parto humanizado gratuito e acessível, pelo SUS, para o maior número de pessoas. Não podemos deixar tudo se perder!
Pelo visto, a solução financeira do Hospital Sofia Feldman, em Belo Horizonte, ainda está distante. Ontem, depois de propor uma reunião com o Conselho Curador da maternidade, representes da prefeitura não compareceram ao encontro e nem deram notícia. Se fossem até aquela unidade encontrariam dezenas de funcionários protestando contra uma possível intervenção da prefeitura na direção do hospital em troca de verba para sua manutenção.
O Sofia Feldman é uma fundação financiada pelo SUS e pelo Estado de Minas que funciona no bairro Tupi, Zona Norte da capital, há mais de 30 anos, após ser idealizado pelo fotógrafo José Moreira Sobrinho. Atualmente vem atuado como uma referência para partos naturais e humanizados em todo o Brasil e América Latina. Para se ter ideia, neste momento duas equipes de funcionários da maternidade encontram-se no Japão e em Israel para levar as técnicas de parto desenvolvidas em Belo Horizonte. E é comum o hospital receber grávidas de vários e distantes estados, como Rondônia, que fazem opção e questão e dar à luz beneficiando-se das técnicas desenvolvidas no Sofia Feldman.
E justamente por isso a maternidade gera ‘ciúmes’, principalmente no setor privado, onde há uma verdadeira farra em torno dos partos por ce$ariana$, que fazem a festa para os bolsos de médicos e hospitais. Isso explica também por que o Sofia Feldman é discriminado na distribuição de verbas públicas. Embora seja responsável por 40% dos partos (1.050 em média por mês) da rede pública de Belo Horizonte, o hospital recebe apenas 22% do bolo de recursos distribuído pelo SUS para sete maternidades da capital. Curiosamente, a Maternidade Odete Valadares, que cuida em média de 300 partos por mês, é a que mais recebe recursos. Curiosamente, também, tem maternidade que recebe R$ 18 mil por parto, enquanto ao Sofia são destinados apenas R$ 5 mil, quando necessitaria de pelo menos R$ 6.500 por parto, tendo o menor custo-benefício para o SUS.
Desta forma, estrangulado, o Hospital Sofia Feldman vem administrando, hoje, uma dívida de R$ 90 milhões e pede socorro. A maternidade não conseguiu pagar o 13º salário de seus funcionários e só agora conseguiu pagar os salários de janeiro. Diante da crise, a Prefeitura de Belo Horizonte ensaiou uma ajuda que, na visão dos funcionários da maternidade, trata-se de verdadeiro cavalo de Troia, uma intervenção que deturparia o modelo do hospital. Hoje a prefeitura não coloca nenhum recurso prório lá, apenas repassa recursos federais e do Estado de Minas. Cogitou bancar os custos do hospital mas, em contrapartida, o diretor geral e o diretor financeiro seriam indicados por ela e ficariam subordinados ao Executivo municipal, o que é rechaçado pelos funcionários e todas as pessoas ligadas à instituição, como é o caso do Conselho Curador.
Mas, como a direção do Sofia Feldman está aberta ao diálogo para solucionar a crise financeira, ontem à tarde receberia representantes da área da saúde da prefeitura para prosseguir nas conversas. Mas os tais representantes da prefeitura acabaram dando o bolo nos integrantes do Conselho Curador, que decidiu partir para a elaboração de um documento formalizando uma proposta de como poderia ser amarrada uma parceria e aguardar um retorno. “Queremos isonomia quanto ao financiamento”, adiantou João Batista Lima, presidente do Conselho Curador.
“Como o hospital é uma fundação particular, então a prefeitura tem de explicar como faria a parceria”, afirmou o advogado Obregon Gonçalves, integrante do Conselho Curador. “O importante é que o modelo de referência e excelência do Sofia seja respeitado”, acrescentou.
“E lembramos que não abrimos mão do modelo de humanização do parto”, acentuou Bruno Pedralva, presidente do Conselho Municipal de Saúde. “E a proposta da prefeitura tem de ser aprovada também pelo Conselho”, lembrou.
O fato é que por trás de toda a crise vivida pelo Hospital Sofia Feldman há um bando de urubus querendo ver a maternidade sucateada para impor seus interesses, o que, aliás, vem ocorrendo em inúmeras instituições de saúde do país, principalmente aquelas que são modelo até mesmo para a iniciativa privada. Por isso, no interior e fora do Sofia não falta quem olhe com preocupação para as movimentações do secretário Municipal de Saúde, Jackson Machado Pinto. Desde outubro, por exemplo, a prefeitura não tem repassado à maternidade os recursos do SUS e do Estado, o que seria uma forma de estrangular o Sofia Feldman.
Está marcada para às 14:30 hs, a reunião que irá definir o futuro da maior maternidade do país, o Hospital Sofia Feldman, responsável por mais de dez mil partos em 2017. A asfixia financeira promovida pelo município de Belo Horizonte, levou o Hospital a acumular um déficit mensal de 1,5 milhão, e resultou no fechamento de leitos e greve de parte dos funcionários. De acordo com o secretário municipal de saúde (oficio nº 0795/2017 ), a adequação do orçamento para o que recebe hoje, implicaria na diminuição de 200 partos e 50 internações neonatais/mês.
Ao contrário do que é alardeado na imprensa pelo prefeito Alexandre Kalil e o secretário de saúde, Jackson Machado, o município não contribui com um centavo, sequer para a manutenção da maternidade, financiada exclusivamente pelo governo federal e estadual. A constituição federal determina que as três esferas de governo financiem o Sistema Único de Saúde (SUS), gerando receita necessária para custear as despesas e os investimentos. Atualmente, da verba que chega ao Hospital, 87% vem do governo federal e 13% do estadual.
Na última reunião, em 19 de fevereiro, para discutir a crise atual, o secretário afirmou que tem lidado “a cada dois, três meses, com o pedido de socorro que o hospital nos faz. Então essa reunião foi para ofertar à maternidade uma proposta que vai resolver, de uma vez por todas, um problema que já vem se prolongando por tempo demais”.
Na conta do secretário estão os repasses que passam pelo caixa do município e um adiantamento de 6 milhões, em forma de empréstimo consignado, que deverão ser devolvidos ao município.
Mas qual o problema do Sofia?
Segundo um relatório elaborado pela própria prefeitura, o Sofia Feldman é a instituição que apresenta os melhores resultados em termos financeiros e de atendimento, se comparado com outras maternidades da cidade.
Em 2016, por exemplo, a maternidade estadual Odete Valadares (MOV) apresentou um custo médio mensal de 6 milhões de reais, para uma produção média de 315 partos/mês, mais 1.043 diárias de UTI neonatal. O Hospital Sofia Feldman gastou os mesmos 6 milhões de reais/mês, para uma produção de 899 partos/mês, mais 2.558 diárias de UTI neonatal. Isso demonstra que a razão de custo por parto – incluindo o custo médio da neonatologia – foi de R$ 19 mil na MOV e R$ 6.700 no Sofia Feldman. No Odilon Behrens, hospital gerido diretamente pela prefeitura, essa mesma razão foi de R$ 10.769,00.
O que é importante ressaltar, para além dos números, é que o Sofia Feldman consegue esses resultados arcando com o custeio da creche, do centro de terapias integrativas, da academia e bolsa complementar dos residentes de GO (ginecologia e obstetrícia) e neonatologia, serviços que nenhuma das outras maternidades oferece.
SUS que dá certo
Segundo conselheiros ouvidos pela reportagem, o problema do Sofia é “o modelo de assistência ao parto e nascimento praticado pelo Sofia, caracterizado pelo respeito à autonomia da mulher e à atuação da enfermagem obstétrica – integrada à equipe assistencial, no mesmo nível hierárquico do médico”, que vem conseguindo resultados expressivos na queda do número de cesarianas (25%) e, consequentemente, nos índices de morbidade materno-infantil.
À medida que o Hospital foi crescendo, ganhando reconhecimento nacional e internacional e se consolidou como Hospital de ensino – não só em enfermagem obstétrica, mas na área médica – passou a incomodar quem defende um atendimento centrado na figura do médico e de aparatos tecnológicos, que elevam os custos com medicamentos, material cirúrgico, equipe, além de aumentar o período de internação de mães e bebês, indisponibilizando leitos para outras parturientes.
Este é um conflito clássico para quem vive o universo da maternidade e nascimento, mas que não aparece nos discursos de médicos e dos órgãos que os representam, os conselho regionais e federal de medicina, sempre simpáticos ao modelo privatista e mercantilizado da saúde.
No caso do Hospital Sofia Feldman, a reportagem apurou algumas suspeitas que evidenciariam o boicote ideológico sofrido pela instituição:
A estratégia protelatória adotada pelo gestor municipal, durante todo o ano de 2017, frente às inúmeras demandas da instituição, mesmo quando o colapso financeiro estava evidente;
A exoneração da pediatra Sonia Lansky da Coordenação da Comissão Perinatal de BH, e Márcia Parizzi da Coordenação de Atenção à Saúde da Criança e Adolescente, que sempre tiveram uma atuação em defesa do Sofia, nas três esferas de governo;
A proximidade do gestor municipal atual com o CRM-MG, reconhecido adversário do modelo de assistência ao parto proposto pelo Sofia;
E a própria intervenção proposta pela prefeitura, sob o argumento gerencial.
Ativistas, usuárias, funcionários e profissionais da saúde se organizam para resistir e proteger a administração do Sofia, que se tornou uma bandeira, em todo o país, na luta pela humanização no atendimento às mulheres e aos bebês. Se conseguirão, dependerá da capacidade de mobilização para fazer frente a mais uma investida dos setores ligados ao favorecimento do modelo mercantilizado da saúde, e da sensibilidade do prefeito Alexandre Kalil em contribuir com a parte que cabe ao município para oferecer um atendimento de qualidade a população de Belo Horizonte.