Prefeitura apresenta proposta de Intervenção do Hospital Sofia Feldman

Está marcada para às 14:30 hs, a reunião que irá definir o futuro da maior maternidade do país, o Hospital Sofia Feldman, responsável por mais de dez mil partos em 2017. A asfixia financeira promovida pelo município de Belo Horizonte, levou o Hospital a acumular um déficit mensal de 1,5 milhão, e resultou no fechamento de leitos e greve de parte dos funcionários. De acordo com o secretário municipal de saúde (oficio nº 0795/2017 ), a adequação do orçamento para o que recebe hoje, implicaria na diminuição de 200 partos e 50 internações neonatais/mês.

Ao contrário do que é alardeado na imprensa pelo prefeito Alexandre Kalil e o secretário de saúde, Jackson Machado, o município não contribui com um centavo, sequer para a manutenção da maternidade, financiada exclusivamente pelo governo federal e estadual. A constituição federal determina que as três esferas de governo financiem o Sistema Único de Saúde (SUS), gerando receita necessária para custear as despesas e os investimentos. Atualmente, da verba que chega ao Hospital, 87% vem do governo federal e 13% do estadual.

Na última reunião, em 19 de fevereiro, para discutir a crise atual, o secretário afirmou que tem lidado “a cada dois, três meses, com o pedido de socorro que o hospital nos faz. Então essa reunião foi para ofertar à maternidade uma proposta que vai resolver, de uma vez por todas, um problema que já vem se prolongando por tempo demais”.

Na conta do secretário estão os repasses que passam pelo caixa do município e um adiantamento de 6 milhões, em forma de empréstimo consignado, que deverão ser devolvidos ao município.

Mas qual o problema do Sofia?

Segundo um relatório elaborado pela própria prefeitura, o Sofia Feldman é a instituição que apresenta os melhores resultados em termos financeiros e de atendimento, se comparado com outras maternidades da cidade.

Em 2016, por exemplo, a maternidade estadual Odete Valadares (MOV) apresentou um custo médio mensal de 6 milhões de reais, para uma produção média de 315 partos/mês, mais 1.043 diárias de UTI neonatal. O Hospital Sofia Feldman gastou os mesmos 6 milhões de reais/mês, para uma produção de 899 partos/mês, mais 2.558 diárias de UTI neonatal. Isso demonstra que a razão de custo por parto – incluindo o custo médio da neonatologia – foi de R$ 19 mil na MOV e R$ 6.700 no Sofia Feldman. No Odilon Behrens, hospital gerido diretamente pela prefeitura, essa mesma razão foi de R$ 10.769,00.

O que é importante ressaltar, para além dos números, é que o Sofia Feldman consegue esses resultados arcando com o custeio da creche, do centro de terapias integrativas, da academia e bolsa complementar dos residentes de GO (ginecologia e obstetrícia) e neonatologia, serviços que nenhuma das outras maternidades oferece.

SUS que dá certo

Segundo conselheiros ouvidos pela reportagem, o problema do Sofia é “o modelo de assistência ao parto e nascimento praticado pelo Sofia, caracterizado pelo respeito à autonomia da mulher e à atuação da enfermagem obstétrica – integrada à equipe assistencial, no mesmo nível hierárquico do médico”, que vem conseguindo resultados expressivos na queda do número de cesarianas (25%) e, consequentemente, nos índices de morbidade materno-infantil.

À medida que o Hospital foi crescendo, ganhando reconhecimento nacional e internacional e se consolidou como Hospital de ensino – não só em enfermagem obstétrica, mas na área médica – passou a incomodar quem defende um atendimento centrado na figura do médico e de aparatos tecnológicos, que elevam os custos com medicamentos, material cirúrgico, equipe, além de aumentar o período de internação de mães e bebês, indisponibilizando leitos para outras parturientes.

Este é um conflito clássico para quem vive o universo da maternidade e nascimento, mas que não aparece nos discursos de médicos e dos órgãos que os representam, os conselho regionais e federal de medicina, sempre simpáticos ao modelo privatista e mercantilizado da saúde.

No caso do Hospital Sofia Feldman, a reportagem apurou algumas suspeitas que evidenciariam o boicote ideológico sofrido pela instituição:

  • A estratégia protelatória adotada pelo gestor municipal, durante todo o ano de 2017, frente às inúmeras demandas da instituição, mesmo quando o colapso financeiro estava evidente;
  • A exoneração da pediatra Sonia Lansky da Coordenação da Comissão Perinatal de BH, e Márcia Parizzi da Coordenação de Atenção à Saúde da Criança e Adolescente, que sempre tiveram uma atuação em defesa do Sofia, nas três esferas de governo;
  • A proximidade do gestor municipal atual com o CRM-MG, reconhecido adversário do modelo de assistência ao parto proposto pelo Sofia;
  • E a própria intervenção proposta pela prefeitura, sob o argumento gerencial.

Ativistas, usuárias, funcionários e profissionais da saúde se organizam para resistir e proteger a administração do Sofia, que se tornou uma bandeira, em todo o país, na luta pela humanização no atendimento às mulheres e aos bebês. Se conseguirão, dependerá da capacidade de mobilização para fazer frente a mais uma investida dos setores ligados ao favorecimento do modelo mercantilizado da saúde, e da sensibilidade do prefeito Alexandre Kalil em contribuir com a parte que cabe ao município para oferecer um atendimento de qualidade a população de Belo Horizonte.

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