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Categoria: Ecologia

  • O Império Bolsonaro no vale da miséria

    O Império Bolsonaro no vale da miséria

    O cunhado não gostou quando uma parte de sua fazenda, fruto de invasão de terras, virou quilombo. Capangas destruíram a nova plantação de bananas assim que o processo de reconhecimento da área foi finalizado, em setembro passado. Por sua vez, em 2015, uma das irmãs se apossou do lote urbano de mais de 800m2 que foi regularizado por um programa voltado a pequenos posseiros. Seis meses depois, ela vendeu o lote para o prefeito do município. Já o núcleo familiar da caçula dos cinco irmãos de Jair Bolsonaro alugou 3 imóveis, sem licitação e na faixa dos R$ 8 mil por mês, para prefeituras do Vale do Ribeira, uma das áreas mais pobres do Estado mais rico do Brasil.

    É nessa região que Jair Bolsonaro morou até os 18 anos de idade, quando saiu para o serviço militar. Filho de um dentista prático e de uma dona de casa, viveu na pacata cidade de Eldorado Paulista. O município hoje tem pouco mais de 15 mil habitantes, 40% deles ganhando menos de dois salários mínimos. Não por acaso, o município sofre com o segundo pior índice de mortalidade infantil do Estado.

    Mas Eldorado Paulista também é o quarto maior município em extensão territorial de São Paulo. No começo do século passado, foi apelidado de “Amazônia Paulista” e, em 1993, reconhecido pela Unesco como “Reserva da Biosfera do Patrimônio Mundial”. Cerca de 70% do território é coberto por Mata Atlântica protegida por reservas e parques, estações ecológicas e áreas de proteção ambiental naturais tombadas, além de 26 quilombos e cerca de 50 comunidades remanescentes de quilombos. Mas Bolsonaro diz que não quer saber de nada disso. É obcecado por minérios como nióbio (usado em siderurgia) e tório, um elemento químico radiativo.

    Natural de Campinas, foi em Eldorado que Bolsonaro se criou. E é aquela região que explica algumas das obsessões do ex-capitão, a começar pela idolatria à caserna. Bolsonaro adora dizer que sua “vocação” militar foi despertada no começo dos anos 1970, quando a região do Vale do Ribeira viu-se ocupada por 2.500 homens do Exército, auxiliados por um contingente não determinado de policiais cedidos pelo governo de São Paulo, que caçavam míseros 17 militantes da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), sob o comando do guerrilheiro Carlos Lamarca, este sim, um mito. Pois não é que os soldados, depois de bloquear a BR-116, a Rodovia Régis Bittencourt, além de estradas vicinais, depois de prender 120 pessoas e varrer a Mata Atlântica com helicópteros, depois – por fim – de bombardear áreas civis suspeitas de abrigarem os guerrilheiros com bombas de napalm jogadas de cargueiro B-26 da FAB; depois disso tudo, Lamarca conseguiu furar o bloqueio do Exército e fugir.

    Nada menos do que 41 dias de fome e cerco depois, e Lamarca conseguiu escapar da maior mobilização da história do II Exército, atual Comado Militar do Leste. O baile que o guerrilheiro deu no Exército marcou indelevelmente o psiquismo do menino Jair Bolsonaro, que até hoje promete vingar-se da esquerda.

    A família do candidato à presidência – que chama ocupantes de terras e fazendas improdutivas de “terroristas” e pretende não “dar nenhum centímetro” de terra para reservas indígenas e quilombolas – está espalhada por todo o Vale do Ribeira. Lá, os Bolsonaros construíram um império. Em municípios como Barra do Turvo (o mais pobre do Estado), Jacupiranga, Pariquera-Açu, Miracatu e outros que compõem a área de baixíssimos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), o clã dos Bolsonaro contabiliza mais de 60 imóveis. Agregam-se ao sobrenome presidenciável os dos cunhados José Orestes Fonseca Campos e Theodoro da Silva Konesuk, considerados os mentores financeiros da família. Mas não só de casas, fazendas e terrenos vive a próspera família. Além das propriedades, eles são donos de empresas. Muitas.

    Um levantamento na Junta Comercial de São Paulo aponta, pelo menos, 19 foram registradas em oito municípios. Se forem contabilizadas as filiais das lojas “Campos Mais” (Magazine Campos Mais, Campos Móveis e Campos Materiais de Construção), e da “Art’s Móveis”, de móveis e produtos eletrônicos, em 13 cidades, são cerca de 30 empreendimentos, de acordo com uma reportagem da revista Época de setembro passado.

    A crise econômica parece que não abalou a família: 14 lojas foram abertas nos últimos oito anos. À boca miúda, diz-se que o shopping em construção em Eldorado também é do grupo, assim como um empreendimento em hotelaria no centro de Cajati, no litoral Sul.

    Um dos negócios mais peculiares da família em Eldorado é a casa lotérica “Trilha da Sorte”, registrada como “Casa Lotérica Bolsonaro ME Ltda”. O empreendimento está no nome do irmão do candidato, Angelo Guido Bonturi Bolsonaro, e desperta a curiosidade. Uma rápida busca no Google, afinal, explica como loterias fazem lavagem de dinheiro sujo: basta o criminoso pagar mais do que o prêmio em troca de um bilhete sorteado.

    Na cidade, também fica a loja de sapatos da mãe, dona Olinda Bonturi Bolsonaro, de 92 anos. Ela mora no mesmo prédio do comércio. Todo esse patrimônio, no entanto, não inclui aquele formado pelo próprio núcleo familiar do candidato à presidência e seus três filhos políticos.

    Uma série de reportagens publicada no começo do ano pelo jornal Folha de S. Paulo apontou que os quatro acumulariam mais de R$ 15 milhões em 13 imóveis. Entre eles, os de Brasília – apesar de o candidato à presidência e seu filho Eduardo, que é deputado federal, receberem R$ 6,1 mil por mês de auxílio-moradia pela Câmara dos Deputados, benefício a que teriam direito apenas os parlamentares sem casa em Brasília.

    A conta feita pra estimar o patrimônio, porém, não contabiliza bens como carros que vão de R$ 45 mil a R$ 105 mil, um jet-ski, além de aplicações financeiras, em um total de R$ 1,7 milhão, como consta na Justiça Eleitoral e em cartórios. As dúvidas sobre transações suspeitas de lavagem de dinheiro e de enriquecimento após começar a atuar na política não foram esclarecidas pelo Bolsonaro-pai nem pelos Bolsonaros-filhos.

    Toda a família e seus tentáculos, por sinal, estão proibidos por Jair Bolsonaro de dar entrevistas. Apesar disso, os Jornalistas Livres foram atrás dos personagens, empreendimentos e atividades do clã no Vale do Ribeira. A partir de documentos, relatos, dados fornecidos por cartórios de registros de imóveis, pela Junta Comercial de São Paulo e no Tribunal de Justiça de São Paulo, traçamos, ao menos em parte, pistas do império dos Bolsonaros.

    O cunhado fazendeiro que não gosta de quilombos

    Theodoro da Silva Konesuk é casado com Vânia Rubian Bolsonaro, a caçula dos irmãos do candidato à presidência pelo PSL. Há pouco mais de um mês, Konesuk perdeu uma área de 55 hectares de uma de suas fazendas para a Associação dos Remanescentes de Quilombos da Barra de São Pedro do bairro Galvão, em Iporanga. A propriedade, em áreas devolutas que pertencem à União e ao Município, foi ocupada por seu pai, que foi prefeito da cidade de Eldorado por dois mandatos, entre os anos 60 e 80. Os quilombolas aguardavam a regularização da terra desde 2013, quando a Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp) e o governo paulista entraram como o processo de reintegração de posse. Theodoro Konesuk não se manifestou. Mas parece que não gostou da sentença.

    Dias depois de os quilombolas receberem o direito à terra, lideranças do quilombo contam que os capangas do cunhado de Jair Bolsonaro destruíram o cercado e as recém-plantadas mudas de bananeiras das 32 famílias da comunidade, segundo reportagem do site www.deolhonosruralistas.com.br.

    O relatório técnico do Itesp realizado em 2000, época de análise dos territórios do bairro Galvão, chamou atenção para os altos níveis de violência na região e até um assassinato ocorrido em conflitos de grilagem das terras. Ao defender a demarcação das terras quilombolas, o documento feito pela antropóloga Maria Celina Pereira de Carvalho afirma que “o sistema agrícola dessas comunidades permanece o mesmo que era praticado pelos antepassados há duzentos, trezentos anos, apoiado em um saber-fazer que exige profundos conhecimentos da natureza e seus ritmos”.

    Aponta ainda que há décadas os descendentes de homens e mulheres negros escravizados lutam contra a construção de uma barragem, ao longo do rio Ribeira de Iguape, que forneceria energia elétrica para uma empresa do grupo Votorantim, e também contra mais três barragens que seriam construídas pela Companhia Energética de São Paulo que, segundo dados do Instituto Socioambiental, inundariam cerca de 60% do território de inúmeras comunidades negras da região.

    Além da propriedade em Iporanga, constam em nome de Konesuk, nos serviços registrais de imóveis, ocorrências nas cidades de Apiaí, Cananéia, Eldorado, Iguape, Itanhaém, Jacupiranga, Miracatu, Peruíbe, Registro e Sorocaba. Em sua fazenda em Registro, há negócios de extração de areia e gado de corte em sociedade com o empresário Maurici Ribeiro Botelho Junior, dono de uma empresa de terraplenagem e de uma transportadora que tem em seu registro de atividades o comércio atacadista de ferramentas, cigarros, cigarrilhas e charutos, artigos de viagem, tecidos, lustres, couros, lãs e peles, jóias, relógios e bijuterias, inclusive pedras preciosas e semipreciosas lapidadas.

    A irmã Vânia e os aluguéis para prefeituras: sem licitação

    Ela é casada com o empresário que perdeu parte de suas terras para quilombolas, Theodoro da Silva Konesuk, e começou seus negócios na venda de artigos para pesca e camping, há 23 anos. Mudou de ramo em 2011 e hoje o casal tem 11 lojas Art’s Móveis. As seis no nome de Vânia Bolsonaro estão registradas como de pequeno porte e as do marido como Eireli, que separa o patrimônio empresarial do pessoal.

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    Os portais de transparência dos municípios da região apontam que Vânia e Theodoro Konesuk já alugaram imóveis para as prefeituras de Cajati, Iguape e Jacupiranga. Todos sem licitação. Entre eles, locação firmada em 2014 do imóvel que hospeda a Delegacia Civil em Cajati. Em Iguape, o nome de Vânia consta como locadora do imóvel destinado à administração do Paço Municipal. Em um ano de aluguel, a partir de março de 2015, a irmã do presidenciável embolsou R$ 90 mil. A locação foi estendida por mais um ano, a R$ 8.325 mensais, totalizando outros R$ 99.906 até março de 2017. Em Jacupiranga, desde 2010, o imóvel onde funciona a Câmara Municipal é do marido, Theodoro Konesuk. Atualmente, ele cobra R$ 8.000 mensais pelo espaço.

    Maria Denise: a empresária-posseira e fazendeira

     

    Na cidade de Barra do Turvo, a mais pobre do Vale do Ribeira, houve regularização de fundiária urbana realizada pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp) em 2015. Maria Denise Bonturi Bolsonaro, irmã do candidato à presidência que já declarou a intenção de criminalizar movimentos sem-terra, foi beneficiada pelo programa “Minha Terra”. Ela recebeu a concessão de um lote de 869,28 m2 na cidade. A propriedade do terreno era do município.

    De acordo com o site do Itesp, o programa “Minha Terra” consiste em um projeto social do Governo do Estado de São Paulo “voltado a pequenos posseiros da cidade ou do campo que, devido à insegurança dominial sobre os imóveis que ocupam, convivem com conflitos pelo uso e posse da terra e com sérios obstáculos para o desenvolvimento social e econômico das comunidades.” Seis meses depois de receber o lote, entretanto, Maria Denise Bonturi Bolsonaro o vendeu para o atual prefeito da cidade, o médico Jefferson Luiz Martins, eleito pelo PSDB em 2014.

    Constam, nos registros da Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo, 12 (doze!!!) menções a imóveis no CPF de Maria Denise nas cidades de Eldorado, Jacupiranga, Itanhaém e Miracatu. Vale citar só alguns:

    • Uma casa residencial de 762,50m² no perímetro urbano da cidade de Jacupiranga

    • Uma área de terra urbana de 941,96m² no perímetro de Jacupiranga

    • Uma área de terra urbana com 190,48m², na cidade de Pariquera-Açu

    • Um lote de terreno urbano na cidade de Barra do Turvo

    Documento original

    Separada há 5 anos, ela foi casada por 30 anos com José Orestes Fonseca Campos, dono da rede de materiais de construção “Campos Mais”, que inclui 14 filiais da Magazine “Campos Mais” (saiba mais no perfil abaixo). Seus filhos também são empresários. Osvaldo está no mesmo ramo da família. Já a empresa de Orestes oferece peças de vestuário, calçados, suprimentos de informática e suporte técnico em tecnologia da informação. Os Bolsonaro Campos também são donos de duas fazendas, uma de gado e outra de banana.

     

    O ex-cunhado José Orestes e o impressionante crescimento em tempos de crise

    2015 foi um ano excelente para o ex-cunhado de Jair Bolsonaro José Orestes Fonseca Campos, que foi casado com Maria Denise Bolsonaro Campos, quando ele inaugurou mais três filiais da Magazine “Campos Mais”. O crescimento do negócio de materiais de construção de fato impressiona. Em cinco anos, entre 2005 e 2010, foram abertas oito lojas espalhadas por todo o Vale do Ribeira e litoral Sul. O último empreendimento, no ano passado, foi em Jacupiranga. Mas, para ampliar ainda mais os negócios, José Orestes montou outra empresa. Agora é dono da incorporadora, construtora e administradora de bens imobiliários “Campos Mais”. Além da gestão de imóveis, as atividades da empresa incluem construção de edifícios e hotéis. Na cidade onde mora, Cajati, está construindo um hotel e espaço de eventos.

    Diante de todas essas informações, fica evidente que os ataques do candidato Jair Bolsonaro às comunidades quilombolas e a movimentos, como o MST e o MTST, são hipócritas e criminosos. Os sem-terra e os sem-teto são humildes e pobres que ocupam propriedades improdutivas, enquanto os parentes de Jair Bolsonaro, riquíssimos, invadem terrenos públicos para transformá-los em objeto de especulação imobiliária e cobiça. Eles querem auxílio-moradia, mas só para eles!

  • Roucos e sufocados: livro investiga a rede de lobby da indústria do tabaco

    Roucos e sufocados: livro investiga a rede de lobby da indústria do tabaco

    “Por sobre as nossas lindas terras, loiro imigrante andou”: pelo hino oficial de Santa Cruz do Sul, cidade-polo do Vale do Rio Pardo (RS), coração da fumicultura brasileira, já é possível identificar a exacerbação do “germanismo”, termo criado por historiadores para definir a imposição cultural alemã a outras etnias da região.

    E a cultura germânica é exaltada por uma indústria que se instalou na região: a do tabaco que, não à toa, enaltece a ascendência alemã como símbolo de disciplina e organização. Não é incomum escutar dos “guias” regionais apontamentos sobre “as diferenças” entre as plantações de folhas de fumo dos “loiros” e do “resto”. De um lado, o capricho é sinônimo de Alemanha. De outro, fica o trabalho daqueles que muitos representantes das empresas chamam de “caboclada”.

    “O investimento pesado da indústria em reforçar a hegemonia alemã para garantir o rótulo de melhores produtores de tabaco do mundo resultou em racismo”, comentam João Peres e Moriti Neto, autores do livro-reportagem Roucos e Sufocados: a indústria do cigarro está viva, e matando, que foi lançado no final de agosto pela Editora Elefante.

    A situação descrita pelos jornalistas é traduzida pelo Deutschtum, palavra alemã que sintetiza o conceito de “germanismo” como uma ideologia que se refere à conservação das características culturais, sociais, raciais e dos grupos formados por indivíduos de origem germânica. O historiador gaúcho Mateus Silva Skolaude, num trecho do artigo História, identidade e representação social: o caso da comunidade afrodescendente de Santa Cruz do Sul, explica:

    Ate o bicicletário no centro de Santa Cruz do Sul tem forma de folhas de fumo

    “No caso de Santa Cruz do Sul, a década de 1970 é paradigmática no sentido de afirmar a identidade germânica. O município apresenta grandes transformações sociais, políticas e econômicas ocasionadas por um intenso processo de urbanização, acompanhado pelo crescimento demográfico, decorrência do grande fluxo de migrantes vindos de municípios vizinhos e do interior do município, motivados pela perspectiva de trabalho no setor fumageiro, que se encontrava em plena ascensão econômica. Algumas estratégias foram articuladas pelo poder público municipal para a invenção de uma tradição germânica para a cidade”, argumenta Skolaude, santa-cruzense de nascença.

    É nesse cenário que as maiores transnacionais de cigarros instalaram sedes no pequeno município, de 773 quilômetros de área e 127 mil habitantes, considerado a “capital mundial do fumo” e o polo aglutinaddor que faz do Brasil o maior exportador de tabaco processado do planeta e vice-campeão mundial em produção da folha, atrás apenas da China.

    Fundada em 6 de dezembro de 1877, a cidade fica a 155 quilômetros da capital gaúcha, Porto Alegre, e é um dos principais núcleos da colonização alemã em solo brasileiro. A combinação entre a prevalência da cultura germânica e a presença da indústria fumageira (como é chamado o oligopólio das transnacionais do cigarro na região) concede outro título ao local: além de “capital mundial do fumo”, Santa Cruz aparece como “campeã” de mortes. Está na lista do Mapa da Violência no Brasil, publicado com base em dados do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde (SIM), entre as líderes do ranking de suicídios no país.

    Para que se tenha uma breve ideia, são 30 as pessoas que se suicidam diariamente no Brasil – 10.950 mil anualmente – o que supera os números diários de vítimas fatais de alguns tipos de câncer. O Rio Grande do Sul, apesar de abrigar somente 14% da população brasileira, é cenário de 23% dos casos anuais (2.518,5), com 10,7 suicídios a cada 100 mil habitantes, o dobro da média nacional (de 5,4), sendo o Vale do Rio Pardo um dos pontos mais alarmantes.

    Em 2014, o Mapa já apontava que, das 20 cidades de maior índice, 11 são gaúchas. Entre elas, três estão na região das fumageiras: Santa Cruz do Sul, Venâncio Aires e Encruzilhada do Sul.

    Órgãos municipais também acompanham a situação. E a confirmam. Venâncio, município habitado por 65 mil pessoas, a 30 quilômetros de Santa Cruz, chegou a ser classificado como a “capital mundial do suicídio”, devido a um surto em 1996, quando 37 casos por 100 mil habitantes ocorreram (60% em área rural).

    Estranhos números em uma região que, de longe, é vista como próspera. Santa Cruz, por exemplo, carrega boas marcas econômicas. É o quinto colocado entre os municípios rio-grandenses no que se refere ao Produto Interno Bruto (PIB), chegando ao montante de R$ 7,8 bilhões produzidos em 2017, com renda per capita média mensal de R$ 1.036,87, valor maior do que as médias do Brasil e Rio Grande do Sul, R$ 793 e R$ 959, respectivamente.

    As corporações do fumo proclamam-se como responsáveis por esse “desenvolvimento”, mas nada falam sobre o envolvimento do cultivo de tabaco com as mortes e as tentativas de suicídio.

    “Os fatos, dados e pesquisas que conectam a relação com os suicídios são diversos e não pautam a mídia tradicional. Tentamos descortinar os motivos dessa tragédia disfarçada. Decidimos realizar uma abordagem sistematizada, que começamos em 2015, sobre a formação da rede estratégica da indústria do tabaco no Brasil, bem como da formação discursiva que coloca na arena do debate público atores diversos que fazem a defesa das empresas para que as próprias não necessitem usar vozes diretas. O Brasil tem uma situação sui generis. O grande número de famílias produtoras garante às empresas uma mobilização forte contra a agenda regulatória e em benefício da eleição de parlamentares ligados diretamente ao cigarro”, contam os autores.

    Foram quase quatro anos em que os repórteres se envolveram com extensa pesquisa, incluindo leituras de livros e de muitos textos, desde reportagens, passando por pesquisas acadêmicas de diversos níveis, até documentos legislativos e decisões judiciais. E, claro, pé na lama. Estiveram três vezes ao interior do Rio Grande do Sul e uma no Paraná para conversar com produtores, políticos, comerciantes, funcionários das grandes empresas, sindicalistas, técnicos do setor de saúde, membros de universidades, líderes de organizações da sociedade civil, empresários do setor tabagista, advogados e juízes.

    “Há muito o que dizer sobre o êxito da indústria do tabaco em causar confusão em torno de fatos Irrefutáveis, como os óbvios problemas de saúde causados pelo cigarro aos fumantes, mas, também, as questões de graves enfermidades geradas aos plantadores das folhas de tabaco, 150 mil famílias na região Sul do país e mais outras no Nordeste. E essa situação só se mantém graças ao lobby que envolve políticos de vários níveis e figurões do Poder Judiciário, inclusive que passaram pelo STF (Supremo Tribunal Federal). O livro busca desvendar essa rede”, concluem os autores.


    João Peres é autor de Corumbiara, caso enterrado (Elefante, 2015), livro-reportagem que esteve entre os finalistas do Prêmio Jabuti em 2016 e foi agraciado com o segundo lugar no Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo em 2015. Foi editor e repórter da Rede Brasil Atual entre abril de 2009 e novembro de 2014, após ter passado pelas redações das rádios Jovem Pan AM e BandNews FM. É tradutor do livro Uberização: a nova onda do trabalho precarizado, de Tom Slee (Elefante, 2017). Nos últimos anos tem se dedicado a investigar o setor privado. É um dos fundadores do site O joio e o trigo, especializado em política alimentar.

    Moriti Neto é jornalista, com passagens pelo site Rede Brasil Atual, pelas revistas Fórum e Caros Amigos, e pelo blog Nota de Rodapé. Também colaborou com jornais e sites do interior paulista. Recebeu o primeiro e o segundo lugar no Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo em 2014 e 2015, e o Prêmio Anamatra de Direitos Humanos em 2016, por reportagens produzidas para a Agência Pública. Como professor, coordenou o jornal Matéria-Prima, do curso de jornalismo da Unifaat, que em 2013 recebeu quatro menções no Prêmio Yara de Comunicação. É um dos fundadores do site O joio e o trigo, especializado em política alimentar.

    Serviço:

    ROUCOS E SUFOCADOS

    R$ 45,00

    FRETE GRÁTIS!

    Roucos e sufocados: a indústria do cigarro está viva, e matando

    Autores: João Peres & Moriti Neto

    Capa: Ana Carolina Soman

    Diagramação: Bianca Oliveira

    Projeto gráfico: Bianca Oliveira

    Editora Elefante

    Lançamento: agosto 2018

    Páginas: 308

    ISBN: 78-85-93115-16-5

    Dimensões: 14 x 21 cm

     

     

     

     

     

     

     

     

  • CIMI denuncia futuro genocídio – Moxihatëtëa: A violência contra os povos indígenas isolados na Amazônia e a omissão do governo

    CIMI denuncia futuro genocídio – Moxihatëtëa: A violência contra os povos indígenas isolados na Amazônia e a omissão do governo

    Ao tomar conhecimento do provável assassinato de dois indígenas isolados Moxihatëtëa por garimpeiros na região da Serra da Estrutura, no interior da Terra Indígena (TI) Yanomami/RR, através da denúncia encaminhada pela Hutukara Associação Yanomami – HAI ao Ministério Público Federal no dia 24 de julho, o Conselho Indigenista Missionário – Cimi vem a público alertar para o risco de extermínio dos povos indígenas isolados na Amazônia e manifestar a sua indignação diante do absoluto descaso e irresponsabilidade do governo brasileiro frente à invasão dos territórios desses povos.

    Era previsível, diante do aumento da presença garimpeira na Terra Yanomami, de total conhecimento das autoridades, que os indígenas isolados estavam sujeitos à violência dos invasores – ainda mais depois de denúncia semelhante, em 2017, sobre um possível massacre de indígenas isolados praticado também por garimpeiros, no rio Jandiatuba, na TI Vale do Javari/AM, até o momento não confirmada nem desmentida pelas autoridades.

    Em outubro de 2017, constatando o avanço do garimpo na região da Serra da Estrutura, o MPF/RR fez um alerta de ameaça de genocídio do povo isolado Moxihatëtëa e moveu uma Ação Civil Pública, com pedido de liminar, contra a União, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Estado de Roraima “para que sejam tomadas as medidas necessárias ao pronto restabelecimento das atividades permanentes nas Bases de Proteção Etnoambiental (BAPEs) das terras indígenas Yanomami […] com fornecimento de recursos materiais e humanos necessários para fiscalizar e inibir a ação de garimpeiros nas comunidades, bem como garantir o bem-estar da população local e a preservação dos recursos naturais das terras indígenas”[1].

    É ainda mais alarmante constatar que não se trata de um caso isolado. A vida dos povos indígenas isolados está ameaçada em toda a Amazônia

    Alerta semelhante foi feita pelo Cimi no Fórum Permanente da ONU para Questões indígenas, em abril deste ano: “Os invasores constituem uma ameaça constante à vida dos Yanomami considerados como de recente contato, e particularmente à vida do grupo Yanomami isolado conhecido como Moxi Hatëtëa, que habita a região da Serra da Estrutura”[2]. Além do risco de novas mortes violentas, a presença permanente e intensa de garimpeiros na região próxima aos Moxihatëtëa pode ser, ainda, um foco de enfermidades, como é o caso do sarampo, que alcançou recentemente o território Yanomami.

    Nem o Judiciário, instado pelo alerta do MPF sobre o “perigo de demora da solução da demanda”, se pronunciou a respeito, nem o governo federal, que por expressa determinação constitucional (Art. 231) tem o dever de proteger e fazer respeitar todos os bens indígenas, tomou providências diante da gravidade da situação.

    É ainda mais alarmante constatar que não se trata de um caso isolado. A vida dos povos indígenas isolados está ameaçada em toda a Amazônia. É o que pode ser constatado por exemplo como os Awá Guajá na TI Arariboia (MA), os isolados da TI Vale do Javari (AM), os isolados da TI Uru-Eu-Wau-Wau (RO), os isolados Kawahiva do Rio Pardo (MT), os isolados da região transfronteiriça do Acre com o Peru, os isolados da Ilha do Bananal (MT/TO), os isolados da TI Marmelos (AM) e os isolados da bacia do rio Tapajós.

    A defesa da vida desses povos também é a defesa do futuro da Amazônia e de tudo o que ela representa para os demais cidadãos brasileiros, para a humanidade e para o planeta

    Estes povos, dentro ou fora das terras indígenas, estão completamente expostos à invasão de garimpeiros, madeireiros, narcotraficantes, caçadores e pescadores, que encontram enormes facilidades de entrar nos territórios indígenas, e são ameaçados pelo avanço do desmatamento e de monocultivos, pela poluição dos rios com mercúrio e agrotóxicos, por queimadas florestais e pelos impactos de projetos de infraestrutura.

    Essa realidade se agravou ainda mais com o corte drástico e sistemático dos recursos orçamentários destinados à Coordenadoria Geral de Índios Isolados e Recente Contato (CGIIRC) da Funai, que em 2018 são 70% menores em comparação com o montante disponível em 2014. Tal situação tem repercussão direta nas onze Frentes de Proteção Etnoambiental da Funai, paralisando ou limitando sobremaneira as ações de campo de suas Bases de Proteção (BAPEs).

    Fazemos um apelo às autoridades, para que tomem com urgência as medidas necessárias e adequadas, e à sociedade brasileira, para que se mobilize pelo fim da violência contra os povos indígenas isolados e pela garantia da proteção e demarcação de seus territórios. A defesa da vida desses povos também é a defesa do futuro da Amazônia e de tudo o que ela representa para os demais cidadãos brasileiros, para a humanidade e para o planeta.

     

    Conselho Indigenista Missionário
    30 de julho de 2018

     

    [1] Informação do site do MPF: MPF propõe ação para reativar bases de proteção etnoambiental da terra Yanomami
    [2] Conferir: Fragilidade na proteção aos povos indígenas isolados é denunciada às Nações Unidas

    Artigo original em: https://www.cimi.org.br/2018/07/moxihatetea-a-violencia-contra-os-povos-indigenas-isolados-na-amazonia-e-a-omissao-do-governo/

  • Parque do Ibirapuera, o primeiro da lista das privatizações de Doria Jr.

    Parque do Ibirapuera, o primeiro da lista das privatizações de Doria Jr.

    A privatização dos parques municipais (parte do grande plano de desestatização, de João Doria Jr. assumido por Bruno Covas (PSDB), está acelerado e atropelando tudo.

    A “argumentação” sobre melhorar a gestão e desonerar a Prefeitura (o mantra de sempre), desconsidera princípios do Plano Diretor do Município e a necessidade de PRIMEIRO construir instrumentos específicos de gestão (plano de manejo·, plano de gestão, zoneamento), como afirmam várias entidades e movimentos, de defesa dos parques e especialistas. O Coletivo Direito a CIdade ( veja o texto completo logo abaixo) explica:

    “ A própria Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, no âmbito do Programa Ambiente Verde e Saudável (PAVS), com recursos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) produziu em 2008, em parceria com o Instituto Socioambiental a publicação “Parques Urbanos Municipais de São Paulo – Subsídios para a Gestão”, onde recomenda que se elaborem esses instrumentos, de forma participativa, para cada parque, sugerindo seu conteúdo mínimo”

    Todo o processo atropelado de destatização, em especial dos parques, não tem levado em consideração muitas questões levantadas pelas entidades, que criticam os processos de debate com a sociedade, e os rumos do tratamento dos bens de interesse PÚBLICO.

    O parque do ibirapuera é o primeiro da lista e tem mobilizado ações de discussão de todo o projeto de privatização.

     

    AMANHÃ acontece da Câmara de Vereadores de São Paulo uma conversa pública para falar do projeto de privatização dos Parques da Cidade de São Paulo, em especial do Parque Ibirapuera. Das 11h às 14hs Auditório Pedroso Horta, 1º sub-solo.

     

     

     

     

    Plano Municipal de Desestatização– Algumas considerações específicas sobre parques e praças

    Do Coletivo Direito à Cidade

     

    Os parques e praças são equipamentos públicos que integram o patrimônio ambiental da cidade, e, por esse motivo, entendo que deveriam ter excluídos do PL 367/2017 e serem objeto de um projeto de lei específico, pelos seguintes motivos principais.

    • Os parques e praças são tratados no capítulo V do Plano Diretor Estratégico – “Do sistema de áreas protegidas, áreas verdes e espaços livres”. O conjunto dessas áreas, conforme o parágrafo segundo “é considerado de interesse público para o cumprimento de funcionalidades ecológicas, paisagísticas, produtivas, urbanísticas, de lazer e de práticas de sociabilidade”. Essas funções não são mencionadas no PL 367/2017;

    • Os parques integram o Sistema Municipal de Áreas Protegidas, Áreas Verdes e Espaços Livres. (SAPAVEL) Dentre as ações prioritárias do SAPAVEL está a elaboração do Plano Municipal de Áreas Verdes e Espaços Livres (artigo 288, inciso II), incluído na última versão do Plano de Metas. É esse o plano que deverá: I) definir tipologias de áreas verdes e espaços livres; II) criar novas categorias de parques municipais e áreas verdes; III) analisar e enquadrar parques existentes e propostos, inclusive reenquadrando-os quando necessário. Isso porque os 107 parques existentes e os 164 parques propostos pelo PDE tem diferentes características e a definição do que pode ou não pode ser concedido deve levar em conta as diferentes tipologias de parques. E, portanto, estabelecer qualquer instrumento que trate da desestatização de parques e áreas verdes sem realizar o Plano é precipitado e inseguro, porque não temos um instrumento norteador.

    Seis dos 107 parques municipais existentes são Unidades de Conservação e, portanto têm regramento específico federal, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o qual precisa ser considerado na decisão do que deve ou não ser objeto de concessão;

    • Os parques municipais paulistanos têm Conselhos (Lei Municipal 15.910/, de 27 de novembro de 2013). Qualquer instrumento de desestatização de parques precisa ser discutido com tais Conselhos, cujas atribuições, previstas no artigo 10 dessa lei, não deixam dúvidas que devem opinar sobre qualquer instrumento de desestatização. Não basta, como afirmou o Secretário, que “os Conselhos Serão mantidos porque estão previstos em lei”. O que precisa ficar claro – e o PL sequer cita – é a participação dos Conselhos, desde a definição dos termos de qualquer instrumento de desestatização, concessão ou parceria até a forma de prestação de contas à sociedade.

    • Os parques municipais não tem instrumentos específicos de gestão (plano de manejo[1]·, plano de gestão, zoneamento). A própria Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, no âmbito do Programa Ambiente Verde e Saudável (PAVS), com recursos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) produziu em 2008, em parceria com o Instituto Socioambiental a publicação “Parques Urbanos Municipais de São Paulo – Subsídios para a Gestão” (VEJA QUI O DOCUMENTO COMPLETO), onde recomenda que se elaborem esses instrumentos, de forma participativa, para cada parque, sugerindo seu conteúdo mínimo.  Esse instrumento (plano de manejo, plano de gestão , zoneamento, a depender do tamanho e característica do parque), visa estabelecer, de forma socialmente pactuada) – ou seja, no mínimo com aprovação do conselho – diretrizes para a gestão de cada parque, que deveriam nortear as concessões. Sem isso, seria precipitado e prematuro.

    • Quanto às praças, a Lei 16703/2017 poderia ter considerado o disposto na Lei 16.212/2015 – gestão participativa de praças.

    Os motivos acima, que não esgotam o assunto, justificariam a retirada dos parques e praças da Lei e a elaboração de um PL específico ou, pelo menos, a inclusão de um capítulo específico para os parques no substitutivo, que assegure o controle social, condicione o lançamento de editais de concessão à prévia construção do plano do SAPAVEL, e estabeleça no mínimo a obrigatoriedade de elaboração, pela SVMA ou pela concessionária (nesse caso, sob orientação da SVMA) de um conjunto de diretrizes, aprovadas pelo Conselho, para a gestão do parque, a serem executadas pela concessionária.

    Isso foi reivindicado durante o processo de discussão do PL 367, que deu origem à lei, na Câmara Municipal, mas infelizmente não foi considerado.

    [1] Exceção feita ao Parque Natural Fazenda do Carmo, único Parque Natural Municipal com plano de manejo publicado.

  • MST MG lança Campanha de 30 anos com mais uma ocupação nas terras de Eike Batista

    MST MG lança Campanha de 30 anos com mais uma ocupação nas terras de Eike Batista

    Na madrugada desta terça-feira, 03|07, cerca de 400 famílias do MST ocuparam mais uma área da empresa em processo de falência, MMX, pertencente ao corrupto Eike Batista. A fazenda está localizada no município de Igarapé. A ação inicia a campanha de memória do movimento, “30 anos de MST em Minas Gerais, semeando e alimentando a ousadia”.

    “É na prática da ocupação que demonstramos nosso compromisso com a resistência contra o golpe, com a luta pela terra e contra as elites que entregam nossos bens naturais de presente ao capital internacional”, explica Mirinha Muniz, da Direção Estadual do MST. Sabemos que esse empresário possui mais de 10 mil hectares de terra no entorno de Belo Horizonte. “Aqui temos o exemplo dos danos causados por essa empresa falida: a mineração ao lado da água, degradando o meio ambiente, enquanto a terra que poderia ser produtiva está abandonada”, completa a dirigente.

    Após três décadas organizando a luta pela terra, pela reforma agrária e pela transformação social, o MST em Minas Gerais possui 42 assentamentos, 4 cooperativas de produção e comercialização, 41 acampamentos e três mil famílias acampadas. “Nossa trajetória é vitoriosa. Diante da conjuntura conturbada que vivemos no país, achamos que este é o momento de resgatar as nossas memórias, entender o passado para apontar os nossos próximos passos. E não temos dúvida de que nosso futuro é de luta”, afirma Wagner Vieira, da Direção Estadual do MST.

    No dia 02 de julho de 1999 o MST realizava a primeira ocupação na região Metropolitana de Minas Gerais, no município de Betim. Atualmente o assentamento, que leva a data de sua ocupação como nome, possui 63 famílias e uma vasta produção de hortaliças agroecológicas, frutas, mandioca, milho, galinha caipira, entre outros. A campanha dos 30 anos segue com ações nas 9 regionais onde o MST está organizado. A ocupação também é uma homenagem ao militante do movimento José Nunes, o Zequinha, que faleceu na última sexta-feira, 22|06.

  • O que eles querem ver?

    O que eles querem ver?

    Por Mauro da Silva com o apoio de Miriã Bonifácio para o Jornal A Sirene (jornalasirene.com.br)

    Em Mariana, o “casarão” da Fundação Renova/Samarco, localizado na Praça Gomes Freire, está continuamente servindo como ponto turístico da cidade, onde são expostas maquetes referentes ao local de reassentamento de Bento Rodrigues e repassados conhecimentos sobre o processo de reparação das comunidades atingidas a partir do ponto de vista da fundação/empresa. Também foi iniciado o programa VimVer, vinculado à área de atuação de Diálogo Social da Renova/Samarco, em que são oferecidas visitas monitoradas com especialistas dessa fundação/empresa nas áreas atingidas de Bento, Paracatu e Gesteira. Tendo em vista isso, foi encaminhada uma carta da Comissão dos(as) Atingidos(as) de Mariana à Renova/Samarco solicitando o transporte e a alocação das maquetes para a Casa dos Saberes. Isso porque se entende que, com tais medidas, a empresa usa ações obrigatórias de reparação para fazer propaganda de si mesma. E, ainda, utiliza recursos e espaços em desigualdade com o dos(as) atingidos(as) para criar a sua versão da história. Diante disso, reafirma-se que toda e qualquer informação que diz respeito a estes territórios deve ter o consentimento das pessoas proprietárias destas terras (e memórias).

    “VimVer o quê?” O que a Renova ou a Samarco estão fazendo? Esse é um projeto muito audacioso por parte da fundação/empresa, de entrar em um território que, embora ela tenha todo um interesse, não lhe pertence, nem à Vale ou à BHP Billiton, e sim ao povo, no caso de Bento, um povo sofrido que, durante três séculos, lutou para ter o seu lugar. Eu sou de uma geração que vem dos fundadores de Bento Rodrigues. Portanto, sou testemunha de que a Samarco sempre pleiteou esse espaço. Agora, por meio desse programa, a gente vê que ela se sente dona do que diz respeito à nossa comunidade, e está querendo se sentir dona também de Paracatu e das demais áreas que foram atingidas por essa tragédia-crime.

    “Assim, somos enfáticos em dizer que nada que diz respeito às nossas comunidades pode ser feito sem a participação direta dos(das) atingidos(as).”

     

     

    Então, esse Projeto VimVer é uma afronta à nossa dignidade, uma falta de respeito com o sentimento daqueles que perderam tudo, que perderam seus entes queridos. E ainda é um projeto que visa criar uma cortina de fumaça sobre aquilo que foi feito até agora em se tratando da nossa reparação. A Renova/Samarco, ao invés de reparar os danos que sofremos, vem causando violações ainda maiores. Eu, então, pergunto, como tive a oportunidade de questionar o Roberto Waack (Presidente da Fundação Renova) durante reunião realizada no dia 4 de maio, em que ele nos disse que esse não é um projeto voltado inteiramente para o turismo, que é um programa que vai levar estudantes, pesquisadores e aquela conversa de sempre, mas que, na verdade, vemos como algo que estou batizando de “turismo da desgraça”: “VimVer o quê?”. Assim, somos enfáticos em dizer que nada que diz respeito às nossas comunidades pode ser feito sem a participação direta dos(das) atingidos(as). Isso que estão fazendo está nos ferindo de morte. Estamos resistindo e lutando pelo tombamento dos nossos espaços, porque acreditamos que é isso que vai resguardar que esse território continue pertencendo a quem é de direito. E que não se enganem, pois, na versão do bandido, ele sempre é a vítima.

    Leia a matéria em seu site original: http://jornalasirene.com.br/manifestos/2018/06/13/o-que-eles-querem-ver