Jornalistas Livres

Categoria: desobediência civil

  • EDITORIAL – HOJE É DIA DE LUTO! PERDEMOS O MENINO GABRIEL

    EDITORIAL – HOJE É DIA DE LUTO! PERDEMOS O MENINO GABRIEL

    Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10
    Gabriel e Lula: aniversário no mesmo dia: 27/10

    Perdemos um camarada valoroso, um menino negro encantador de feras, um sorriso no meio das bombas e da violência policial, um guerreiro gentil que defendeu com unhas e dentes a Democracia, a presidenta Dilma Rousseff durante todo o processo de impeachment, e o povo brasileiro negro e pobre e periférico, como ele.

    Gabriel Rodrigues dos Santos era onipresente. Esteve em Brasília, na frente do Congresso durante o golpe, em São Paulo, nas manifestações dos estudantes secundaristas; em Curitiba, acampando em defesa da libertação do Lula. Na greve geral, nas passeatas, nos atos, nos encontros…

    O Gabriel aparecia sempre. Forte, altivo, sorrindo. Como um anjo. Anjo Gabriel, o mensageiro de Deus

    Estamos tristes porque ele se foi hoje, no Incor de São Paulo, depois de um sofrimento intenso e longo. Durante três meses Gabriel enfrentou uma infecção pulmonar que acabou levando-o à morte.

    Estamos tristíssimos, mas precisamos manter em nossos corações a lembrança desse menino que esteve conosco durante pouco tempo, mas o suficiente para nos enriquecer com todos os seus dons.

    Enquanto os Jornalistas Livres estiverem vivos, e cada um dos que o conheceram viver, o Gabriel não morrerá.

    Porque os exemplos que ele deixou estarão em nossos atos e pensamentos.

    Obrigada, querido companheiro!

    Tentaremos, neste infeliz momento de Necropolítica, estar à altura do Amor à Vida que você nos deixou.

     

     

    Leia mais sobre quem foi o Gabriel nesta linda reportagem do Anderson Bahia, dos Jornalistas Livres

     

    Grande personagem da nossa história: Gabriel, um brasileiro

     

     

     

     

  • Basta de Bolsonaro! O Brasil não pode ser governado por um genocida confesso

    Basta de Bolsonaro! O Brasil não pode ser governado por um genocida confesso

    Por Dacio Malta*

     

    Com pouco mais de 500 dias de governo, Jair Bolsonaro já reúne condições mais do que suficientes para que sofra um processo de impeachment.

    O capitão foi eleito com 57 milhões de votos, sendo que oito milhões foram de órfãos de Alckmin, Amoedo, Meirelles, Marina e Álvaro Dias —todos arrependidos ou envergonhados. Mas ele não tem 57 milhões de votos. Ele teve. Hoje recebe o apoio de menos de 30% da população, se tanto.

    Bolsonaro não pode ser condenado pelo seu passado. Este é conhecido. Sempre disse que nada mudaria no país através do voto. Para ele, o golpe de 64 errou ao não matar 30 mil. Sempre foi a favor da tortura, e seus pronunciamentos eram racistas, misóginos e homofóbicos.

    E 2018 o absolveu.

    Não se deve culpá-lo pelo alinhamento aos Estados Unidos, mas sim ao presidente Donald Trump. Ele repetiu várias vezes que o idolatra. Nem a sua fanfarronice em favor do governo de Netanyahu —embora ele nada saiba sobre o Holocausto  , e muito menos de qualquer coisa que diga respeito ao povo judeu. Israel para ele é vestir uma túnica branca e molhar a cabeça no rio Jordão.

    Não se pode execrá-lo por seguir os “ensinamentos” do astrólogo, ideólogo e chantagista Olavo de Carvalho —responsável pela indicação de alguns dos mais desqualificados integrantes do governo, como os ministros da Educação e o das Relações Exteriores, além de figuras menores, mas não menos perigosas, como é o caso do presidente da Fundação Palmares.

    Ser pai de três milicianos foi o destino que traçou. Laranjinha, Carluxo e Bananinha são retrato fiel de um pai tosco e machista. Os ensinamentos que receberam foram mentir, prevaricar, conspirar e alimentar conflitos.

    Bolsonaro não deveria ser punido pelo ódio ao Exército, que o expulsou por tentativa da prática terrorista e quebra de disciplina.
    Muitos dos comandantes militares são irmãos, filhos ou netos de militares. A adoração pela Arma faz com que muitos procurem traçar o mesmo caminho. Bolsonaro, ao contrário, não encaminhou nenhum dos filhos para a carreira militar, pelo simples fato de que ele a odeia. Preferiu colocá-los na política, onde a imunidade parlamentar é uma porta escancarada para a impunidade, o caixa 2, as rachadinhas, a lavagem de dinheiro, o enriquecimento ilícito e outras  ilicitudes. O Exército serviu apenas para que ele chegasse à Câmara e lá permanecesse por 28 anos.

    Muitos militares estão nesse governo, mas pouquíssimos exercem o poder. Engana-se quem pensa que alguns o tutelam. Ele não respeita ninguém e, sempre que possível, humilha-os. Em dezembro de 2018, às vésperas de sua posse na presidência, exigiu do então comandante Eduardo Villas Bôas uma medalha por ato de bravura  —que teria praticado 40 anos antes. E o Exército, covardemente, se curvou a um reles capitão que foi expelido de suas fileiras.

    Bolsonaro não pode ser crucificado por não entender de economia, não ter programa de governo e ter em seu ministério pelos menos três corruptos conhecidos – os ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente), Ônyx Lorenzoni (Cidadania) e Marcelo Álvaro Antônio (Turismo).

    O capitão não deve ser culpado pelo convite ao ex-juiz Sérgio Moro para o papel de super ministro, apesar de humilhá-lo a ponto de o Marreco ser obrigado a pedir demissão. Hoje, os dois duelam. E ambos devem estar certos.

    Seu comportamento fascista contra a imprensa —desrespeitando o trabalho dos repórteres e insuflando anunciantes visando a falência dos jornais— também não é o suficiente para derrubá-lo.

    Nem mesmo todo o conjunto da obra levaria ao impeachment.

    O que condena Bolsonaro —e isso faz com que se torne urgente o seu afastamento do poder— é a escancarada sabotagem diante da maior e mais devastadora crise sanitária vivida pelo país, que prevê a morte de mais de 100 mil brasileiros até meados de agosto.

    Em 100 dias de pandemia, Bolsonaro não teve uma única palavra de consolo aos familiares das vítimas, não visitou um único hospital, demitiu dois ministros da Saúde, entregou a pasta a um capacho treinado para obedecer a ordens —por mais estúpidas que elas sejam, obrigando-o a assinar protocolos condenáveis, portarias assassinas, nomeação de despreparados, o desprezo constante à ciência e, mais recentemente, a camuflagem do número de contagiados e de mortos, falseando estatísticas e duvidando da veracidade dos atestados de óbitos. Humilhando, assim, médicos e familiares dos mortos, como se fosse possível desenterrar quase 40 mil cadáveres e realizar novas autópsias.

    É sabido que as subnotificações aumentariam em cerca de 20% a quantidade de óbitos pelo Covid-19, mas o general paraquedista que está comandando o Ministério da Saúde trabalha para reduzir esses números atendendo aos anseios do coveiro da nação.

    A exposição e o discurso diário contra o isolamento, a luta pela abertura do comércio, volta às aulas, o chamamento do povo para passear nas ruas, a sabotagem explícita diante da pandemia e o descaso à ciência  —são razões mais do que suficientes para que as instituições dêem um basta já.

     

    *Dacio Malta trabalhou nos três principais jornais do Rio – O Globo, Jornal do Brasil e O Dia – e na revista Veja.

    Leia mais Dacio Malta em:

     

    Com Bolsonaro, Brasil se torna o paraíso do Coronavírus

     

  • Barack Obama: “Como tornar este momento o ponto de virada para mudanças reais”

    Barack Obama: “Como tornar este momento o ponto de virada para mudanças reais”

     

     

     

     

    Segunda-Feira dia 1 de junho de 2020 Barack Obama compartilha em seu Medium (Medium é uma plataforma de publicação online) um texto cujo título:

     

    “How to Make this Moment the Turning Point for Real Change” 

     

     

     

    Em tradução livre:

    “Como tornar este momento o ponto de virada para mudanças reais”

     

    “À medida que milhões de pessoas em todo o país saem às ruas e levantam suas vozes em resposta ao assassinato de George Floyd e ao problema contínuo de justiça desigual, muitas pessoas se perguntam como podemos sustentar o momento para provocar mudanças reais”


    Barack Obama No Twitter

     

    Após o discurso de Trump em Rose Garden na segunda-feira, BarackObama voltou ao Twitter, citando o irmão de George Floyd, que falou no início do dia em Minneapolis.

    “Vamos fazer isso de outra maneira. Vamos parar de pensar que nossa   voz não importa e vota. Não apenas para o presidente … eduque-se e saiba em quem você está votando. E é assim que vamos atingi-los […] “

     

     

      Obama escreveu, anexando um clipe da NBC News do discurso de Terrence Floyd.

    https://twitter.com/BarackObama/status/1267606608953192449?s=20

     

     

     

     

     

    “Por fim, caberá a uma nova geração de ativistas moldar estratégias que melhor se ajustem aos tempos. Mas acredito que há algumas lições básicas a serem tiradas dos esforços passados ​​que merecem ser lembradas. […]

    […] Artistas e Ativistas como Kylie Jenner, Beyoncé, Madonna e  Lady Gaga, Dr Dre, Anitta, Snoop Dogg se manifestaram através do instagram, Chance the Rapper se manifestou na rua, Jordan, a marca do esportista Michael Jordan postou no seu instagram “faça parte da mudança. […]

    […] Primeiro, as ondas de protestos em todo o país representam uma frustração genuína e legítima ao longo de décadas de falha na reforma das práticas policiais e no sistema de justiça criminal mais amplo nos Estados Unidos. A esmagadora maioria dos participantes tem sido pacífica, corajosa, responsável e inspiradora. Eles merecem nosso respeito e apoio, não condenação – algo que a polícia de cidades como Camden e Flint compreendeu louvável.”Barack Obama no the Medium

     

     

     

    O chefe de polícia do condado de Camden, Joe Wysocki, que trabalha na cidade há décadas, juntou-se à linha de frente de uma marcha em Camden na tarde de sábado, ostentando seu uniforme, uma máscara protetora e um sinal de paz. Wysocki em comunicado por e-mail à Associated Press, disse:

     

    “Ontem foi outro exemplo de nosso compromisso contínuo e um diálogo muito real que estamos tendo com os moradores de Camden que tornaram nossa agência parte da estrutura desta cidade” […]

    […] Por outro lado, a pequena minoria de pessoas que recorreram à violência de várias formas, seja por raiva genuína ou por mero oportunismo, está colocando em risco pessoas inocentes, agravando a destruição de bairros que costumam ter poucos serviços e investimentos. e prejudicando a causa maior. Vi uma negra idosa sendo entrevistada hoje em prantos, porque o único supermercado do bairro havia sido destruído… o objetivo do protesto é aumentar a conscientização do público, destacar as injustiças e tornar desconfortáveis ​​os poderes… – e em uma democracia, que só acontece quando elegemos funcionários do governo que respondem às nossas demandas.

    […] Além disso, é importante entendermos quais níveis de governo têm maior impacto em nosso sistema de justiça criminal e nas práticas policiais…São prefeitos e executivos do condado que nomeiam a maioria dos chefes de polícia e negociam acordos coletivos com sindicatos policiais….Portanto, a questão é: se queremos trazer mudanças reais, a escolha não é entre protesto e política. Temos que fazer as duas coisas. Temos que nos mobilizar para aumentar a conscientização, e precisamos organizar e votar para garantir que elegemos candidatos que atuarão em reforma.”

     

     

    Cardi B no seu Twitter fala a respeito das saques que ocorrem nos Estados Unidos em resposta a morte de George Floyd

     

    “Eles saquearam em Minnesota e, por mais que eu não goste desse tipo de violência, é isso: marchas pacíficas demais, muitas hashtags de tendências e SEM SOLUÇÕES! As pessoas ficam sem escolha.”

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

    https://twitter.com/iamcardib/status/1265831359425073153?s=20

     

    Barack Obama:

     

    “Por fim, quanto mais específicos pudermos exigir demandas por justiça criminal e reforma da polícia, mais difícil será para os funcionários eleitos oferecerem apenas elogios à causa e depois voltarem aos negóciosE se você estiver interessado em tomar medidas concretas, também criamos um site dedicado na Obama Foundation para agregar e direcionar você a recursos e organizações úteis que lutam pela boa luta nos níveis local e nacional há anos… Se, daqui para frente, pudermos canalizar nossa raiva justificável em ações pacíficas, sustentadas e efetivas, esse momento poderá ser um verdadeiro ponto de virada na longa jornada de nossa nação para cumprir nossos ideais mais elevados.”

    Barack Obama se dirige também no seu Twitter no dia 29 de maio e publica sua declaração sobre a morte de George Floyd:

    https://twitter.com/BarackObama/status/1266400635429310466?s=20

    “Eu chorei quando vi o vídeo. Ele me quebrou. O’ joelho no pescoço ‘é uma metáfora de como o sistema detém tão negativamente os negros, ignorando os pedidos de ajuda”.

    – Barack Obama

     

    Seguindo o texto diz:

     

    “Isso não deveria ser ‘normal’ na América de 2020”. Barack Obama

     


    LEIA MAIS SOBRE O ASSUNTO EM:

     

    Policial americano tortura e mata no meio da rua homem negro que estava algemado

    Protestos se intensificam contra o assassinato de George Floyd

     

  • A quem interessa ser profeta do caos?

    A quem interessa ser profeta do caos?

    Por Jacqueline Muniz, Ana Paula Miranda e Rosiane Rodrigues
    Imagens de autoria dos Jornalistas Livres, capturadas em protestos, no último final de semana, em São Paulo e na França
    A advertência de não realização de manifestações políticas, fundada no medo e na promoção do pânico social, é um atentado à democracia, uma forma de extorsão de poderes, de dirigismo monopolista das pautas plurais e das reivindicações divergentes de sujeitos que são diversos em cor, classe, renda, gênero, orientação sexual, instrução, etc. A advertência sob a forma de ameaça produz paralisia decisória de lideranças, imobilismo social e lugares resignados de fala, que seguem aprisionados nas redes sociais, na política emoticon do “estamos juntos” até o próximo bloqueio, diante da comunhão de princípios com diferença de opiniões: “você deve ir ao shopping, mas não a passeata”.
    A fabricação de conjecturas apocalípticas e suposições catastróficas com roupagem analítica é um recurso de persuasão de via única, impositiva, que aponta para um sentido hierárquico e, até mesmo autoritário, de quem se acha portador de uma verdade ‘revelada’ sobre os atos políticos e de uma razão superior sobre os fatos da política. A fala profética é uma fala moralista, ilusionista, que, por meio do uso da fé e do afeto, inocula nas pessoas uma culpa antecipada por suas escolhas para desqualificar seus arbítrios e fazê-las rebanho dependente de um guia despachante do juízo final. Este projeto de poder necessita fazer crer que o pessimismo visionário e proselitista é mais real que a própria realidade vivida e que deve fazer parte do cálculo das ovelhas boas e más, dos aliados e opositores de ocasião. A fala profética serve aos senhores da paz, da guerra e do mercado, sem distinção. É um jogo ardiloso do ganha ou ganha em qualquer circunstância ou resultado obtido.
    A quem interessa ser o profeta do caos? Ao próprio profeta que, inventor do jogo do quanto pior melhor, sacrifica seus seguidores feito gado, gasta a tinta das representações com seu próprio manifesto e promove a tensão entre espadas para se manter como o grande  conselheiro conciliador.  
    Os profetas do caos são como uma fênix que ressurgem da crise que criam. Eles se apresentam como proprietários das representações políticas, à direita ou à esquerda, em cima e embaixo. Eles se oferecem como mediadores dos conflitos que provocaram, como tradutores intérpretes na Torre de Babel que criaram entre nós.  A ameaça (do caos, da morte e do cerceamento da liberdade) não serve como advertência. Os profetas do caos produzem o medo, moeda de troca fundamental para a construção de milícias, para vender os seus remédios (previsíveis, amargos e inócuos). Para eles, não importa se os doentes morrem ou vivem, o que importa é que, doentes ou não, consumam suas previsões do passado.
    É notório que as polícias no Brasil têm tradição em policiar eficazmente o entretenimento lucrativo dos blocos de carnaval, shows e aglomerações em campeonatos de futebol. Nesses casos, sua atuação se dá na manutenção do status quo dos públicos, constituída a partir das atividades de contenção e dispersão das multidões. Já para o controle de pessoas que ocupam o espaço público sob a forma de protestos de todos os matizes políticos, apesar de ser um fenômeno relativamente recente e não haver protocolos policiais escritos e validados, sabemos que esses eventos se tornam encenações, nas quais janelas são abertas para oportunistas de todas as ordens, para acertos de contas da polícia dos bens com a polícia do bem, incluindo os ‘caroneiros’ de manifestação que comparecem por motivos completamente alheios às pautas dos protestos.
    Nesses espetáculos públicos que encenam os jogos da política aprendemos coisas muito básicas, sejamos nós manifestantes ou espectadores: sempre haverá a presença de agentes infiltrados (que ajudam na contenção) e de provocadores, para providenciar a dispersão. A infiltração de agentes de inteligência por dentro dos movimentos sociais remonta uma antiga estratégia estadunidense da década de 1960. Ou seja, muito antes do surgimento dos Black Bloc. Nos últimos 60 anos, acumulou-se um aprendizado sobre o uso do espaço
    público relativo ao círculo do protesto (aglomeração, deslocamento,  ato de encerramento e dispersão) que permite que os movimentos saibam lidar com esses elementos internos. 
    Neste mesmo período aprendemos, também, que o que torna legítimo um protesto não é a quantidade de indivíduos reunidos em um território específico por um período de tempo determinado, mas os modos de ocupação do espaço público e a construção coletiva de uma agenda política que os mobilize e tenha impacto na sociedade. A produção de dossiês intimidatórios, com a participação de agentes públicos, também não é novidade. Os constrangimentos da exposição de dados acabam por jogar na lama do “tribunal digital” os adversários, fortalecendo a promoção de linchamentos virtuais, de direita ou de esquerda.
    O governo Bolsonaro não é o único que tem disseminado o medo para sabotar os mecanismos de cooperação e mobilização sociais, substituindo práticas de coesão por coerções e cruzadas moralistas vindas de cima, de baixo e ao redor. Discursos do medo contra ou a favor de Bolsonaro são péssimos conselheiros porque dão a #Elenão um tamanho e uma agilidade política irreal, retirando-o do isolamento político em que se encontra para nos fazer acreditar que, quando chegarmos às ruas, imediatamente um cabo e um soldado fecharão o Congresso, o STF e tirarão as emissoras e os portais de internet do ar. O medo transforma Bolsonaro num bicho papão, num monstro mítico incontrolável que atira hordas de zumbis (com cabelos tingidos de acaju) contra todos nós.
    O medo disseminado faz com que as pessoas vejam gigantes onde há sombras e abram mão de seus direitos e garantias em favor de um ‘libertário do agora’ que prometa proteção. Mas o profeta-liberador de hoje será o seu tirano de amanhã!
    O rigor científico não permite que nós, pesquisadores, determinemos como os movimentos sociais devem se comportar, nem que sejam pautados por oráculos que anunciam profecias que se autorrealizam. A contemporaneidade produziu os ativismos acadêmicos, mas eles não devem substituir jamais a liberdade dos sujeitos de decidir suas agendas, nem servir de chofer dos movimentos sociais em direção à “Terra sem Males”, um mundo idílico sem conflitos e, por sua vez, sem a política. A ciência pode contribuir com diagnósticos da realidade e oferecer alternativas que considerem, inclusive, que a negação dos conflitos monopoliza o debate e as representações, obscurecendo as negociações dos interesses em disputa. Quando a decisão científica está acima da pactuação social ela deixa de ser ciência e passa a ser doutrina, retira da sociedade a responsabilidade pelas escolhas que faz, para o bem e para o mal.
    Ao  olharmos a história vemos que os discursos de “lei e ordem” são utilizados sempre a serviço dos interesses do Estado e seus grupos de poder. Viver sob o jugo da espada não é novidade para as pessoas para quem o isolamento social é uma prisão histórica dos direitos de cidadania, e não um privilégio de classes. A juventude, principalmente a negra, conhece de perto a violência policial, e sabe que nem em casa está protegida.
    Sobre as autoras do texto: 
    JACQUELINE MUNIZ,antropóloga, professora da UFF.
    ANA PAULA MIRANDA, antropóloga, professora da UFF
    ROSIANE RODRIGUES, antropóloga, pesquisadora do INEAC/UFF.
  • Coronel da PM causou tumulto para provocar a repressão ao ato pela Democracia

    Coronel da PM causou tumulto para provocar a repressão ao ato pela Democracia

     

     

    O coronel Américo Massaki Higuti, oficial da reserva da Polícia Militar, foi o causador de uma briga que serviu de pretexto para a brutal repressão contra os manifestantes antifascistas que foram no domingo (1/6) à avenida Paulista  para defender a Democracia.

    Embora na reserva, o coronel Américo Higuti compareceu à avenida Paulista trajando uma farda do COE, Comando de Operações Especiais, tropa de elite da Polícia Militar de São Paulo. Acontece que o uso de uniforme é privativo dos militares em serviço ativo. Os militares da reserva e os reformados podem usar seus uniformes por ocasião de cerimônias sociais, militares e cívicas, categorias em que a manifestação de domingo na avenida Paulista definitivamente não se encaixa.

    O coronel Américo Higuti é um ativo apoiador de Jair Bolsonaro. Ele mantém três perfis no facebook, em que posta fotos ao lado de celebridades de extrema direita, como o príncipe destronado Luiz Philippe de Orléans e Bragança, Carla Zambelli e o próprio presidente.

     

    Xingamentos na travessia

     

    No domingo, ele participaria do ato em apoio a Bolsonaro e contra o STF (Supremo Tribunal Federal), que acontecia a um quarteirão de onde se reuniam os Torcedores pela Democracia –corinthianos, palmeirenses, sãopaulinos e santistas contra o fascismo.

    Um cordão de isolamento formado por uma fileira de policiais militares separava um grupo do outro. Apesar das provocações fascistas dirigidas ao grupo dos torcedores, a situação estava sob controle. Cada grupos gritava suas palavras de ordem e agitava suas bandeiras.

    Foi então que o coronel Américo Higuti, o sargento PM Valdani, também fardado irregularmente, já que é da reserva, e um manifestante bolsonarista embrulhado na bandeira brasileira decidiram atravessar a pé a manifestação dos torcedores pela Democracia e contra o Fascismo. O grupo estava sendo escoltado por um soldado fardado da PM.

     

    Ao se aproximarem, em atitude claramente provocativa, os homens foram advertidos. “Não entrem aí, vocês estão querendo briga? Não vão!” Mas foi inútil. Torcedores presentes na manifestação relataram aos Jornalistas Livres que o grupo bolsonarista do coronel Américo Higuti entrou, xingando, na concentração pela Democracia: “ladrões”, “vândalos” e “maconheiros” foram algumas das ofensas.

     

    O coronel Américo Higuti, ao sair do outro lado da manifestação, alegou ter sido espancado, esfaqueado e “vítima de uma emboscada”.

     

    O sargento Valdani, também da reserva, alegou ter sido violentamente agredido pelos Torcedores.

     

    Foi a senha para começar a repressão.

     

    Os PMs que atuavam na segurança dos atos entraram em alvoroço e começou a confusão. Arremessaram bombas contra os torcedores enquanto o coronel Américo Higuti conversava com um soldado, parecendo dar-lhe ordens.

     

    Quando a avenida Paulista já havia se transformado em uma praça de guerra, o coronel Américo Higuti ainda foi visto tomando água, ladeado por PMs, no posto móvel da polícia, em frente ao parque Trianon e ao Masp.

     

    Depois do ato, o coronel foi ao 78º Distrito Policial, denunciando ter sido agredido, esfaqueado, “vítima de uma emboscada” e “impedido de se manifestar livremente”. Mas as imagens mostram que, ao contrário, foi ele que armou contra os manifestantes. Quanto à facada, será mesmo que ocorreu? Um homem esfaqueado não estaria tranquilamente assistindo à repressão que desencadeou e, depois, tomando um copo de água com os soldados do posto móvel da PM. Nem muito menos dando entrevista na porta da delegacia para sites fascistas. 

     

    O sargento Valdani também conversou com blogs da extrema direita tão logo terminou de prestar queixa no 78º DP. Estava firme e forte. Estranhamente, logo depois, foi internado, alegando fortes dores causadas pelas supostas agressões dos torcedores.

     

     

    Jornalistas Livres encaminharam às 10h43 à assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo as seguintes questões. Recebemos a nota em resposta às 16h46.

     

    PERGUNTAS:

     

    Prezados senhores,

     

    (…) Gostaríamos de obter as seguintes informações:

     

    1. Qual o estado de saúde presente do coronel Américo Massaki Higuti? E do sargento Valdani?

     

    1. Por que o coronel Américo Massaki Higuti e o sargento Valdani compareceram à avenida Paulista trajando uniformes do Comando de Operações Especiais da Polícia Militar? PMs da reserva podem usar fardamento em atos políticos?

     

    1. Por que um policial militar da ativa escoltou os manifestantes pró-bolsonaro em sua passagem por dentro do grupo contra Bolsonaro, colocando em risco a segurança dos escoltados?

     

    1. Torcedores que entrevistamos dizem que a “provocação” do coronel Higuti foi o que deu pretexto para a repressão que se iniciou a partir daí. Gostaríamos que a PM descreva o fato que deflagrou a repressão.

     

    RESPOSTAS:

    Nota da Secretaria de Segurança Pública a respeito dos questionamentos feitos pelos Jornalistas Livres
    Nota da Secretaria de Segurança Pública a respeito dos questionamentos feitos pelos Jornalistas Livres

     

    Prezados senhores,

     

    (…) Gostaríamos de obter as seguintes informações:

     

    1. Qual o estado de saúde presente do coronel Américo Massaki Higuti? E do sargento Valdani?

     

    1. Por que o coronel Américo Massaki Higuti e o sargento Valdani compareceram à avenida Paulista trajando uniformes do Comando de Operações Especiais da Polícia Militar? PMs da reserva podem usar fardamento em atos políticos?

     

    1. Por que um policial militar da ativa escoltou os manifestantes pró-bolsonaro em sua passagem por dentro do grupo contra Bolsonaro, colocando em risco a segurança dos escoltados?

     

    1. Torcedores que entrevistamos dizem que a “provocação” do coronel Higuti foi o que deu pretexto para a repressão que se iniciou a partir daí. Gostaríamos que a PM descreva o fato que deflagrou a repressão.

     

    Leia mais sobre Manifestação dos Torcedores Antifascistas em:

     

    Torcedores antifascistas: Heróis da Resistência, Povo em Luta, nossos Panteras Negras

    Torcidas do Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo se unem contra o fascismo

     

     

  • Brasil e EUA: dois experimentos sociais falidos

    Brasil e EUA: dois experimentos sociais falidos

    Os episódios recentes de protestos no Brasil e nos EUA não deveriam surpreender. É compreensível que, em meio ao surto virótico, milhares de pessoas ocupem as ruas nas duas maiores nações do continente americano. A escalada de confrontos e violência reflete problemas estruturais em ambos os países que os caracterizam, até certo ponto, como “casos únicos” no mundo. Não que protestos violentos demandando igualdade, justiça social e melhores condições de vida não aconteçam em outras partes do globo. Mas Brasil e EUA possuem uma combinação maléfica entre passado e presente que os empurra a um conflito interminável caso mudanças profundas na economia e sociedade não ocorram.

    A similaridade entre os dois países torna insustentável a convivência pacífica em sociedade, conforme demonstrado pelo cotidiano violento e cruel aqui e acolá.  As diferenças entre Brasil e EUA não podem obliterar características comuns à formação e consolidação de suas estruturas econômica e social. É importante insistirmos que ambos nasceram da expansão comercial europeia entre os séculos XV e XVIII calcada no escravismo e que o capitalismo, em sua face mais livre e, portanto, selvagem, reina nas duas maiores economias do Novo Mundo. Forjados na crueldade do trabalho escravo e vitaminados pelo capitalismo sem peias, a guerra entre “vencedores” e “perdedores” é uma constante nas duas localidades. 

    À base fundante excludente que, desde o início, apartou os proprietários de terra brancos dos negros, indígenas, mestiços e brancos pobres, acrescentou-se a competição desregulada no mercado de trabalho e no sistema econômico como um todo, ausente da devida intervenção estatal necessária à amenização das injustiças e distorções oriundas da dinâmica capitalista. O resultado não poderia ser outro: dentre as nações industrializadas, Brasil e EUA possuem as maiores desigualdades econômicas e sociais. Em ambas as nações, riqueza e pobreza têm cores.  

    Repressão e violência nos EUA e no Brasil: o legado do escravismo e do capitalismo feroz
    Repressão e violência nos EUA e no Brasil: o legado do escravismo e do capitalismo feroz

    A desigualdade do ponto de partida foi aprofundada pela desenfreada, injusta e não-meritocrática concorrência capitalista, ampliando a distância entre ricos e pobres, brancos e negros, incluídos e excluídos. Os favorecidos inicialmente saíram na frente na corrida com um acúmulo de riqueza e propriedades e foram turbinados pelas políticas discriminatórias de educação, saúde, habitação, cultura, direitos e afins… o resultado é que ficou impossível, via trabalho, esforço ou mérito, alcançar os privilegiados. O Abismo ficou deveras grande. O capitalismo prometeu prosperidade mas entregou disparidade. Os ricos já deram voltas e voltas em cima dos excluídos na corrida da luta pela sobrevivência cotidiana. Impossível alcançá-los correndo. A única maneira é mudar o curso da corrida. Dar meia volta e cruzar a linha de chegada pelo outro lado. O problema é que na inversão, choca-se com quem está vindo na direção oposta. Ou esses viram e saem correndo para o mesmo lado, ou serão atropelados. Necessário lembrar que nessa colisão o número, a quantidade, leva vantagem. Ou toda a sociedade caminha para o mesmo lado, ou a violência continuará na ordem do dia.    

    O debate precisa, entretanto, ir além. Reivindicamos mesmas oportunidades, igualdades de condições. Mas igualdade de condições para que? Para competir? Para participarmos da corrida? Para continuarmos moendo pessoas através da concorrência por dinheiro? Mas será que precisa haver corrida? Será que precisamos competir e aniquilar o próximo em 2020?

    O passado e o presente dos dois países resultaram em um sistema no qual, independente da vontade individual, não importando quem ocupa determinada posição, os valores capitalistas, a exploração e a exclusão são permanentes.

    Criou-se um sistema no qual o narcisismo, o individualismo, o egoísmo, a competição tresloucada, o enriquecimento ilimitado, o consumo exacerbado e o culto ao corpo imperam. Tais atributos não são, obviamente, predicados brasileiros e estadunidenses, mas, sem dúvida, avançaram mais nesses dois países. E nesse sentido a fala de Cornel West, viralizada nas redes sociais, caminha nessa direção quando afirma que “Estamos testemunhando a América como um experimento social falido”.

    O sistema precisa mudar. Não adianta substituir um homem por uma mulher como CEO de um banco, se ela continuar ganhando 400 vezes mais do que o auxiliar de almoxarifado. Não adianta substituirmos um modelo branco por um modelo negro na propagando da Zara se a lógica consumista de destruição dos recursos terrestres permanecer. Não adianta darmos educação de qualidade se o objetivo é trucidar o próximo na entrevista de emprego. É inútil substituirmos as peças se o jogo continua o mesmo. Não se trata de indivíduos melhores ou piores, bons ou maus. Trata-se de relações perniciosas derivadas do próprio sistema; um sistema nocivo ao bem-estar coletivo que precisa urgentemente mudar.

    Temos por obrigação reconhecer que falhamos como sociedade. Permanentemente, excluímos mais que incluímos; destruímos mais que construímos. É preciso mudar a lógica do sistema, seus valores. Enaltecer o coletivo, o bem-estar, o amor ao próximo e não a competição, o individualismo, a diferença, a desigualdade, o “mérito”. É preciso libertar a humanidade do jugo mercantil. O momento é propicio para reflexões e atitudes que realmente mudem o sistema, transformem nossas vidas. Não dá mais para vivermos num mundo onde a maioria sofre. É insustentável. É impossível. É imoral. Uma bomba relógio.

    O ideal é que o nascimento de uma nova sociedade ocorra através das vias democráticas, sem violência. Mas parece que a democracia não funciona no mundo do livre-mercado. As histórias do Brasil e dos EUA mostram que no capitalismo selvagem, sem a devida mediação/proteção econômica e social do Estado, os interesses da maioria são relegados ao esquecimento. Isso é sentido na pele pelos excluídos. Que as forças democráticas se unam a favor de um mundo novo pois, é bom relembrar, a violência é a parteira da história.

    Daniel de Mattos Höfling

    é doutor em Economia

    pela Unicamp

    (Universidade Estadual de Campinas)

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