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  • Moro, Lava Jato e interesses dos EUA

    Moro, Lava Jato e interesses dos EUA

    O juiz Sérgio Moro é louvado em verso e prosa pelos meios de comunicação tradicionais, nacionais e estrangeiros. Foi “personalidade do ano” pelo Globo, esteve entre “as 100 personalidades mais influentes” da revista Time, alçado à condição de 13o entre “os maiores líderes mundiais” pela revista Fortune e 10o entre os mais influentes da agência de notícias financeiras Bloomberg.

    O que teria levado o juiz federal ao estrelato? Que apoios teria acumulado para se tornar uma quase unanimidade internacional? Certamente muitos se apressarão em concluir que foi seu trabalho destemido e incansável contra a corrupção. No entanto, outros tentaram e não tiveram sucesso com seus processos, nem tampouco viraram ídolos mundiais, muito ao contrário.

    As ocorrências com o juiz Fausto De Sanctis nos dão um exemplo marcante do caminho oposto ao de Moro. De Sanctis teve sua condenação do banqueiro Daniel Dantas revertida e toda a operação Satiagraha anulada, mesmo de posse da gravação da entrega da propina aos policiais federais para que paralisassem as investigações de lavagem de dinheiro e evasão de divisas no Banco Opportunity. Sua carreira, especializada em crimes financeiros, foi encerrada pela “promoção” ao Tribunal Regional Federal para atuar na área previdenciária.

    Por que os processos de Moro não tiveram a costumeira gaveta como destino? Qual teria sido seu diferencial?

    Alguns amigos do juiz paranaense declararam ao jornal Washington Post que sua abordagem pode ter sido influenciada pela exposição que teve aos processos legais nos Estados Unidos: ele participou de um programa especial na Universidade de Harvard em 1998 e de um programa para líderes potenciais em 2007, patrocinado pelo Departamento de Estado daquele país.

    As relações de Moro com as autoridades estado-unidenses já pareciam consolidadas quando ele “determinou em 2007 a criação de RG e CPF falsos e a abertura de uma conta bancária secreta para uso de um agente policial norte-americano, em investigação conjunta com a Polícia Federal do Brasil. No decorrer da operação, um brasileiro investigado nos EUA chegou a fazer uma remessa ilegal de US$ 100 mil para a conta falsa aberta no Banco do Brasil, induzido pelo agente estrangeiro infiltrado”, conforme reportagem dos Jornalistas Livres.

    Em seminário sobre o crime organizado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em maio de 2009, o juiz defendeu a delação premiada e revelou conhecimento sobre os métodos da justiça estado-unidense. Ele afirmou que “nos Estados Unidos entende-se como acordo precioso aquele que tem efeito dominó” e que “a sugestão de juiz dos Estados Unidos é pedir uma amostra ao delator com o compromisso de não utilizá-la, a não ser que haja acordo”.

    “Outra experiência que o juiz contou é de que, nos Estados Unidos, foi levada à Suprema Corte um caso em que delator grava declarações do investigado. Alguns sustentaram que isso era vedado, por entender que era autoincriminação. Os EUA, diz Moro, entenderam que o devido processo legal não protege quem confia na pessoa errada e que a autoincriminação só ocorre quando é feita diante de autoridade pública”, revela, ainda, a matéria do Consultor Jurídico.

    Projeto Pontes: Construindo Pontes para a Aplicação da Lei no Brasil

    No final de outubro, ainda em 2009, a comunicação interna da Agência de Contraterrorismo do Departamento de Estado dos EUA, vazada pelo Wikileaks, destacou a cooperação com juízes, procuradores e policiais brasileiros na realização de uma conferência, denominada Projeto Pontes, no Rio de Janeiro, financiada pela Agência. Sérgio Moro, que fez parte do time de apresentadores, falou sobre os casos de lavagem de dinheiro nas cortes brasileira. Os apresentadores estado-unidenses discutiram vários aspectos relativos à investigação e ao julgamento de casos de transações financeiras ilícitas e de lavagem de dinheiro, incluindo cooperação internacional formal e informal, arresto de bens, delação premiada, entre outros assuntos.

    Para os treinamentos futuros, o comunicado do Departamento de Estado sugere que: “Idealmente, o treinamento deve ser de longo prazo e coincidir com a formação de forças-tarefa de treinamento. Dois grandes centros urbanos com apoio judicial comprovado para casos de transações financeiras ilícitas, em particular São Paulo, Campo Grande ou Curitiba, devem ser selecionados como local para este tipo de treinamento. Em seguida, as forças-tarefa podem ser formadas, e uma investigação real utilizada como base para treinamento que evoluiria, sequencialmente, desde a investigação até a apresentação do caso no tribunal e a conclusão do caso. Isso proporcionaria uma experiência real aos brasileiros, em trabalhar em uma força-tarefa proativa, de longo prazo, de transações ilícitas e permitir o acesso a peritos dos EUA para orientação e suporte contínuos”. Destaque-se que a sugestão de “orientar” uma força-tarefa em um caso real ocorreu pouco mais de quatro anos antes do início da operação Lava Jato.

    O “monitoramento” da NSA sobre a comunicação da Petrobras

    O cientista político brasileiro Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira, ao unir as relações de Moro com os Estados Unidos, apontou, em entrevista ao Jornal do Brasil, que: “a Agência Nacional de Segurança (NSA), que monitorou as comunicações da Petrobras, descobriu a ocorrência de irregularidades e corrupção de alguns militantes do PT e, possivelmente, forneceu os dados sobre o doleiro Alberto Yousseff ao juiz Sérgio Moro, já treinado em ação multi-jurisdicional e práticas de investigação, inclusive com demonstrações reais (como preparar testemunhas para delatar terceiros)”.

    Moniz Bandeira denunciou que os prejuízos, causados pela Lava Jato à Petrobras, às construtoras e a toda a cadeia produtiva associada, ultrapassam “em uma escala imensurável” os prejuízos que dizem combater. Contabilizando a desestruturação, a paralisação e a descapitalização das empresas nacionais, públicas e privadas, ele pergunta: “a quem serve o juiz Sérgio Moro, eleito pela revista Time um dos dez homens mais influentes do mundo? A que interesses servem com a Operação Lava Jato? A quem serve o procurador-geral da República, Rodrigo Janot?”

    Os crimes apurados nos EUA e na Europa não destruíram as corporações que os cometeram

    Na mesma linha de Moniz Bandeira, o professor de Economia Política Internacional da UFRJ, Maurício Metri, observou, na GGN, que os vazamentos de Snowden, em 2013, já revelavam que um dos alvos da espionagem da NSA era a Petrobras. O que torna absolutamente plausível a conclusão que informações sobre a empresa devam ter sido repassados aos operadores da Lava Jato. Processo que culminou com “uma conjuntura que tem fragilizado a própria empresa para além do necessário à averiguação de responsabilidades por malversações, forçando-a a se desfazer de ativos estratégicos e comprometendo a cadeia produtiva ligada a ela”.

    O contexto político produzido abriu espaço para a mudança do marco regulatório que dava prioridade à Petrobras na exploração do pré-sal. Metri complementa: “em nome do combate à corrupção, acaba-se por retirar do Estado brasileiro sua capacidade de iniciativa estratégica no setor, atendendo aos objetivos geopolíticos de outros países e de suas respectivas empresas nacionais”.

    Para Metri as potências estrangeiras perceberam a política externa autônoma exercida pelo Brasil nos últimos governos, a política de defesa com acesso à energia nuclear e as grandes reservas descobertas de petróleo. O professor finaliza: “alguns dos alvos da operação Lava Jato constituem-se pilares deste conjunto de iniciativas. Sob a névoa das disputas políticas domésticas, as conexões estrangeiras da operação Lava Jato ainda não estão claras, mas seus efeitos já se fazem sentir.”

    O Brasil se insinuava forte candidato a tornar-se uma potência média, o que gerou imediatas hostilidades da Superpotência, os EUA, aponta Bruno Lima Rocha, mestre e doutor em ciência política pela UFRGS. “Assim, simplesmente não estamos negando a existência de corrupção, ou mesmo de corrupção estrutural. Afirmamos sim que para a Superpotência, as acusações de práticas empresariais criminosas são um recurso de guerra, uma arma com emprego tático, assim como o uso da força ou da espionagem. Logo, o alvo estratégico da relação EUA com os frutos das delações da Lava Jato, é o desmonte da Petrobras e das empresas de engenharia complexa operando a partir do Brasil.”

    Uma bactéria alienígena que se nutria de frações de classes nacionais

    “Os órgãos de inteligência americanos, ao passarem as informações da Petrobras, inocularam uma bactéria perigosa no organismo institucional brasileiro, mas que, provavelmente, poderia ter sido contida por anticorpos institucionais básicos em sua fase inicial”, asseverou o estudo A Guerra de Todos contra Todos: A Crise Brasileira, do Instituto de Economia da UFRJ.

    A flagrante desestruturação econômica, política e institucional do país atende os interesses externos, especialmente dos EUA, na medida em que “(i) possibilita a abertura da exploração do pré-sal para as empresas estrangeiras; (ii) retarda/paralisa o projeto nuclear brasileiro; (iii) desestabiliza o engajamento do Brasil aos arranjos configurados pelos BRICS; e (iv) desestabiliza a presença das empresas de construção civil nacional na América Latina e África, abrindo mercados para novos entrantes”, complementa o estudo.

    “[…] o projeto político aliado com a Lava Jato não se importa com a ‘‘justiça’’, somente em perpetuar uma crise política viciosa como meio de arrastar a sétima maior economia do mundo para a lama”, já afirmava Pepe Escobar antes do impedimento de Dilma Rousseff.

  • Movimentos sociais: prestem atenção a essa expressão em inglês: “Lawfare”! Quem será a proxima vítima?

    Movimentos sociais: prestem atenção a essa expressão em inglês: “Lawfare”! Quem será a proxima vítima?

    O Washington Post, de 23/dez/2015, publicou uma matéria sobre o juiz Sérgio Moro que contém o seguinte parágrafo:

    Em 1998, Moro e Gisele Lemke, uma juíza federal amiga dele, passaram um mês em um program especial na Escola de Direito de Harvard. Em 2007, Moro participou de um curso de 3 semana para potenciais líderes patrocinado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América.

    A Operação Lava Jato representa um típico exemplo de Lawfare, no seu sentido mais amplo e atual: trata-se da utilização de meios judiciais frívolos, com aparência de legalidade para cooptação da opinião pública, com o inegável objetivo de neutralizar o inimigo eleito – Lula. Assim os advogados de Lula argumentam contra as teses da acusação.

    Em outras palavras, o defensores de Lula acusam Moro e envolvidos na Lava Jato de usar a lei para, através de ações inconsistentes e de pouca importância, tentar deslegitimar e incapacitar Lula perante a opinião pública, que é exatamente o objetivo de Lawfare.

    Teria sido essa a instrução passada ao juiz em curso do Departamento de Estado dos EUA?

    Como surgiu a expressão e a tática Lawfare?

    A origem da palavra Lawfare (“Lawfare” que se pronuncia “lofér”, com “o” aberto) é a junção das palavras law, que é lei (e se pronuncia “ló”), e warfare, que significa arma de guerra (e se pronuncia “uorfér”, com “o” aberto). Lawfare passou, assim, a referenciar o uso da lei como uma arma de guerra.

    No primeiro uso da palavra, os autores, John Carlson e Neville Yeomans, em um ensaio de 1975, consideravam Lawfare uma tática de paz, em que a guerra dava lugar à disputa por leis: “um duelo de palavras em vez de espadas”.

    A definição que disseminou o uso comum da expressão foi dada pelo coronel da Força Aérea dos EUA, Charles Dunlap, em 2011. Lawfare é “a estratégia do uso – ou mau uso – da lei como um substituto dos meios militares tradicionais para alcançar um objetivo operacional.”

    Aqui o site lawfareproject.org inclui fins políticos:

    Lawfare significa o uso da lei como uma arma de guerra. Denota o abuso das leis ocidentais e sistemas judiciais para conseguir fins militares estratégicos ou políticos. Lawfare é inerentemente negativa. Não é uma coisa boa. É o oposto da busca de justiça. É a apresentação de processos judiciais frívolos e mau uso de processos legais para intimidar e frustrar adversários no teatro de guerra. Lawfare é o novo campo de batalha legal.

    Susan Tiefenbrun define lawfare: “é uma arma projetada para destruir o inimigo através do uso, mau uso e abuso do sistema legal e dos meios de comunicação, para levantar o clamor público contra aquele inimigo.”

    A defesa de Lula acusa a Lava-Jato

    A defesa de Lula enumera 11 táticas Lawfare utilizadas pela Operação Lava-Jato:

    – Manipulação do sistema legal, com aparência de legalidade, para fins políticos;

    – Utilização de processos judiciais sem qualquer mérito;

    – Abuso do direito para danificar e deslegitimar um adversário;

    – Promoção de ações judiciais para descredibilizar o oponente;

    – Tentativa de influenciar opinião pública: utilização da lei para obter publicidade negativa;

    – Judicialização da política: a lei como instrumento para conectar meios e fins políticos;

    – Promoção de desilusão popular;

    – Crítica àqueles que usam o direito internacional e os processos judiciais para fazer reivindicações contra o Estado;

    – Utilização do direito como forma de constranger e punir o adversário;

    – Bloqueio e retaliação das tentativas dos atores políticos de fazer uso de procedimentos disponíveis e normas legais para defender seus direitos;

    – Acusação das ações dos inimigos como imorais e ilegais, com o fim de frustrar objetivos contrários.

    Notas

    1 Para ter acesso à defesa completa de Lula, apresentada por Cristiano Zanin Martins, Roberto Teixeira e Valeska Teixeira Zanin Martins veja em: http://www.abemdaverdade.com.br/2/Noticias/DefesaIdentificaTaticasDeLawfareEmDenunciaContraLula_381/

    2In 1998, Moro and Gisele Lemke, a fellow federal judge, spent a month in a special program at the Harvard Law School. In 2007, Moro participated in a three-week course for potential leaders sponsored by the U.S. Department of State.” Esse é o parágrafo no original e texto completo do Washington Post sobre Moro está no endereço:

    https://www.washingtonpost.com/world/the_americas/brazils-new-hero-is-a-nerdy-judge-who-is-tough-on-official-corruption/2015/12/23/54287604-7bf1-11e5-bfb6-65300a5ff562_story.html

    3 A juíza Gisele Lemke, da 2ª Vara Federal de Curitiba, participa das questões cíveis da Lava Jato.