O governo brasileiro já não reconhece os diplomatas de Maduro. No dia 4 de setembro, foi lançado um comunicado oficial do Ministério de Relações Exteriores dizendo que o corpo diplomático, assim como membros administrativos, são ‘personae non gratae’, ou seja, não são bem vindos no Brasil.
Mas o que isso significa na prática? Segundo o advogado Gustavo Jorge Silva, de acordo com a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas (CVRD), os diplomatas estrangeiros têm algumas imunidades, como impossibilidade de prisão, a própria residência deles também é inviolável, assim como a embaixada. No caso a embaixada continua sendo um espaço protegido por lei, mas não as residências dos diplomatas.
Tendo em conta toda a história de cooperação entre o Brasil e a Venezuela, nem os próprios apoiadores de Bolsonaro estão felizes com isso, como é o caso do senador Telmário Mota (PROS/RR), que explicitou seu descontentamento em um ofício dirigido ao presidente na semana passada: ‘Diante desse quadro, Senhor Presidente, são preocupantes as crescentes hostilidades da parte do Chanceler Ernesto de Araújo para com o governo da Venezuela. O quadro atual, que já é desfavorável para os negócios, será agravado absurda e desnecessariamente com a escalada de medidas provocativas, irresponsáveis e contrárias ao interesse nacional (…)’.
O ofício do Senador foi motivado pela visita do Secretário de Estado Mike Pompeo, que ao invés de se reunir em Brasília com o chefe do Itamaraty, se dirigiram ambos à Boa Vista, na fronteira de Brasil e Venezuela. Ernesto Araújo foi convocado na última quinta-feira (23) a dar explicações em audiência pública da Comissão de Relações Exteriores do Senado por conta da visita. A atitude foi vista como um sinal de uso do território e cenário político brasileiros para promover a campanha de Donald Trump e conseguiu desagradar parlamentares da esquerda, da direita e até o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que chegou a afirmar que a visita de Pompeo era uma “afronta às tradições de autonomia e altivez” da política externa brasileira.
Nem gregos nem troianos estão contentes com a política atual do Itamaraty, que está sendo usada não para os interesses do povo brasileiro, como deveria, mas para interesses dos Estados Unidos. Como nos relatou o deputado Paulo Pimenta (PT/RS), ‘trata-se de mais uma medida autoritária cujo objetivo principal nesse momento é criar factóides que possam refletir nos EUA para ajudar na eleição de Trump. Uma perseguição permanente à Venezuela e uma postura insana de um governo que submete o Brasil a uma pauta que não interessa ao povo brasileiro, e sim aos EUA.’
As relações entre os dois países, que já vinha se deteriorando, atingiu seu ponto máximo quando o governo Bolsonaro decidiu reconhecer o deputado de extrema direita Juan Guaidó, que se autoproclamou presidente da Venezuela. Uma “embaixadora” chegou a ser nomeada para o Brasil e recebeu do Itamaraty as credenciais oficiais, em atitude inédita na história da diplomacia brasileira. Em novembro de 2019, um grupo de extremistas ligados à embaixadora tentou invadir a Embaixada da Venezuela. Ação que não só não obteve sucesso, como evidenciou os impulsos golpistas do grupo ligado a Juan Guaidó – que já tentou em território venezuelano golpe de estado, fraude eleitoral, patrocínio de mercenários armados pela fronteira colombiana com apoio dos EUA, dentre outros.
Em março deste ano, o Itamaraty removeu os funcionários da embaixada brasileira em Caracas e outras cidades do país vizinho. A medida já sinalizava uma posterior medida hostil. A remoção dos diplomatas foi publicada no DOU sem explicações. Em seguida, o governo brasileiro pediu formalmente ao governo da Venezuela que os diplomatas venezuelanos fossem retirados. Mas com a chegada das medidas de distanciamento social relativas à pandemia que atingiu o mundo, a situação ficou em suspenso.
No final de março, uma mensagem foi enviada pelo Itamaraty dando prazo de saída para os diplomatas até o dia 2 de maio. Ainda no dia 30 de março, o governo da Venezuela divulgou comunicado assinado pelo chanceler venezuelano Jorge Arreaza que em nota acusou o governo Bolsonaro de ser “abertamente subordinado” aos EUA. O procurador-geral da República, Augusto Aras, chegou a enviar ofício ao Itamaraty pedindo que a medida fosse suspensa por contrariar tratados e convenções internacionais diante da situação sanitária global. Em maio, o STF atendeu ao pedido de Habeas Corpus impetrado pelo deputado e advogado Paulo Pimenta, em caráter liminar, suspendendo os efeitos da decisão do Ministério de Relações Exteriores brasileiro. A decisão monocrática favorável, tomada pelo Ministro Luis Roberto Barroso, perdura enquanto durar o estado de calamidade decretado pelo governo brasileiro, em razão da pandemia.
Ainda que a situação na Venezuela, em relação ao controle da pandemia de Covid-19, seja muito melhor que a do Brasil (que ultrapassou essa semana a marca dos 140 mil mortos), ainda é impossível para os diplomatas – especialmente os que estão em Brasília – retornar ao país, já que a fronteira está fechada e não há voos previstos entre Brasil e Venezuela.
Praticamente não há uma sentença no discurso de Bolsonaro na ONU que não cometa pelo menos uma falsificação, uma manipulação, uma adulteração dos fatos. O Brasil que Bolsonaro descreve não existe, e não existe por causa dele.
As maiores florestas brasileiras ardem em chamas, com recordes de incêndios, e ele culpa os índígenas, que são as primeiras vítimas desses crimes ambientais.
Os maiores biomas do país são consumidos pelo desmatamento ilegal, e ele diz que exerce controle rigoroso sobre a ação dos destruidores das florestas, o que é falso.
O Brasil voltou a registrar a mazela da fome, que maltrata mais de 10 milhões de pessoas, e ele se jacta de estar alimentando o mundo.
Quase 140 mil brasileiros já morreram de Covid-19, e ele diz que agiu com rigor para combater a doença. ao mesmo tempo em que culpa os governadores pelas mortes.
Bolsonaro dissimula de maneira contumaz e o faz por cálculo, não por ignorância. Mesmo quando fala na ONU, não é ao mundo que está se dirigindo, mas ao seus seguidores mais radicalizados, que ele mantém mobilizados à base de fake news e deturpações da verdade. Seu objetivo é manter a iniciativa política e a polarização. Foi assim que, na Itália dos anos 1910 e 1920 e na Alemanha dos anos 1930, o fascismo e o nazismo cresceram até chegar ao poder: mobilizando permanentemente uma minoria de seguidores agressivos, capazes de intimidar o campo democrático da sociedade.
O mundo já não acredita em Bolsonaro. Parte dos brasileiros já não acredita nele. Mas não há sinal de que ele pretenda parar. Terá de ser parado.
No texto a seguir, é possível verificar pelo menos 12 falsificações que Bolsonaro apresentou ao mundo, ontem, no seu discurso.
Por Nei Lima
1
A fala – “Desde o princípio, alertei, em meu país, que tínhamos dois problemas para resolver: o vírus e o desemprego, e que ambos deveriam ser tratados simultaneamente e com a mesma responsabilidade.”
A verdade – Bolsonaro negou a gravidade da doença. Tratou-a com desdém, afirmando que era uma gripezinha. Não tomou medidas efetivas para garantir o emprego, propôs R$ 200 de auxílio emergencial e foi apenas diante da pressão da sociedade e da iniciativa da oposição no Congresso que acabou sendo aprovado o valor de R$ 600. Por culpa do governo, o Brasil foi o país que menos aplicou testes. Bolsonaro foi contrário ao isolamento e distanciamento social, ele próprio promovendo e participando de aglomerações e desprezando o uso de máscaras. Defendeu e expandiu a produção de cloroquina, enquanto deixava de adquirir analgésicos para a implantação de tubos respiratórios nos doentes graves.
2
A fala – “Por decisão judicial, todas as medidas de isolamento e restrições de liberdade foram delegadas a cada um dos 27 governadores das unidades da Federação. Ao Presidente, coube o envio de recursos e meios a todo o País.”
A verdade – Bolsonaro vem se escondendo por trás de uma decisão do STF que, supostamente, transferia o poder de enfrentar a Covid-19 para estados e municípios. Trata-se de uma versão inverídica e absurda, pois há uma clara obrigação constitucional da Presidência da República de coordenar ações diante da gravidade da crise sanitária, que já matou 138 mil pessoas; também somos uma Federação e, assim, há o dever intransferível de a União articular a ação dos 26 estados, o Distrito Federal e os 5.570 municípios. O Supremo nunca eximiu o governo federal do dever de agir, nem transferiu seu poder. Apenas deu a estados e municípios o direito de também tomar decisões sobre medidas sanitárias, de isolamento e de distanciamento social, segundo suas circunstâncias específicas.
3
A fala – “Nosso governo, de forma arrojada, implementou várias medidas econômicas que evitaram o mal maior: concedeu auxílio emergencial em parcelas que somam aproximadamente 1000 dólares…”
A verdade – Não houve arrojo, mas mesquinharia. Bolsonaro tentou impor um auxílio emergencial de apenas R$ 200 por mês. O auxílio só foi de R$ 600 por decisão do Congresso, proposta pelo PT e demais partidos de oposição, impondo uma derrota ao governo. Bolsonaro insinua, na fala, que pagou mil dólares por mês. Mas mesmo somadas, as parcelas do auxílio emergencial estarão longe de totalizar mil dólares. Se cumprir o que anunciou, o governo terá pago, até o fim de dezembro, 5 parcelas de R$ 600 e no máximo 4 parcelas de R$ 300. Isto totalizará, na melhor hipótese, R$ 4.200, muito abaixo de mil dólares, que são R$ 5.470. A iniquidade do governo também se fez sentir no tratamento dado aos que têm direito ao auxilio emergencial, na forma de milhões de exclusões injustificadas, atrasos, filas e aglomerações nas agências da Caixa, aplicativos que não funcionam — um labirinto burocrático que transformou a busca por ajuda num grande sofrimento.
4
A fala – “[Nosso governo] assistiu a mais de 200 mil famílias indígenas com produtos alimentícios e prevenção à Covid.”
A verdade – Do projeto aprovado no Senado de apoio às comunidades indigenas, Bolsonaro vetou artigos que obrigavam o governo federal a fornecer água potável, material de higiene e limpeza e cestas básicas às aldeias. Em outro momento, proibiu a entrada de equipes da organização Médicos sem Fronteiras nas comunidades indigenas.
5
A fala – “Não faltaram, nos hospitais, os meios para atender aos pacientes de covid.”
A verdade – O governo federal falhou fragorosamente no planejamento e na distribuição de máscaras, EPIs e respiradores aos hospitais de todo o país. A testagem é uma das mais baixas do mundo. A falta de testes suficientes é uma das causas de o Brasil ter se tornado um dos epicentros da doença no mundo. A maior parte dos recursos federais destinados ao combate à pandemia nos estados não foi liberada de fato, segundo várias reportagens. A maioria das máscaras e equipamentos prometidos não chegou aos hospitais e os estados e prefeituras foram obrigados a agir por conta própria. Faltaram equipamentos e medicamentos nos hospitais, sobrou cloroquina nas prateleiras do ministério da Saúde, comandando por um militar especializado em logística.
6
A fala – “O caboclo e o índio queimam seus roçados em busca de sua sobrevivência, em áreas já desmatadas. Os focos criminosos são combatidos com rigor e determinação.”
A verdade – Praticamente todos os casos de incêndios na Amazônia e no Pantanal identificados ou suspeitos de ação criminosa foram cometidos por fazendeiros, grileiros e invasores de terras públicas e reservas florestais e terras indigenas. Sentiram-se autorizados para tal diante do desmonte das políticas de contenção do desmatamento e da fiscalização. Os caboclos e os indígenas são, sabidamente, vitimas dos incêndios e do desmatamento criminosos, não seus autores. Dados obtidos pelo sistema de monitoramento da NASA mostram que 54% dos focos de incêndios na Amazônia estão relacionados ao desmatamento. No Pantanal, organizações de proteção ambiental informam que incêndios iniciado em 9 fazendas particulares destruiram 141 mil hectares, quase a área da capital de São Paulo. Cinco destas fazendas estariam sendo investigadas pela PF.
7
A fala – “Lembro que a Região Amazônica é maior que toda a Europa Ocidental. Daí a dificuldade em combater, não só os focos de incêndio, mas também a extração ilegal de madeira e a biopirataria. Por isso, estamos ampliando e aperfeiçoando o emprego de tecnologias e aprimorando as operações interagências, contando, inclusive, com a participação das Forças Armadas.”
A verdade – A extração ilegal de madeira e os incêndios criminosos não são combatidos devidamente por causa da leniência deliberada do governo Bolsonaro, que desde ao assumir desautorizou, fragilizou e desmontou a fiscalização, assim como cometeu ataques contra o INPE, tendo, inclusive, demitido seu diretor, um dos cientistas mais respeitados do Brasil. O ministério do Meio Ambiente não apenas suspendeu o trabalho de fiscalização, e cancelou operações, como tem protegido os verdadeiros criminosos ambientais. Chegou a trazer a Brasília, em aviões da FAB, para reunião com o ministro, um grupo de garimpeiros ilegais que atuava em reserva indígena. Em famosa reunião ministerial, filmada e divulgada, o ministro defendeu que o governo aproveitasse a distração criada pela pandemia para, como disse, “passar a boiada” de decretos e portarias que facilitem os crimes ambientais.
8
A fala – “Somente o insumo da produção de hidroxicloroquina sofreu um reajuste de 500% no início da pandemia.”
A verdade – No Brasil e no mundo, a comunidade científica séria e conceituada alertou o tempo todo, desde o início da pandemia, para o fato de que a cloroquina e a hidroxocloroquina não têm eficácia contra a Covid-19, em nenhum estágio da doença, e podem, ao contrário, acarretar efeitos colaterais que levam à morte. Até mesmo Trump, a quem Bolsonaro imitou agindo como garoto-propaganda de um remédio perigoso, abandonou a defesa da cloroquina e, para livrar-se do medicamento que parou de indicar, despachou o estoque para o Brasil.
9
A fala – “No campo humanitário e dos direitos humanos, o Brasil vem sendo referência internacional.”
A verdade – Só se for referência negativa. Desde a posse de Bolsonaro, a situação dos Direitos Humanos no Brasil vem se deteriorando, a ponto de provocar advertências da Alta comissária de Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet, que denunciou a miliarização de instituições civis, a violência policial, e ataques a ativistas, líderes comunitários e jornalistas.
10
A fala – “Em 2019, o Brasil foi vítima de um criminoso derramamento de óleo venezuelano, vendido sem controle.”
A verdade – Não há nenhuma conclusão ou prova de que a Venezuela tenha contribuído para o derramamento de óleo no Atlântico, trazido pelas correntes marítimas à costa brasileira. O que ficou demonstrado, sobejamente, foi a demora e a inação do governo brasileiro, que levou quase três meses para tomar as primeiras providências em relação ao desastre que atingiu o litoral de 10 estados.
11
A fala – “No primeiro semestre de 2020, apesar da pandemia, verificamos um aumento do ingresso de investimentos, em comparação com o mesmo período do ano passado. Isso comprova a confiança do mundo em nosso governo.”
A verdade – A imprensa informa hoje que do ano passado para cá houve, na verdade, uma queda de 30% nos Investimentos Estrangeiros Diretos no Brasil. E nos primeiros oito meses deste ano o Brasil sofreu uma fuga recorde de capitais, que chegou a US$ 15,2 bilhões. Outra notícia dá conta de que, por causa do estado de paralisia do MEC desde a posse de Bolsonaro, o país deixou de receber os repasses de um empréstimo de US$ 250 milhões do Banco Mundial para dar suporte à reforma do ensino médio.
12
A fala – “O homem do campo trabalhou como nunca, produziu, como sempre, alimentos para mais de 1 bilhão de pessoas. O Brasil contribuiu para que o mundo continuasse alimentado.”
A verdade – O Brasil de fato continua sendo um grande produtor e exportador agropecuário, mas dilapidou a agricultura familiar, que até 2014 era responsável pela produção de 70% dos alimentos consumidos pelo povo brasileiro. Por esta e outras escolhas de índole neoliberal, o Brasil voltou a registrar a calamidade da fome, que aumentou em 43,7% em cinco anos, atingindo mais de 10 milhões de brasileiros.
A cada dia cresce mais o número de relatos de moradores de Pacaraima sobre a violência na cidade a 214 km de Boa Vista (RR), que faz divisa com a Venezuela. Furtos e roubos se tornaram frequentes e a situação revela como o aumento da pobreza está diretamente ligado com o aumento da violência.
A outrora pequena Pacaraima, que segundo o Censo de 2010 tinha 4514 habitantes, tem hoje quase quatro vezes mais. O aumento se deve a migração venezuelana registrada nos últimos 5 anos. Com o aumento de moradores e o não-investimento dos governos municipal, estadual e federal na região, a pobreza se tornou realidade visível nas ruas de Pacaraima.
A crise econômica aprofundada pelo bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos desde 2015 à Venezuela, assim como a crise do mercado petroleiro, foram os principais fatores que levaram à precarização da vida da população do país vizinho.
Em 2014, 47 pessoas foram mortas por arma de fogo em Roraima. Já em 2017 quase o dobro, 93. Os últimos dados divulgados pelo Atlas da Violência em relação a estupros é de 2016. Em 2014 foram registrados 128 casos, em 2015 um pequena queda, e um aumento em 2016, com 156 casos registrados no estado.
Os números não param de crescer. Se em 2018, houve 57.956 homicídios no Brasil, o menor nível desde 2015 e em quase todos os estados houve queda nas taxas de homicídios por 100 mil habitantes em comparação com 2017, Roraima foi uma exceção (alta de 51,3%), ao lado de Amapá (7%) e Tocantins (2%).
Para a socióloga e cientista da religião Tainah Biela Dias, não há como falar de violência sem falar sobre aumento da pobreza. “Vemos no Brasil atual um desmonte geral de políticas públicas e um aumento da pobreza intensificado também por uma gestão praticamente inexistente da pandemia da Covid-19. O aumento da pobreza, e isso já está mais do que debatido, tem como consequência o agravamento da violência, e isso recai ainda mais fortemente sobre populações que são vítimas de preconceito, como é o caso dos imigrantes, alimentando uma lógica que estabelece ‘culpados’ pela situação de precarização generalizada”, explica.
Para ela, os imigrantes em Roraima, especialmente em Pacaraima, sofrem com diversos fatores, entre eles a cultura do “você está ocupando um lugar que é meu”.
“Existem debates e pesquisas que mostram como o aumento da violência contra populações em diáspora — ou seja, separadas de seu território de origem por razão política, religiosa, preconceituosa — está diretamente relacionadas à ascensão de governos de extrema direita, e não só no Brasil, como por exemplo as políticas anti-imigração do governo Trump e o crescimento de milícias civis armadas nos EUA. A ideia que direciona esses conflitos tem a ver com a consolidação de uma identidade nacional que se estabelece através da rotulação negativa daquelas pessoas que são entendidas como ‘de fora’, explica Dias.
“No caso do Brasil não é diferente, apesar de o país ter suas questões específicas. Nesse caso, a oposição explícita do governo Jair Bolsonaro com relação ao regime Maduro gera, por si só, um senso comum preconceituoso contra a população venezuelana. O governo Bolsonaro produz continuamente discursos que estabelecem a separação ‘nós’ x ‘eles’, uma hipervalorização da identidade nacional brasileira em prejuízo da desumanização do ‘outro’, reproduzindo mecanismos xenofóbicos e racistas que tratam algumas vidas como menos dignas ou, de fato, sem dignidade alguma.”
“É também importante dizer que a lógica dos discursos do presidente somente considera como brasileiro quem apoia o governo de forma incondicional, vide seus comentários sobre os “comunistas” no período eleitoral e posteriormente também, com ameaças à imprensa”, completa a socióloga.
Segundo Rommulo Cesar Teixeira Saraiva, Secretário Adjunto da Secretaria de Estado da Segurança Pública de Roraima, a localização geográfica de fronteira com a Venezuela facilita a existência de crimes transnacionais, com interesses das organizações criminosas locais e internacionais. Ele afirma que foi necessário acionar outras organizações para dar conta da nova demanda que o estado de Roraima está tendo por conta dos imigrantes.
“Houve mudanças de impactos sociais, como exemplo o modus vivendi da sociedade e a evidente característica de multiculturalidade no contexto urbano, o aumento do desemprego, e aumento do acesso aos atendimentos na rede pública, como atendimentos na saúde, nas escolas públicas, e demais órgão que prestam atendimento à sociedade.”
“Quanto à implementação de políticas públicas, o atendimento da triagem junto aos estrangeiros se inicia com a operação Acolhida, por uma equipe multidisciplinar. Na área da Segurança Pública, especificamente, houve intervenção federal com Força Nacional e patrulhamento ostensivo, e intervenção de agentes penitenciários federais através da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP).”
“Em 2019 foram dadas continuidade às ações articuladas entre os órgãos de segurança de forma integrada, o que levou a redução dos dados de homicídio. Neste, além da FTIP atuou também a força tarefa denominada Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (FICCO), composta por policiais civis, militares e policiais federais”, explica o secretário.
Em fevereiro deste ano, 2020, a bancada de Roraima no Senado, pensando na região de Pacaraima, cobrou, em sessão plenária, providências do governo federal no controle da violência e dos conflitos causados pela entrada de imigrantes venezuelanos no estado, pelo município de Pacaraima, que faz fronteira com a Venezuela. Os senadores Chico Rodrigues (DEM-RR), Mecias de Jesus (Republicanos-RR) e Telmário Mota (Pros-RR) criticaram a Lei de Migração (Lei 13.445, de 2017) e pediram atenção à cidade, que não possui estrutura e nem recursos para abrigar os refugiados.
Refugiados
Segundo a Coordenação-Geral do Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE) até dezembro de 2018, foram recebidas 85.438 solicitações de reconhecimento da condição de refugiado da Venezuela. Dessas, 61.681 foram recebidas apenas em 2018 e 81% das solicitações foram apresentadas no estado de Roraima. Existem hoje cerca de 45 mil venezuelanos no Brasil que solicitaram o pedido de refúgio. Destes, mais de 33 mil residem em Roraima, seguido do Amazonas, com cerca de 8,4 mil pessoas.
Todos os pedidos de refúgio no Brasil são decididos pelo Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e composto por representantes do Ministério da Justiça, do Ministério das Relações Exteriores, do Ministério do Trabalho, do Ministério da Saúde, do Ministério da Educação, do Departamento de Polícia Federal e de organizações da sociedade civil dedicadas a atividades de assistência, integração local e proteção aos refugiados no Brasil. O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) e a Defensoria Pública da União (DPU) têm assento no CONARE com direito a voz, porém sem direito a voto.
A pessoa que consegue refúgio no Brasil tem alguns direitos garantidos, entre eles estão a não-devolução ao país de qual foi expulso /fugiu; não-penalização pela entrada irregular; elaboração de documentos de identidade e carteira de trabalho; permissão para trabalhar formalmente; livre trânsito pelo território brasileiro; educação; saúde; não ser discriminado por raça, sexualidade, classe, situação econômica, religião, origem; e pode praticar livremente sua religião.
Porém muitos imigrantes que recebem o status de refugiados reclamam que após o reconhecimento, nenhuma política de inclusão na sociedade é colocada em prática. Muito moram nas ruas e vivem de doação ou vendas em semáforos. Realidade nas ruas de Pacaraima.
O Itamaraty acaba de publicar, na noite desta sexta-feira (4), um comunicado que declara todo o corpo diplomático venezuelano no Brasil como “personae non gratae”. Esta declaração é um instrumento jurídico extremo das relações internacionais para indicar que um representante oficial estrangeiro não é mais bem-vindo como tal em seu território.
Este tipo de ação, em um governo que respeita as relações exteriores, ocorre quando justificada por algum fato que indique o rompimento das relações diplomáticas entre os países, o que não é o caso entre Brasil e Venezuela, senão os indícios do governo de Jair Bolsonaro em servir aos interesses dos Estados Unidos.
O comunicado emitido pelo Ministério das Relações Exteriores, dirigido por Ernesto Araújo, declara que o corpo diplomático venezuelano não precisa sair do Brasil, mas não serão reconhecidos como autoridades representantes de Caracas. Perdem, então, o status diplomático, além das imunidades e privilégios correspondentes a estes cargos, por exemplo suas próprias moradias.
O Ministro do Poder Popular para Relações Exteriores da Venezuela, Jorge Arreaza, declarou que esta é a resposta primitiva do governo do Brasil à carta enviada no dia 7 de agosto, cujo conteúdo demonstrava o interesse do governo venezuelano em relação ao brasileiro, em dialogar e enfrentar a crise sanitária pandêmica juntos, deixando de lado as diferenças. ”Definitivamente, o Itamaraty está sequestrado pela anti-diplomacia fascista, subordinada a Washington”, declarou Arreaza em seu Twitter.
Esta é a segunda vez durante a pandemia da Covid-19 que o Ministério das Relações Exteriores do governo de Bolsonaro faz uso desta medida de diplomacia extrema, sem nenhum fato que justifique tal atitude. No fim de abril deste ano, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, interveio em outra manobra executada por Ernesto Araujo e vetou a tentativa de expulsão, que determinava 48h como prazo máximo para a saída de todo o corpo diplomático venezuelano do Brasil.
Alegando que os funcionários não representavam nenhum perigo ao Brasil, a decisão assegurava que os representantes venezuelanos ficassem no país enquanto durasse o estado de calamidade pública e emergência sanitária reconhecido pelo Congresso Nacional em função da pandemia.
Quatro meses depois, o estado de calamidade pública no Brasil cresceu exponencialmente, o Brasil já registra mais de 100 mil mortes pela Covid-19. Além de negar a cooperação proposta pelo governo de Maduro, que tem dado exemplo no combate à crise sanitária do coronavírus, o Ministério das Relações Exteriores insiste em colocar o corpo diplomático em risco mais uma vez.
Já não bastasse a agressão sofrida pelo consul da Venezuela em Boa Vista, Faustino Torella, que morreu no dia 5 de agosto, após contrair a covid-19 em território brasileiro e ter seu tratamento negado nas unidades de saúde do estado de Roraima, segundo denunciam as autoridades venezuelanas. O governo de Bolsonaro continua a sinalizar o desprezo pela soberania do país vizinho, contribuindo para aumentar a tensão entre latino-americanos, que sempre mantiveram boas relações e respeito mútuo.
AÇÕES COORDENADAS
Também nesta sexta-feira (4), o governo da República Bolivariana da Venezuela denunciou, diante da comunidade internacional, novas agressões intervencionistas de Washington. Em violação ao Direito Internacional, o governo de Donald Trump pretende impor ilegalmente medidas coercitivas unilaterais contra as instituições democráticas venezuelanas, procurando interferir na realização das eleições parlamentares previstas na Constituição para dezembro de 2020.
O governo dos Estados Unidos acusa a presidenta do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela, Indira Alfonzo, bem como três outras autoridades venezuelanas de realizar “interferências” para impedir que as eleições legislativas sejam transparentes.
Em comunicado oficial, o governo da Venezuela afirma que “com estas medidas ilegais, a administração de Trump pretende impedir o inevitável. Nenhuma pressão externa poderá evitar que o povo venezuelano exerça seu direito ao voto e decida seu destino de maneira soberana”.
Trump e sua trupe está sinalizando que não reconhecerá os resultados das eleições parlamentares marcadas para dezembro. O CNE Venezuelano tem tentando articular com a União Europeia (EU) e a Organização das Nações Unidas (ONU) para acompanhar como observadores internacionais e garantir a legitimidade das eleições.
Em função das duras agressões imperialistas impostas pelo bloqueio econômico desde a administração de Barack Obama, em 2015, potencializadas por Donald Trump, as eleições de dezembro se revelam como uma das mais importantes eleições parlamentares da Venezuela. O papel da assembleia é fundamental para aprovar acordos internacionais por meio dos quais o governo pode receber fundos e créditos internacionais e reverter toda a crise econômica criada por Washington no país latino-americano
Desde as últimas eleições para o congresso venezuelano, em 2015, quando o governo perdeu maioria para a oposição, o partido de Nicolás Maduro, Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), aumentou consideravelmente seu número de militantes. Em 2015, o PSUV era composto por 5 milhões de pessoas, hoje, registra-se 7,8 milhões de militantes, em um país com 30 milhões de habitantes, o que faz do PSUV um dos maiores partidos do mundo.
Esta crescente organização popular no partido que guarda o legado de Hugo Chavez pode ser um indicador dos resultados das eleições de dezembro, o que contraria os interesses imperialistas dos Estados Unidos sobre o país com a segunda maior reserva de petróleo do mundo.
O aeroporto de Boa Vista recebe voos em apenas dois horários, durante a madrugada ou ao meio-dia. Enquanto em São Paulo o voo partia em uma alvorada fria, chegava-se ao estado nortista com a marca de 37º. Havia um grande contraste de temperatura no mês de março. A viagem por avião e a rápida mudança de clima, no entanto, não eram a realidade da maioria das pessoas que entravam no estado de Roraima naquele momento. A maioria doa imigrantes venezuelanos realizava o caminho a pé ou em automóveis. A cidade fronteiriça do lado brasileiro, Pacaraima, era o reduto de alguns deles. Outros caminhavam, pediam carona, pegavam ônibus ou táxis até a capital Boa Vista, que fica a 214 km e, aproximadamente, 4h30 de distância de carro.
Por Martha Raquel e Michele de Mello, do Brasil de Fato | Boa Vista (RR) e Caracas (Venezuela)
O aeroporto internacional de Boa Vista é um dos únicos do país que mantém um posto fixo da Defesa Civil com agentes sanitários. / Michele de Mello
A reportagem do Brasil de Fato acompanhou por 18 dias a situação de Roraima, entre o momento da chegada à capital do estado até o fechamento da fronteira terrestre com o país vizinho, motivado pela pandemia da covid-19, em março.
Segundo os últimos dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), existem cerca de 45 mil venezuelanos no Brasil que solicitaram o pedido de refúgio. Destes, mais de 33 mil residem em Roraima, seguido do Amazonas, com cerca de 8,4 mil pessoas.
A crise econômica aprofundada pelo bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos desde 2015 à Venezuela, assim como a crise do mercado petroleiro, foram os principais fatores que levaram à precarização da vida da população do país vizinho. O boom dos pedidos de refúgio aconteceu em 2018, quando o Conare avaliou que havia uma situação “grave e generalizada de violação de direitos humanos” na Venezuela, facilitando a entrada e documentação dos imigrantes.
Caminhar por Boa Vista ao longo do mês de março era como estar em uma cidade venezuelana. Pelas ruas do Centro da cidade, o idioma predominante era o espanhol e as calçadas eram preenchidas com centenas de barracas, mesas, toalhas no chão ou pequenas estruturas para venda de produtos. Abridores de latas, canetas, pirulitos, bombons, pentes de cabelo, sabonetes, desodorantes, panos de prato, espigas de milho, frutas, água. Era possível comprar tudo direto das mãos dos imigrantes venezuelanos.
Boa Vista é uma capital com clima de interior, que tem um quarto de seu território demarcado como área indígena. A cidade também é a segunda com maior número de venezuelanos no país, ficando atrás apenas de Pacaraima, que faz divisa com Santa Elena de Uairén, na Venezuela.
Em ambas as cidades, havia venezuelanos que moravam em casas alugadas ou compradas, outros viviam em abrigos e uma boa parte dormia nas ruas, por exemplo, as do entorno da rodoviária de Boa Vista, por onde também chegavam diariamente centenas de imigrantes.
Uma das ocupações independentes que servem de abrigo aos venezuelanos é a Ka Ubanoko, “lugar de morada” na língua indígena Warao. Esta é uma é uma das 11 casas independentes e autogestionadas de Boa Vista. Com regras rígidas de organização, a ocupação sobrevive há quase um ano e meio em um terreno público que já foi a tentativa de construção de um clube de trabalhadores, obra que nunca foi terminada.
Uma das construções da ocupação Ka Ubanoko, que abriga indígenas venezuelanos em Boa Vista (RR) / Martha Raquel/Brasil de Fato
No mês de março, o local abrigava cerca de 850 pessoas, que dividiam cinco áreas, entre espaços reaproveitados da construção do parque, casinhas de madeira, barracas e redes. Eram povos crioulos e indígenas de quatro etnias diferentes: Warao, Enepà, Karina e Pemon. A maioria falava espanhol, mas outros se comunicavam apenas na língua originária. Não havia estrutura de banheiros e cozinha para todas as famílias. Uma mesma torneira era usada para tomar água, banho de balde, cozinhar, além de lavar roupas e utensílios.
Muitos dos indígenas que ali estavam foram parar na ocupação por falta de vaga nos abrigos da Operação Acolhida do Exército brasileiro, mas hoje valorizam a autonomia que conquistaram no espaço. Lá, eles continuam mantendo seus costumes e sua cultura, por meio de suas línguas originárias, músicas e cultos.
Também atuante em solo roraimense, a Agência de Refugiados das Nações Unidas (Acnur) gerencia outros 13 abrigos temporários e um espaço emergencial, onde viviam, em março, cerca de 6 mil pessoas, entre refugiados e migrantes. Esses espaços são administrados pela Acnur junto à Força-Tarefa do Exército brasileiro. A reportagem do Brasil de Fato esteve em dois dos abrigos da Operação Acolhida.
Composto por casinhas compartilhadas por duas famílias cada, mais espaço de banheiros, mesas para refeições, bicicletário, horta comunitária e estrutura para aulas de português para imigrantes, o abrigo São Vicente 2 é um dos mantidos pela Operação.
Josiah Okal K’Okal, da ordem dos Missionários da Consolata, é oriundo do Quênia e já trabalhou por 22 anos na Venezuela, sendo nove deles acompanhando o povo Warao. Atualmente, cursa mestrado em Antropologia na Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (Flacso), em Quito, Equador. Os estudos acadêmicos o motivaram a passar dois meses no Abrigo Pintolândia, organizado pelo Exército brasileiro em Boa Vista, para pesquisar o processo migratório dessa etnia. Além disso, fez visitas ao Abrigo Janokoida, em Pacaraima.
“Nos dois abrigos que estive, os moradores são todos indígenas, Warao e Enepá. A primeira coisa que me impressionou foi o número de atores na administração do abrigo. Posso classificar em grupos aqueles que administram o abrigo: os que estão fisicamente presentes todo o tempo – a Fraternidade Internacional e o Exército –, e os que tomam decisões e quase nunca estão presentes no espaço do abrigo – outros órgãos estatais, governo regional, governo municipal, ACNUR, OIM [Organização Internacional para as Migrações]”, afirma.
K’Okal também lista outras agências que, segundo ele, estão em alguns momentos, como o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Médicos Sem Fronteiras, entre outros.
Segundo o missionário, há críticas dos migrantes quanto à ausência física de acompanhamento, o que acarreta em problemas cotidianos. “A comida servida vem de fora do abrigo, já embalada em marmitas. Geralmente, o menu consiste em carne com salada crua e arroz, acompanhado de uma bebida industrial, suco. A comida é a mesma para todos, até para crianças recém-nascidas. A carne é frequentemente frita e sempre muito seca. Às vezes, eles comem frango ou peixe, mas é bem raro isso acontecer”, relata o pesquisador.
O Exército é o responsável pela contratação de quem fornece a alimentação dos abrigos, mas a administração diária é incumbência da Fraternidade Internacional. A rotina diária, além da distribuição dos alimentos, envolve horários rígidos para despertar, café da manhã, almoço e jantar, bem como horários para entrada e saída do local. Todas as pessoas devem portar um documento com foto e o cartão com o código de barras do abrigo ao qual pertencem. Não é permitida a entrada de terceiros nem de moradores que estejam alcoolizados.
“Em geral, no abrigo, há uma atmosfera de alegria, mas também de angústia. Os indígenas são sempre pessoas muito gratas e não exigem muito. Pintolândia tem mais características de comunidade do que de um campo de refugiados. Observei que a equipe da Fraternidade tenta fazê-los sentir que o abrigo é o lar deles. Há muita flexibilidade, muita proximidade, muita irmandade. Mas, seu contexto lhes tira a alegria às vezes”, conta K’Okal.
Abrigo oficial do Exército São Vicente 2, no bairro São Vicente, em Boa Vista (RR) / Martha Raquel/Brasil de Fato
O plano da reportagem do Brasil de Fato era conhecer todos os 13 abrigos e o centro de acolhida emergencial da Operação Acolhida, mas não houve tempo. O Estado brasileiro tinha cinco casos suspeitos de coronavírus já em 13 de março, mesmo dia em que o governo brasileiro anunciou que avaliaria o fechamento da fronteira terrestre com a Venezuela.
Segundo o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, a medida teria como estratégia conter o avanço do coronavírus no Brasil. No entanto, do lado venezuelano, no estado de Bolívar, nenhum caso havia sido registrado sequer como suspeito até então.
A solicitação para o fechamento da fronteira do Brasil com a Venezuela e com a Guiana havia sido feito dois dias antes, em 11 de março, pelo governador de Roraima, Antonio Denarium. Na ocasião, o ministro da Saúde à época, Luiz Henrique Mandetta, disse que a fronteira com a Venezuela era “a única que realmente dava preocupação ao governo brasileiro”.
Ao jornal O Estado de S.Paulo, Denarium disse que o grau de preocupação com a fronteira era “muito grande”. “Em Roraima estão entrando de 500 a 700 venezuelanos todos os dias. Se tiver um foco de novo coronavírus na Venezuela, e com essa migração desordenada, pode se tornar uma epidemia”, afirmou o governador no dia 12 de março. O fechamento da fronteira foi decretado na manhã do dia 18 de março.
Àquela altura, o temor já estava generalizado pelo Brasil. Na capital de Roraima já não era mais possível encontrar máscaras, luvas ou álcool em gel nas farmácias. Em Pacaraima, apenas um lugar vendia máscaras. A unidade que, antes da pandemia, custava R$ 0,35, agora custava R$ 2. Um cartaz de oferta divulgava a caixa com cem máscaras por R$ 180,00.
Proporcionalmente, Roraima possui a maior população indígena do Brasil, quase 50 mil pessoas, que também habitam a região próxima à fronteira / Michele de Mello
No paço fronteiriço, por volta das 8:30 da manhã, venezuelanos foram impedidos de entrar no Brasil. Já os venezuelanos que estivessem em solo brasileiro poderiam voltar ao seu país de origem. Carregadores do país vizinho que viviam em Roraima e trabalhavam levando produtos de um lado a outro da fronteira não puderam retornar às suas casas.
Um desses trabalhadores impedidos de retornar ao Brasil contou à reportagem que não sabia o que fazer. Pai de duas filhas, ele havia acabado de cruzar a fronteira para fazer uma entrega e estava impedido de retornar para a sua família. Junto a ele haviam pelo menos mais 30 carregadores na mesma situação.
Ao Brasil de Fato, pedindo para não ser identificado, ele declarou que fazia mais de quatro horas que ele e outros carregadores estavam sob um sol de 34º, sem comida ou água. “Trabalhamos do lado brasileiro e, assim, sustentamos a família. A situação vai ficar pior do que está. A maioria de nós trabalha para nossas famílias, se não nos deixam passar, não trabalhamos nem comemos”, disse.
Do lado brasileiro, havia barreiras da Força Nacional, da Polícia Federal e do Exército. Já do lado venezuelano, havia uma Brigada Itinerante de Prevenção à Contaminação pelo coronavírus, que contava com representantes da Milícia Nacional, do Exército, da Guarda Nacional, da Polícia do Estado Gran Sabana, além de médicos venezuelanos e estudantes de medicina brasileiros que fazem a graduação na Venezuela.
A fronteira estava fechada apenas do lado brasileiro aos venezuelanos. Brasileiros tinham livre circulação. Um único agente da Polícia Federal checava a nacionalidade e liberava a passagem.
Com o passar dos meses, o decreto inicial que estabelecia 15 dias de fechamento da fronteira terrestre foi alterado algumas vezes. A situação dos imigrantes venezuelanos, tanto os que vivem nas ocupações independentes quanto os que estão nos abrigos oficiais da Operação Acolhida, também mudou durante a pandemia.
Os moradores da Ka Ubanoko estão recebendo visitas diárias de profissionais do Médicos Sem Fronteiras. Porém, ainda falta infraestrutura, com reclamações de dificuldades para exames, testagem e atendimentos especializados.
Segundo a Acnur, houve a instalação de oito pias com água para os imigrantes que vivem em assentamentos espontâneos realizarem a higienização constante, além disso, o órgão afirma que distribuiu 7,3 mil kits de higiene e limpeza, colchões, redes, fraldas e roupas de ajuda emergencial.
A ONU também investiu na construção de um hospital de campanha em Boa Vista, com capacidade para 1,2 mil leitos. A Área de Proteção e Cuidados (APC) deverá atender até 2,2 mil pessoas.
Após ter o funcionamento adiado cinco vezes, o Hospital de Campanha de Roraima foi inaugurado no dia 19 de junho, três meses após o fechamento inicial da fronteira. O atraso foi devido ao não cumprimento, por parte do governo estadual, da compra de equipamentos e contratação de funcionários.O funcionamento será custeado através da união dos governos municipal e estadual.
Para atender aos refugiados que perderam seus empregos durante a pandemia, a Agência assegura que ampliou seu programa de assistência financeira. Para a Irmã Telma Lage, advogada e coordenadora do Centro de Migração e Direitos Humanos da Diocese de Roraima, o esforço feito ainda é insuficiente diante da situação precária em que vivem os imigrantes venezuelanos no estado brasileiro.
“A gente tem um número grande de invisíveis, pessoas que estão fora do radar, principalmente das agências da ONU e da Força-Tarefa. São as pessoas que estão pagando aluguel ou em situação de rua. Essa tem sido nossa maior preocupação durante a pandemia da covid-19, porque estes são os vulneráveis dentro dos vulneráveis, já que a maioria está na periferia da cidade”, conta.
O último centro da Operação Acolhida em Pacaraima (RR) tem capacidade para atender cerca de duas mil pessoas, no entanto abriga apenas 50 venezuelanos. / Michele de Mello
Atualmente, Roraima tem aproximadamente 22 mil casos confirmados com o novo coronavírus. Boa Vista tem a grande maioria das confirmações, mais de 16,4 mil. Pacaraima, cidade que faz fronteira com a Venezuela, é a segunda do estado, com mais de 900 casos confirmados. O estado registrou 396 mortes. Os dados são da Secretaria de Estado da Saúde de Roraima, desta sexta-feira (10).A reportagem buscou contato com o governo estadual para um panorama da situação do estado, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.
Como último estado do Brasil a confirmar casos de infecção pela covid-19, Roraima recebeu o vírus não pela fronteira com a Venezuela, espaço de grande preocupação de mandatários brasileiros, mas por duas pessoas contaminadas oriundas de São Paulo, no dia 21 de março. Naquela data, segundo dados do Ministério da Saúde, o Brasil contava com 1.128 casos confirmados de coronavírus e 18 mortes (três no Rio de Janeiro e 15 em São Paulo). Na Venezuela, de acordo com dados oficiais, o país registrava 70 casos em todo o território nacional; a primeira morte só veio a acontecer no dia 26 de março.
Fronteira entre Brasil e Venezuela, no dia 18 de março de 2020 / Martha Raquel/Brasil de Fato
Do lado de lá da fronteira: Venezuela
As bandeiras entre os dois países são o último símbolo que marca o limite invisível da fronteira entre Brasil e Venezuela. No lado tupiniquim, um agente da Polícia Federal, com seu telefone celular, fotografa os caminhões e cidadãos que tentam cruzar o passo fronteiriço. Este é o último rastro do Estado brasileiro. A sede do órgão está fechada para atendimentos presenciais por conta da pandemia. Tampouco existe qualquer equipe de saúde realizando controle sanitário.
Dois passos adiante, numa tenda instalada a céu aberto, soldados da Força Armada Nacional Bolivariana (Fanb) solicitam documentos e fazem a primeira entrevista ao viajante. Em seguida, militares transportam malas e passageiros na caçamba de camionetes para evitar o contato até o próximo posto de controle.
Chegando à primeira estrutura dos Pontos de Atenção Social Integral (Pasi), todos são desinfectados com uma solução de água e hipoclorito de cloro. Em seguida, equipes de médicos, muitos deles cubanos, novamente entrevistam os recém-chegados e realizam os testes rápidos, do tipo PCR (sigla em inglês para “reação em cadeia de polímeros”).
Aqueles que testam positivo são imediatamente afastados. Entre as sete pessoas presentes naquela tarde do dia 29 de maio, quatro estavam infectadas, o que corrobora com o dado oficial de que cerca de 78% dos casos registrados na Venezuela são importados e, muitos deles, chegam pelas fronteiras terrestres com a Colômbia e o Brasil, ou pelos voos humanitários que aterrissam em Caracas.
No estado de Bolívar, divisa com Roraima, 992 venezuelanos permaneciam nas instalações do Pasi de Santa Elena de Uairén, até o dia 10 de junho, parte sendo tratada nos hospitais de campanha e outra cumprindo a quarentena obrigatória de 14 dias nos alojamentos do Estado, em pousadas e hotéis alugados. Depois de passar por novos testes, os venezuelanos são levados às suas regiões de origem em ônibus fretados pelo governo nacional.
A Venezuela foi o primeiro país do continente americano a decretar quarentena em nível nacional e o fechamento de fronteiras. Desde março até junho, 59 mil cidadãos retornaram ao país pelos corredores humanitários terrestres e aéreos organizados pelo Estado. Desse total, 3.626 regressaram do território brasileiro, e, entre eles, 441 estavam contaminados.
Em Caracas, capital do país, foram recebidos ao menos 36 voos com cerca de 1,8 mil venezuelanos. Para atender os cidadãos em regresso e a população local, foi criada uma equipe de resposta imediata sentinela, que faz quatro processos: desinfecção; mapa dos contágios positivos, conversas de reeducação, onde foram registrados casos positivos; além de um cerco epidemiológico para evitar o contágio de vizinhos.
Existem quatro protocolos para o atendimento da população venezuelana. Um deles é a atenção de casa em casa para poder verificar se existem pessoas com sintomas. Tal medida é apoiada pelos questionários da Plataforma Pátria, que atende mais de 8 milhões de habitantes, com isso o Estado busca realizar um procedimento massivo para descartar a possibilidade de transmissão.
Em seguida, são realizados testes rápidos nos pacientes suspeitos, aqueles que dão positivo são atendidos em algum dos 46 hospitais de referência instalados no país.
“Na Venezuela ninguém vai morrer por negligência ou por falta de atenção médica”, assegura Jessica Lalana, coordenadora da força-tarefa do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), em Caracas.
O país mantém uma média de 45.258 testes de diagnósticos para cada 1 milhão de habitantes, chegando a um total de 1.257.732 milhão de exames realizados. Já no Brasil a proporção é de 22.800 para cada milhão.
O Brasil é o segundo país em número de mortos e infectados com a covid-19 em todo o mundo, concentra mais de 50% dos casos registrados na América Latina. Alegando a situação de crise sanitária e o colapso do Sistema Único de Saúde (SUS), os imigrantes têm relatado dificuldades para ser atendidos nos hospitais.
Em novembro do ano passado, a Câmara de Vereadores de Boa Vista aprovou o projeto de lei 452/2019, que limitava em 50% o atendimento de estrangeiros na rede pública da capital. A proposta de autoria do vereador Júlio Medeiros (PTN) culpava “o aumento desenfreado de migrantes no estado de Roraima, o que veio a impactar em diversos setores na vida da população local, tais como saúde, educação e segurança”. A lei entrou em vigor em janeiro deste ano.
“Quando os compatriotas passam para o lado venezuelano e recebem atendimento médico eles manifestam que do lado brasileiro, nos municípios próximos, Pacaraima, Boa Vista, não lhes prestam atendimento para descartar se estão com covid-19”, confirma Maria Abad, militante da Frente Francisco Miranda, no estado de Bolívar. A frente é um dos movimentos populares que apoia nas comissões multidisciplinares do corredor sanitário da fronteira.
Brigada Itinerante de Prevenção à Contaminação pelo Coronavírus do Estado venezuelano na fronteira com o Brasil / Martha Raquel/Brasil de Fato
A realidade novamente confirma os dados. Um dos jovens que testou positivo ao chegar no território venezuelano, no dia 29 de maio, relatou à reportagem do Brasil de Fato que decidiu retornar pela falta de emprego e porque não foi atendido pelo SUS, em Boa Vista. Viajou 210 km com o pé fraturado.
“Muitos desses companheiros vieram com a esperança de que na Venezuela possam ser atendidos com todos esses protocolos. Tanto atenção médica, como hospitalização e hospedagem de maneira totalmente gratuita”, assegura Jessica Lalana, coordenadora de grandes missões do PSUV em Caracas.
Em maio, María Teresa Belandria, que responde como embaixadora venezuelana no Brasil nomeada pelo autodeclarado presidente Juan Guaidó, também deputado venezuelano, afirmou que existiam “mais de 280 mil venezuelanos” em território brasileiro, e pediu ajuda financeira às vésperas da Conferência Nacional de Doadores, realizada em 26 de maio.
Mesmo sendo reconhecida pelo presidente Jair Bolsonaro, Belandria não tem autoridade para emitir documentos, vistos e, segundo relatos de venezuelanos no Brasil, os enviados de Guaidó tampouco oferecem algum tipo de suporte econômico para quem chega, apesar dos anúncios constantes de “ajuda humanitária” recebida do exterior.
“A nossa pátria e o nosso governo revolucionário estão dispostos a seguir recebendo esses compatriotas com amor, com uma atenção de primeira e todos os elementos necessários para garantir o direito à vida. Porque a Revolução Bolivariana se propôs desde o dia zero da pandemia a garantia da vida ao ser humano, ao nosso povo. Acredito que essa é uma das posturas mais heróicas que se apresentaram nesse período, porque isso não acontece no Brasil, Colômbia, Chile ou Equador”, assegura Jessica Lalana, membro do PSUV.
O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, assegura que a Venezuela é um dos únicos países que está sofrendo “migração reversa” durante a pandemia da covid-19, considerando os números do programa social Vuelta a la Patria (De Volta à Pátria).
Para entender o retorno
Apesar de os dados, desde 2018, terem parado de subir, a oposição regional ao governo de Nicolás Maduro aponta uma crise migratória e acusa o país de ser uma ameaça para a América Latina.
Uma reunião no dia 2 de fevereiro de 2018, convocada pelo Conselho de Relações Exteriores dos Estados Unidos, foi o primeiro espaço a levantar o tema do refúgio para os venezuelanos. Em seguida, foram disparadas medidas adotadas pelos governos do chamado Grupo de Lima para facilitar a imigração venezuelana. Apenas nove dias depois da reunião em Washington, o então presidente Michel Temer viajou até a fronteira afirmando que “não faltariam recursos para os venezuelanos que fogem”.
Nesse mesmo ano, foi lançada a Força Tarefa Logística do Exército, incentivada pela administração Trump. Em visita ao Brasil, em junho de 2018, o vice-presidente estadunidense, Mike Pence, visitou os abrigos da Operação Acolhida em Manaus (AM), quando afirmou que doaria US$ 1 milhão para apoiar o governo do então presidente brasileiro Michel Temer.
Em abril daquele mesmo ano, a Casa Branca já havia anunciado o envio de US$ 16 milhões ao Brasil e à Colômbia para apoiar a imigração venezuelana.
Também para Jessica Lalana, o discurso de crise migratória faz parte de uma guerra híbrida contra a Venezuela e também parte do bloqueio midiático internacional contra o seu país.
“Na Venezuela, os direitos humanos são garantidos. Apesar do bloqueio ideológico, financeiro, naval, de toda a tergiversação de informações divulgadas no mundo sobre a Venezuela, este é um país que garante os direitos humanos, garante a recepção de homens e mulheres que se foram com esperança, talvez com alguma situação econômica, mas que hoje regressam. E nós vamos recebê-los como povo e como revolução, de braços abertos”, finaliza a coordenadora do grupo que recepciona os imigrantes na capital do país.
Por Clara Luiza Domingos, especial para Jornalistas Livres
Carolus Wimmer, presidente do Comité de Solidariedad Internacional y Lucha por La Paz na Venezuela (COSI Venezuela) e secretário de relações internacionais do Partido Comunista da Venezuela participou do Boletim Semanal Venezuela, que foi ao ar na última quinta-feira (11.06), no Facebook e Youtube do Jornalistas Livres, para denunciar as ofensivas imperialistas dos Estados Unidos contra o país da revolução bolivariana. O exemplo venezuelano no combate ao coronavirus foi um dos temas do Boletim desta semana, além de como os EUA têm insistindo em sua agressão em plena crise sanitária mundial.
Semanalmente o Jornalistas Livres coloca no ar o Boletim Venezuela, para tratar dos assuntos mais importantes envolvendo a Venezuela, com o objetivo de informar o público fatos e análises que, muitas vezes, não chegam pela mídia hegemônica, dando voz a lideranças que possam expor os problemas vividos diariamente pelos venezuelanos e os conflitos internacionais.
Wimmer iniciou sua fala destacando que a crise sanitária do coronavírus é mais uma das crises do capitalismo e ressaltou a diferença de resultados no combate a pandemia entre países que não são regidos pelo sistema econômico capitalista. “Atualmente, a Venezuela tem 2700 infectados e 23 falecidos, em comparação com outros países da América Latina, é relativamente pouco e esperamos que siga assim”.
De acordo com Carolus, governo de Nicolás Maduro tomou as medidas sugeridas pela OMS a tempo, reconhecendo a pandemia rapidamente. Maduro rapidamente decretou o isolamento por três meses, fechou as fronteiras internacionais, interrompeu o tráfico nacional entre um estado e outro e já realizou 36 mil testes por milhão de habitantes, que em números gerais representa mais de 1 milhão de testes realizados no país.
Carolus também destacou que a parceria com o governo cubano na construção de um sistema de saúde gratuito, selada há 10 anos, durante o governo de Hugo Chavez, construiu uma estrutura física e profissional que permite atender a todo o povo venezuelano gratuitamente durante a crise sanitária.
“Há um reconhecimento do risco para a saúde, uma responsabilidade do governo Venezuela em atender de uma forma direta os infectados, e também tomar medidas preventivas, isso em um momento quando a Venezuela vive a agressão direta do imperialismo dos estados unidos e de seus aliados europeus. Isso é um crime contra os venezuelanos. Isso já não tem nada a ver com as diferenças políticas e ideológicas. É um direito de cada povo receber nesse momento da pandemia os produtos necessários a nível de medicina e a nível da vida”, afirma Carolus, lembrando que o bloqueio econômico durante a pandemia foi criticado inclusive pela subsecretária geral das Nações Unidas (ONU) para Assuntos Políticos e de Construção da Paz, Rosemary DiCarlo.
Cooperação Internacional
Apesar de países como os Estados Unidos, Inglaterra e França insistirem em não cumprirem as ordens da ONU em defesa dos direitos humanos, o presidente do COSI Venezuela destaca em sua fala a contrapartida de cooperação internacional de países como Rússia, Irã, China e outros países. “Há dois dias chegou o sexto avião da China cheio de produtos com medicamentos e materiais para hospitais”, conta Wimmer.
Os Estados Unidos têm apertado o bloqueio econômico, imposto desde 2013, ameaçando sanções a embarcações ligadas ao comércio do petróleo na Venezuela, dessa forma, atacando o coração da economia venezuelana.
“Os EUA têm interesse nos recursos naturais da Venezuela, no petróleo, no gás, nos recursos minerais, na biodiversidade, na reserva de água doce, porque o capitalismo está em crise, querem se salvar roubando os recursos de outros países, especialmente dos países da América do Sul e da África.”, ressalta Carolus.
“Venezuela pode comprar as coisas, não precisamos de presentes, mas com esse bloqueio naval e o sistema jurídico mundial é um juiz, os EUA castigam empresas de outros países que fazem negócios com Venezuela”, denuncia a liderança do COSI Venezula.
Wimmer explica no vídeo que não basta ter petróleo no território, é necessária tecnologia moderna, maquinaria e produtos químicos para fazer com que o óleo mineral natural chega às bombas como combustível. “Normalmente, qualquer país importa produtos, isso é como funciona a economia do petróleo, mas ao ter o bloqueio total dos EUA, não podemos importar nada. Naturalmente, temos o colapso das refinarias”, explica.
Para ajudar na crise vivida pela Venezuela, no início do mês de Junho, o Irã enviou cinco petroleiros iranianos carregados de combustíveis para satisfazer a demanda interna da Venezuela. Um total de 1,53 milhão de barris de gasolina e outros hidrocarbonetos. Todos os petroleiros foram escoltados pela Marinha e Força Aérea da Venezuela após entrarem nas águas territoriais venezuelanas, já que os EUA ameaçaram usar força para impedir a chegada dos navios aos portos da Venezuela.
Carolus alerta para essa tentativa de impedir a entrada de petroleiros nos portos venezuelanos gera um risco de conflito bélico a nível mundial, já que China, Irã e Rússia também estão envolvidos e posicionam ao lado da Venezuela.
Contudo, a chegada dos petroleiros no país da revolução bolivariana está sendo fundamental para resolver muitos problemas cotidianos que tem surgido depois das sanções impostas pelos EUA, como a fome, já que a gasolina é fundamental para a produção agrícola.
“Somos muito otimistas, mas também muito vigilantes, o povo venezuelanos e a classe trabalhadora precisa ser vigilante, porque há fatores negativos do Estado como corrupção, burocracia e ineficiência, temos inimigos externos e internos, onde está a contra-revolução, operada pela oposição venezuelana”, destaca Wimmer.
Assista na íntegra o Boletim Semanal Venezuela, que foi ao ar na última quinta-feira (11/06), conduzido pelas jornalistas Clara Luiza Domingos e Martha Raquel: