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  • Papel do jornalismo é discutir a sociedade e não “ficar de bem com público”

    Papel do jornalismo é discutir a sociedade e não “ficar de bem com público”

    Por: Vinicius Souza – Jornalista Livre, da MediaQuatro e professor da UFMT (com contribuição de Laura Capriglione)
     
    Um amigo de longa data, “de direita, conservador nos costumes e liberal na economia” postou no Facebook o texto do colunista JR Guzzo, da Veja (íntegra aqui), afirmando ser “jornalismo de verdade”. Com três décadas de trabalho em campo e há 10 anos pesquisando e ensinando Jornalismo na universidade, acho que esse tipo de inversão de valores e manipulação perversa precisa ser exposta e contestada. Assim, apesar de detestar com todas as forças da minha alma dar espaço pra esse tipo de gente, ética e profissionalmente não posso me furtar a comentar a obscenidade representada pelo colunista.
     
    Primeiro, chamar o que Guzzo faz de “jornalismo de verdade” é não ter a menor ideia do que é jornalismo, a começar pelo que ele diz ser o objetivo do jornalismo: vender jornais, aumentar a audiência. NÃO, NÃO É !!! O jornalismo pertence a uma área do pensamento, pesquisa e ação chamada de Comunicação Social. Sua função é comunicar o que de fato é importante para a vida saudável e democrática em sociedade. É orientar a população sobre discursos populistas (e muitas vezes mentirosos) que levarão ao desastre social. É investigar de denunciar as mentiras propagadas pelos poderosos. É registrar os fatos históricos da maneira mais honesta possível. Por isso, o jornalismo independente e responsável é um dos pilares da democracia!
     
    Guzzo confunde, propositalmente, Jornalismo com Propaganda. Jornalismo bom é o que tem tamanha obsessão pela verdade factual, que às vezes até afronta o leitor/ouvinte/espectador. A Publicidade, por outro lado, pode jogar pra plateia, pra ficar de bem com a massa. Já o conceito de Propaganda inclui a manipulação das massas. Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda da Alemanha nazista, o cara que alimentou e disseminou, e contaminou até a última essência a sociedade alemã com o vírus do antissemitismo, teria gostado muito do conceito de Guzzo sobre jornalismo. Porque, em vez de esclarecer o país sobre a falsidade do mito da superioridade da raça ariana, Guzzo teria defendido a tese, pra não se afastar de seus leitores. O nome disso é escrotidão!
    Diferente de Guzzo, Hitler pelo menos teve a decência de não chamar de jornalismo, e sim de PROPAGANDA, o que fazia seu ministro
     
    É fato que toda a imprensa minimamente decente no Brasil (e no mundo) denunciou a farsa que é Jair Bolsonaro e seus apoiadores e a parte mais decente da imprensa é exatamente a que mais sofre e vai sofrer ainda mais com esse governo de destruição nacional, que começou com a preparação do Golpe em 2014, sua efetivação em 2016 e agora tem sua consolidação, tristemente, pelas urnas. É fato que as novas tecnologias de comunicação estão dando um nó na velha imprensa e colocando em xeque a democracia, já que estão municiando a população com desinformação e fake news, ao invés dos instrumentos que a sociedade necessita para fazer suas escolhas de modo consciente. Pensando com a cabeça e não com o fígado. É fato que isso em grande parte está acontecendo exatamente pela ação da mídia hegemônica no Brasil nas últimas três décadas, criando sucessivamente “salvadores da pátria” que se mostrariam rapidamente as farsas que efetivamente são. Desde o “caçador de marajás” das Alagoas até Demóstenes Torres, Serra, Aécio e até mesmo o Eduardo Cunha. Os ídolos com pés de barro Sérgio Moro e Jair Bolsonaro seguirão exatamente o mesmo caminho, não tenham dúvidas.
     
    Fake News nos jornais como a ficha falsa de Dilma Rousseff no DOPs na capa da Folha em abril de 2009 (https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc0504200906.htm e http://observatoriodaimprensa.com.br/imprensa-em-questao/folha-publicou-ficha-falsa-de-dilma/) associada aos spams espalhados no ano seguinte pela equipe de propaganda da campanha à presidência de José Serra via e-mail a exemplo do texto sobre sua “esposa” empregada doméstica abandonada que a estaria processando (https://www.boatos.org/politica/balela-amante-de-dilma-entra-na-justica-e-cobra-pensao-de-presidente.html) são os pais legítimos do kit gay, da mamadeira de piroca e dos guerrilheiros comunistas disfarçados de médicos.
    Folha de São Paulo levou 20 dias para admitir que “não podia confirmar a procedência” da ficha falsa de Dilma – http://observatoriodaimprensa.com.br/imprensa-em-questao/folha-publicou-ficha-falsa-de-dilma/
     
    A credibilidade é realmente um valor jornalístico essencial e que foi de fato desprezado pela Grande Mídia em favor de um projeto político de DIREITA e na crença infundada que sua hegemonia (garantida pelo monopólio e oligopólio dos meios de comunicação) jamais seria desafiada (a esse respeito sugiro a leitura do artigo O Pêndulo de um Lado Só, em https://brasilmais40.wordpress.com/2013/09/02/o-mito-do-jornalismo-imparcial/). Foi. E a Grande Mídia está perdendo rapidamente sua hegemonia. Mas dizer que isso ocorre porque os veículos apostaram numa candidatura de esquerda desvinculada dos reais interesses do povo e contra a candidatura que o povo “queria” é uma viagem!! Pior, é uma hipocrisia sem tamanho feita da tribuna do talvez mais venal, corrupto, interesseiro e antipetista dos grandes veículos de comunicação, a Veja (digo talvez, porque em venal temos concorrentes do nível da Isto É e no campo do antipetismo temos o Estadão).
    Civita à “esquerda” e Marinho à “direita”, com o então Ministro das Comunicações do Governo Lula e ex-funcionário da Globo, Hélio Costa, ao “centro”, no primeiro seminário do Think Tank de direita Instituto Milennium, ouvindo o então colunista da Veja, Reinaldo Azevedo, dizer que os jornais deveriam partir pra luta política e não dar espaço para “o outro lado” . Foto: www.mediaquato.com
     
    Desde o artigo DE OPINIÃO (uma atividade lateral do jornalismo e francamente perniciosa se não permitir o contraponto) comparando o ativismo dos sindicatos de professores sobre a política educacional com os posicionamentos da indústria do tabaco sobre as políticas de saúde pública (https://veja.abril.com.br/educacao/hora-de-peitar-os-sindicatos/, se você tiver estômago pra ler), nunca mais tive dúvidas sobre a capacidade de manipulação, desinformação e desonestidade intelectual de Guzzo para atingir os seus mais baixos interesses. Aparentemente, agora tenta se manter relevante lambendo as botas do fascismo e jogando pra plateia que acredita em “qualquer coisa”, até que o diabo é melhor do que o PT ou a esquerda no poder. Resta saber se os generais vão aceitá-lo como aliado/capacho ou vão ignorá-lo como também costumam fazer com os puxa-saco. 
    PS: As capas da Veja tiveram como fonte o Blog https://blogdopaz.com.br/as-capas-da-veja-que-entraram-para-a-historia/ . Gostaria de ter publicado, também, a escrotíssima coluna do mais que escroto e dissimulado Augusto Nunes na Veja em que ele republica da ficha falsa da Dilma, mas está fechado para assinantes da revista (sic). Pra quem ainda tiver estômago, tem também a “bombástica” matéria de capa sobre a fuga de Lula para a Itália… (https://www.youtube.com/watch?v=AxkteZf0f68). O que se divulgou como “furo” nada mais foi do que mais uma fake news.
    PS2: Para quem, como eu, não é assinante da Veja, segue abaixo a íntegra do infame texto de Guzzo:
    A mídia diante do público
    É fácil saber o que aconteceria com uma empresa de ônibus que vende nos seus guichês da rodoviária de São Paulo uma passagem para Belo Horizonte, por exemplo, e leva o passageiro para Piracicaba. Vive fazendo isso, aliás, pois a sua grande dificuldade é anunciar no letreiro a cidade para onde o ônibus realmente está indo. O que aconteceria é o seguinte: os passageiros, um dia, não iriam mais viajar com essa companhia para lugar nenhum. Chega, diriam eles — assim não dá mais. Da mesma forma, se uma pessoa costuma lhe dizer coisas que nunca acontecem, ou simplesmente vive contando mentiras, o mais provável é que você deixe de prestar atenção no que ela diz. Num processo na Justiça, igualmente, uma alegação falsa feita por uma das partes pode lhe causar sérios problemas: todo o resto da sua versão passa a correr o risco de ficar sob suspeita. Para sorte de muita gente, porém, nem tudo funciona assim. A memória dos seus clientes é mais tolerante, ou mais fugaz — e, portanto, mais disposta a esquecer que lhes disseram uma coisa que não aconteceu, ou disseram uma coisa e aconteceu outra, ou, ainda, que aconteceu justamente o contrário do que lhes foi dito que iria acontecer. Faz parte dessa gente de sorte, hoje em dia, a mídia brasileira.
    Mas será mesmo sorte — ou, ao contrário, é um problema cinco-estrelas que ninguém está vendo direito? Os leitores, ouvintes e telespectadores podem estar em relativo silêncio, mas há sinais de que a tolerância do público a pagar passagens para uma cidade e ser depositado em outra está deixando de ser uma proteção garantida para a imprensa. Ninguém reclama em praça pública — mas o consumidor de informação nunca reclama em praça pública. Um dia ele simplesmente vai embora, sem dizer até logo, e não volta mais. Quando os proprietários de órgãos de comunicação, e os jornalistas que trabalham neles, percebem o que aconteceu, já é tarde. A menos que tenham o suporte de uma fortaleza financeira em seu conjunto de negócios, podem encomendar o caixão — e os cemitérios brasileiros de jornais, revistas, rádios, televisões e, ultimamente, páginas eletrônicas que se imaginavam a última palavra em matéria de jornalismo moderno estão cada vez mais lotados. A diminuição do público interessado em acompanhar o que a mídia lhe diz não começou agora, é claro. Há dez ou quinze anos a migração passou a ganhar volume — e não parou mais, por motivos que já foram explicados em milhões de palavras, a maioria delas, aliás, lida por bem pouca gente. Mas, pelo menos no caso do Brasil, provavelmente não tinha havido até esta última campanha eleitoral uma oportunidade tão clara de medir o tamanho da distância, a cada dia maior, que separa hoje o que a imprensa imprime ou põe no ar daquilo que existe nos corações, mentes e sentimentos da audiência. É um abismo. A mídia diz uma coisa. O público acha o contrário. A mídia anuncia que vão acontecer os fatos A, B e C. Não acontece nenhum dos três. A mídia quer que as pessoas façam isso ou aquilo. As pessoas fazem exatamente o oposto.
    Para que ficar tentando esconder a realidade? O que acaba de acontecer na eleição, muito simplesmente, foi o maior fiasco que os meios de comunicação brasileiros já viveram em sua história recente. É melhor assinar logo o boletim de ocorrência, admitir que alguma coisa deu horrivelmente errado e pensar, talvez, se não seria o caso de averiguar quais falhas foram cometidas. Por que a mídia ignorou a lista de desejos, claríssima, que a maioria da população estava apresentando aos candidatos? Por que não tentou, em nenhum momento, entender por que um número cada vez maior de eleitores se inclinava a votar em Jair Bolsonaro? Durante meses seguidos, os comunicadores brasileiros tentaram provar no noticiário que coisas trágicas iriam acontecer para todos se Bolsonaro continuasse indo adiante — mas nunca pensaram na possibilidade de que milhões de brasileiros estivessem achando que essas coisas trágicas, justamente essas, eram as que consideravam as mais certas para o país. A mídia, na verdade, convenceu a si própria de que não estava numa cobertura jornalística, e sim numa luta do bem contra o mal. Em vez de reportar, passou a torcer e a trabalhar por um lado na campanha, convencida de ter consigo a “superioridade moral”. Resultado: disputou uma eleição contra Jair Bolsonaro e perdeu, por mais de 10 milhões de votos de diferença.
    Não é função dos órgãos de comunicação disputar eleições, é claro, muito menos perder. É o pior dos mundos. Já que decidiram fazer a coisa errada, engajando o seu trabalho a favor de um lado e contra o outro, deveriam, pelo menos, evitar o papelão de acabar surrados pelo candidato que declararam “inimigo” e por seus quase 58 milhões de eleitores. Isso, para usar português claro, significa que você está falando, mas ninguém está ouvindo o que você diz — ou ouvindo tão pouco que não faz diferença nenhuma. É a tal “credibilidade” — a sua capacidade de ser acreditado entre os semelhantes, ou levado a sério por eles. No caso da eleição de Jair Bolsonaro, a credibilidade foi para o espaço. Como passar seis meses seguidos ou mais fazendo uma operação contínua contra o candidato menos equipado materialmente para disputar a campanha eleitoral e constatar, no dia da apuração, que todo esse esforço não resultou em nada? A conclusão é que o público está pouco ligando para o que a mídia lhe diz. A partir daí, ela se torna irrelevante na vida real. Fica como arquibancada em jogo de futebol: xinga o juiz de ladrão e o técnico de burro, mas não altera em nada o resultado do placar.
    Os fatos estão aí, confirmando a futilidade de projetos para ganhar eleições livres, hoje em dia, sem combinar o resultado com as pessoas de carne e osso que vão votar. Inven­tou-se como estratégia, desde o começo, que o ex-presidente Lula era candidato à Presidência da República em 2018 — não apenas isso, a mídia garantia que ele era o favorito disparado para ganhar. Foi uma falsificação integral. Lula não podia ser candidato, porque estava e está na cadeia, condenado a mais de doze anos como ladrão em duas instâncias da Justiça brasileira. Mas os “institutos de pesquisa” asseguravam que Lula tinha “40% dos votos”, que havia “avançado mais X pontos”, que ganhava de todos os outros candidatos — e a imprensa, em peso, reproduzia essa fábula em suas manchetes. Só quando o próprio Lula, em pessoa, anunciou que não era candidato, as pesquisas retiraram o seu nome da lista. No meio-tempo, man­teve-se viva por vários dias a ficção de que “a ONU” iria obrigar o Brasil a aceitar a candidatura — chegaram a convocar o STF para julgar essa aberração. Sai Lula, entra Fernando Haddad. Sete dias antes da eleição, uma das “pesquisas”” deu Haddad com “22%”, numa “ascensão” que só poderia levá-lo, matematicamente, à vitória. Para não deixar dúvidas, todos os meios de comunicação repetiram até o dia da eleição que Bolsonaro perderia de “todos os outros candidatos” no segundo turno, em “todas as pesquisas”. Deu-­se o exato contrário.
    Nos dias finais da campanha apareceu uma reportagem tentando mostrar que haviam sido feitas doações para que Bolsonaro pagasse uma campanha de notícias falsas contra os adversários — em cima disso, pediu-se a “anulação do primeiro turno”, inclusive com atrizes da Globo exigindo, num vídeo eleitoral especialmente irado, “uma atitude” do Supremo. Falsa, mesmo, só a reportagem — reproduzida maciçamente através da imprensa até morrer de inanição, por ausência de fatos, de pé e de cabeça. A brutal tentativa de homicídio que Bolsonaro sofreu em Juiz de Fora foi geralmente tratada como uma notícia menor, fruto natural do “ódio” trazido à campanha em grande parte por ele próprio. Até hoje, a maioria dos jornalistas se refere ao episódio como “a facada”; é jornalisticamente incorreto escrever que um criminoso quis assassinar Bolsonaro. Desde o início da campanha, os mais potentes cérebros da análise política do Brasil deram como fato científico que a candidatura de Bolsonaro iria “desaparecer” assim que começasse o horário eleitoral obrigatório na TV, no qual ele contava com poucos segundos. No mundo dos fatos, Bolsonaro ganhou a eleição — e o candidato que tinha o maior tempo de TV não conseguiu nem 5% dos votos.
    Mais do que tudo, talvez, a mídia não chegou nem perto de entender uma realidade evidente: a maioria do público brasileiro, nos dias de hoje, pensa basicamente o contrário do que pensam os jornalistas e os donos dos veículos de comunicação. Tem valores opostos aos dos comunicadores. Aprova o que a mídia condena. Condena o que a mídia aprova. É a favor da polícia, que a imprensa considera inimiga dos pobres, e contra os bandidos, que os jornalistas consideram vítimas da injustiça social. Os heróis da imprensa, como a vereadora Marielle, não são os heróis da população. E nem o que a imprensa divulga maciçamente como sendo problemas essenciais para o Brasil é percebido da mesma maneira pela massa — homofobia, racismo, fascismo, machismo, “agrotóxicos”, terras indígenas, torturas cometidas quarenta anos atrás são vistos mais com indiferença do que com indignação. Em questões como a conveniência de eliminar as diferenças entre os gêneros masculino e feminino, deixando em segundo plano as leis da biologia, mídia e maioria estão simplesmente em posições opostas.
    Naturalmente, há um preço a pagar por tudo isso. Ele aparece na dificuldade cada vez maior, por parte da mídia, de fazer avanços na única questão que realmente interessa: a batalha pelo público. Ninguém tem ouvido histórias de veículos que triplicaram seus leitores ou sua audiência nos últimos anos; é perfeitamente óbvio, assim, que o método que vem sendo utilizado pela mídia para fazer o seu trabalho está dando errado. Como poderia estar dando certo se os resultados são um desastre? O aviso das eleições está aí. A televisão, em seu conjunto, deixou de existir como um fator de importância numa eleição brasileira — é como se tivesse sido jogada uma bomba de hidrogênio em cima dela.
    Até quatro anos atrás era no programa eleitoral obrigatório que tudo se decidia numa campanha; hoje ele não vale nada. Os “institutos de pesquisa” também podem publicar os números que bem entenderem na mídia. Não são capazes de mudar coisa alguma. Não quando dizem que Dilma Rousseff seria “a senadora mais votada do Brasil” — e ela acaba em quarto lugar. Os meios de comunicação, enfim, fizeram uma guerra sem descanso contra Bolsonaro — e sua influência foi absolutamente nula no resultado da eleição.
    A internet, o Facebook, o Twitter e o restante do arsenal nuclear que a tecnologia eletrônica despeja a cada momento sobre o universo das comunicações mudaram a política no Brasil em 2018. Há muitos anos vêm transformando a imprensa num animal cada vez mais diferente de tudo o que possa ter sido — e não há sinais de que essa história venha a tomar um novo rumo. Em momentos como este, é uma tragédia que a imprensa brasileira venha demonstrando, no conjunto daquilo que publica em seus veículos, uma inteligência inferior à inteligência média dos seus leitores, ouvintes e espectadores. Desse jeito, torna-se cada vez mais inútil para eles. Da mesma maneira, é complicado manter-se em estado de hostilidade eterna perante o público. É como dizer a todos: “Não queremos mais você por aqui. Vá ler outra coisa. Pista”. Ninguém vai chegar a lugar nenhum por aí.
  • Editora Abril flerta com a insolvência

    Editora Abril flerta com a insolvência

    O balanço de 2017 mostra que, se a Editora Abril vender tudo o que possui, faltarão R$ 716 milhões para pagar tudo o que deve.

    O Brasil está cheio de exemplos de empresas que vão muito mal e empresários vão muito bem. Há muitos exemplos, também, de empresas que faliram, mas que a vida confortável de seus donos em nada mudou. As demonstrações financeiras da Abril Comunicações S.A. e suas controladas mostram uma situação muito próxima à insolvência. Nada se pode dizer sobre a famiglia Civita.

    O balanço de 2017 mostra que, se a empresa vender tudo o que possui, ainda faltarão R$ 716 milhões para pagar tudo o que deve. Em termos contábeis diz-se que “em 31 de dezembro de 2017, a Companhia apresentou patrimônio líquido negativo de R$ 715.931 mil”. No ano de 2016 faltavam R$ 414 milhões, ou seja, o rombo cresceu cerca de R$ 300 milhões em 2017.

    A operação da empresa gerou um prejuízo de R$ 164 milhões. Se acrescentarmos as despesas financeiras de R$ 215 milhões, atingimos o prejuízo de R$ 379 milhões. Nos termos da demonstração do resultado da companhia para o exercício findo em 31/12/2017, “o prejuízo antes do imposto de renda e da contribuição social foi de R$ 379 milhões”. No ano de 2016, essa mesma linha, apresentou prejuízo de R$ 414 milhões.

    Imagine que a empresa teve R$ 977 milhões de receitas em 2017. Mas para arrecadar esse volume teve custo com vendas de R$ 479 milhões. Pagas essas despesas sobram R$ 498 milhões. As despesas administrativas e despesas com vendas foram de R$ 662 milhões, ultrapassando o valor das receitas líquidas e gerando prejuízo operacional de R$ 164 milhões.

    A PricewaterhouseCoopers, que auditou as demonstrações, afirma que “os acionistas controladores se comprometem a prover o suporte financeiro necessário para a manutenção da continuidade operacional da Companhia por meio de mútuo ou por qualquer outra forma”. Em outros termos, diz a empresa de auditoria que a famiglia prometeu emprestar recursos para que a empresa não quebre e interrompa suas atividades”.

    A Price, em item que trata especificamente da “incerteza relevante relacionada com a continuidade operacional”, revela que não fez ressalvas em sua avaliação por conta da incerteza. Aponta, porém, que as demonstrações financeiras “indicam a existência de incerteza relevante que pode levantar dúvida significativa sobre sua continuidade operacional”.

    Nota

    Para ver as Demonstrações Financeiras da Abril Comunicações http://www.grupoabril.com.br/ABRILCOMUNI17_DEZ.pdf

  • Todo apoio às ocupações dos Sem-Teto

    Todo apoio às ocupações dos Sem-Teto

    Governos federal, estadual e municipal fingem que choram a morte de homens, mulheres e crianças sem-teto, na tragédia do edifício Wilton Paes de Almeida, no Largo do Paissandu, centro de São Paulo. Fingem que choram enquanto acabam com as políticas públicas destinadas a gerar moradias populares, enquanto destroem o Minha Casa, Minha Vida. Mas eles são piores do que isso… Agora, tentam esconder sua responsabilidade pela tragédia habitacional existente na maior e mais rica cidade do país, jogando a culpa nos movimentos de moradia.

    Reportagem publicada na revista Veja, aquele panfleto golpista, tenta criminalizar todas as ocupações, mesmo sabendo que há diferenças gritantes entre elas. Os movimentos sérios que lutam por moradia, não apenas pressionam o poder público. Eles revitalizam prédios mortos, dotam-nos de condições mínimas de segurança, de higiene e conforto, porque esses imóveis tornam-se imediatamente depois de ocupados o lar de famílias sem-teto que estavam ao relento.

    A Revista Veja tenta criminalizar uma simples vaquinha entre os moradores das ocupações sérias, feita e decidida coletivamente, por exemplo, para prover o prédio de extintores de incêndio. Ou alguém acha que é o poder público que coloca extintores de incêndios nas ocupações da Frente de Luta Por Moradia? Ou que instala os canos de água e esgoto e os conduítes de luz, inutilizados pelo abandono? Que contrata as caçambas para retirar toneladas e toneladas de entulhos e lixo acumulados ao longo de anos nos prédios mortos que só servem à especulação imobiliária? Ou que lavam as paredes com creolina e pintam-nas com cal, para combater as infestações por pulgas, carrapatos, escorpiões e aranhas?

    Tudo isso custa dinheiro, e a revista Veja sabe disso. Quem custeia são os beneficiários imediatos das ocupações, que são os sem-teto, em um sistema de vaquinha decidido em assembléia.

    Querer criminalizar a vaquinha é o cúmulo do absurdo. Não permitiremos que a mídia hegemônica, que já mantém preso um homem inocente, Lula, a quem ataca diariamente com calúnias, injúrias e difamações, faça outras vítimas entre os pobres moradores de ocupações.

    #QuemOcupaNãoTemCulpa

  • Pasadena vazou outra vez

    Pasadena vazou outra vez

    Com base em informações ainda não tornadas públicas pelo, Tribunal de Contas da União, a Folha de São Paulo divulgou hoje, 29/08, que auditores do tribunal teriam isentado o Conselho de Administração da Petrobras de ter cometido qualquer “ato de gestão irregular” no episódio da compra da refinaria de Pasadena.

    O relatório técnico, no entanto, ainda não é público. Somente está disponível para os ministros que, na sessão Ordinária de Plenário de amanhã (30/08, às 14:30hs), apreciarão a matéria. O ministro relator, Vital do Rêgo, assim como os ministros participantes da sessão, pode acompanhar ou divergir do relatório técnico.

    Refinaria de Mentiras

    Ao pesquisar sobre os termos “Pasadena” e Dilma”, no próprio site da Folha, encontramos 605 resultados em 2014. Desnecessário dizer que a maioria das matérias levantavam suspeitas de corrupção na compra da refinaria. Os editoriais do jornal, nesse período, tiveram títulos como: “Refinaria de mentiras” e “Sombras na Petrobras”.

    A Petrobras de Dilma

    A colunista da Folha, Eliane Cantanhêde, na matéria “A Petrobras de Dilma”, repetia a falsa comparação de que “A Petrobras simplesmente pagou US$ 360 milhões por 50% dessa refinaria, que fora comprada um ano antes por US$ 42,5 milhões.” (FSP 20/03/2014) Eliane Cantanhêde é ex-Folha. Hoje, empresta ela seu talento para contar “histórias” à Globonews.

    A refinaria sem refinamento de Dilma

    Vinícius Torres Freire, também colunista do jornal, no artigo “A refinaria sem refinamento de Dilma” fazia coro: “Dilma presidia o conselho de administração da Petrobras em fevereiro de 2006, quando ela e outros autorizaram a empresa a comprar refinaria nos EUA (US$ 360 milhões por 50% de um negócio que um ano antes saíra por US$ 42,5 milhões)”. (FSP, 21/03/2014)

    O verdadeiro mensalão

    Barbara Gancia, com o título “O verdadeiro Mensalão”, escreveu: “Não é de hoje que a tal compra da refinaria de Pasadena surge na boca de empresários como sendo emblemática dos desmandos do PT. Ela é o verdadeiro mensalão. Ali é que eles veem a amostra de desmontagem de quadros técnicos e cargos de carreira para o aparelhamento de que tanto falam. Estão ali as grandes somas, sem aliados para repartir. Um contrato fajuto, um ativo multiplicado 100 vezes… E tudo isso tendo à disposição o maior financiador do país e uma das maiores empresas do mundo, que tinha recém descoberto a maior bacia de petróleo… Faz-me rir, mensalão, troco de pinga!”(FSP 21/03/2014)

    Procurador diz que prejuízo da Petrobras nos EUA ‘não foi só um mau negócio’

    Matéria de Dimmi Amora trazia o procurador do Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União), Marinus Marsico. “Não foi só um mau negócio, o que pode acontecer em qualquer empresa. Era algo completamente evitável e por isso pedimos que se apure as responsabilidades de quem fez esse negócio e que eles sejam condenados por gestão temerária, sejam multados e tenham que devolver os recursos desperdiçados”, disse o procurador. (“Procurador diz que prejuízo da Petrobras nos EUA ‘não foi só um mau negócio’”, FSP 27/02/2013)

    A correção de Cerqueira Leite

    O físico e membro do Conselho Editorial do jornal, Rogério Cezar Cerqueira Leite, jogou uma agulha no palheiro de notícias incorretas: “Após quase um mês de confusões, a presidente da Petrobras, Graça Foster, explica que o valor pago pela Astra foi de US$ 248 milhões, que somados a investimentos alcançariam US$ 390 milhões.” (FSP 29/04) Em outras palavras, na ponta do valor pago pela Petrobras, as afirmações de Cantanhêde e Torres Freire estavam erradas em mais de US$ 100 milhões. A Petrobras não pagou os US$ 360 milhões que os colunistas afirmaram. Eles também estavam errados nos valores pagos e investidos pela Astra na refinaria.

    A correção de Gabrielli

    José Sérgio Gabrielli de Azevedo, ex-presidente da Petrobras, em matéria na Folha, “Pasadena: mitos e verdades”, corrigiu o valor que a Astra pagou pela refinaria: “Vamos aos mitos: o primeiro refere-se ao fato de que o antigo proprietário de Pasadena, o grupo Astra, pagou US$ 42,5 milhões pela refinaria e depois revendeu à Petrobras por US$ 1,25 bilhão.”

    Prossegue Gabrielli: “A verdade é que a Astra desembolsou US$ 360 milhões antes de revender por US$ 554 milhões, sendo US$ 259 milhões pagos pela Petrobras em 2006, como afirmou a presidente da empresa, Graça Foster, e US$ 295 milhões posteriormente à disputa judicial, já em junho de 2012, mas considerando as condições de mercado de 2006. O crescimento da demanda de derivados nos EUA, sobretudo de 2004 a 2007, levou a um aumento progressivo no preço das refinarias, contudo, o valor de Pasadena foi inferior à média das transações em 2006.” (FSP 20/04/2014)

    Quem perde com informações falsas?

    Cantanhêde e Torres Freire, e toda imprensa, levaram as pessoas a crer que a corrupção era evidente na compra da refinaria de Pasadena. As correções nos valores pouco efeito tiveram no ano eleitoral de 2014. Mesmo assim Dilma ganhou. Mas o país…

    Por fim

    Depois de ampla exploração política, será que o caso da refinari de Pasadena terminará amanhã? Ou um pedido de vista buscará continuar o sangramento de Dilma e do PT? Como a Folha de São Paulo noticiará? Fará 605 matérias se corrigindo, se o caso terminar sem acusação de “ato de gestão irregular”? E o que farão Veja, Globo, Istoé, Estado, etc.?

  • Teria Haddad aprendido mesmo?

    Teria Haddad aprendido mesmo?

    Caro senhor Fernando Haddad,

    Seu artigo para a revista Piauí ficou muito bom. Diríamos até que sua erudição nos iluminou. Esperamos, contudo, que ele, o artigo, signifique o início de uma discussão e não um fechamento de questão, porque nos suscitou muitas dúvidas.

    O senhor começou seu texto falando mal de Dilma e se alongou, na mesma toada, por algumas páginas. Há muitas críticas à ex-presidenta. O senhor apontou que ela errou ao não aceitar a municipalização da CIDE. Afirmou que ela errou ao cogitar sobre o represamento da tarifa de ônibus e, mais ainda, que “não se chega a um erro deste tamanho sem ter feito um percurso todo ele equivocado”. Em outros termos, o senhor disse que ela cometeu uma sucessão de erros, “um percurso todo ele equivocado”.

    Sua avaliação é de que eram necessários ajustes no rumo da política econômica, quando ela se reelegeu. O senhor escreveu assim: “era evidente que ajustes tinham que ser feitos porque, entre outras coisas, o governo tinha comprado uma agenda equivocada, elaborada em parte pela Fiesp: desonerações, redução da tarifa de energia elétrica, swap cambial, administração de preços públicos etc.”

    “A relação de Dilma com São Paulo nunca se resolveu completamente.” Com essa frase o senhor a acusou de não tratar São Paulo de modo adequado. Acredita, no entanto, que ela “comprou” uma agenda elaborada pela Fiesp? O objetivo é jogar São Paulo contra Dilma? O senhor foi o único que, no nível federal, cuidou adequadamente de São Paulo, desde 1932, quando ministro da Educação?

    Até mesmo na frase “eu diria até que sempre me tratou com consideração”, está subentendida uma crítica a ela. Por que o senhor resolveu criticá-la publicamente neste momento? Foi para justificar sua derrota no primeiro turno ou o senhor está mirando uma disputa futura? Ou quem sabe uma outra razão que nossa limitação não alcança?

    O senhor acredita que essas críticas vindas do senhor, nesse momento, ajudam no combate ao golpe?

    O senhor encomendou um estudo elaborado pelo economista Samuel Pessoa e o apresentou à Dilma. O estudo era sobre a municipalização da CIDE, Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, que o senhor preferia ao aumento da tarifa dos ônibus. Samuel Pessoa, assim como a grande maioria dos economistas da GV, é bastante conhecido por seu neoliberalismo radical.

    Em 2015, ele afirmou à revista Época que “Com o PT, não dá para conversar”. “O economista diz que o problema estrutural das contas públicas só poderá ser resolvido em outro governo, porque não dá para fazer pacto com os petistas”, escreveu a revista. Para ele a Constituição de 1988 não cabe no orçamento: “O problema de a gente continuar com um contrato social cuja dinâmica não cabe dentro do PIB é que a gente pode escorregar para uma hiperinflação e chegar no cenário da Venezuela.”

    É a opinião de um notório neoliberal que o senhor queria que Dilma aceitasse? O senhor comunga as mesmas ideias de economia política que Samuel Pessoa? De que maneira fiar esse economista contribui para a resistência contra as reformas? A propósito, o senhor é favorável às reformas? Acha que, como assegura Pessoa, a Constituição de 1988 não cabe no orçamento?

    O senhor conta o que sentiu na saída da primeira fatídica reunião com Dilma da seguinte forma: “O que eu sentia ali era algo que já havia experimentado algumas outras vezes na vida: mais do que um mal-estar ou uma simples angústia, era uma espécie de intuição, a sensação nítida de que algo muito sério estava se passando, de que havia um risco real e iminente.”

    O senhor se resignou à negativa de Dilma ou continuou a lutar pelo que acreditava? O senhor tem essas intuições ou dons premonitórios com frequência? Anteviu o golpe?

    O senhor acredita que “numa democracia, até uma imprensa ruim pode ajudar. […] Em dezesseis anos de vida pública, sempre mantive com as principais famílias proprietárias dos meios de comunicação uma relação cordial e respeitosa, em que pesem nossas diferentes visões de mundo. Não dispensava interlocução com os Marinho, os Frias e os Civita.”

    Aqui o senhor nos embatucou. Poderia explicar em que medida a Veja ou o Jornal Nacional têm ajudado nossa democracia? Mais importante do que isso, seria saber com quem o senhor julga estar dialogando quando faz essas afirmações, poderia nos revelar? A interlocução com os Marinhos, os Frias e os Civitas o ajudou em quê? O que o fez divulgar esse texto em uma revista editada por uma sociedade entre um membro da família Moreira Salles (Unibanco) e três membros da família Civita?

    O senhor se disse pressionado, lá em 2013, pela decisão do prefeito do Rio de adiar o reajuste e resolveu “ir ao Palácio dos Bandeirantes e propor ao governador Alckmin que fizéssemos juntos o anúncio da revogação do aumento”. Olhado de hoje, o senhor julga acertado ter unido sua imagem à de Alckmin naquela ocasião?

    O senhor contou sobre o diálogo com seu filho, no momento de tristeza pelo caminho que tomou a negociação da tarifa. Que ele teria tentado animá-lo dizendo: “Mas, pai, ainda faltam três anos e meio de governo.” Ao que o senhor respondeu: “Eu sei, filho, mas aconteceu uma coisa muito séria e não há como não viver o luto.” Como esse assunto da primeira reunião com Dilma é bastante recorrente em seu texto, gostaríamos de saber se esse luto passou? E quando?

    O senhor termina com a afirmação de que a escolha, do modo como se darão as eleições do próximo ano, está sendo feita agora. Poderia, por fim, nos esclarecer qual tem sido sua atuação nessa escolha, nesse momento?

    “Li praticamente todos os clássicos sobre a formação do Brasil. Conhecia teoricamente o nosso país. Mas a experiência prática é insubstituível. Vivi na pele o que li nos livros.” Perdoe-nos a franqueza, não nos sentimos seguros de que aprendeu mesmo. Durante seu mandato, criticamos sua distância da população e sua tibieza na luta contra o golpe. Na primeira oportunidade, o senhor escreve uma matéria de 20 páginas, opta por um canal elitista, participante da mídia que critica, e joga a culpa de tudo que deu errado nos outros. Precisamos de mais evidências.

    Um fraternal abraço.

  • Toda solidariedade ao Jornalismo ameaçado pelo rei Janot

    Toda solidariedade ao Jornalismo ameaçado pelo rei Janot

    O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, parece obstinado a roubar de Chatô o epíteto de “rei do Brasil”. Chatô usava as empresas do seu império midiático para chantagear e extorquir de acordo com seus interesses. Janot abusa do poder do cargo que ocupa, mas não lhe pertence. O episódio mais recente, tendo como alvo o jornalista Reinaldo Azevedo, prócer da extrema-direita entre jornalistas, não guarda qualquer relação com a cruzada contra a corrupção que faz muita gente de boa fé aplaudir seus excessos. É nada além de um gesto grotesco de intimidação contra toda a imprensa e uma gravíssima ameaça ao livre exercício da atividade jornalística.

    Profissionais que, como Azevedo, se lambuzaram com os vazamentos seletivos e festejaram a mesma violência quando os alvos do PGR eram Lula e Dilma, por exemplo, agora condenam a afronta evidente à Lei das Interceptações Telefônicas. Só agora percebem a espada de Dâmocles sobre suas cabeças. Jornalistas e blogueiros “sujos”, há muito tempo na resistência crítica à cruzada moralista que devasta o país, entendem ser dever de coerência condenar as atitudes imperiais do rei Janot e expressar solidariedade a um colega e também algoz. Sem festejar seu infortúnio, cabe refletir se presunçoso e arrogante autor de “Máximas de um país mínimo” faz jus a gesto tão magnânimo.

    Reinaldo Azevedo se fartou nos banquetes onde reputações alheias eram a entrada, o prato principal e a sobremesa. Ao lado de seus antigos pares e hoje desafetos, como Olavo de Carvalho, oráculo da direita mais empedernida, o delatado Diogo Mainardi e Joice Hasselman, vilipendiam diariamente a profissão praticando um jornalismo declaratório rebaixado e servil, mas essencial ao ativismo judiciário que hoje ameaça a imberbe democracia brasileira.

    “Tio Rei” experimenta o gosto amargo do veneno que tem destilado nos últimos anos. Se for merecedor da solidariedade misericordiosa que lhe hipotecam jornalistas de há muito atacados por ele sem falsos pudores, haverá de fazer alguma inflexão. Só o tempo dirá se vai conseguir deixar de ser o mínimo que é: um raivoso neoliberal, instilador do ódio e da violência tão em voga nesses tempos temerbrosos.

    Agredida 24 horas por dia e merecedora da solidariedade geral, e não apenas corporativa, é a profissão de jornalista. Agredida por jornalistas, como Reinaldo et caterva. Agredida pela omissão de jornalistas narcotizados pela fábula da objetividade, incapazes até de assumir o próprio lado e sair em defesa, por exemplo, da tal cláusula de consciência que lhes daria o direito de dizer não às ordens do departamento comercial. Agredida pelos empresários da comunicação, beneficiários da acumulação de dinheiro e poder a partir da exploração econômica e simbólica do trabalho nas redações. Agredida por quem ataca jornalistas com processos cíveis e criminais, usando a Justiça e o poder econômico para impor a censura e incutir a auto-censura.
    Definitivamente, não é necessário expressar solidariedade a Reinaldo Azevedo para condenar os abusos de membros do Ministério Público, do Judiciário e da Polícia Federal. Isso não significa regozijo pela violência da qual hoje é vítima, mas foi e é um cúmplice dedicado.

    Quem merece solidariedade é a nossa democracia, novamente ameaçada antes de completarem-se os 30 anos de promulgação da Constituição Cidadã de 1988. Ai reside uma dolorosa contradição: vem dela o poder que subiu à cabeça do rei Janot. É o mesmo poder que fez de Geraldo Brindeiro, escolhido por FHC, passar à história como “engavetador geral da República” por não dar andamento às inúmeras denúncias de corrupção, como a compra de votos para a PEC da reeleição.

    Procurador Geral da República escolhido por Tancredo Neves ao ser eleito presidente na última eleição indireta, em 1985, o jurista Sepúlveda Pertence colaborou com a Assembleia Nacional Constituinte eleita no ano seguinte. Ajudou a redefinir o Ministério Público a partir da sua experiência de procurador durante o regime militar e do seu reconhecido saber jurídico. Tinha sido defenestrado do Ministério Público por obra do Serviço Nacional de Inteligência, monstro institucional da ditadura. Criado pelo general Golbery do Couto e Silva, o SNI viria a tragar o seu criador quando ele ousou tramar o fim do regime.

    No processo da AP-470, em 2005, Pertence conheceu a criatura da qual era um dos pais: “não sou Golbery, mas também criei um monstro”. Carlos Lacerda, o “Corvo” demorou mais de uma década para ser devorado pela ditadura monstruosa que ajudou a criar. Vejamos quanto tempo Tio Rei precisará para compreender as ameaças para ele mesmo, para seus colegas e para o Brasil, intrínsecas ao monstro que ele tem ajudado a alimentar e afiar os caninos. Foi apenas uma mordidinha…