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  • A oposição conservadora da mídia da ‘Casa Grande’ e as fake news

    A oposição conservadora da mídia da ‘Casa Grande’ e as fake news

     

    Ângela Carrato, jornalista e professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG

    Por falta de segurança para realizarem seu trabalho, os repórteres das TVs Globo e Band, da Folha de S. Paulo e do portal UOL não vão mais cobrir a entrevista matinal de Bolsonaro, na saída do Palácio da Alvorada. A decisão foi tomada por essas empresas, uma vez que o “cercadinho” destinado à imprensa fica colado ao local de onde os apoiadores do “Mito”, alguns extremamente exaltados, ameaçam os jornalistas.
    O próprio Bolsonaro já ameaçou cassar a concessão da TV Globo e cortar a publicidade do governo federal na “Folha”. A cada dia, Bolsonaro vem subindo mais o tom das críticas aos profissionais e aos veículos que divulgam notícias que o desagradam. Enquanto isso, a reação da mídia brasileira, quando acontece, se mantém tímida e circunscrita a alguns poucos assuntos.
    A título de exemplo, enquanto a mídia internacional, há meses, chama Bolsonaro pelo
    que ele realmente é – um presidente fascista que está destruindo o Brasil – aqui, a mídia hegemônica, também conhecida como mídia da “Casa Grande”, insiste em tratá-lo por presidente. A mídia da “Casa Grande”, por exemplo, não faz qualquer menção à eleição fraudada de 2018. Fraudada por fake news e também pelas matérias tendenciosas e distorcidas por ela publicadas ao longo de anos.
    Nas redes sociais e em inúmeros grupos de Whatsapp, as questões envolvendo Bolsonaro e essa mídia estão cada dia mais polarizadas. De um lado, os apoiadores do capitão reformado insistem em afirmar que a Rede Globo e qualquer outro veículo que o critica “é comunista” e, de outro, os que defendem que essa mídia mudou.
    Já em locais sombrios da internet, continuavam sendo produzidas e divulgadas fake news sobre os mais diversos assuntos. Estavam em alta as “fakes” dando como certa a intervenção militar, as que insultavam os ministros do STF e as que desacreditavam a ciência e a quarentena em se tratando do combate ao covid-19.

    Razões que levaram o ministro do STF, Alexandre de Moraes, no âmbito do processo
    aberto naquela Corte em 2019 para investigar o uso de fake news e a disseminação de
    discursos de ódio, ter determinado, na quarta-feira (27/5), a busca e apreensão de
    material junto a 29 suspeitos – entre empresários e blogueiros -, ter quebrado os sigilos
    fiscal e bancário deles (de agosto de 2018 a maio de 2020) e determinado que sete
    parlamentares prestem esclarecimentos.
    Entre os suspeitos que tiveram seus sigilos fiscal e bancário quebrados estão o
    empresário Luciano Hang, dono das lojas Havan, o dono da rede de academias Smart
    Fit, Edgard Gomes Corona, Wiston Rodrigues, que coordena o Bloco Movimenta Brasil,
    e a blogueira Sara Winter. Os quatro, bolsonaristas de primeira hora. Todos devem ser
    ouvidos pela Polícia Federal nos próximos dias.
    O resultado disso tudo tem sido uma enorme confusão na cabeça do cidadão comum.
    E não é para menos. Daí a importância de se entender esse aparente novo
    posicionamento de parte da mídia corporativa brasileira, o impacto das fake news
    nesse contexto e o que isso tem a ver com os interesses da oposição conservadora.

    Racha das TVs

    Essa é uma das poucas vezes, em mais de três décadas, que as seis famílias que detém concessões de TVs no Brasil (Marinho, Macedo, Santos, Saad, Dallevo Jr. e Carvalho) apresentam divergências e estão rachadas. A Globo, mesmo apoiando a agenda ultraliberal do governo (Estado mínimo, retirada de direitos sociais, privatizações, subserviência aos Estados Unidos) tem sido crítica a determinadas posturas de Bolsonaro em especial agora, no que diz respeito à pandemia. Já as demais têm feito de tudo para se manterem numa boa com o governo.
    O espaço de emissora “chapa branca”, do qual a Globo foi titular durante tanto tempo, passou a ser ocupado pela TV Record, do empresário e autointitulado bispo, Edir Macedo. O apoio explícito de Macedo e de sua igreja a Bolsonaro no segundo turno da eleição de 2018 lhe valeu as boas graças e gordas verbas oficiais desde a posse do ex- capitão. Foi para a Record que Bolsonaro deu a primeira entrevista depois de eleito, desbancando um privilégio sempre concedido à Globo.

    As brigas entre os Marinho e Edir Macedo não são de agora e antes se pautavam mais
    por questões específicas do que por problemas políticos. Os Marinho sempre tiveram
    uma relação espúria com o poder público, e Macedo, uma relação promiscua com a
    Igreja Universal do Reino de Deus. Os ataques que uns faziam aos outros não eram
    mentirosos, mas o problema é que expunham milhares de telespectadores aos interesses privados desses dois grupos, valendo-se de uma concessão pública, como são os canais de TV.
    Essa guerra, onde não há “mocinhos”, acabou chegando à política e tem atingido a Globo e a própria saúde da população brasileira. Um exemplo disso aconteceu com a série que o Jornal Nacional estreou há poucos dias, na qual apresenta depoimentos de médicos e profissionais de saúde que estão na linha de frente do combate ao coronavírus no país.

    Em um desses depoimentos, houve uma confusão por parte do JN, ao apontar um dos hospitais no qual uma médica trabalha como não possuindo condições adequadas de atendimento aos pacientes. Foi o que bastou para que a TV Record lançasse críticas à série. Críticas replicadas por muitos internautas como sendo prova de “fraude” e de “mentira” por parte da Globo e que contribuíram para alimentar o submundo das fake news.

    A pressão foi tanta que a Globo, que raramente leva ao ar um “erramos”, em editorial lido por William Bonner, dois dias depois, explicou o que aconteceu e pediu desculpas à médica, ao hospital e aos telespectadores.

    O SBT vem em seguida à Record no quesito apoio ao governo. Como se não bastassem os elogios rasgados (pagos a peso de ouro) que Sílvio Santos tem feito dentro e fora de seu programa a Bolsonaro, no sábado (23/5) ele chegou ao cúmulo de cancelar a edição do principal noticiário de sua emissora, o “SBT Brasil”, depois de ouvir reclamações do governo após a edição do telejornal do dia anterior, quando foi mostrado o execrável vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, aquela onde sobraram palavrões e ameaças e faltou um mínimo de espírito público.

    No lugar do telejornal, sem qualquer aviso prévio de mudança, o SBT exibiu a reprise do programa “Triturando”. A descarada censura empresarial de Sílvio Santos é um caso único mesmo em se tratando da mídia da “Casa Grande” e está sendo criticada até pelas emissoras afiliadas ao SBT, que a consideraram “vergonhosa”.
    Já a TV Bandeirantes e Rede TV vêm alternado elogios e críticas a Bolsonaro, conforme as verbas publicitárias que recebem. Isso ficou nítido na fala do presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, durante a reunião ministerial do dia 22 de abril, em que afirmou que a Band “queria dinheiro”.
    A frase dá a entender que o banco havia recusado um pedido de ajuda da emissora, pois Guimarães emendou dizendo que “acho que a gente tá com um problema de narrativa. Hoje de manhã, por exemplo, o pessoal da Band queria dinheiro. O ponto é o seguinte: vai ou não vai dar dinheiro pra Bandeirantes? Ah, não vai dar dinheiro pra Bandeirantes? Passei meia hora levando porrada, mas repliquei”.
    Considerado porta-voz informal de Bolsonaro, o apresentador do programa policialesco “Brasil Urgente”, José Luiz Datena, de maior audiência na Band, reagiu com indignação e criticou as palavras do presidente da Caixa. Chegou mesmo a anunciar que “nunca mais” entrevistaria Bolsonaro, atitude que, para muitos, não passou de jogo de cena, certo de que os brasileiros têm memória curta.

    Dos veículos da “Casa Grande”, apenas a Folha de S. Paulo, durante a campanha eleitoral de 2018, com uma série de reportagens de Patrícia Campos Mello, chegou a fazer críticas ao processo. A série dava conta de que dezenas de empresários brasileiros, que apoiavam Bolsonaro e haviam comprado pacotes de disparos de mensagens contra o PT no WhatsApp às vésperas do primeiro turno, se preparavam para repetir a prática no segundo turno das eleições. A prática é ilegal, pois se trata de doação de campanha por empresas, o que é vedado pela legislação eleitoral. Some-se a isso que o conteúdo dessas mensagens era mentiroso. O que constitui crime.

    A grave denúncia da “Folha” acabou caindo no vazio, pois não teve repercussão nos
    demais jornais como Globo e Estado de S. Paulo e menos ainda nas TVs. O próprio
    Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que havia se comprometido publicamente a combater
    e punir as fake news durante as eleições, não tomou qualquer providência.
    Os chamados “jornalões” que tanto combateram os governos petistas, por sua vez, foram unânimes ao apoiar a retirada de direitos da população brasileira, a exemplo das reformas Trabalhista e da Previdência, nos governos Temer e Bolsonaro, apresentadas por eles como “fundamentais e necessárias” para a “geração de empregos e retomada do crescimento”.
    Esses mesmos jornais, na maioria das vezes, fizeram vistas grossas não só às declarações como as próprias ações do governo Bolsonaro no que diz respeito à destruição da Amazônia, à perseguição aos índios, mulheres, negros, LGBTs, professores, artistas, cientistas, aposentados e funcionários públicos. Perseguição às quais se somam agora as contra governadores e prefeitos que criticam Bolsonaro e resistem ao “retorno às atividades normais” em plena pandemia. O que esses jornais e a própria Globo não imaginavam é que poderiam ser a próxima vítima.
    Como a perseguição chegou também a alguns veículos da “Casa Grande”, era de se esperar que, finalmente, passassem a fazer jornalismo. Vale dizer: divulgar o que está acontecendo e ouvir sempre os vários lados envolvidos na questão. Mas não é o que se vê. Nesse sentido, os casos da TV Globo, do Estado de S. Paulo e da própria “Folha” são emblemáticos.
    Na edição de quarta-feira (27/5) o Jornal Nacional trouxe uma longa reportagem sobre a decisão do ministro Alexandre de Moraes no que diz respeito ao combate às fake news e aos discursos de ódio. Os mandados de busca e apreensão atingiram em cheio apoiadores de Jair Bolsonaro e têm tudo para chegar ao Palácio do Planalto.
    Para repercutir a decisão, sem dúvida muito importante para o futuro da democracia
    brasileira, o JN ouviu quase uma dúzia de pessoas: entrevistou os presidentes da Câmara e do Senado, além de parlamentares de diversas agremiações e de especialistas.
    Ficou de fora dessa repercussão, no entanto, o nome mais importante: o do candidato
    Fernando Haddad, do PT, que disputou com Bolsonaro o segundo turno das eleições em 2018 e foi derrotado exatamente pelo discurso de ódio e pelas fake news. Excluir o PT e os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff do noticiário não só da TV Globo como de todos os demais veículos do Grupo Globo – O Globo, CBN, G1, Valor Econômico, Época, GloboNews – tem sido uma prática. Além de jamais entrevistá-los, até em comparações são excluídos. Já se transformou em bordão os repórteres da Globo, por exemplo, ao fazerem comparações entre o governo atual e os de Lula e Dilma, citá-los apenas como “governos anteriores”. O nome dessa técnica em jornalismo é silenciamento e tem como objetivo impedir que recordações positivas voltem à memória das pessoas.

    Moro

    Ao mesmo tempo em que buscam apagar a memória positiva associada aos governos Lula e Dilma, a Globo não mede esforços para expor seus “heróis” como é o caso do ex-juiz da Operação Lava Jato e ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, e do governador de São Paulo, o tucano João Dória, possivelmente já de olho nas eleições de 2022.
    O pedido de demissão de Moro rendeu uma cobertura digna dos mais importantes fatos da República. Presente com destaque em todas as edições do JN desde então, Moro foi alvo de uma entrevista de 20 minutos no Fantástico, no domingo 24/5.
    Entrevista que se assemelhou muito a um processo de mídia training, no qual os
    “pontos positivos” de Moro (implacável contra a corrupção, determinou a prisão de Lula) foram destacados e os “negativos” apresentados de maneira que ele pudesse, desde já, neutralizá-los. Algo como: permaneci no governo Bolsonaro por 16 meses, porque queria defender a independência da Polícia Federal e deixei o governo, por me sentir traído.
    Quanto a João Dória, ele tem sido presença constante no JN, que tem deixado sua câmera e microfone abertos para falar sobre o combate à pandemia e quaisquer outros assuntos do seu interesse. O curioso é que São Paulo, o estado mais rico da federação, é o que tem também o maior número de contaminados e mortos pelo covid-19.
    São Paulo vem sendo governado pelos tucanos há mais de 20 anos, mas isso não vem ao caso. Como não vem ao caso que todos os partidos conservadores – MDB e PSDB à frente – com o entusiástico apoio da mídia da “Casa Grande” aprovaram o congelamento por 20 anos dos gastos com saúde e educação. Deu no que deu. Já o “Estadão” que no segundo turno das eleições presidenciais havia considerado, em editorial, “uma escolha muito difícil” entre o candidato do PT, Fernando Haddad, e Jair Bolsonaro, então filiado ao PSL, voltou a insistir na mesma tecla.
    Um dia depois de ver parte da mídia determinar que seus profissionais abandonassem o “cercadinho”, o matutino conservador paulistano fez outra comparação para lá de esdrúxula, entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula, dizendo que “nasceram um para o
    outro” e “enxergam o mundo e seu papel nele da mesmíssima perspectiva”.
    Além de vergonhoso e não corresponder minimamente à realidade (Bolsonaro é um
    fascista e Lula, um humanista) um texto como esse tem tudo para entrar para a história da mídia da “Casa Grande” como prova da má-fé e subserviência de um punhado de redatores aos seus patrões. Não por acaso, o próprio Haddad, fazendo uma paródia do editorial do “Estadão”, publicou, em suas redes sociais, que entre o jornal conservador paulistano e Bolsonaro, a “escolha ficou muito difícil”.
    Já a “Folha”, como esses outros dois veículos, quer a saída de Bolsonaro do poder, mas
    está longe de admitir, por exemplo, que fez campanha contra Dilma; que defendeu a
    condenação e prisão, sem provas, de Lula; que a eleição de 2018 foi fraudada e que a
    restauração da democracia no Brasil passa por novas eleições. Uma pista do que ela e
    os demais veículos da “Casa Grande” pretendem foi dado pelo artigo do professor de
    Direito Internacional da USP, Pedro Dallari, publicado em sua edição de 28/5.
    Sob o título de “A hora do vice-presidente. A gravidade da situação atual não admite
    outra solução para o país”, o também matutino paulistano deixa claro os limites e os
    interesses da oposição que passou a fazer ao governo Bolsonaro. Essa oposição, por
    exemplo, exclui o campo progressista, a começar pelo maior partido político brasileiro,
    o PT.

    É nesse sentido que, guardadas as proporções, a mídia da “Casa Grande” tem lá suas
    semelhanças com a turma das fake news e da disseminação do ódio. Foi no caldo da
    sistemática desconstrução dos governos petistas – e, no passado, no de todos os governos progressistas como Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart – que as fake news prosperaram: combate ao comunismo, denúncias sem provas de corrupção, linchamento midiático de adversários etc.
    Ao tomar partido contra o PT, a mídia corporativa brasileira passou a apoiar tudo o que pudesse significar a sua derrota. E foi aí que veio Bolsonaro. E foi aí também que essa mídia, que já não gozava de muita respeitabilidade, perdeu a condição de fonte confiável de informação, se é que algum dia a teve. Condição que agora luta para recuperar e até mesmo para sobreviver.
    A TV Globo – que tem visto sua audiência aumentar, mas ao mesmo tempo, vem sendo
    obrigada a um drástico enxugamento em sua folha de pessoal e reestruturação de seus
    veículos – trabalha para sair por cima não só desse racha, mas para voltar a dar as cartas na política brasileira. Quem não se lembra que o patriarca Roberto Marinho se considerava um “fazedor de presidentes” e realmente o foi mesmo após o fim da ditadura de 1964?
    Daí o dilema que vivem no momento Globo, Folha e Estadão. Ao contrário dos demais veículos e da turma das fakes news, que parecem dispostos a ir com Bolsonaro até o fim (qualquer que seja ele), os três tendem a calibrar essas críticas. Dificilmente, no entanto, elas atingirão a agenda ultraliberal do governo, que defendem com unhas e dentes. Daí, cada dia mais, a oposição que fazem assumir a postura de “conservadora”, com nome e sobrenome para quem apoiam: Hamilton Mourão.
    A Globo sabe que Bolsonaro não tem como cassar-lhe a concessão, pois exigiria o apoio de dois terços dos membros do Congresso Nacional, que ele não tem. Mas ele pode adotar medidas como colocar a Receita Federal para analisar a situação da empresa. Várias no setor da mídia são devedoras contumazes. Toda essa situação é inédita no Brasil. É a primeira vez que parte dessa mídia se vê
    afrontada por quem ela mesma ajudou a eleger. O fato, por si só, deveria propiciar uma profunda reflexão e mudança de comportamento por parte dessa mídia e de quem a faz.
    Como dificilmente isso acontecerá, a democracia no Brasil continua precisando de outra mídia. Mas isso é assunto para outro artigo.

  • CNN BRASIL, A TRAMOIA ANUNCIADA

    CNN BRASIL, A TRAMOIA ANUNCIADA

    Por Ricardo Melo, especial para os Jornalistas Livres

     

    Colunistas de mídia com pouco assunto, mas talvez muitos interesses, têm se esmerado em festejar a provável estreia da CNN Brasil nos próximos meses. Estreia adiada várias vezes, é bom lembrar.

    Ninguém nega. A marca internacional é uma grife, inaugurou um jeito novo de fazer TV, constituiu-se num marco ao transmitir notícias 24 horas com uma amplitude até então inédita. Um sucesso, descontados os limites do conteúdo de suas coberturas. Mas será isso suficiente para repetir o mesmo no Brasil?

    Vamos pelo início. Por aqui, a CNN tropical tem como seus manda-chuvas duas figuras singulares. O sócio “jornalístico” é Douglas Tavolaro. Quem vem a ser o cidadão? Durante anos e anos, foi braço direito de Edir Macedo, que dispensa maiores comentários.

    Ocioso também falar do “jornalismo” da TV Record nestes tempos da Igreja Universal, cuja independência e imparcialidade sempre foram medidas em dízimos e favores governamentais. Lulista e Dilmista até outro dia, hoje é porta-voz escancarado do neo-fascista Jair Bolsonaro.

    Douglas Bolsonaro andava por lá nessa época, sempre é bom lembrar. Sua “saída” da Record até hoje é um mistério –será que abandonou mesmo as bênçãos do padrinho Edir Macedo? Silêncio ensurdecedor.

    Já o “sócio-capitalista”, Rubens Menin, é o dono da construtora MRV. Para quem não sabe, Menin tornou-se bilionário com o programa Minha Casa, Minha Vida dos governos petistas. Quando o governo Dilma começou a adernar, Menin rapidamente mudou o curso em direção a Michel Temer e depois Jair Bolsonaro. Nesse intervalo, abriu um banco, o Inter, que hoje é um dos campeões de reclamações de clientes por mau atendimento.

    Para não deixar dúvidas sobre quais interesses impulsionam a nova empreitada “jornalística”, basta ver a foto que abre este texto…

    A foto diz tudo. Pelo menos na teoria (embora no Brasil ela não valha nada), o primeiro papel da imprensa deveria ser a independência diante dos governos. Aqui, como se vê é o contrário. O primeiro passo é ir ao Planalto beijar a mão do mandante de plantão, seja ele fascista no conteúdo, defensor da censura, liberticida e inimigo da informação desimpedida. Precisa desenhar o que acontecerá no noticiário?

    Descendo mais um pouco. A cada contratação da CNN Brasil há um foguetório dos colunistas sem assunto. Mas até agora observa-se apenas gente da série B ou C. Não há nenhum nome de peso, com trajetória jornalística de respeito, credibilidade, seriedade. Na cúpula, gente de segunda linha, arrivistas conhecidos, profissionais timoratos, desde expelidos da Record até rejeitados pela RedeTV! e Empresa Brasil de Comunicação.

    Reinaldo Gottino, um dos Datenas da Record, é tratado por essa mídia como se fosse um Peter Jennings, Dan Rather, Paulo Henrique Amorim, Ricardo Boechat. Que desgraça. Dejetos de Edir Macedo, personagens dispensados pela Globo —um deles agora garoto propaganda de uma empresa financeira caça-níqueis—, âncoras que infelizmente incineraram suas carreiras expondo opiniões neo-racistas, casais juvenis sem nenhuma expressão até para propaganda de shopping-centers e por aí afora são considerados medalhões.

    Detalhe: para todo jornalista que se depara com um mercado cada vez mais estreito, em tese é bom saudar novas oportunidades de emprego. Mas também é bom saber que oportunidades são essas. Já vimos aventuras como a do Jornal do Brasil na época de Nelson Tanure; da RedeTV! que até hoje esfola funcionários, mas é financiada pelo dinheiro público para bancar o enriquecimento e aventuras amorosas indecentes dos donos; e das demais “redes” da mídia oficial subservientes aos governos de plantão.

    A CNN Brasil tem o mesmo cheiro. E ele não é bom. Cabe a cada um escolher aquele que mais lhe agrada.

     

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  • Aécio fez Joe$ley pagar compra de jornal

    Aécio fez Joe$ley pagar compra de jornal

    BELO HORIZONTE – Não há como negar, boleto para pagamento do IPTU obtido pelos Jornalistas Livres comprova que realmente a J&F, a holding de Joesley Batista, pagou a compra do jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte, por R$ 17 milhões, a pedido do senador Aécio Neves. Isso é mais uma prova de que o senador Romero Jucá, do MDB, sabia mesmo muito bem do que dizia quando se referiu ao colega mineiro como o “primeiro a ser comido”, durante diálogo telefônico com o ex-presidente do PSDB e ex-senador Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.

     

    Falou-se muito dos R$ 2 milhões pedidos por Aécio ao dono da JBS “para pagar advogado”, conforme delatou o empresário, mas só agora fala-se com mais vigor sobre os R$ 17 milhões usados na compra do “predinho” do jornal, como chegou a ser dito pelo próprio Joesley. Se faltava algo para comprovar a destinação dos R$ 17 milhões aos negócios do senador mineiro, aí está a guia de pagamento do IPTU do tal prédio da Rua Padre Rolim, 652, um filé mignon imobiliário bem na região hospitalar da capital mineira. Curiosamente, este é o único bem de Joesley em Minas, onde não possui qualquer negócio.

     

    O imóvel, usado como sede do Hoje em Dia durante décadas, está em nome de nada menos do que a J&F Investimentos S/A, a holding da empresa JBS que, por sinal, teve o ministro Henrique Meirelles no comando de seu conselho de administração entre 2012 até pouco antes de assumir o atual cargo. Ali ele recebia R$ 40 milhões por ano e uma de suas raras funções seria irrigar as campanhas eleitorais dos apaniguados de Joesley. E quando se pesquisa na Prefeitura de Belo Horizonte para saber quem são os titulares da J&F, eis que aparece o nome de Joesley Mendonça Batista abaixo de Antônio da Silva Barreto Júnior como ‘contatos’

     

    Um prédio polêmico

     

    Após a confissão de Joesley sobre suas relações com Aécio, há um ano, o prédio de cinco andares começou a dar o que falar. Desocupado desde que o jornal mudou de endereço nas mãos de novo dono no início de 2016 e sem alguém que se apresentasse como seu proprietário, chegou a ser ocupado, na marra, em 1º junho de 2017 por jornalistas, gráficos, pessoal da administração e movimentos sociais. Demitidos pelo atual dono sem receber seus direitos e até mesmo salários, os jornalistas viram na ocupação do prédio um bom motivo para chamar atenção sobre o drama que viviam. Conseguiram.

     

    Em junho do ano passado o “predinho” foi ocupado por ex-funcionários do jornal Hoje em Dia e Joesley Batista acabou reconhecendo a sua posse – Foto de Isis Medeiros

    A ocupação colocou os holofotes sobre o prédio. Logo a J&F se apresentou como dona do pedaço e colocou o imóvel à venda por R$ 17,5 milhões. Só que surgiu nova pedra no caminho da holding de Joesley: a Justiça do Trabalho bloqueou a venda do imóvel até que se resolva o pagamento de todos aqueles que buscam seus direitos. E assim continua, e, enquanto aguarda uma solução, um terreno ao lado, também de Joesley, foi arrendado para estacionamento de veículos.

     

    Pelo boleto do IPTU nota-se que a J&F vem pagando religiosamente as 11 parcelas de R$ 5.686,06, que vão totalizar R$ 34.116,36. Reza a lenda que o prédio é um pau que nasceu torto desde que foi construído pelo jornal Diário do Comércio, o primeiro dono, e não teria habite-se, principalmente depois que um bispo da igreja Universal resolveu construir mais um andar para instalar a nova redação sem a contratação de um arquiteto ou engenheiro.

     

    Trajetória sinistra

     

    Também o jornal tem uma trajetória sinistra desde que foi criado pelo então governador Newton Cardoso, há 30 anos, para ser o “maior de Minas”. Mas pouco depois acabou vendido para a TV Record/Igreja Universal, num pacote em que incluía a emissora mineira de TV da rede Record. Nas mãos dos bispos de Edir Macedo chegou a ter 64 mil exemplares impressos. Depois, decadente e acumulando um prejuízo de R$ 38 milhões em 2012, a TV Record/Igreja Universal trataram de se livrar do abacaxi em 2013. Logo apareceram apressados interessados.

     

    Há cinco anos o empresário mineiro Rogério de Aguiar Ferreira, então dono da Axial Medicina Diagnóstica, irrompeu pela redação anunciando a compra do jornal. Saiu carregando o apelido de “Boneco de Olinda”, devido à sua estatura avantajada. Na semana seguinte correu para São Paulo a fim de acabar de fechar o negócio com os bispos da Universal. Deu com os burros n’água naquela terça-feira. À boca pequena correu a versão de que não teria levado a mala recheada com dinheiro vivo, uma exigência do bispado.

     

    Era tudo o que a dupla Aécio/Andrea Neves queriam. Imediatamente entraram em ação rumo a algum pomar onde encontrassem laranjas. Semanas depois era a vez de Marco Aurélio Jarjour Carneiro, do Grupo Bel, irromper pela redação do jornal para anunciar a sua compra no dia 18 de setembro de 2013. Parte do dinheiro da aquisição teria vindo da desapropriação de parte de um terreno da antena de rádio dos Carneiros no alto do bairro Novo São Lucas, porta de entrada da favela do Cafezal, com valor superfaturado. R$ 10 milhões, o que motivou uma ação do governo de Minas em tramitação na 5ª Vara da Fazenda, processo 1700189-54.2013.8.13.0024 do Tribunal de Justiça de MG contra a Rádio Del Rery Ltda., de Jarjour Carneiro. Outro dinheiro que entrou no negócio foram R$ 2 milhões da construtora Andrade Gutierrez, a título de publicidade que nunca foi vista.

     

    Dono também da Rádio 98, concorrente da Jovem Pan em BH, entre outros negócios, Carneiro colocou o filho Flávio Jaques Carneiro, um amigão de Aécio, na presidência do jornal, e trouxe para comandar a redação o jornalista Ricardo Galuppo, um mineiro radicado em São Paulo.

     

    A função de Galuppo era, principalmente, azeitar o jornal para ser usado na campanha de Aécio Neves à presidência. E azeitou. Principalmente na acirrada disputa do segundo turno, quando o jornal se esmerou em publicar, com exclusividade, sensacionais manchetes a favor da candidatura do tucano, baseadas em estranhas pesquisas eleitorais do desconhecido instituto de pesquisas Veritá, de Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Manchetes e números que eram largamente expostos nos horários de propaganda eleitoral gratuita de rádio e TV. Cuidou o jornal também de deturpar e mentir sobre Igor Rousseff, um pacato irmão da então presidente Dilma Rousseff, morador na também pacata Passa Tempo, no interior de Minas, informações que foram exploradas por Aécio nos debates de TV entre os dois candidatos.

     

    O episódio rendeu, inclusive, uma denúncia de ‘crime eleitoral’ contra Aécio Neves no Ministério Público Federal, onde recebeu o número de expediante 1.22000.002391/2016-50. Atualmente a denúncia está sob sigilo, após ser absorvida por Rodrigo Janot, que ordenou investigação a respeito e mandou o caso até mesmo para a Lava Jato.

     

    Na época, Jarjour Carneiro dizia aos mais chegados: “Estamos com um dinheiro aí, vamos ver até onde poderemos ir”. E, realmente, foi até onde pôde. Se Aécio tivesse sido eleito à Presidência da República estaria nadando de braçadas no paraíso, mas, com a derrota do senador, deu com as portas abertas do inferno. Acabou vendendo o jornal por apenas R$ 1 mil, isso mesmo, sem o prédio, logicamente, para o então prefeito de Montes Claros, Ruy Muniz, marido da deputada Raquel Muniz (PSC), que ficou conhecida negativamente pelo seu “Sim, sim, sim” após elogiar a honestidade do maridão e votar pelo impeachment da presidente Dilma. Na manhã seguinte, Ruy Muniz era preso pela Polícia Federal por corrupção.

     

    Muniz ficou com o jornal e seus credores, enquanto o prédio, o patinho feio que ninguém queria assumir, voltou para os braços daquele que patrocinou a sua compra a pedido de Aécio Neves: Joesley Mendonça Batista.