Jornalistas Livres

Tag: The Intercept Brasil

  • ‘Vamos criar distração’ VAZAJATO#parte21

    ‘Vamos criar distração’ VAZAJATO#parte21

    Do The Intercept Brasil

    O Procuradores da Lava Jato no Paraná programaram a divulgação da denúncia contra Luiz Inácio Lula da Silva no caso do sítio em Atibaia fazendo um cálculo corporativista e midiático. Em maio de 2017, eles decidiram publicar a acusação numa tentativa de distrair a população e a imprensa das críticas que atingiam Procuradoria-Geral da República na época, mostram discussões travadas em chats no aplicativo Telegram entregues ao Intercept por uma fonte anônima.

    À época, a equipe do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, estava sob bombardeio por causa de um áudio vazado da colaboração premiada dos executivos do conglomerado JBS que atingia em cheio o presidente Michel Temer. Havia suspeitas de que o material havia sido editado. Meses depois, problemas mais graves – como o jogo duplo do procurador Marcelo Miller, que recebeu R$ 700 mil para orientar a JBS – levaram o próprio Janot a pedir que o acordo fosse rescindido.

    A denúncia do sítio já estava pronta para ser apresentada em 17 de maio de 2017, dia em que o jornal O Globo publicou reportagem acusando Temer de dar aval a Joesley para a compra do silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, do MDB. Diante da notícia, que caiu como uma bomba em Brasília, o coordenador das investigações no Paraná, Deltan Dallagnol, decidiu adiar o oferecimento e a divulgação da acusação contra Lula, inicialmente programadas para o dia seguinte.

    O perito Ricardo Molina, contratado pela defesa de Michel Temer, disse que o áudio da gravação da conversa de Joesley Batista com o então presidente era “vagabundo” e questionou sua autenticidade.

    Quatro dias depois, num domingo, a força-tarefa debatia no Telegram o tratamento dado pela imprensa ao áudio de Temer e Joesley. Peritos entrevistados ou contratados por veículos de comunicação identificaram cortes na gravação e apontaram que poderia ter havido edição do arquivo.

    A Lava Jato do Paraná, que não teve participação na delação da JBS, se preocupava: além de considerarem as falas de Temer inconclusivas do ponto de vista jurídico, os procuradores – que nunca lidaram bem com críticas da imprensa – se incomodavam com a repercussão das suspeitas de adulteração do material.

    Convencidos da integridade da gravação, os procuradores esperavam que viesse a público o quanto antes um laudo da Polícia Federal sobre o áudio. Foi durante essa discussão que Santos Lima expôs seu plano no grupo Filhos do Januario 1, restrito aos integrantes da força-tarefa: “Quem sabe não seja hora de soltar a denúncia do Lula. Assim criamos alguma coisa até o laudo”. Após seu chefe, Deltan Dallagnol, se certificar de que o plano poderia ser posto em prática, ele comemorou, no mesmo grupo: “Vamos criar distração e mostrar serviço”.

    A denúncia contra Lula foi apresentada à justiça e divulgada à imprensa no final da tarde do dia seguinte, dia 22.

    ‘ANUNCIARAM BATOM NA CUECA. E COM RELAÇÃO AO TEMER, NÃO TEM’

    COMO QUASE TODO O BRASIL, a força-tarefa da Lava Jato no Paraná ficou sabendo do áudio em que Joesley Batista incriminava Michel Temer pela imprensa. Às 19h54 de 17 de maio, o procurador Athayde Costa enviou ao grupo de Telegram Filhos do Januario 1 o link da reportagem de O Globo. A informação abalou Brasília a tal ponto que forçou Temer a fazer um pronunciamento no dia seguinte para garantir, em seu português empolado, que não renunciaria à Presidência.

    Enquanto os procuradores da Lava Jato discutiam o vazamento, a procuradora Jerusa Viecili avisou aos colegas que a denúncia do sítio estava pronta para ser apresentada. Dallagnol, porém, avaliou que a acusação seria “engolida pelos novos fatos”, ou seja, os desdobramentos das revelações contra Temer.

    17 de maio de 2017 – Filhos do Januario 1

    Jerusa Viecili – 20:11:21 – pessoal, terminamos a denuncia do sitio. segue em anexo caso alguem quiera olhar. a ideia era protocolar amanha, mas devido aos novos acontecimentos …..
    Deltan Dallagnol – 20:11:26 – Por isso Janot me disse que não sabe se Raquel è nomeada pq não sabe se o presidente não vai cair
    Dallagnol – 20:11:38 – Esperar
    Dallagnol – 20:11:45 – Amanhã será engolida pelos novos fatos
    Dallagnol – 20:11:56 – E cá entre nós amanhã devemos ter surpresas
    Viecili – 20:11:56 – [anexo não encontrado]
    Viecili – 20:12:06 – [anexo não encontrado]
    Athayde Ribeiro Costa – 20:12:09 – Tem que ser segunda ou terca
    Viecili – 20:12:18 – sim, por isso podem olhar. pq eu nao aguento mais esse filho que não é meu! hehehehe
    Costa – 20:12:39 – É nosso
    Costa – 20:12:47 – E de todos

     

    As primeiras conversas dos procuradores sobre a delação da JBS revelam um clima de excitação. “To em êxtase aqui. Precisamos pensar em como canalizar isso pras 10 medidas”, escreveu Dallagnol em 17 de maio, no mesmo grupo, referindo-se ao projeto de medidas contra a corrupção capitaneado por ele.

    “Bem que poderia vir uma gravação do Gilmau junto né?!”, escreveu minutos mais tarde o procurador Roberson Pozzobon, em alusão ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, visto como um arqui-inimigo pela força-tarefa. O procurador Orlando Martello retrucou, pouco depois: “Defendo uma delação com temer ou Cunha para pegar Gilmar”.

    Passada a euforia inicial, no entanto, alguns procuradores começaram a expressar ceticismo sobre o real impacto do áudio contra Temer.

    19 de maio de 2017 – Filhos do Januario 1

    Carlos Fernando dos Santos Lima – 07:14:59 – Os áudios do Temer não são matadores, mas são bem melhores que eu imaginava.
    Santos Lima – 07:21:31 – E quanto a participação do Miller, ele até poderia negociar valores, mas tratar do escopo é algo inadmissível, pois é justamente aí que há a possibilidade de uso de informações privilegiadas. Houve ingenuidade em aceitar essa situação como se ela não fosse aparecer na imprensa.
    Santos Lima – 07:28:11 – [anexo não encontrado]
    Santos Lima – 07:28:52 – Júlio. Você que é especialista, conhece essa dupla sertaneja?
    Viecili – 07:31:41 – Problema foi que anunciaram batom na cueca. E com relação ao Temer, não tem.
    Viecili – 07:35:21 – Kkkkk desconheço; só apareceram nas paradas recentemente
    Santos Lima – 07:40:28 – Os diálogos são indefensaveis no contexto politico. Não há volta para o Temer. Ainda mais que a Globo não está aliviando como os jornais de São Paulo.
    Santos Lima – 07:40:33 – http://m.oantagonista.com/posts/exclusivo-a-integra-do-anexo-9
    Viecili – 07:44:22 – Sim. No contexto político. Mas com relação a crime, os áudios não são tão graves como anunciado.

     

    ‘AÍ MATA A REPERCUSSÃO’

    À MEDIDA QUE OS DIAS PASSAVAM, crescia a preocupação dos procuradores com questões que a força-tarefa considerava perigosas à imagem da Lava Jato. Uma delas era a situação delicada do ex-procurador Marcello Miller, que veio à tona no dia seguinte à reportagem de O Globo.

    A imprensa apontava que Miller, braço-direito de Janot na Lava Jato até o início de 2017, havia sido contratado pelo escritório de advocacia Trench Rossi Watanabe, que trabalhava no acordo de leniência – a delação premiada de pessoas jurídicas – da JBS em outra operação, a Greenfield. À época, a PGR limitou-se a afirmar que Miller não participou das negociações da delação.

    A força-tarefa também se preocupava com as condições do acordo com a JBS, que previa, inicialmente, total imunidade aos delatores: eles não seriam denunciados criminalmente, ficariam livres da prisão e de tornozeleira eletrônica e poderiam se manter no comando das empresas. Dallagnol reportou aos colegas que apoiadores da Lava Jato consideraram “absurdo os batistas nos EUA rindo da nossa cara”, referindo-se aos irmãos Joesley e Wesley Batista, que deixaram o Brasil no mesmo dia em que fecharam a delação.

    O procurador Athayde Costa considerava que o Ministério Público estava “perdendo a guerra da comunicação” no caso da JBS. Concordando, Dallagnol angustiava-se com o silêncio de Janot, que não havia se manifestado publicamente desde a revelação de O Globo. Um trecho do diálogo entre os dois no Telegram mostra que Dallagnol tentou orientar o procurador-geral da República sobre como abafar a crise.

    20 de maio de 2017 – Chat privado

    Deltan Dallagnol – 15:50:31 – Caro segue o que postei mais cedo para mais de 100 colegas. Conte comigo e com a FT.
    Dallagnol – 15:50:32 – Caros a FTLJ não participou dos acordos e ficamos sabendo com a matéria do globo, como todos. É fácil quem não está na mesa de negociacao criticar. Há muitas peculiaridades no caso que justificam os termos do acordo. A questão é utilitária. Esse acordo entregou mais de 1800 políticos; o presidente da república e alguém que poderia ser o próximo, com provas bastante consistentes de ilícitos graves. Como creio que a PGR esclarecerá em breve, Miller não atuou no acordo, nem mesmo a empresa Trench, que só trabalha na leniencia, que é conduzida pela Greenfield e ainda não foi fechada. Está começando, como outras vezes, uma intensa guerra de comunicação. A imunidade é justificável, mas será um desafio na área da comunicação. A PGR conta com nosso apoio nesse contexto porque temos plena confiança na correção do procedimento e no interresse público envolvido na celebração dos acordos como feitos, considerando inclusive as peculiaridade do ambiente de negociação, feita com empresários que não tinham sequer condenações ou um ambiente adverso muito claro. Lembremos que o mais importante agora são as reformas que poderão romper com um sistema político apodrecido e as revelações desse acordo poderão contribuir muito nessa direção, se soubermos canalizar a indignação para o ponto certo, que é a podridão do sistema e a necessidade de mudanças.
    Dallagnol – 15:50:41 – Na minha opinião, precisamos focar em esclarecer os seguintes pontos em redes sociais e entrevistas: 1) Falsa estabilidade não justifica mantermos corruptos de estimação e crises intermitentes decorrerão da omissão em enfrentar esse mal. 2) A gravação é regular – tem a matéria da Folha que postei. Quanto à edição, há análises periciais com resultado pendente, mas tudo indica que confirma a ausência de edições. 3) Miller não atuou nos acordos feitos. 4) A excepcionalidade dos benefícios se justifica pela excepcionalidade das circunstâncias, pela exclusividade do que foi entregue, pela força dos fatos e provas, pela pela ausência de condenações e disposição em correr riscos na ação controlada. 5) A podridão revelada justifica priorizar a reforma anticorrupção. O ideal é que a PGR tome a frente nisso. Esse caso é um desafio pelo prisma da comunicação, com a máquina de marketeiros profissionais e duvidas naturais e legítimas da população.
    Dallagnol – 15:51:17 – Eu creio que um pronunciamento seu em vídeo ou exclusiva no JN seria muito pertinente e daria o tom para nós todos.

     

    Janot não respondeu naquele sábado, mas fez uma declaração, pela primeira vez desde a eclosão do escândalo, horas após as mensagens de Dallagnol. O Procurador-geral enviou ao STF uma manifestação afirmando que o áudio contra Temer “não contém qualquer mácula que comprometa a essência do diálogo”.

    A angústia em Curitiba, contudo, não foi aplacada. Assim, no domingo à noite, Santos Lima apareceu com a ideia salvadora.

    21 de maio de 2017 – Filhos do Januario 1

    Carlos Fernando dos Santos Lima – 20:02:26 – Quem sabe não seja hora de soltar a denúncia do Lula. Assim criamos alguma coisa até o laudo.
    Deltan Dallagnol – 21:03:14 – Acho que a hora tá ficando boa tb. Vou checar se tem operação em BSB, que se tiver vai roubar toda a atenção

     

    A resposta de Dallagnol mostra que os procuradores queriam garantir que não haveria, na Lava Jato de Brasília, uma operação – prisões ou buscas e apreensões contra investigados, por exemplo – que disputasse a atenção da imprensa com a acusação contra o ex-presidente.

    No minuto seguinte, ele enviou uma mensagem a outro grupo de Telegram, o Conexão Bsb – CWB, e consultou os colegas da PGR sobre a agenda da semana seguinte.

    21 de maio de 2017 – Conexão Bsb – CWB

    Deltan Dallagnol – 21:04:26 – SB, estamos querendo soltar a nova denúncia do Lula que sairia semana passada, mas seguramos. Contudo, se tiver festa de Vcs aí, ela será engolida por novos fatos… Vc pode me orientar quanto a alguma data nesta semana? Meu receio é soltarmos num dia e no seguinte ter operação, pq aí mata a repercussão
    Sérgio Bruno – 21:24:03 – Sem operações previstas para esta semana
    Dallagnol – 21:39:18 – Obrigado!

     

    Com o sinal verde de Brasília, Dallagnol retornou ao grupo da força-tarefa no Paraná e deu a notícia.

    21 de maio de 2017 – Filhos do Januario 1

    Dallagnol – 21:39:51 – Nesta semana não tem op de BSB (mantenham aqui óbvio). Da pra soltar a den Lula Cf acharmos melhor
    Jerusa Viecili – 21:40:51 – Faremos o release amanha
    Santos Lima – 21:45:18 – Vamos criar distração e mostrar serviço.

     

    AS REVIRAVOLTAS SOBRE A DELAÇÃO DA JBS, no entanto, estavam apenas começando. No início de setembro de 2017, após os delatores entregarem novos materiais em complementação ao acordo já homologado, Janot anunciou que a PGR iria rever as delações de Joesley, do diretor de relações institucionais da JBS, Ricardo Saud, e do advogado da empresa, Francisco de Assis e Silva.

    O motivo: em meio à nova remessa de arquivos entregues à PGR, a JBS incluiu a gravação de uma conversa em que Joesley e Saud falam sobre a atuação alinhada da holding com Marcello Miller durante a negociação da delação.

    11 de outubro: Um dia após ser preso, Joesley Batista deixa sede da Polícia Federal em São Paulo rumo a Brasília.

    A situação de todos os envolvidos deteriorou-se rapidamente. Em dez dias, Joesley e Saud foram presos e viram seus acordos de delação serem cancelados por Janot. A rescisão dos contratos ocorreu em 14 de setembro, mesma data em que a PGR fez a segunda denúncia contra Temer com base na colaboração da JBS. Meses depois, em fevereiro de 2018, o executivo Wesley Batista e o advogado Francisco de Assis e Silva também perderiam os benefícios da delação.

    Miller, por sua vez, acabaria denunciado em junho de 2018 por ter aceitado R$ 700 mil da JBS para orientar os delatores durante as negociações. O processo contra ele, que corre na Justiça Federal de Brasília, foi trancado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região em 17 de setembro. A Quarta Turma do tribunal acatou um pedido da defesa de Miller, que apontou “inépcia” na denúncia do Ministério Público.

    A perícia da PF sobre o áudio, revelada mais de um mês depois que Lula foi denunciado no caso do sítio, identificou cortes, mas descartou adulteração na gravação. O conteúdo dela foi usado na denúncia que a PGR faria contra Temer e seu ex-assessor, Rodrigo Rocha Loures, em 26 de junho de 2017.

    Lula foi condenado a 12 anos e 11 meses de prisão no processo do sítio de Atibaia pela juíza Gabriela Hardt, em fevereiro de 2019. Ela admitiu ter partido de uma sentença do antecessor, Sergio Moro. O petista espera o julgamento de seu recurso na segunda instância, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

    Já os delatores da JBS aguardam, até hoje, que o STF decida se vai homologar a rescisão de suas colaborações, como pediu Rodrigo Janot. No último dia 9, pouco antes de encerrar seu mandato à frente da PGR, Raquel Dodge enviou um pedido ao STF para que priorize o julgamento do caso.

     

    QUESTIONADO PELO INTERCEPT SOBRE O CASO, o Ministério Público Federal do Paraná disse que “quando nenhuma questão legal (como a existência de prazo ou risco de prescrição) ou razão de interesse público determina o momento de apresentação de uma denúncia ou manifestação, a força-tarefa ouve a equipe de comunicação quanto ao melhor momento para sua divulgação”.

    Um dos mentores da estratégia, o ex-procurador Carlos Fernando dos Santos Lima foi consultado separadamente porque não integra mais os quadros do MPF, já que aposentou-se em março deste ano. No entanto, ele não respondeu aos contatos do Intercept. O espaço está aberto para os comentários dele, que serão acrescentados se forem enviados.

    A Procuradoria-geral da República também foi procurada para comentar o tema, mas informou que não irá se manifestar.

     

     

  • O TEATRO DE LULA É UM ESPETÁCULO

    O TEATRO DE LULA É UM ESPETÁCULO

    ARTIGO

    ALEXANDRE SANTOS DE MORAES, professor do Instituto de História da Universidade Federal Fluminense

     

    Na última semana, o promotor Deltan Dallagnol defendeu que Lula cumprisse o restante da pena em regime semiaberto. Reunido com advogados e companheiros de partido, o ex-presidente recusou o pedido de progressão de pena. Em carta, repetiu a frase que já se tornou célebre: “Não troco minha dignidade pela minha liberdade”. Tem início um debate que envolve não apenas as mixórdias da jurisdição, mas reflexões que o caráter excepcional da recusa provocam. A liberdade é um direito que pode ser livremente recusado por quem dela se beneficiaria ou um dever que, na contramão da própria noção de liberdade, deve ser exercido a despeito da vontade?

    Não é um tema novo na Filosofia, mas raras são as oportunidades em que essas reflexões se materializam na vida comum. De todo modo, a decisão inusual de Lula abriu espaço para discussões políticas. Pelas redes sociais, vi pessoas da direita fascista e da esquerda cirista acusarem-no de “estar fazendo teatrinho”. No primeiro momento, achei uma crítica rasa e medíocre, mas agora decidi acolher a metáfora.

    A peça está aberta. Muitos aguardam e lutam pelo final que gostariam de assistir. A plateia está exultante, como Brecht gostaria de ver: à direita do palco, aqueles que defendem o encarceramento perpétuo; à esquerda, os que gritam pela libertação apoteótica. Essa divisão também parece envolver a disputa pelo protagonismo e antagonismo.

    Alguns querem que Deltan Dallagnol seja o personagem principal. Eles defendem o menino cristão de Curitiba, de face rosada, que viveu seus melhores anos trancado no quarto estudando para concursos públicos e que da vida não conhece nada. Outros defendem o protagonismo de Lula, o imigrante nordestino que conheceu o amargo da vida, que lutou pela via sindical, fundou o maior partido de esquerda da América Latina, foi o presidente mais bem avaliado da História e se tornou vítima de uma tenebrosa farsa judicialesca.

    Seria uma competição muito naturalmente injusta, mas o cenário dessa tragédia política não foi o palanque em que Lula sempre atuou, mas os tribunais nos quais Dallagnol passou parte da vida adulta ensaiando. O ex-presidente sabia que a disputa seria difícil, mas resolveu bancar essa peça que começou há mais de 500 dias.

    Primeiro Ato. É exarada a condenação de Lula. Tem início a ilusão dramática e o público se vê diante do impasse: ele se entregará ou fará a opção pelo exílio? É bem provável que muitas pessoas próximas a Lula tenham recomendado a fuga, mas isso, de alguma forma, encerraria o espetáculo. Distante do palco, não teria como atuar e disputar as flores ao final da peça.

    Lula decide se entregar, mas não sem preparar uma cena monumental: monta um palco em São Bernardo do Campo, no Sindicato dos Metalúrgicos, e faz um discurso inflamado. Era uma missa ecumênica. No palco, aliás, além dos políticos, muitos artistas famosos fizeram fala. As músicas foram escolhidas a dedo pelo próprio Lula. Seu monólogo foi particularmente inspirado e levou a plateia ao delírio. Não faltou quem colocasse o próprio corpo entre ele e a Polícia Federal. As câmeras da televisão transmitiam do alto de prédios ou helicópteros. Após muita resistência, e fora do prazo legal estabelecido, Lula consegue se entregar e vai pra Curitiba. Ele controlou o tempo.

    Segundo ato. Começam as entrevistas. Alguns coadjuvantes, como a juíza federal Carolina Lebbos, tentam impedir que Lula permaneça em cena. A decisão é por censurar sua fala. Não tarda, porém, para que as movimentações políticas denunciem o regime de excepcionalidade jurídica. Esse não era o roteiro que o Judiciário esperava, mas são obrigados a ceder. Ainda que fora do cenário que gosta de atuar e sem a presença do povo que nunca cansou de aplaudi-lo, Lula começa a falar para a imprensa. Tentaram ganhar protagonismo isolando o competidor, mas ele voltou à cena em excelente forma física e com figurino impecável. Suas falas permanecem pontuais e envolventes, resultado da experiência que acumulou nos palcos da política. Os debates continuam e Deltan Dallagnol sabe que um power point não será mais suficiente para que os holofotes o iluminem.

    Terceiro Ato. Tem início a “Vaza Jato”. A série de reportagens que começaram com o The Intercept Brasil renovaram a disputa cênica. Deltan Dallagnol e Sérgio Moro (não podemos esquecê-lo!) tentam ficar na ribalta, escondidos. O primeiro foge feito galinha dos convites feitos pelo Congresso Nacional; o segundo, que não pode fugir, pois se assumiu político, vai e não diz nada. Suas falas são monótonas, pouco criativas, sem emoção. Não encantam ninguém. Mais do que isso, o enredo da tragédia começa a se desenhar tal como Lula, desde o início de preparação do espetáculo, previa.

    Estava claro que o núcleo da narrativa era o uso político do sistema de Justiça. O Ministério Público, como se sabe, só tinha convicções; agora, há provas que mostram que o único que conhecia o enredo era exatamente quem tentaram fazer de algoz. Só por isso é que as matérias da imprensa não funcionaram como um deus ex-machina, aquela solução abrupta celebrizada no teatro clássico de Eurípides. De alguma forma, Lula deu um spoiler, quase como um oráculo, e fez com que a tragédia toda se desenrolasse como também os gregos faziam muito bem: antecipando o final e atribuindo os rumos à Moira, ou seja, ao Destino.

    Quarto Ato. Deltan pede a Liberdade de Lula. Percebendo que o enredo caminha para um desfecho trágico, o ator faz uma tentativa desesperada de controlar os rumos da peça. Acuado, tenta decidir como será a vida de seu adversário, como se fosse ele a controlar um títere para manter-se no centro do palco. Acontece que Lula inverte o jogo e assume os pauzinhos da marionete, deixando Dallagnol envolvido pelos movimentos que ele próprio faz. Lula recusa a liberdade (quem recusaria?) para aumentar a tensão dramática e inverter o foco da ação. Tem início a disputa, a contenda, o agón: de um lado, aquele que encarcerou lutando pela liberdade do condenado para conseguir protagonismo; do outro, o encarcerado recusando a liberdade para constranger o carrasco. Cria-se uma abertura no drama. Não há solução fácil.

    O Brasil e o mundo aguardam os próximos atos. Dallagnol tentou ser o ator principal de uma tragédia que ele próprio se propôs a dirigir. O problema é que, como dizia o saudoso Antônio Abujamra, “há uma zona negra no palco que é do ator e que o diretor não entra”. O cenário burlesco foi montado por eles para ser hostil a Lula, mas ainda que os elementos cênicos envolvam as características de um tribunal, o conteúdo da peça é político, e disso o rapazote de Curitiba, com sua pele lisa e rosada, não entende absolutamente nada. Quem sabe mesmo é o barbudo nordestino, que se sente confortável nesse palco. Agora, os procuradores se tornaram reféns do processo penal do espetáculo que eles mesmos criaram.

    No início, poderíamos pensar que tudo isso seria um típico teatro do absurdo, que deixaria Beckett e Ionesco morrendo de inveja, mas Lula fez virar uma comédia de vaudeville, fazendo os procuradores de palhaços que caem, rolam e gritam numa tentativa miserável por algum riso da plateia. Os bastidores são terríveis e cada ato aumenta nossa angústia, mas a estética teatral é espetacular. Não há Shakespeare nesse mundo que produzisse obra de tamanha grandeza, e o final só pode ser um: Lula Livre!

  • Reprovação de Bolsonaro pula de 26% para 40%

    Reprovação de Bolsonaro pula de 26% para 40%

     

    Entre abril e agosto, a avaliação negativa do presidente Jair Bolsonaro saltou de 26% para 40% entre os eleitores consultados em pesquisa nacional Vox Populi, enquanto a aprovação caiu de 26% para 23%, junto a uma queda de 39% para 35% dos que consideram seu desempenho “regular”. Apenas 2% não responderam. A reprovação representa a soma dos que consideram o desempenho “ruim” (13%) e “péssimo” (27%, ou mais de um quarto dos pesquisados), enquanto a aprovação soma apenas 18% de “bom” e 5% de “ótimo”.

    A reprovação à maneira como o presidente faz política, às ideias que defende e ao modo como se relaciona com as pessoas e os opositores, o chamado “bolsonarismo”, aumentou de 30% para 47%, ou quase metade dos pesquisados. A aprovação ao “bolsonarismo” despencou de 30 para 23% no mesmo período, enquanto os que se consideram “neutros” nessa questão passaram de 30% para 27%. Só 4% não responderam à questão. Lula continua sendo o melhor presidente para 50% das pessoas.

    A queda expressiva da avaliação do desempenho de Bolsonaro ocorre em todas as regiões e segmentos de sexo, idade, renda, escolaridade e religião, segundo o levantamento que ouviu 1.987 pessoas em 119 municípios entre 23 e 26 de agosto. A pesquisa, contratada pelo PT, tem margem de erro de 2,2% e capta os impactos da aprovação da reforma da Previdência na Câmara, a crise das queimadas na Amazônia e os ataques do presidente aos governadores do Nordeste.

    O pior desempenho do presidente se verifica no Nordeste (47% de negativo, 18% positivo e 32% regular), seguido do Sudeste (37%, 27% e 34%, respectivamente) e Norte/Centro-Oeste (35%, 22% e 41%). No Sul há praticamente um empate (29%, 32%, 34%). A reprovação a Bolsonaro entre homens cresceu de 29% para 35% e, entre mulheres, de 31% para 44%. Entre jovens, saltou de 29% para 40%; entre adultos, de 26% para 41%, e cresceu de 29% para 33% entre pessoas de idade madura.

    A reprovação cresceu de 34% para 40% entre pessoas com ensino fundamental, de 26% para 39% entre as com ensino médio, e de 28% para 39% no ensino superior, tornando-se praticamente igual em todos os níveis de escolaridade. Entre pessoas de baixa renda saltou de 32% para 43%; na faixa de renda média, de 27% para 37%, e de 23% para 36% na renda alta. Entre os que se declaram católicos, a reprovação saltou de 33% para 42%. Entre os que se declaram evangélicos, a reprovação aumentou de 21% para 31%, empatando com a aprovação, que variou de 29% para 31%, com queda de 42% para 36% no “regular”.

    Entre abril e junho, foi de 57% para 59% a percepção de que “o Brasil está no caminho errado”, enquanto passou de 33% para 31% a opinião de que o país está “no caminho certo”, com 10% que não responderam ou não sabem. 52% se declaram insatisfeitos em relação ao Brasil e 15% estão “muito insatisfeitos”, somando 67% de insatisfação, número semelhante aos 70% de abril. Os que se dizem satisfeitos são 29% e os “muito satisfeitos” são 2%, somando 31% (29% em abril).

    Bolsonaro x Lula

    Comparando o governo atual e os anteriores, para 62% das pessoas o governo do ex-presidente Lula foi aquele em que tiveram “melhores condições de vida: emprego, maior renda, menor inflação etc.” Apenas 5% consideram que Bolsonaro proporciona melhores condições de vida. Lula é considerado o melhor, por esse critério, até entre eleitores de Bolsonaro (32% contra 16% que dizem que o melhor governo é o atual). Para 50%, Lula é o melhor presidente que o país já teve. Seu governo foi positivo para 62%, regular para 23% e negativo para apenas 13%.

    A Vox perguntou qual o sentimento “como pessoa” em relação a Lula, Bolsonaro e FHC. Trinta por cento disseram “gostar muito” de Lula, 11% de Bolsonaro e 5% de FHC. Vinte e três por cento disseram gostar “um pouco” de Lula, 20% de Bolsonaro e 18% de FHC. 22% “não gostam nem desgostam”de Lula, 24% de Bolsonaro e 38% de FHC. Os que “não gostam mas não chegam a detestar” Lula são 16%; de Bolsonaro, 23%, e de FHC, 17%. E os que dizem que “detestam, não gostam de jeito nenhum” de Lula são 8%; de Bolsonaro, 21%, e de FHC, 16%.

    Em relação à pesquisa de abril, o percentual dos que gostam (muito + um pouco) de Lula como pessoa cresceu de 48% para 53%, o dos que não gostam nem desgostam passou de 26% para 23%, e o dos que não gostam (não chegam a detestar + detestam) permaneceu em 23%. Os que detestam ou não gostam de Bolsonaro como pessoa saltaram de 28% para 44%, os neutros caíram de 33% para 24% e os que gostam muito ou um pouco passaram de 18% para 30%.

    Novo julgamento para Lula

    A pesquisa também captou o sentimento da população sobre os diálogos entre Sérgio Moro e os procuradores da Lava Jato, revelados pelo site The Intercept Brasil e outros veículos desde 9 de julho. Apesar da censura da Rede Globo, 53% disseram ter tomado conhecimento dos diálogos em que Moro orienta a ação dos procuradores e revelam outras irregularidades proibidas por lei. Para 47% das pessoas pesquisadas, “Moro agiu de forma incorreta”, enquanto para 26% ele “agiu corretamente”, e 27% não sabem ou responderam à questão.

    Com base no que a imprensa divulgou, a Vox perguntou se Lula “deveria ter direito a um novo processo sem irregularidades, para que seja averiguado se ele cometeu ou não algum crime; ou a sentença deve ser mantida e ele continuar preso?”. 53% responderam que Lula “tem direito a um novo processo e um julgamento sem irregularidades”, enquanto 35% disseram que “deve ser mantida a sentença atual e ele deve continuar preso”. Doze por cento não souberam ou não responderam.

    “E, na sua opinião, o que o Supremo Tribunal Federal deveria fazer: anular a condenação e mandar soltar o Lula, abrindo um novo processo; ou manter a condenação e a prisão dele”, perguntou a Vox Populi. Nada menos que 47% responderam que o STF deve “anular a condenação e mandar soltar o Lula, enquanto 37% disseram que o STF deve “manter a condenação e a prisão de Lula”. Quinze por cento não responderam ou não souberam.

    A Vox voltou a perguntar se a condenação e a prisão de Lula ocorreram por motivos políticos ou se foi um processo normal. O número de pessoas que dizem que a condenação foi política cresceu de 55% para 58% em relação à pesquisa feita em abril. Os que consideram a condenação normal caiu de 37% para 34% no mesmo período, permanecendo iguais os 8% que não responderam ou não souberam.

    A avaliação de que Lula “cometeu erros, mas fez muito mais coisas certas pelo povo e pelo Brasil” passou de 65% em abril para 68% em agosto, enquanto passou de 30% para 28% o percentual dos que dizem que o ex-presidente “errou muito mais do acertou”.

    Fonte: PT Notícias

     

  • Pedido de retenção do passaporte de Deltan Dallagnol é protocolado na Câmara dos Deputados

    Pedido de retenção do passaporte de Deltan Dallagnol é protocolado na Câmara dos Deputados

    O deputado federal Rogério Correia (PT-MG) protocolou na manhã desta segunda-feira 15 de julho pedido de retenção do passaporte do procurador Deltan Dallagnol.

    O protocolo foi feito na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, uma das comissões a que havia sido submetida a presença de Dallagnol para explicar as últimas denúncias feitas pela imprensa.

    Em seu Twitter, Correia afirmou que Deltan não deu justificativas plausíveis para não comparecer às audiências que foi convidado, para se explicar sobres as denúncias feitas  pelo The Intercept Brasil.

    “Dallanol tem tempo para responder a órgãos de imprensa, mas não demonstra vontade para falar com parlamentares, o que afronta a democracia”, escreveu o deputado em seu Twitter.

  • Urgente! The Intercept Brasil acaba de vazar áudio de Deltan Dallagnol

    Urgente! The Intercept Brasil acaba de vazar áudio de Deltan Dallagnol

    Via The Intercept Brasil

    Na manhã do dia 28 de setembro de 2018, a imprensa noticiou que o ministro do STF Ricardo Lewandowski autorizara Lula a conceder uma entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. Em um grupo no Telegram, os procuradores imediatamente se movimentaram, debatendo estratégias para evitar que Lula pudesse falar. Para a procuradora Laura Tessler, o direito do ex-presidente era uma “piada” e “revoltante”, o que ela classificou nos chats como “um verdadeiro circo”. Uma outra procuradora, Isabel Groba, respondeu: “Mafiosos!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!”

    Eram 10h11 da manhã. A angústia do grupo – que, mostram claramente os diálogos, agia politicamente, muito distante da imagem pública de isenção e técnica que sempre tentaram passar – só foi dissolvida mais de doze horas depois, quando Dallagnol enviou as seguintes mensagens, seguidas de um áudio.

    28 de setembro de 2018 – grupo Filhos do Januario 3

    Deltan Dallagnol – 23:32:22 – URGENTE
    Dallagnol – 23:32:28 – E SEGREDO
    Dallagnol – 23:32:34 – Sobre a entrevista
    Dallagnol – 23:32:39 – Quem quer saber ouve o áudio
    Dallagnol – 23:33:36 –

    Leia a matéria completa no site do The Intercept Brasil:

    https://theintercept.com/2019/07/09/vazajato-audio-inedito-deltan-dallagnol/

  • THE INTERCEPT EXPLICA PASSOS DA VAZA JATO À COMUNIDADE

    THE INTERCEPT EXPLICA PASSOS DA VAZA JATO À COMUNIDADE

    Leandro Demori: “Não podemos esperar porque há pessoas presas ilegalmente”

    “Se não fosse o impacto do escândalo, Sérgio Moro já teria nos prendido e tomado nossos equipamentos”, afirma Leandro Demori, em debate na UFSC

    Em dia de novas revelações da Vaza Jato, a comunidade universitária lotou o Auditório e o Hall da Reitoria da UFSC para ouvir Leandro Demori, editor-chefe do The Intercept Brasil, na manhã de sexta-feira, 5/7, em Florianópolis. Durante quase três horas, estudantes, pesquisadores e profissionais de jornalismo sabatinaram o premiado editor sobre os resultados e o futuro da investigação jornalística que desmascarou os esquemas entre a Lava Jato e o então juiz Sérgio Moro para condenar Lula e tirá-lo da disputa eleitoral. Assista aqui à cobertura ao vivo pelos Jornalistas Livres.

    Uma plateia entusiasta do trabalho do The Intercept, mas também crítica e curiosa, pediu explicações sobre a parceria com veículos da grande mídia que ajudaram a acobertar a “arbitragem ilegal e antiética” do atual ministro da Justiça, como ele próprio a qualificou. Demori afirmou que as parcerias são necessárias para acelerar o trabalho de apuração. Garantiu, contudo, que todas as produções resultantes dessas alianças são acompanhadas pelo site. “Nós franqueamos o acesso ao material bruto sob a condição de que as reportagens passem pelo nosso crivo.” Acrescentou ainda que ocupar a grande mídia, assim como dar entrevistas e fazer palestras diárias pelo país é fundamental “para que não vença a narrativa do governo e da direita criminalizando os jornalistas”.  Especializado em jornalismo investigativo e diretor da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, lembrou o discurso de Moro no Senado, afirmando que a intenção dos jornalistas era provocar um fato para serem presos e terem seus equipamentos apreendidos. Hoje Demori vê essa acusação como uma confissão: “Se não fosse a repercussão nacional e internacional do escândalo, Sérgio Moro já teria nos prendido e tomado nossos equipamentos no dia seguinte à primeira matéria da série”.

    As perguntas ao  ex-editor da Piauí giraram sobre o processo da investigação como um todo, mas também sobre a segurança dos jornalistas e as ameaças de bolsonaristas e do próprio ministro Sérgio Moro. O ministro tenta criar uma nova narrativa para jogar a sociedade contra a investigação ao dizer que nosso  objetivo é destruir a Lava-Jato, quando na verdade nós queremos fortalecer o combate à corrupção”, denuncia Demori. “Como se não estivesse mais do que na hora de denunciar as coisas erradas que eles fizeram, gerando injustiças em série. Formado em Jornalismo pela PUC do Rio Grande do Sul, 38 anos, natural de São Miguel D’Oeste, Demori vê com máxima gravidade a notícia do pedido da Polícia Federal de quebra de sigilo da conta bancária do jornalista Glenn Greenwald pelo COAF para descobrir as fontes do escândalo Vaza Jato. Na manhã do evento, essas notícias começaram a ser refutadas com veemência pelas instituições democráticas, como a OAB e a Associação Brasileira de Imprensa. (ABI).

    “Se for verdade esse anúncio, é uma violação inominável da democracia e da liberdade de imprensa, que só indica o caminho do fim da PF. Isso não será aceito no mundo inteiro. Na melhor das hipóteses, é mais uma mentira do site O Antagonista”, ironizou.

    Debate com Leandro Demori, mediado pela estudante Clarissa Levy e o professor de jornalismo Samuel Lima durou três horas

    “Não seria melhor ter divulgado todos os vazamentos de uma só vez?”, indagou uma pergunta encaminhada por escrito. Demori explicou que a equipe trabalha diária e intensamente na conferência dos dados, mas não poderia aguardar a finalização do trabalho para fazer uma denúncia com consequências direta na vida das pessoas. “Diferente de outras investigações, como o Panamá Papers, que não afetava ninguém diretamente, aqui não pudemos esperar porque a Vaza Jato mexe com a vida de uma pessoa que está na prisão”. E ele não se refere apenas ao ex-presidente Lula, mas a todos os que entraram ilegalmente nos processos de delação, muitos inocentes, segundo ele.

    Moderadas pelo professor de Jornalismo Samuel Lima e pela estudante de jornalismo Clarissa Levy, as perguntas da plateia foram respondidas com o humor, a ironia e a franqueza peculiares a Demori. Ele, contudo, preferiu não responder questões estratégicas relacionadas ao sistema eletrônico de investigação usado pelo The Intercept, à identificação das fontes e às próximas denúncias. Também esquivou-se de perguntas sobre o embate com a rede Globo. Explicou contudo, a origem da agressiva carta da direção da emissora, na qual ela acusava o caráter de Glenn e garantia ter sido receptiva à proposta de averiguação e divulgação d

    as denúncias..

    “Como a rede sempre utilizou dados obtidos por investigações exclusivas da nossa equipe sem citar a fonte, descobrimos que havia um veto antigo na emissora contra o The Intercept”. Esse veto foi mencionado na proposta de parceria com o Fantástico: “Perguntamos se isso seria impedimento para um trabalho conjunto, mas eles se limitaram a repetir que nunca houve qualquer tipo de restrição, sem responder a questão principal, que era a proposta de parceria”.

    O evento promovido pelo Departamento de Jornalismo da UFSC integra as comemorações do aniversário de 40 anos do curso. Fundado por célebres teóricos da área, como os já falecidos Adelmo Genro Filho e Daniel Hertz, críticos contundentes do sistema de monopólios da comunicação social no Brasil, o curso orgulhou sua tradição encorajando o trabalho do jornalismo investigativo com um longo e vigoroso coro de aplausos.