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  • Tortura foi excluída da sentença do caso Ricoy

    Tortura foi excluída da sentença do caso Ricoy

    Na última quarta-feira, 11, o juiz Carlos Alberto Corrêa Almeida Oliveira, da 25ª Vara Criminal de São Paulo, condenou a mais de três anos de prisão, os dois seguranças que torturam o jovem E.M.O, no supermercado Ricoy, da Avenida Yervant Kissajikian, zona sul de São Paulo.

    Embora a condenação seja certa agora, na sentença não foi considerado que o crime de tortura foi praticado, somente, os crimes de cárcere privado, lesão corporal simples e “filmagem e divulgação de um adolescente pelado”. A pena total dos três crimes citados é de três anos e dez meses de reclusão, três meses e vinte dois dias de detenção e doze dias de multa.

    Ao fundo o anexo do supermercado, onde o jovem foi torturado
    Foto: Lucas Martins / Jornalistas Livres

    O caso

    Os dois seguranças, Valdir Bispo dos Santos e David de Oliveira Fernandes, foram denunciados após um vídeo que eles mesmos gravaram, enquanto torturavam E.M.O e que depois passou a circular na internet.

    Depois da repercussão do vídeo, o jovem denunciou o ato que teria sido motivado pelo furto de uma barra de chocolate. Após o furto o jovem foi levado para um cubículo nos fundos do mercado, que era uma espécie de “sala de segurança”. Lá foi amordaçado e amarrado e passou mais de 30 minutos sendo chicoteado nu.

    De acordo com o primeiro testemunho no inquérito policial, de autoria do segurança David ele “confessou que estava na sala de segurança” e que “ele filmava a as agressões sofridas pelo adolescente e aplicadas pelo corréu Valdir”. Já Valdir escolheu não se pronunciar. Ainda durante o inquérito, David mudou sua versão alegando que tinha pego o jovem roubando barras de chocolate e o levado para uma sala do mercado, momento em que o deixou no local com o supervisor de segurança e não viu o que aconteceu, negou, inclusive, que tivesse gravado a sessão de tortura. Depois Valdir assumiu que despiram o menino na revista e deram chicotadas para reprimilo por ter pego a barra de chocolate sem pagar. David o acompanhava.

    A sentença

    O juiz Carlos Alberto Corrêa Almeida Oliveira reconheceu que “não há dúvidas quanto à veracidade dos fatos imputados contra os acusados e a coautoria dos dois”, mas não os condenou por tortura como pedia o Ministério Público Estadual.

    Para o magistrado, a lei que tipifica o ato de tortura não poderia ser utilizada no caso, uma vez que ela “ visava não atingir qualquer pessoa física que pratique um sofrimento físico e metal ao semelhante, como forma de castigo ou como de medida de caráter preventivo” e “teria uma intepretação vertical com base em uma ideia de autoridade, deixando de considerar a conduta horizontal, ou seja, de pessoas sem autoridade sobre a vítima”. A lei 9.445 de 1997 é a que regula o que se considera tortura no Brasil e deixa clara que:

    “Constitui crime de tortura: I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou religiosa;” e no ainda destaca, no parágrafo quarto que “Aumenta-se a pena de um sexto até um terço: I – se o crime é cometido por agente público”

    Mais adiante na sentença Carlos Alberto menciona que “a inércia do Estado pode levar à violência, em face do abandono de pessoas que se tornam criminosas, como pela reação das vítimas que não acreditam no Estado e reagem, desproporcionalmente, contra os criminosos passando a se tornarem criminosos também” e considera que “não ocorreu crime de tortura, uma vez que as agressões infringidas ao menos não foram com a finalidade de obter informações e também não forma aplicadas por que estava na condição de autoridade, guarda ou poder”.

    O Ministério Publico já recorreu, na última sexta, 13.

    Reações

    Luana Vieira, do coletivo Uneafro, entende que a sentença está incorreta

    “a tortura é a imposição de dor física, psicológica por prazer, crueldade, é um delito imprescritível e Inafiançável, como trás o Artigo 5º inciso XLIII da Constituição Federal, é um delito equiparado a crime hediondo. A Tortura independente de seu resultado existe apenas pelo ato de se causar sofrimento a alguém. O menino estava, sim, sob poder e autoridade desses agressores, sob responsabilidade do mercado e essa agressão foi utilizada como castigo em razão dos acontecimentos que o jovem estava sendo acusado” e aponta que “esses agressores deveriam estar sendo condenados a uma pena extremante severa e rígida, e seu cumprimento em regime fechado. O processo tem que retornar ao Ministério Público , para que se tenha uma nova definição jurídica e uma interpretação sobre o desfecho criminoso que ocorreu no supermercado Ricoy , não podemos aceitar essa decisão , não podemos naturalizar o genocídio e extermínio da população preta e pobre, matar , hostilizar e torturar corpos negros está cada dia mais legitimado pelo estado, na periferia a ação da polícia sempre foi truculenta e racista , a periferia , em especial os jovens que vivem dentro dela, são diariamente criminalizados e reduzidos a um estereótipo de criminosos, que, por sua vez resultam em ações violentas e repressivas por parte de um Estado que sua função seria de garantir a sua proteção, e não de extermina-los”

    “Ele estava sim, sob o poder e autoridade dos agressores. Então devemos lamentar que o judiciário não considere ou não interprete adequadamente a lei para crimes de tortura, que não se aplica apenas em casos de agentes públicos, mas também em casos de agente privados. Principalmente aqueles que tem algum tipo de relação de poder, como no caso desses seguranças”. Opinião do advogado Constitucionalista, especializado na defesa de direitos da criança e do adolescente, Ariel de Castro

    Numa das manifestações realizadas no bairro, em protesto ao fato, a rede Jornalistas Livres conversou com moradores do entorno da unidade do Ricoy, naAv.  Yervant Kissajikian e ouviu de muitos a revolta com a violência sofrida pelo garoto, misturada com o medo das organizações criminosas que comandam o tráfico de drogas na região. Segundo moradores, esse tipo de ação de tortura acontece há muitos anos no mercado, mesmo antes de ser chamado de Ricoy. Há notícias que a rede se chamava Baratani e que há muitos anos atrás, registrou no bairro ocorrência muito parecida com a de E. M. O e que por isso, teve que mudar de nome, passando a se chamar Ricoy.

    Fizemos diversas tentativas de conversa com o proprietário da rede Ricoy, que possui cerca de 49 lojas, mas não obtivemos sucesso. O protesto citado nesta reportagem, contou com cerca de 10 mil manifestantes.

     

     

     

  • Menino diz que foi torturado três vezes no supermercado Ricoy

    Menino diz que foi torturado três vezes no supermercado Ricoy

    Por Fabiana Kelly e Laura Capriglione, dos Jornalistas Livres

     

    O vídeo que mostra o cidadão E.M.O. nu, uma bola de pano sujo enfiada na boca lacrada por fita adesiva, sendo humilhado, ameaçado e açoitado com um chicote feito com dois fios de cobre entrelaçados, viralizou nas redes sociais do Brasil e abriu sob o signo do horror a Semana da Pátria Amada Brasil.

    O local da tortura, visto do estacionamento: a sala da segurança fica em um anexo ao supermercado
    Fachada do Supermercado Ricoy

    A tortura, obscenamente explícita, foi filmada pelos próprios torturadores, dentro de uma construção anexa ao supermercado, como prova de que ali, naquela quebrada da zona sul de São Paulo, ladrãozinho não se cria. Ladrãozinho mesmo.

    Twix é o chocolate que E.M.O. tentou furtar do Supermercado Ricoy em um dia impreciso de julho, quando foi flagrado pelos seguranças da loja. A barrinha de 20 gramas, uma bomba calórica que envolve biscoito e caramelo sob uma camada de chocolate, custa a bagatela de R$ 1,49. E.M.O., que tem 17 anos de vida materializados em um corpo franzino de 1,60 metro, adora Twix –a embalagem dourada concentra a energia que falta ao garoto depois dos longos períodos de jejum impostos pela correria decorrente da dependência no crack.

    “Todos os comerciantes da avenida Yervant Kissajikian, na altura da Cidade Ademar-Vila Joaniza, conhecem o menino, sabem que ele é um dependente químico, tem um retardo mental, é completamente desamparado e que comete pequenos furtos aqui e ali, para sustentar o consumo da droga”, disse o delegado Pedro Luis de Sousa, do 80º Distrito Policial, da Vila Joaniza, que cuida da região. “E.M.O. tem passagens pela delegacia por furtos de coisas insignificantes”, atestou.

    Vivendo nas ruas desde os 12 anos de idade, E.M.O. não sabe ler e escrever –apenas desenha em letra de forma o seu nome. A mãe dele, alcoólatra, sumiu. O pai morreu há cinco anos em um incêndio. Um dos sete irmãos, Wagner Bispo de Oliveira, que também luta para se livrar da dependência em cocaína, tomou para si a tarefa de ajudar o irmão agora famoso a “sair dessa vida”. Os dois não se encontravam havia pelo menos sete meses.

    Com 42 anos de vida policial, o delegado Pedro de Sousa não conseguiu assistir até o fim o vídeo mostrando a tortura de E.M.O.: ecos da escravidão

    O vídeo que viralizou é perturbador demais pela covardia que contém. O delegado Pedro Luis, homem negro de 62 anos, 42 de polícia, 10 anos na Homicídios, é um policial experiente, que já viu sofrimento demais por conta do ofício. Mesmo assim, ele disse não ter conseguido assistir ao vídeo até o fim de seus infinitos 41 segundos e quatro chicotadas no corpo de E.M.O., que se contorce e retorce como aqueles bonecos de ar que vêem na frente de borracharias.  E.M.O. chora e geme, mas não pode gritar porque a boca está tampada com a fita adesiva. Repugnante pelo evidente eco da escravidão, é tudo pior do que aparece, porque o vídeo mostra apenas uma fração do longo sofrimento imposto ao menino. Em seu depoimento à polícia, E.M.O. relatou que a sessão de maus tratos durou cerca de 40 minutos, ou 2.400 segundos.

    O método do Supermercado Ricoy para evitar os pequenos furtos ganhou fama porque os seguranças que torturaram E.M.O. (Davi de Oliveira Fernandes, 37 anos, e Waldir Bispo dos Santos, 49 anos) decidiram filmar e colocar nas redes o registro de sua covardia. “Queriam impingir o medo à comunidade”, segundo o delegado. E.M.O. afirmou em entrevista aos Jornalistas Livres que a mesma punição os mesmos dois seguranças já lhe haviam aplicado em duas outras oportunidades, quando ele também tentou furtar o chocolate predileto. E ele nunca os denunciou porque sabia que ninguém lhe daria crédito, além de temer represálias piores. No vídeo divulgado, um dos torturadores tripudia sobre o menino, depois das chicotadas: “Você é corajoso, né? Você pega e volta?”

    O crime de tortura é passível de pena de 2 a 8 anos de reclusão, acrescidos de até um terço em razão de a vítima ser adolescente. Também deverá contar como agravante o fato de E.M.O. ser portador de déficit cognitivo. Segundo o delegado, só isso explica ele tentar três vezes o “crime impossível” que é furtar o chocolate em uma loja repleta de câmeras de vigilância e bem na frente do guichê dos seguranças.

    Chocolates no corredor que dá de frente para o balcão dos seguranças: crime impossível

    A rede de supermercados Ricoy, com aproximadamente 75 lojas e mais de 4500 funcionários, disse em nota estar “chocada” com a tortura revelada dentro de suas instalações e jogou sobre a empresa de segurança terceirizada a responsabilidade pelos atos de barbárie. A KRP Valente Zeladoria Patrimonial, sediada em São José dos Campos, de propriedade de Kátia Regina Pelacani Valente, tem 15 anos de vida e 250 colaboradores. Em seu site, a empresa afirma realizar ações em conjunto com os órgãos de segurança, “objetivando o bem comum, que é a segurança de todos”. Também diz que “iniciou suas atividades diante da necessidade de ofertar à sociedade, um complemento na área de zeladoria patrimonial, a fim de manter a qualidade de vida de seus clientes, devido ao recrudescimento dos crimes, em especial os de roubo”. E que seus clientes “contam com atendimento personalizado, tecnologia de ponta, equipamentos de última geração e uma equipe de profissionais altamente treinada e qualificada”. Agora se sabe que treinamento é esse, que tecnologia de ponta é essa.

    Segundo o advogado Ariel de Castro Alves, especialista em direito da criança e do adolescente, é infrutífera a tentativa do supermercado de livrar-se do escândalo, jogando a responsabilidade sobre a empresa terceirizada. “O supermercado responde pelos atos da empresa que contratou para lhe fazer a segurança”, diz ele (veja abaixo a vídeo-entrevista com o doutor Ariel)

    Jornalistas Livres encontraram E.M.O. e seu irmão Wagner no estacionamento que fica no subsolo de um templo da Igreja Universal do Reino de Deus, na avenida Nossa Senhora de Sabará, 2.445. Exausto, esfomeado, E.M.O. descreveu a tortura e mostrou as marcas deixadas em seu corpo pelas chibatadas, mais de um mês depois das agressões, enquanto devorava, na padaria em frente, um X-Egg-Salada e três barras de chocolate. Wagner diz que conseguirá, com a força da fé, livrar o irmão da dependência de crack. “Se eu consegui, por que ele não conseguirá?” Às 20h em ponto, os dois irmãos estavam sentados em um dos bancos da igreja, as palmas das mãos voltadas para cima, implorando pela libertação dos vícios.

     

     

    Observação: Jornalistas Livres não conseguiram contato com as defesas dos seguranças Davi de Oliveira Fernandes e Waldir Bispo dos Santos. Também buscam manifestação da empresa de segurança KRP Valente Zeladoria Patrimonial e do supermercado Ricoy, a quem desde já franqueamos espaço neste site para que façam suas defesas.

     


    Reclame Aqui registra preconceito e discriminação do Ricoy

     

    O site Reclame Aqui, que registra reclamações de consumidores que se sentem lesados por estabelecimentos e empresas vendedoras de bens e serviços, tem várias reclamações contra a rede supermercadista Ricoy. Várias dizem respeito a reclamações sem resposta descrevendo comportamentos abusivos, preconceituosos, discriminadores em relação a raça e classe.

     

     

     

     

     

     

     

  • Jovem é torturado em mercado de São Paulo

    Jovem é torturado em mercado de São Paulo

    Um jovem de 17 anos passou cerca de quarenta minutos sendo torturado em uma unidade do Supermercado Ricoy, após ter sido acusado de furtar um chocolate. A tortura é apurada pela 80° Delegacia de Polícia, na Vila Joaniza, extremo sul da cidade de São Paulo.

    Segundo o Boletim de Ocorrência (B.O), registrado ontem (02), o jovem entrou na unidade da rede Ricoy, que fica na Avenida Yervant Kissajikian, 3384. O fato ocorreu no mês de julho e depois de tentar sair com uma barra de chocolate, sem pagar, foi levado para um quarto no fundo do estabelecimento por dois indivíduos, identificados no B.O como Santos, segurança do mercado, e Neto. No B.O consta que uma vez no quarto “a vítima foi despida, amordaçada, amarrada e passou a ser torturada com um chicote de fios elétricos trançados. Ali permanecendo por cerca de quarenta minutos”, depois da tortura os torturadores o liberaram, mas ainda ameaçaram “que caso falasse algo para alguém iriam mata-lo”.

    Este ano um jovem foi morto em um supermercado da Rede Extra, no Rio de Janeiro, por seguranças. Em ambos os casos as vítimas são negras. Após o caso do Extra diversos movimentos sociais, liderados por movimentos negros, exigiram ações do Extra sobre o caso.

    A 80° DP abriu um inquérito para investigar o caso e busca informações sobre os acusados. Segundo a lei 9.445 de 1997 a tortura se configura quando se constrange “alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental” em razão de, entre outros motivos, “discriminação racial ou religiosa” e quando se submete “alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo”.

    No vídeo, de cerca de 40 segundos, que passou a circular nas redes sociais é possível ouvir um dos torturadores falando que estavam torturando o jovem para não ter que “te matar”. Também é possível ouvir eles discutindo se os golpes chegaram a acertar o jovem e mandando ele tirar as mãos da frente do corpo. Nas imagens o jovem está nu e com uma fita sobre a boca.