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  • Lei que garante a alimentação escolar na pandemia é sancionada

    Lei que garante a alimentação escolar na pandemia é sancionada

     

    Por Tatiana Scalco – Ciranda.net

    O presidente Bolsonaro demorou uma semana para sancionar a Lei nº 13.987 que autoriza a distribuição da merenda escolar pela rede pública de educação básica em tempos de pandemia do coronavírus (Covid-19).

    O texto que altera a lei da alimentação escolar (Lei nº 11.947/2009) foi publicado na última terça-feira (7/4) e assegura o direito à alimentação dos alunos durante o período de suspensão das aulas.

    “Estávamos aguardando ansiosamente a sanção. Demorou para sair, mas ela é bem-vinda no momento, (na medida em) que contribui para a garantia do direito humano à alimentação”, fala Vanessa Schottz, professora UFRJ Macaé, membro do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.

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    Imagem: Abrasco

    Um “fato incomensurável”, diz Naidson Baptista – coordenador Nacional da Articulação do Semiárido (ASA), sobre a importância da lei que transforma, em caráter emergencial, “a alimentação escolar em cesta básica para as famílias”. Ele observa que muitas crianças frequentam a escola motivadas pelo acesso à alimentação e “têm na alimentação escolar, praticamente, a principal alimentação do dia”.

    A professora Schottz enfatiza a amplitude e capilaridade do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que atende cerca de 39 milhões de alunos, em todos os municípios do país (Inep,2019), e é o segundo principal acesso aos alimentos entre os beneficiários do Programa Bolsa Família.

    A alteração da lei decorre de grande mobilização social sobre o governo e o Congresso, explicam ativistas da segurança alimentar.

    “É uma vitória diante da imensa batalha de garantir alimentação saudável a uma parcela fundamental da população”, diz Leila Santana do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA). Ela inclui entre os beneficiários também ” camponeses/as, empreendimentos da economia solidária, povos originários e povos/comunidades tradicionais que produzem alimentos (que integram merendas escolares) e deles obtém renda para sua sobrevivência”, diz Leila.

    A alteração da legislação “responde aos anseios do conjunto da sociedade civil e ajuda a normatizar a atuação dos gestores públicos nesse período de pandemia”, explica André Luzzi, André Luzzi, integrante do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional de São Paulo (Comusan-SP)

    A Defensoria Pública da União (DPU-SP) expediu recomendação ao Estado da São Paulo e todos os seus municípios, bem como ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para que o orçamento próprio destinado ao PNAE seja aplicado integralmente, as escolas organizem as entregas de cestas básicas e as ações ocorram em “estreito diálogo e parceria com os conselhos de Alimentação Escolar (CAEs) e Segurança Alimentar (Conseas), entre outros.

    SEI_DPU – 3567630 – Ofício

    Desafios de implementação

    O momento da pandemia requer cuidados, como observa Lozzi. É preciso assegurar a distribuição dos alimentos nos diferentes ciclos de ensino, mas evitar que se formem grandes filas ou aglomerações. Serão necessárias estratégias de fornecimento às famílias. que podem ser por meio de cestas básicas ou feiras de natura. E atenção aos produtos perecíveis nas escolas pólo ou de maior vulnerabilidade e dificuldade de acesso da população aos equipamentos públicos de segurança alimentar.

    (merendeiras entregando comida aos alunos )

    Imagem: Arquivo/FNDE

    A logística de distribuição dentro do território, articulada em conjunto com cooperativas, associações e demais organizações da sociedade civil para garantir sua operacionalização é fundamental, comenta Leila Santana.

    As ações devem ocorrer de forma coordenada e intersetorial nos munícipios e estados. “Estamos apostando em que se criem comitês de solidariedade nos municípios e que esses comitês sejam acionados pelo poder público no sentido de ajudar a criar a logística e estratégia da entrega desses produtos”, explica Baptista.

    A implantação de comitês emergenciais, em níveis estadual e municipal é a recomendação do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar para a viabilizar a distribuição e monitoramento das ações. O documento intitulado “Garantir o direito à alimentação e combater a fome em tempos de coronavírus: a vida e a dignidade humana em primeiro lugar!” foi assinado por mais de 140 organizações da sociedade civil e publicado em 24 de março.pastedGraphic.png

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    Imagem: Ribs

    A composição dos comitês, como explica Naidson Baptista, deve contemplar “pessoas que têm acesso às comunidades e se inter-relacionam com as associações e grupos, que chegam na ponta, nas comunidades, na família. E, portanto, têm mais possibilidade de fazer chegar com rapidez e eficiência essa alimentação às pessoas.”

    Abastecimento e Agricultura Familiar

    “É da agricultura familiar que vem cerca 70% da alimentação que chega à mesa dos brasileiros. Isso, se transferido para a alimentação escolar, vai fazer que boa parte dessa alimentação possa ser adquirida na agricultura familiar. Sendo adquirida na agricultura familiar, nós teremos a manutenção da lei que já garante 30% das compras da alimentação escolar no município na agricultura familiar”, fala Naidson Batptista da ASA.

    Imagem:Ascom/SDR-BA

    A alteração de lei do PNAE não mexeu nas suas diretrizes, que continuam valendo: alimentos regionais, desenvolvimento local por meio da promoção da agricultura familiar, entre outros. Para a professora Vanessa Schottz, é fundamental que as prefeituras e estados apoiem a agricultura familiar para que esses alimentos sejam entregues.

    “O principal desafio é garantir que os entes estatais cumpram a lei, ou seja, comprem no mínimo 30% dos gêneros alimentícios destinados a alimentação escolar diretamente dos agricultores familiares ou das organizações representativas com DAP Jurídica”, comenta Leila Santana. Ela destaca que não há teto para aquisição de produtos oriundos da agricultura familiar, apenas o mínimo. “Estados e municípios podem adquirir até 100% dos produtos diretamente dos agricultores familiares, dinamizando a economia local e distribuindo renda” – sugere ela.

    A representante da Agendha, Valda Aroucha, destaca que “a questão do PNAE não é simplesmente colocar alimentação na escola.” O contexto a ser considerado inclui a priorização das comunidades tradicionais e os povos originários na compra, as particularidades das escolas quilombolas, indígenas, a inserção de produtos não só regionais na alimentação escolar. “Nem todo lugar planta tomate, nem todo local planta batata”- diz Valda. Organizar essa logística “é uma questão muito complexa, mas necessária e urgente” – fala.

    Diversos estados e municípios tem se movimentado para implementar ações. A Bahia discutirá esta semana o uso do cartão PNAE. Valda explica que a Secretaria de Educação adotou a mesma metodologia do PNAE SP, com ajustes.

    A Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro publicou decreto (nº 47357) no dia 8 de abril dispondo sobre fornecimento de Cartão Cesta Básica aos alunos da rede pública municipal inscritos nos Programas Bolsa Família ou Cartão Família Carioca, Os alunos que não estão nos programas de garantia de renda não foram contemplados.

    Tramitação em Regime de Urgência.

    O Projeto de Lei da Alimentação Escolar em tempos de coronavírus (PL nº 786/2020) tramitou em regime de urgência. Ele foi aprovado dia 25/3 pela Câmara dos Deputados e dia 30/03 pelo Senado. Seu texto estabelece a distribuição dos alimentos da merenda escolar às famílias dos estudantes que tiveram suspensas as aulas na rede pública devido à pandemia do coronavírus (Covid-19). O autor do PL foi o deputado federal Hildo Rocha (MDB-MA).

    A sanção do Presidente Bolsonaro e sua publicação no Diário Oficial da União demorou uma semana. A lei nº 13.987lei nº 13.987 foi publicada no dia 7 de abril de 2020, pela imprensa nacional.

    A Lei nº 13.987/2020

    O texto autoriza, em caráter excepcional, a distribuição de gêneros alimentícios adquiridos com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) aos pais ou responsáveis dos estudantes das escolas públicas de educação básica. Será válida durante o período de suspensão das aulas em razão de situação de emergência ou calamidade pública.

    A lei prevê que “durante o período de suspensão das aulas (….) a distribuição imediata aos pais ou responsáveis (….) dos gêneros alimentícios adquiridos com recursos financeiros da Lei” do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

    Ou seja, durante a pandemia do Coronavírus o dinheiro da alimentação escolar (PNAE) deverá continuar a ser repassado pela União aos estados e municípios para compra da merenda escolar. pastedGraphic.png

    imagem: FNDE
    O PNAE

    A Lei nº 11.947/2009 trata da alimentação escolar. Dentre suas diretrizes trouxe o emprego da alimentação saudável, adequada e universalizada aos alunos da rede pública de educação básica e criou o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

    Valores previstos PNAE

    O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) garante acesso à alimentação de quase 39 milhões de estudantes da rede pública de educação básica (Inep 2019). Seu papel é estratégico, seja relacionado à segurança alimentar dos alunos, como potencializador das redes de agricultura familiar. pastedGraphic.png
    Os valores de repasse de recursos PNAE são definidos por dia letivo de cada aluno e de acordo com a etapa e modalidade de ensino. Atualmente são os seguintes:

    Creches: R$ 1,07pastedGraphic.png
    Pré-escola: R$ 0,53pastedGraphic.png
    Escolas indígenas e quilombolas: R$ 0,64pastedGraphic.png
    Ensino fundamental e médio: R$ 0,36pastedGraphic.png
    Educação de jovens e adultos: R$ 0,32pastedGraphic.png
    Ensino integral: R$ 1,07pastedGraphic.png
    Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral: R$ 2,00pastedGraphic.png
    Alunos que frequentam o Atendimento Educacional Especializado no contraturno: R$ 0,53

    30% do valor repassado pelo PNAE deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar. Isso estimula o desenvolvimento econômico e sustentável das comunidades.

    A reportagem prosseguirá acompanhando a situação da alimentação escolar em tempos de coronavírus.

     

  • A quem interessa barrar a investigação sobre a máfia das merendas?

    A quem interessa barrar a investigação sobre a máfia das merendas?

    Roubar dinheiro da merenda escolar não tem perdão. O ladrão sabe que está tirando dinheiro da alimentação de crianças que vivem no limite da vulnerabilidade social e que têm na merenda escolar, muitas vezes, a única fonte de nutrientes para seu adequado desenvolvimento físico e psíquico.

    Pois foi isso o que aconteceu no Estado de São Paulo, onde uma organização mafiosa montou um esquema de corrupção para vender merendas escolares a preços superfaturados para a Secretaria da Educação do Estado e mais 22 prefeituras paulistas. 

    A investigação sobre essa máfia, feita pelo Ministério Público e pela Polícia Civil de São Paulo, mostra que o esquema funcionava assim: políticos do PSDB, PMDB, PTB e Solidariedade, além de funcionários da Secretaria da Educação do governo Geraldo Alckmin (PSDB-SP) topavam contratos em que o preço da merenda era muito maior do que o real, em troca de receber dinheiro “por fora” dos mafiosos. 

    A Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, responsável também pela proposta de reorganização escolar, é o setor que detém o maior contrato. De acordo com o Ministério Público, o governo de Geraldo Alckmin (PSDB) pagou R$ 7,7 milhões à cooperativa só no último ano.

    A operação foi anunciada no dia 19 de janeiro, quando foram presos os chefões da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf), que fica no município de Bebedouro. Segundo a investigação policial, eram eles que pagavam a propina para os políticos em troca de contratos milionários. Escutas telefônicas mostraram que contratos de fornecimento de merenda que valeriam, por exemplo R$ 100, eram aumentados para até R$ 125 (25% a mais).

    Até o presidente da Assembléia Legislativa, o tucano Fernando Capez, é suspeito de receber propina para facilitar a assinatura dos contratos superfaturados da merenda escolar (ele nega todas as acusações). Capez, que é promotor de Justiça e aspira a disputar a cadeira de Alckmin em 2018,  teria recebido propina a cada contrato celebrado entre a entidade e o setor público. Adriano Gilbertoni Mauro, um dos funcionários presos na operação, afirmou que Capez foi o responsável por conseguir a celebração de contrato com a Secretaria Estadual da Educação. Capez receberia parte das propinas por meio de assessores, identificados pelos investigados como ‘Licá’ e ‘Jeter’. Licá, Luiz Carlos Gutierrez, é assessor de Capez, e Jeter Rodrigues Pereira integrava o Departamento de Comissões da Assembleia, mas foi demitido em dezembro.

    Um litro de suco de laranja, que custava para a Coaf R$ 3,70, era vendido para a merenda a R$ 6,80.

    O suco mais caro do mundo!

    Além disso, nas investigações, foi apurado que 80% dos produtos fornecidos pela Coaf vinham na verdade de grandes indústrias. Apesar de envolver contratos em 22 prefeituras, o principal interesse financeiro da Coaf era os milionários pagamentos feitos pela Secretaria Estadual da Educação. O vice-presidente da Coaf, Carlos Alberto Santana da Silva, conhecido como Cal, declarou que houve propina de R$ 1,94 milhão em um único contrato.

    Foi oferecido a todos os detidos que fizessem delações premiadas, para reduzir suas penas. E eles toparam “dedurar” os políticos a quem pagaram propinas. Citaram, além de Fernando Capez (PSDB); o ex-chefe de gabinete da Casa Civil do governo Alckmin e braço-direito do secretário Edson Aparecido, Luiz Roberto dos Santos, conhecido como “Moita”; o presidente do PMDB paulista, deputado federal Baleia Rossi; o deputado federal Nelson Marquezelli (PTB); e o deputado estadual Luiz Carlos Gondim (SD).

    O dinheiro para pagar a safadeza dos envolvidos era entregue em pacotes de dinheiro vivo ou em depósitos em conta.

    O pior dessa modalidade de corrupção é que ela se valeu de uma lei muito importante, que obrigou os governos a comprar pelo menos 30% da merenda escolar da chamada agricultura familiar. Ou seja, em vez de os governos comprarem de grandes empresas e produtores, devem comprar 30% dos alimentos de pequenos produtores. Esta foi uma forma de apoiar o pequeno camponês, porque garante a ele o escoamento de sua produção.

    Por lei, as contratações ocorrem por meio de “chamada pública”, uma espécie de licitação. A Coaf, essa tal Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar, então, disputava esses 30% de verba destinada à agricultura familiar, fingindo que oferecia os melhores preços entre várias outras cooperativas do mesmo gênero. Só que o jogo estava todo combinado de antemão, inclusive os preços que eram superfaturados.

    Para investigar todo esse rolo, 19 deputados estaduais da Assembléia Legislativa de São Paulo querem instalar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). Mas são necessários 32 assinaturas de deputados para que isso aconteça. O receio é que os deputados tucanos e a base parlamentar do governador Geraldo Alckmin bloqueie a investigação.

    O deputado estadual Geraldo Cruz (PT) está à frente da batalha para conseguir as 32 assinaturas de parlamentares. Na entrevista acima, ele conta mais detalhes sobre a CPI da Máfia das Merendas.