A resolução do Conselho Nacional dos Direitos Humanos – CNDH recomenda que seja revogado o Decreto nº 10.252 de 20 de fevereiro de 2020 que muda significativamente a estrutura do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e que como consequência extinguiu o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), o programa Terra Sol e outros programas que davam incentivos aos assentados, quilombolas e comunidades extrativistas.
O Ministério Público Estadual (MPE), através da Procuradoria Geral de Justiça, manifestou-se favorável ao efeito suspensivo da ação de reintegração de posse movida pela Fazenda Eldorado Empreendimentos Imobiliários onde hoje vivem as famílias do Acampamento Marielle Vive!, no município de Valinhos/SP.
No dia 12 de agosto a juíza de primeira instância, Bianca Vasconcelos, sentenciou pelo despejo das famílias que desde o dia 14 de abril de 2018 vivem na área. Em caráter de urgência, a juíza estabeleceu 15 dias úteis para saída voluntária após publicação da decisão. O prazo se encerra no dia 09 de setembro de 2019.
A manifestação do MPE é favorável ao efeito suspensivo para que seja julgada a apelação da Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPE) que, conforme o documento, solicita a nulidade da sentença da juíza por considerar, entre outras coisas, o cerceamento da defesa do réu decorrente do atropelo do prazo para a defesa; houve ausência da delimitação precisa do objeto da ação; houve ausência de comprovação do exercício da posse pela fazenda Eldorado; em relação a “função social da posse exercida pelos requeridos e da perda da propriedade por abandono; e do papel do Município de Valinhos que deveria ser de garantidor do cumprimento da promoção da função social da propriedade” .
Outra ação do Ministério Público foi entrar, através da Promotoria de Justiça de Valinhos, com um Procedimento Administrativo de Acompanhamento (PAA) de Conflito Fundiário oficiando a Prefeitura a prestar esclarecimentos e informar quais ações serão realizadas para garantir os direitos sociais das famílias acampadas. Atualmente são cerca de 1000 famílias que não possuem local para onde ir em caso de despejo; maior parte desempregada e que serão jogadas na rua para passar fome. Segundo o MP, o município precisa garantir as condições para as famílias em caso de reintegração de posse, como “aluguel social”, inscrição em programas habitacionais, acompanhamento da assistência social para evitar o “caos social”, entre outras medidas.
O PAA foi protocolado no dia 20 de agosto e a Prefeitura possui o prazo de 15 dias para responder ao MP.
Além da ação da DPE, também está para análise do Tribunal de Justiça outro recurso de apelação protocolado pelos advogados representantes das famílias que argumenta pela nulidade do processo.
A proposta do Movimento Sem Terra é construir um assentamento agroecológico para a produção de alimentos saudáveis, a ação do MP traz esperança às famílias sobre a possibilidade de ter esse sonho conquistado com a reversão do sentença de reintegração de posse. O projeto do assentamento contempla a preservação ambiental, solução de demandas sociais das famílias envolvidas e desenvolvimento regional.
Muitas famílias se alimentam exclusivamente da própria produção
Produção orgânica no Acampamento Marielle Vive
Geleia de Hibisco produção familiar
A única renda de algumas famílias vem da produção artesanal e familiar
o Acampamento possui produção de alimentos agroecológicos, não utiliza agrotóxicos, realiza plantios de árvores e ações de preservação ambiental na Serra dos Cocais.
Texto e fotos por Vinicius Souza e Maria Eugênia Sá – www.mediaquatro.com – Especial para os Jornalistas Livres
Depois do grande sucesso da última Marcha das Margaridas, que reuniu mais de 100 mil trabalhadoras rurais em Brasília na primeira quinzena desse mês, agora é hora de preparar o I Encontro Nacional de Mulheres Sem Terra, marcado para os dias 22 a 26 de novembro no Pavilhão do Parque da Cidade, também na Capital Federal. Na última terça, 27 de agosto, professoras, ativistas e lideranças do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra de Mato Grosso fizeram sua terceira reunião preparatória numa sala do Instituto de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT. Nesse momento estão ocorrendo algumas ações para levantar o dinheiro suficiente para transporte e alimentação das participantes. A primeira é um acordo com a Cia D’Artes do Brasil para uma apresentação no próximo dia 20 de setembro da peça teatral Cafundó – Onde o vento faz a curva, de Amauri Tangará, no Cine Teatro, com renda revertida para o MST. Também está prevista uma feijoada comunitária mas a data ainda não foi definida.
Uma das principais preocupações das mulheres matogrossenses é o feminicídio, já que o estado possui atualmente o maior índice do país, com 4,6 assassinatos por 100 mil mulheres, segundo levantamento de 2018. De acordo com a polícia civil da capital, Cuiabá, somente na região metropolitana houve um aumento no ano passado de 38% em relação a 2017 e 21 casos no primeiro semestre desse ano em todo o estado. Já a Comissão Pastoral da Terra – CPT, alerta que 28 mil trabalhadores e trabalhadoras rurais sofreram algum tipo de violência no campo ano passado. Dessas, muitas são mulheres, já que o número de famílias acampadas (portanto sem o título da terra) saltou de 96 em 2017 para 474 em 2018. “Temos várias mulheres, sozinhas ou com crianças, em assentamentos, sem a presença da figura masculina”, contou Elizabete Flores, ativista da CPT em reportagem para o RDNews em maio (https://www.rdnews.com.br/cidades/conteudos/113477). Comumente, elas foram abandonadas ou decidiram deixar uma vida na qual eram vítimas de violência”.
Outra preocupação é o avanço das queimadas no estado, que até o dia 21 de agosto acumulava 13.682 focos de calor acumulados no ano, conforme levantamento do Instituto Centro da Vida com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, superando todos os outros estados da nação. A maioria dos incêndios, 60%, ocorrem em áreas privadas, muitos sobre mata nativa para o aumento da exploração pecuária. No entanto, 16% são em áreas indígenas. Tanto trabalhadores rurais pobres e sem terra quanto indígenas e quilombolas estão na alça de mira de latifundiários, com apoio, às vezes explícito mas agora mais discreto, do governo federal. Lutar por mais demarcações e mais assentamentos da reforma agrária, que trabalham com agricultura agroecológica sem depredar o meio ambiente, é uma das prioridades das mulheres do MST.
Um lutador ao lado dos trabalhadores, dos camponeses, dos indígenas, o Bispo Emérito de Goiás, Dom Tomás Balduíno, foi incansável nas décadas em que atuou junto ao Conselho Indigenista Missionário e à Comissão Pastoral da Terra, entre 1972 e 2005 numa vasta região entre Minas Gerais e o Araguaia. Assim, nada mais natural aos movimentos sociais de Mato Grosso usarem uma frase sua, o título desta reportagem, como tema da 29ª Romaria dos Trabalhadores e Trabalhadoras e da 1º Romaria da Terra e das Águas.
De pé, pelos direitos – www.mediaquatro.com
O evento tradicional em celebração ao Dia do Trabalho, ocupou por dois dias a sede do Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Federal do Mato Grosso, Sintuf-UFMT, e se encerrou hoje com uma marcha pelas ruas da capital do estado. Trabalhadores sem terra, índios, quilombolas, religiosos e sindicalistas se revezaram nas mesas de debates, plenárias e no microfone do carro de som da romaria para denunciar a violência contra as populações originais e humildes, o Estado de Exceção que o país vive desde o golpe de 2016 e para exigir, de pé e na caminhada, os direitos básicos de cidadania que merecemos todos e todas.
Mulheres foram forte presença na romaria – www.mediaquatro.com
O evento com o tema “Direitos não se pede de joelhos, exige-se de pé” teve como objetivo fortalecer a luta pelo direito à cidade, direito à terra e à permanência no campo com qualidade de vida e respeito à realidade camponesa. Entre as mensagens destacadas estava o apelo do Papa Francisco à urgente unidade da luta: “o tempo para encontrar soluções globais está acabando. Só podemos encontrar soluções adequadas se agirmos juntos e de comum acordo. Portanto existe um claro, definitivo e improrrogável imperativo ético de agir”. Segundo a coordenação do evento, a Romaria contribui para transformar a mística e a espiritualidade em gesto concreto. Afinal, como disse o padre Dirceu Fumagalli, agente da CPT Paraná, “As Romarias da Terra e das águas e dos trabalhadores e trabalhadoras são o Sacramento da caminhada. Elas são o templo do encontro do divino com o humano”.
A romaria juntou a luta pelos direitos com espírito cristão – www.mediaquato.com
Direito à cidade e direito à terra e às águas
Pela primeira vez em 29 anos de evento, à Romaria dos Trabalhadores e Trabalhadoras se somou a Romaria da Terra e das Águas, tão importantes no estado do cerrado, das chapadas e do pantanal. Para os organizadores, “defender o direito à cidade é garantir o exercício do poder para a classe trabalhadora, para as pessoas de cor, para os imigrantes, os jovens as mulheres, LGBTs e para todas as pessoas comprometidas com uma sociedade verdadeiramente democrática”. Já sobre a questão agrária, o folder de divulgação do evento afirmava que “a concentração de terras propaga a fome, o desemprego, os conflitos sociais, a miséria e a morte. Assim, a luta pela terra é a luta por trabalho, produção de alimentos, respeito à biodiversidade e geração de renda. A luta pela terra é a luta pela vida. A terra não pode ser fonte de lucro e exploração, ela tem que ser terra de trabalho, de alimentação, de sustentabilidade. Uma terra da qual brote vida e não devastação, envenenamento, destruição da biodiversidade. A luta pela terra é a luta pela vida em abundância.
A denúncia do Golpe de 2016 e da prisão política de Lula também se fez presente – www.mediaquatro.com
Denúncia do Golpe
Durante a romaria propriamente dita, no dia 2 de maio, os organizadores (CPT, Centro Burnier, CEBs, CEBI, Paróquia S. Família, MST, CIMI, Assessoria Dep Ságuas, Economia Solidária/Caritas, CUT, Sintep – MT, Sintuf – MT, Seeb-MT, Sindsep-MT e JPT) distribuíram uma carta aberta ao povo matogrossense em que denunciam a situação vivida pela maioria da população após o “golpe parlamentar, midiático e jurídico em conluio com as elites do atraso no Brasil em 2016”. Segundo eles, os únicos beneficiados com isso são os interesses do empresariado nacional e internacional que lucram com a privatização do patrimônio do povo, incluindo as terras agriculturáveis da Amazônia e do cerrado.
O povo do Mato Grosso e do Brasil – www.mediaquatro.com
Os mais prejudicados com isso também estão indicados no documento: as mulheres, o povo negro, a juventude e as populações LGBTs. Entre os elementos causadores dessa desgraça estão, segundo a carta, a corrupção de um Congresso antidemocrático que aprovou leis como a Emenda Constitucional 95, de congelamento dos gastos sociais por 20 anos, “as reformas trabalhista e do Ensino Médio, desmonte das universidades, institutos federais e a qualquer momento a Reforma da Previdência”. O documento denuncia, ainda, os cortes em programas essenciais para o povo do campo como o PRONERA, ATER, PNAE e PAA “que asseguravam a educação, a produção e a compra de alimentos da agricultura familiar”.
Nas cruzes cobertas de terra, os nomes dos lutadores e lutadoras que tombaram mas não são esquecidos – www.mediaquatro.com
Por fim, durante a mística da romaria, os trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade apresentaram cruzes com os nomes de dezenas de pessoas assassinadas por causa de sua luta social nas últimas décadas. Entre elas foram lembradas as nove vítimas da chacina de Colniza (assassinadas há um ano por pistoleiros a mando de madeireiros no extremo oeste de Mato Grosso), a missionária Dorothy Stang (morta em 2005 por defender as comunidades extrativistas no Pará) e a vereadora carioca Marielle Franco (executada há exatamente 50 dias num crime ainda não esclarecido).
Nota de esclarecimento sobre edição na reportagem:
A Associação dos Docentes da Universidade Federal de Mato Grosso – Adufmat, solicitou a retirada de seu nome da matéria acima. Apesar de fazer parte dos apoiadores da Romaria, a entidade não assinou a Carta Aberta citada. Segundo a assessoria de imprensa da Adufmat, “o sindicato assina outro material, que compõe o folder da atividade, mas não a carta. A Adufmat-Ssind apoia a luta dos trabalhadores, mas tem posição política contrária ao termo ‘golpe’”. A entidade afirmou estar afinada à posição do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior – ANDES, filiado à central sindical CSP Conlutas. Na próxima semana, dias 9 e 10 de maio, haverá eleições no ANDES opondo a situação, chapa 1 “ANDES Autônomo e de Luta”, e a oposição na chapa 2 “Renova ANDES” que, diferente da primeira, usa como slogan: “Na luta contra o golpe. Em defesa da democracia”.
Por: Luiz Felippe Fagaraz (Brasil de Fato-MG). Fotos e vídeo: Diego Leão (Brasil de Fato-MG)
Neste domingo (04/09), jovens de diversos estados brasileiros viajaram até a cidade mineira de Iturama para concorrer a uma das 50 vagas do curso de Agronomia da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM. O processo seletivo contou com cerca de 350 inscritos, sendo que pelo menos 80% destes é de jovens do MST, outros movimentos de luta pela terra e de comunidades tradicionais, como os quilombolas.
Aguinaldo Batista, da coordenação estadual do MST, destacou a importância do curso e da participação de estudantes vindos de movimentos organizados, principalmente para a luta dos movimentos na região do Triângulo Mineiro. Aguinaldo reafirmou a motivação da juventude organizada: “Além de marcha do movimento apoiar os jovens, também serve como uma denúncia pela falta de cursos voltados à juventude do campo. Se abrirem 50 turmas de agronomia no Brasil inteiro para a juventude do campo, a gente preenche todas as vagas e ainda vai faltar lugar. Existe a intenção de fazer bem o curso e depois devolver à sociedade com serviços no campo que possam melhorar a terra e o meio ambiente, rompendo com o agronegócio e o uso de agrotóxicos na produção de alimentos”, concluiu.
O Curso
Por meio de apoio do PRONERA (Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária) o curso de Agronomia da UFTM na cidade de Iturama foi desenvolvido tendo como público-alvo jovens e adultos de assentamentos da reforma agrária.
Apesar dessa importante iniciativa, na prática o que se viu foi uma tentativa de excluir os trabalhadores do campo do processo. Conforme pontua a militante Renata Menezes, do Levante Popular da Juventude e do MST, “os movimentos sociais e toda a população do campo repudiam essa tentativa de afastar a gente das discussões do PRONERA e da educação do campo. Precisamos fortalecer esse processo para que seja cada vez mais participativo, como sempre foi e como era a intenção do PRONERA quando foi planejado e criado”.
Segundo Renata, “o curso é a materialização de um processo que já vinha sendo construído antes. Na região do pontal do Paranapanema, já faz dois meses que a gente está em preparação com a juventude para o vestibular”. Para ela, o compromisso da luta pela terra, também, é um compromisso da luta por conhecimento. “A gente entende que essa é um trincheira, a universidade é um latifúndio que precisa ter as cercas cortadas”, finalizou.