Ciro Gomes, Guilherme Boulos, Manuela D´Ávila. Dificilmente algum aliado das teses progressistas irá levantar reparos capitais em torno desses nomes. Cada um a seu modo, os três ocuparam lugares na trincheira oposta à dos golpistas que assaltaram o poder em 2016. Têm sido porta-vozes da luta pela democracia e soberania nacional. Mas também se revelam miúdos e personalistas diante de um cenário de retrocessos sucessivos, só comparáveis ao período pré-golpe militar de 1964.Não adianta brigar com os fatos. E o mais importante deles é a tentativa manifesta do grande capital internacional e seus títeres nativos de impedir a candidatura de Luis Inácio Lula da Silva.
Este é o jogo na divisão principal. Nada a ver com assinar um cheque em branco com relação à trajetória passada e futura de Lula. Os erros de sua administração, o convívio pacífico com seus coveiros de agora e a desorientação da sua sucessora não escapam mesmo a um observador desatento. Aliás, o próprio Lula é obrigado a admitir os tropeços, entre os principais o de tratar o cartel da mídia como aliada.
Mas a política concreta, aquela que movimenta o povo –e sem isso discursos mirabolantes quando muito tornam-se notas de rodapé em papelórios de academia–, esta política acontece em outro plano. Poucas vezes na história brasileira houve um líder popular com tamanho reconhecimento e audiência como Lula. Suas caravanas, as pesquisas e o reconhecimento internacional são de eloquência suficiente para comprovar o óbvio. Por isso o ódio visceral, patológico até, destinado a ele por parte da camarilha no poder.
Chega a espantar que a oposição prefira, ou finja, não enxergar isso em nome de interesses oportunistas e paroquiais. Ciro Gomes, vamos combinar, é o maior exemplo disso. O ex-ministro já passeou por quase uma dezena de partidos cavando um lugar na janela. O atual, PDT, deu-se a licença de votar em bloco pela intervenção no Rio, indiferente ao pensamento do pré-candidato. Ciro fez-se de morto. Mas se enche de coragem quando se trata de criticar Lula e defender a própria candidatura por um partido que fala uma língua oposta à sua. Um desastre anunciado.
Por trilha parecida seguem Manuela D’Ávila e Guilherme Boulos. Ninguém, em sã consciência, pode em tese condenar suas postulações. Em tese, repita-se. O que se discute é o momento histórico e o ambiente político atual. Basta perguntar: onde foi parar no palavrório desta gente o combate pelo direito de Lula se candidatar, combate que deveria ser levado até as últimas consequências, inclusive na esfera jurídica? Sumiu. Virou apenas saudação protocolar à bandeira –no caso de Ciro, nem isso, já que elegeu Lula como o inimigo principal, patrocinador de “chicanas jurídicas”.
Esse erro histórico não será sem consequências. O país está à beira da militarização completa. O golpe branco de 2016 rapidamente se transforma em quartelada verde oliva com tudo o que isto significa. A oposição não deveria se dar ao luxo de brincar de democracia de segunda divisão quando as garantias fundamentais vêm sendo estraçalhadas. O memorando do Exército que fala da intervenção no Rio é explícito: a operação vai impor sacrifícios ao povo e ignorar garantias constitucionais. Vai servir de “laboratório”. A “entrevista coletiva” do interventor mostrou qual é a regra do jogo doravante. Só valem perguntas aceitáveis, censuradas de antemão e privilegiando a mídia poderosa. Enquanto isso, o desemprego grassa, o povo sofre e o país vai colecionando ruínas.
Este é o quadro real. Ao lançar Lula ao desterro, na esperança de dividir seus despojos, a esquerda posa de muito esperta e joga a toalha de antemão. O Jaburu e a Casa Branca comemoram tamanha colaboração.
Após 5 mil quilômetros percorridos por mais de 30 cidades dos nove estados nordestinos, a Caravana “Lula pelo Brasil”, que teve início no dia 17 de agosto, chegou ao fim nesta quarta-feira (5), em São Luís do Maranhão.
Foto: Mídia Ninja
A Caravana, como foi falado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em diversos momentos, teve como principal objetivo vivenciar o grande desenvolvimento pelo qual a região passou durante os 13 anos de governo do Partido dos Trabalhadores. E, principalmente, entender de que forma o Nordeste vem sofrendo com os desmontes sociais do governo de Michel Temer, exatamente um ano depois do golpe que tirou do poder a presidenta Dilma Rousseff, e aprovou uma série de medidas que restringem o investimento em políticas públicas e flexibilizam os direitos dos trabalhadores, como a PEC 55 e a Reforma Trabalhista.
Entre as principais mudanças na região durante a última década, que a Caravana mostrou, está a interiorização do ensino superior brasileiro, a construção de cisternas para armazenamento de água, e a distribuição de renda e direitos básicos através de programas como o Luz para Todos e o Bolsa Família. Foram 63 campi universitários, 150 novas escolas técnicas e sete novas universidades construídas no Nordeste pelo governo do PT; 1/,2 milhão de cisternas para consumo instaladas em casas do semiárido nordestino, e milhões de pessoas beneficiadas pelos programas sociais.
O contexto político atual é essencial para entender a importância histórica dessa Caravana, e marcou boa parte dos discursos do ex-presidente, assim como os depoimentos do povo que o recepcionou. Difamado diariamente pela grande imprensa, réu em primeira instância pela Operação Lava Jato, e aguardando uma decisão em segunda instância que pode barrar sua candidatura em 2018 – para uma eleição que já é antecipada como uma das mais polarizadas da história do país – Lula encontrou na Caravana o apoio e reconhecimento das milhares e milhares de pessoas beneficiadas pelo seu projeto de país.
Apoio esse que, mais uma vez, tentou ser apagado por veículos da mídia empresarial que descaradamente insistiam em fotografar praças esvaziadas horas antes dos atos marcados, ignorando fatos noticiosos como cidades que reuniram um número de pessoas (algumas vindas de regiões próximas) que somavam mais da metade de sua população para assistir às falas do ex-presidente, como Currais Novos (RN), que tem 35 mil habitantes e aglomerou pelo menos 30 mi pessoas.
Nesse sentido, tivemos a decisão de fazer uma cobertura colaborativa entre três dos maiores veículos da mídia alternativa, assumindo o desafio de construir em conjunto uma narrativa, acompanhando todas as atividades dos 20 dias de Caravana, contando os relatos, lembranças e sonhos daqueles que tiveram suas vidas transformadas, mas são os últimos a serem ouvidos pela mídia hegemônica. Produzimos textos, fotos, vídeos, matérias para rádio, transmissões ao vivo, memes, em quatro comunicadores no dia a dia da Caravana, mas contando com o apoio das equipes das bases e de colaboradores em diversas cidades pelas quais passamos. A nossa cobertura atingiu cerca de 30 milhões de pessoas.
Assim, acompanhar a jornada de Lula pelo mesmo Sertão que ele deixou há 64 anos, como retirante, foi uma das mais comoventes experiências vivenciadas por cada uma e cada um de nós. De tudo que presenciamos e contamos, algumas cenas foram especialmente marcantes, como a travessia de Lula pelo Rio São Francisco, quando centenas de pessoas aguardavam para recebê-lo no estado de Alagoas, às margens do rio, ao por do sol. Ou também em uma noite, na pequena cidade de Acari (RN), quando fomos surpreendidos por uma multidão deixou a missa, que acontecia naquele momento, para assistir à passagem da Caravana dos degraus de uma igreja.
Essas paradas não programadas em cidades onde os habitantes espontaneamente se reuniam e se mobilizavam para encontrar com o ex-presidente, foram, talvez, os momentos mais emocionantes da viagem. No trajeto original de cinco horas entre Quixadá (CE) e Juazeiro do Norte (CE), onde foram realizados atos programados, por exemplo, a Caravana parou em oito pequenas cidades do interior, demorando o dobro de tempo para chegar.
Nesses momentos, Lula descia com o apoio de alguns seguranças e era engolido por uma multidão de pessoas que fazia questão de seguir os ônibus para tocá-lo e agradecê-lo, segurando bandeiras vermelhas improvisadas com paus, lençóis e outros tecidos, em cenas que pareciam histórias de realismo fantástico. Após duas semana de Caravana, as mãos e braços do ex-presidente já estavam bastante arranhadas, sua voz havia praticamente sumido, mas ele continuou com o impressionante esforço de cumprimentar e abraçar as pessoas em cada lugar que o recebia.
A presença incansável do povo marcou desde a primeira atividade da Caravana, a visita de Lula ao recém-inaugurado metrô de Salvador (BA), até o última fala do ex-presidente em São Luís do Maranhão. Nesse meio tempo, Lula participou de atividades inesquecíveis como a colação de grau dos estudantes brasileiros e africanos da primeira turma do curso de Humanidades da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (Unilab), criada durante seu governo para promover a integração Sul-Sul, e agora ameaçada de cortes de bolsas para seus estudantes. Ou o almoço no acampamento Valdir Marcedo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), em Jandaíra (BA), onde centenas de acampados e assentados se reuniram para recebê-lo. Ou os cinco títulos de Doutor Honoris Causa que o ex-presidente recebeu durante a Caravana, apesar de, como ele disse diversas vezes, não ter tido a oportunidade de ter uma formação universitária.
Foto: Guilherme Imbassahy
Outro ponto marcante que notamos foi a presença das mulheres em cada uma dessas manifestações. Mais afetadas pelas políticas públicas de distribuição de renda e reparação histórica dos governos do PT, e consequentemente as maiores vítimas dos desmontes sociais de Temer, elas foram as protagonistas de cada uma das atividades organizadas pela Caravana. Nossa cobertura decidiu contar a história de algumas dessas mulheres, já que elas apareciam como presentes a cada parada da Caravana, com suas histórias comoventes e que traduzem toda a força e peleja de suas vidas.
Assim, contamos a história da jovem Iva Mayara, que devolveu seu cartão de beneficiária do programa Bolsa Família à Lula em Aracaju (SE), afirmando não precisar mais dele após ter se graduado pelo PROUNI e se tornar cadastradora do próprio programa. Narramos a vida da peixeira Simone Virgínia e da lavadeira Alzira de Souza, moradoras do bairro de Brasília Teimosa, no Recife, desde quando ele sofria com a falta extrema de saneamento básico, antes da visita de Lula ao local, em 2004.
Também tivemos a honra de conversar com a lendária militante da reforma agrária Elizabeth Teixeira, que aos seus 92 anos não deixou de comparecer ao ato de recepção de Lula em João Pessoa (PB), e com a fundadora do MST no Ceará, dona Maria Lima, hoje com 80 anos. Conversamos também Solange Saldanha, a Sol, que esteve presente em Currais Novos (RN) para agradecer Lula pela possibilidade de ter entrado no curso de letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte aos 35 anos, através do mesmo sistema de cotas raciais que colocou sua filha mais velha – e colega de classe – na mesma universidade.
Após 20 dias acompanhando Lula pelo Nordeste, voltamos, cada um para seu respectivo estado, com a certeza de que somente por termos estado debaixo do sol com o ex-presidente, durante ao menos 10 horas diárias, pudemos entender a dimensão do desenvolvimento trazido pelo seu governo, e das injustiças que tentam diminuir uma das maiores lideranças políticas da América Latina. É preciso estômago para ignorar e deslegitimar os relatos de pessoas que representam o primeiro diploma de suas famílias, que relatam com propriedade o fim dos saques nas épocas de seca após as políticas de Lula, que agradecem com lágrimas nos olhos pela atenção que lhes garantiu sobrevivência.
Deixamos o Maranhão sabendo que, independente da linha editorial de cada veículo da nossa cobertura compartilhada, e da opinião política de cada comunicador, tivemos a chance de vivenciar e entender a proporção mais bruta das medidas tomadas em Brasília e da intensificação da luta de classes no país.
Por esse motivo, voltamos acreditando ainda mais no potencial de uma mídia independente, ativista ou popular, e da importância de oferecer contra-narrativas, com o apoio de um povo que hoje não apenas tem o que comer e onde morar, mas possui a consciência política e os meios tecnológicos necessários para disseminar essas informações. Como disse Lula, em uma entrevista coletiva realizada no terceiro ônibus da Caravana, que durante as três semanas nos abrigou, temos alternativas à mídia hegemônica: “Nós não precisamos deles”.
A cobertura da caravana “Lula pelo Brasil” foi realizada por meio da parceria entre Brasil de Fato, Mídia Ninja e Jornalistas Livres.
Alvo de diversas campanhas que pediam que o país fosse separado, o Nordeste tem um papel fundamental na construção do Brasil. Entre os dias 17 de agosto e 07 de setembro, o ex-presidente Lula fará a segunda edição da Caravana pelo Nordeste. 25 anos depois o ônibus percorrerá mais de 30 cidades, saindo de Salvador-BA e terminando em São Luís-MA.
Os Jornalistas Livres compreendem a importância de contar a história do povo que é deixado à margem não só pelo atual governo mas também pela mídia, que diversas vezes não os consideram pessoas dignas e importantes para o país. Queremos conhecer quem saiu da miséria nos governos Lula e Dilma e agora está voltando a ter fome. Queremos dar voz a quem é ignorado por todos os lados. Os Jornalistas Livres afirmam o caráter jornalístico e ético da cobertura, com ênfase em quem tem esperança de que o Brasil volte a ser governado tendo seu povo como prioridade.
Nos ajude a mostrar o que não estará na grande mídia. Nos ajude a dar rosto para as lutas pelo fim da miséria, pelo fim da fome, pela saúde, pela educação, pelos direitos trabalhistas, pela água e, principalmente, pela vida. Contribua com qualquer valor para que essas histórias sejam contadas.
PARTICIPE:
Banco Caixa Econômica Federal
AG: 3033
Conta Poupança: 8971-0
OP: 013
Confira o trajeto completo da caravana:
QUINTA-FEIRA, 17 DE AGOSTO Salvador – Bahia
SEXTA-FEIRA, 18 DE AGOSTO Cruz das Almas e São Francisco do Conde – Bahia
SÁBADO, 19 DE AGOSTO Feira de Santana – Bahia
DOMINGO, 20 DE AGOSTO Estância – Sergipe
SEGUNDA-FEIRA, 21 DE AGOSTO Lagarto, Itabaiana e Nossa Sra. da Glória – Sergipe
TERÇA-FEIRA, 22 DE AGOSTO Aracaju – Sergipe
Penedo – Alagoas
QUARTA-FEIRA, 23 DE AGOSTO Arapiraca – Alagoas
Maceió – Alagoas
QUINTA-FEIRA, 24 DE AGOSTO Recife – Pernambuco
SEXTA-FEIRA, 25 DE AGOSTO Recife – Pernambuco
SÁBADO, 26 DE AGOSTO João Pessoa – Paraíba
DOMINGO, 27 DE AGOSTO Campina Grande – Paraíba
Currais Novos – Rio Grande do Norte
SEGUNDA-FEIRA, 28 DE AGOSTO Mossoró – Rio Grande do Norte
TERÇA-FEIRA, 29 DE AGOSTO Quixadá – Ceará
QUARTA-FEIRA, 30 DE AGOSTO Juazeiro do Norte – Ceará
QUINTA-FEIRA, 31 DE AGOSTO Granito – Pernambuco
SEXTA-FEIRA, 1º DE SETEMBRO Marcolândia – Piauí
Picos – Piauí
SÁBADO, 2 DE SETEMBRO Teresina – Piauí
DOMINGO, 3 DE SETEMBRO Timon – Maranhão
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE SETEMBRO São Luís – Maranhão
TERÇA-FEIRA, 5 DE SETEMBRO São Luís – Maranhão