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  • Assassinato de Luiz Eduardo Merlino volta à Justiça na próxima quinta 10/10

    Assassinato de Luiz Eduardo Merlino volta à Justiça na próxima quinta 10/10

    O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, irá julgar na próxima quinta-feira, 10 de outubro, às 9h30, o recurso da denúncia criminal do Ministério Público Federal contra três agentes públicos pela morte do jornalista Luiz Eduardo Merlino, em julho de 1971.

    Os denunciados são o delegado aposentado Aparecido Laertes Calandra e o delegado da Polícia Civil de São Paulo Dirceu Gravina, acusados de homicídio doloso qualificado (com intenção de matar), por motivo torpe e com emprego de tortura que impossibilitou a defesa da vítima. O médico Abeylard de Queiroz Orsini, à época, legista, é acusado pelo crime de falsidade ideológica, decorrente da falsificação do laudo necroscópico do jornalista. Carlos Alberto Brilhante Ustra, que comandou o DOI-Codi, também havia sido denunciado, mas a punibilidade criminal contra ele foi extinta com sua morte, em 2015.

    “Caso a Justiça não permita que o assassinato por tortura de meu companheiro Luiz Eduardo Merlino seja julgado, estará colaborando com a naturalização da tortura em nosso país, tal  como fazem as altas autoridades que defendem a ditadura e a tortura, que continua hoje a ser praticada contra as comunidades pobres e negras das periferias e favelas.”, afirma Angela Mendes de Almeida, viúva de Merlino.

     

     

     

     

     

    Durante o julgamento, a advogada Eloísa Machado de Almeida, professora de direito constitucional da FGV, fará a assistência de acusação.

    Apresentada em setembro de 2014, a denúncia do MPF contra os agentes foi rejeitada pelo juiz federal Fábio Rubem David Müzel, sob a alegação de que os acusados estariam cobertos pela Lei de Anistia. Em outubro do mesmo ano, o MPF recorreu da decisão. O caso será analisado nesta quinta-feira por três desembargadores – o relator é José Lunnardeli.

    A tese da denúncia é que de acordo com normas internacionais às quais o Brasil está submetido, delitos como o assassinato de Merlino são considerados crimes contra a humanidade, impassíveis de anistia e imprescritíveis.

    Em outubro de 2018, sob alegação de prescrição, a Justiça de São Paulo extinguiu a ação na área cível movida pela família de Merlino contra Ustra. Em 2012, uma decisão de primeira instância havia condenado o coronel reformado ao pagamento de uma indenização às proponentes.

    Apresentada em setembro de 2014, a denúncia do MPF contra os agentes foi rejeitada pelo juiz federal Fábio Rubem David

    O crime ocorreu nas dependências do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), centro de tortura comandado por Ustra entre outubro de 1969 e dezembro de 1973.

    Merlino era jornalista. Trabalhou nas publicações Jornal da Tarde e Folha da Tarde. Era militante do Partido Operário Comunista (POC).

    VEJA A AUDIÊNCIA PÚBLICA (parte 1 e 2) sobre o caso Merlino na Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva em 2014.

     

    + SOBRE O CASO NOS JORNALISTAS LIVRE

    Familiares de mortos e desaparecidos poderão retificar registro de óbito de seus entes amados

    Assassinato de Luiz Eduardo Merlino pela ditadura tem novo julgamento

     

  • Com participação negada por criminosos, Lucas continua preso

    Com participação negada por criminosos, Lucas continua preso

    Há mais de 1 ano, quatro maiores e um menor de idade estão presos acusados de praticarem um roubo de veículo próximo a Av. Gen. Edgar Facó, zona norte de São Paulo.

    Um dos maiores e o menor assumiram a crime e os outros três alegaram inocência. O reconhecimento da vítima foi a prova que condenou os três homens: Lucas Leandro Vieira Yoyo, Luan e Ricardo, mesmo quando os outros dois admitiram não conhecerem e não nunca tendo visto nenhum deles antes.

    A mãe de Lucas, 22, busca provar sua inocência e trazê-lo de volta para casa: “ele é super tranquilo, carinhoso e trabalhador”. Lucas está preso condenado a 22 anos de prisão. Com um filho de quatro anos, sob os cuidados da avó, ele espera o resultado do julgamento em segunda instância.

    O caso

    No dia 01 de  agosto de 2018, um empresário chegava em sua casa, por volta das 21h30, na R. Santa Romana quando foi abordado por “cinco indivíduos que chegaram a pé, um deles armado com uma pistola. A vítima foi obrigada a tirar o carro da garagem e depois a passar para o banco do passageiro dianteiro.  No boletim de ocorrência constam as versões da vítima, do menor, de Lucas e de mais seis policiais que fizeram as prisões.

    O carro seguiu e a vítima entregou um cartão, a senha e um celular para os criminosos.

    Na Av Elísio Teixeira Leite o carro passou a ser seguido por uma viatura até que, na Rua Mica Branca, um dos criminosos que dirigia pulou do carro em movimento e o veículo caiu num córrego.

    O carro foi recuperado junto com o celular e o cartão.

    Naquela noite cinco pessoas foram presas e na 72° Delegacia de Polícia (DP), da Vila Penteado, a vítima reconheceu todos os indivíduos.

    Contradições

    Até o momento em que o carro caiu no córrego, os depoimentos da vítima, dos policiais e dos detidos  batem. Depois, como se o crime não bastasse, outras versões conflitantes aparecem no caso.

    Depoimento do primeiro policial a chegar no córrego
    Depoimento da vítima

    Lucas foi preso, chegando em sua casa, na rua R. Expedito Ribeiro de Souza. Ele vestia calça jeans e blusa azul, as peças estavam limpas, longe do aspecto de quem parecia ter caído num córrego.

    Via rádio, policiais receberam ordem para iniciar uma busca por um homem com calça jeans e blusa com capuz: “em patrulhamento pela região localizaram na Rua Expedito Ribeiro de Souza um indivíduo que estava correndo e trajando o mesmo tipo das vestes mencionadas anteriormente”, é o que diz o texto do boletim de ocorrência.

    Policiais encontram Lucas correndo  e questionam o  porquê da pressa? O jovem responde que estava indo para casa.

    Lucas

    A mãe de Lucas, Simone Fernandes Vieira narra uma outra versão sobre o fato e segue reunindo provas para tentar provar a inocência do filho.

    Ela conta que o filho saiu de casa por volta das 21h para encontrar uma amiga na frente da Escola Municipal Mario Lago, na Rua Dourada. Simone diz que o percurso dura em média quinze minutos a pé.

    O tempo da caminhada de Lucas bate com a minutagem de um vídeo captado da câmera de um prédio próximo a escola. Na imagem uma pessoa trajando roupas da mesma cor que Lucas usava naquele dia que ele usava aparece. Lucas teria ficado uma hora na frente da escola e voltado para casa por volta das 22h.

    A mãe tem as mensagens trocadas com a amiga, nas quais é possível confirmar o horário e local onde iriam se encontrar. A última mensagem foi envidada por volta das 20:40, quando Lucas saiu, sem o celular.

    O advogado Edson Júlio da Silva apresentou o vídeo para a juíza Cynthia Maria Sabino Bezzera Camurri, mas o o pedido foi indeferido, em razão da baixa resolução da imagem, o que na interpretação da magistrada dificulta a identificação de Lucas.

    Lucas foi abordado por volta das 22h30, já na rua de casa.

    Simone viu o filho ser algemado e ser levado na viatura. A mãe foi informada pelos policiais que o filho seria levado até a cena do crime, ou seja, o córrego. Chegando no córrego, Simone foi orientada a seguir para o para o 33° DP, mas depois soube que Lucas havia sido encaminhado para o 72 DP.

    Um mês depois, Simone encontrou Lucas preso, ele reafirmou sua inocência. Lucas estava indignado. Esse foi o fim de noite que o jovem pensou em ter algum dia em sua vida?

    Lucas é pai e quer ser cirurgião ortopedista. É um sonho que ainda pode se realizar, tanto que na audiência, quando teve a oportunidade de estar diante da juíza ele diz: ‘o que eu queria era um Coren [Conselho Regional de Enfermagem] e não de um processo”. Antes de ser preso ele estava terminado um curso de enfermagem e trabalhava em uma oficina de motos.

  • Mobilização pede justiça para o caso de estupro de vulnerável em festa da Medicina da USP

    Mobilização pede justiça para o caso de estupro de vulnerável em festa da Medicina da USP

    Foi suspenso, mais uma vez, o julgamento em segunda instância no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) do médico Daniel Tarciso da Silva de Cardoso acusado de estupro de vulnerável quando aluno da Faculdade de Medicina da USP numa festa universitária. A decisão aconteceu nesta segunda-feira, 2.

    O colegiado de desembargadores, além de ter nas mãos um processo simbólico, à sombra de atitudes institucionais de “cumplicidade” com o acusado, se viu pressionado por coletivos feministas e movimentos de defesa dos direitos humanos, que ocuparam os corredores do tribunal pela segunda vez.

    O pedido de vista do processo pelo desembargador Geraldo Luis Wohlers Silveira foi considerado um VITÓRIA pelos coletivos e movimentos que ocuparam os corredores do TJ-SP, e que tem se mobilizado em atos, debates e espalhado informação pela rede sobre o caso.  O desembargador Maurício Henrique Guimarães  Pereira Filho, relator do processo pediu a absolvição do réu, e o processo corre em sigilo de justiça.

    Entenda mais sobre o caso 

    ALERTA: Médico da USP, acusado de estupro pode ficar impune e sobre o simbolismo da cultura do estupro nas universidades e na sociedade em  O que o caso de estupro na Faculdade de Medicina da USP revela sobre a nossa sociedade, ou ainda como o machismo e misôginia são atitudes frequêntes e até esperadas dentro das faculdades de medicina em  Estudantes de medicina baixam as calças sob os jalecos e ameaçam as mulheres. 

     

    Assista a cobertura feita hoje, 2,  ao vivo na saída do Tribunal:

    https://www.facebook.com/jornalistaslivres/videos/837678643022681/

     

    Assista, também transmissão feita ao vivo, no dia 19, da mobilização no tribunal no primeiro dia em que estava planejado o julgamento, mas que defesa pediu o adiamento. Importantes entrevistas esclarecem o andamento do caso, e as principais questões envolvidas.

     

    https://www.facebook.com/jornalistaslivres/videos/819266461530566/

     

    O simbolismo deste caso

    Apesar das denúncias a Faculdade permitiu que Daniel Tarciso da Silva de Cardoso se titula-se “à portas fechadas para não causar tumulto” e o réu conseguiu em 2017 o registro de médico no Conselho Regional de Medicina de Pernambuco e pretende especializar-se em ginecologia e obstetrícia.

    Em fevereiro de 2017 Daniel Tarciso da Silva de Cardoso foi inocentado pelo juiz Klaus Marouelli Arroyo, da 23ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo. Na sentença, Arroyo justifica sua decisão com base na “inconsistência das declarações da ofendida”.

    Em 2014, por iniciativa de Adriano Diogo, então deputado estadual, foi criada uma CPI na Assembleia Legislativa para averiguar violações de direitos humanos nas instituições universitárias, que ficou conhecida como CPI dos Trotes. A CPI documentou denúncias de racismo institucional e de uma cultura do estupro nas universidades. O relatório verificou que “112 estupros em 10 anos” teriam sido cometidos “no chamado ‘quadrilátero da saúde’ área da USP onde estão concentradas no Bairro de Pinheiros, na Capital paulista, as faculdades ligadas às Ciências Médicas”. 

    A CPI descobriu que havia pelo menos mais 5 casos de abuso envolvendo Danielo. Duas dessas vítimas se dispuseram a testemunhar¨ contando o mesmo modo de operação de Daniel, oferecer uma bebida adulterada e ter relações sexuais com a moça desacordada.

     

    A reação

    Nesse contexto de mobilização em prol da pauta de Direitos Humanos a Faculdade de Medicina da USP presenciou o surgimento de grupos auto-organizados que buscavam quebrar a cultura da omissão institucional e dar voz as vitimas dos diversos casos de violência que a universidade vivia. Grupos como o Coletivo Feminista Geni e a Rede Não Cala USP estão sendo fundamentais para acolher as alunas e atuar de forma a tornar a faculdade, aos poucos, um ambiente menos permissivo a violências.

     

    NÃO PODEMOS ESQUECER:

    Do caso do (ex) médico Roger Abdelmassih, 73, condenado a 181 anos de prisão por abusar sexualmente de 56 pacientes em sua clínica de reprodução.Hoje ele está em prisão domiciliar, mas seus advogados ainda tentam a sua absolvição, junto ao STF. 

     

    O caso de Roger Abdelmassih, é tão absurdo, mas ele sinaliza como o cenário que compõe a narrativa da mídia sobre estupro no Brasil, pode ser um componente bastante estimulador da impunidade, e por tanto da perpetuação da injustiça.

    Em materia do Jornal da Usp  a jornalista Lieli Karine Vieira Loures fala de sua pesquisa, feita para Escola de Comunicações e Artes (ECA), em que analisou as reportagens do jornal Folha de S. Paulo sobre o caso Roger Abdelmassih, publicadas entre janeiro de 2009 e maio de 2015. De acordo com o estudo, o discurso jornalístico usado estava em desacordo com o discurso jurídico do Ministério Público Estadual (MP).

    “O jornal se referia às mulheres como acusadoras. Porém, quem estava acusando era o Ministério Público. A Folha de S. Paulo somente começou a chamá-las de vítimas após Abdelmassih ser condenado e fugir do Brasil”, conta a autora da pesquisa.

     

     

     

     

    A Pesquisa pode ser acessada no banco de teses da USP neste LINK

     

     

  • ALERTA: Médico da USP, acusado de estupro pode ficar impune

    ALERTA: Médico da USP, acusado de estupro pode ficar impune

    Nesta quinta-feira ¨dia 19 de Julho¨ poderá ser julgado em segunda instância no TJSP o médico Daniel Tarciso da Silva de Cardoso¨ acusado de estupro de vulnerável quando aluno da Faculdade de Medicina da USP numa festa universitária.

    Entidades e movimentos sociais se mobilizam para defender a vítima e falar novamente do assunto, para que ele não se “institucionalize” ainda mais caso o acusado seja absolvido em 2ª instância. A vítima foi perseguida e difamada pelos colegas e professores da faculdade ¨recebeu ameaças do réu¨ desenvolveu transtorno de estresse pós-traumático e abandonou o curso. Restou-lhe dedicar sua vida a obter justiça pela violência que sofreu.

    Este caso é emblemático e dos poucos que seguem como processo civil criminal, como não acontece com a maioria dos casos de estupro, apesar das inúmeras denúncias de abusos sexuais e todo tipo de violências que são cometidas nos “tradicionais” trotes que ocorrem em algumas instituições de ensino superior de São Paulo e de outros estados também.

    Em 2014, por iniciativa de Adriano Diogo, então deputado estadual, foi criada uma CPI na Assembleia Legislativa para averiguar violações de direitos humanos nas instituições universitárias, que ficou conhecida como CPI dos Trotes. A CPI documentou denúncias de racismo institucional e de uma cultura do estupro nas universidades. O relatório verificou que “112 estupros em 10 anos” teriam sido cometidos “no chamado ‘quadrilátero da saúde’ área da USP onde estão concentradas no Bairro de Pinheiros, na Capital paulista, as faculdades ligadas às Ciências Médicas”.

     

     

     

     

     

     

     

    AQUi NA  PLAYLIST  sobre o caso na página do YouTube de Adriano Diogo, é possível assistir a íntegra das audiências públicas feitas na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, matérias e depoimentos sobre o andamento da CPI, e também uma série de vídeos que documentam as práticas destas “festas” que representam “verdadeiras armadilhas” para os calouros e que não terminam no dia  “da libertação dos bixos”.

    As atitudes misóginas, machistas e homofóbicas, são muitas vezes premiadas por seus pares. Como pode ser visto nesta  matéria:

    Estudantes de medicina baixam as calças sob os jalecos e ameaçam as mulheres

     

    O tema também foi amplamente discutido pelos Jornalistas Livres aqui

    O que o caso de estupro na Faculdade de Medicina da USP revela sobre a nossa sociedade

     

    HISTÓRICO DO CASO

    Um dos casos foi o de Daniel Tarciso da Silva Cardoso. Ele foi acusado de dopar uma estudante para manter relações sexuais à força em 11 de fevereiro de 2012, depois de uma festa da USP na sede da Atlética de Medicina.

    A vítima procurou o Judiciário já em 2012, bem antes da CPI. No entanto, só depois da Comissão, onde o acusado nunca apareceu para explicar-se, apesar de convocado, é que ele acabou sendo suspenso pela faculdade por um ano e meio. As denúncias dos coletivos feministas da USP eram sumariamente ignoradas pela direção da Faculdade.

    Duas estudantes de Medicina da USP que também foram dopadas e sofreram abusos do acusado, foram testemunhas. Drauzio Varella, na época, escreveu e gravou vídeo contra a cultura de estupro na Faculdade de Medicina. No entanto, no fim de 2016, a Faculdade realizou secretamente a colação de grau, para evitar protestos e proteger o acusado.

    Em 7 de fevereiro de 2017, o juiz Klaus Marouelli Arroyo, da 23ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, absolveu-o ignorando não só laudos psicológicos e psiquiátricos que atestam que a vítima passou por abuso sexual, bem como exame médico que comprovou escoriações decorrentes de violência. A sentença invisibilizou a voz e o corpo da vítima.

    Em abril de 2017, Daniel Tarciso da Silva Cardoso conseguiu finalmente o registro de médico no Conselho Regional de Medicina de Pernambuco. Além disso, pretende especializar-se em ginecologia e obstetrícia.

    Não foi a primeira vez que o acusado enfrentou problemas com a Justiça: entre 2004 e 2008, ele foi policial militar e, já em seu primeiro ano de serviço, matou um homem com oito tiros durante briga em um bloco de carnaval. Condenado por homicídio culposo, o Tribunal de Justiça, acabou extinguindo sua pena em 2012 julgando recurso da defesa. Além de ignorar de forma grotesca as leis e tratados que exigem uma justiça eficaz, justa e responsável com vítimas de crimes tão graves.

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    Ao falar das violências e “tragédias” que estão no currículo do ritual e dos envolvidos institucionais, é impossível não lembrar da morte de um estudante Edson Tsung Chi Hsueh, de 22 anos que morreu afogado em uma piscina da Universidade da Medicina após um trote 1999. O Supremo Tribunal Federal acatou a decisão do STJ de absolver os 4 acusados pela morte do jovem calouro, mesmo sem que o caso tenha sido julgado pelo juiz de primeira instancia. Os ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Gilmar Mendes e Celso de Mello entenderam que o STJ poderia ter arquivado o processo por falta de provas.

    ESTUPRO NO TRIBUNAL

    texto de  FELIPE SCALISA OLIVEIRA¨ 26¨ aluno do 6º ano da FMUSP – Faculdade de Medicina da USP**foi depoente da CPI dos trotes em 2015.

    O réu foi inocentado em primeira instância¨ segundo o juiz Klauss Arroyo¨ por “falta de provas” por parte da acusação. O juiz alegou que precisava de certeza e que¨ in dubia pro reo ¨decidiu pela absolvição. Tal dúvida ¨entretanto¨ não eliminou o fato concreto do crime que aconteceu¨ tampouco o sofrimento da vítima.

    A vítima¨ estudante da escola de enfermagem da USP não pode contar sozinha o que lhe aconteceu. Lembra-se apenas de tomar uma bebida oferecida por Tarciso durante uma festa e acordado horas depois no quarto do rapaz¨ nua¨ com o réu sobre ela praticando o ato sexual¨ e sentindo dores nas partes genitais e no ânus. Fez um exame de corpo de delito que comprovou a conjugação carnal e abriu um inquérito. Foi perseguida e difamada pelos colegas e professores da faculdade¨ recebeu ameaças do réu¨ desenvolveu transtorno de estresse pós-traumático e abandonou o curso. Restou-lhe dedicar sua vida a obter justiça pela violência que sofreu.

     

     

     

     

     

     

     

    Depôs na CPI dos trotes em 2015 junto a outras mulheres vítimas de violência sexual em universidades. Descobriu que junto a ela havia pelo menos mais 5 casos de abuso envolvendo o mesmo rapaz. Duas dessas vítimas se dispuseram a testemunhar¨ contando o mesmo modo de operação de Tarciso∫ oferecer uma bebida adulterada e ter relações sexuais com a moça desacordada.

    O réu tem antecedente. É ex-policial militar e foi condenado por homicídio com arma de fogo (10 disparos)¨ fora de serviço¨ contra um rapaz durante uma festa de carnaval.

    O TJSP¨ entretanto¨ reconheceu “legítima defesa” e impôs a pena de serviços comunitários por “excesso”. Após as denúncias de violência sexual¨ Tarciso obteve da FMUSP uma amistosa suspensão de 1 ano e 6 meses. Formou-se em fevereiro de 2017¨ obteve o registro médico de Pernambuco e exerce a profissão médica em São Paulo.

    O caso de Daniel Tarciso é o caso mais paradigmático da história de violência sexual nas universidades brasileiras. A “falta de provas” persegue as vítimas¨ que têm sua palavra desacreditada pelos amigos¨ pelo médico¨ pela polícia¨ pelo juiz e pela sociedade. A violência sexual no Brasil só é punida em casos extremos¨ envolvendo crianças e sequestros¨ onde se pune ou o incesto ou o sequestro¨ nunca o ataque à dignidade sexual.

    A diferença é que no caso de Tarciso há um conjunto de provas considerável¨ com pareceres psicológicos e psiquiátricos atestando o abuso e negando sinais de falso testemunho por parte da vítima¨ além de um conjunto significativo de testemunhas com narrativas consistentes dando fortes indícios de um comportamento padrão do réu. No entanto¨ bastou que o réu alegasse que o ato sexual foi consentido para o juiz decidir in dubio pro reo.

    O sistema de justiça brasileiro vive uma crise de legitimidade. De um lado narrativas criam jurisprudência para crimes materiais com ocultação de provas¨ como o crime de colarinho branco¨ afirmando que bastam fortes indícios para penalizar alguém¨ abdicando das “provas cabais”. De outro¨ o crime de violência sexual¨ em que a vítima de um crime hediondo muitas vezes tem apenas a própria palavra e – embora a jurisprudência torrencial diga que em casos de crime sexual a palavra da vítima tem especial relevância – é obrigada mesmo assim a conviver com o descrédito e o silêncio.

    O desembargador Mauricio Henrique Guimarães Pereira Filho tem um processo acelerado¨ que vai ocorrer em período de férias¨ entre uma copa do mundo e as eleições¨ e tem em suas mãos um réu acusado de crimes amparados pela cultura da sociedade¨ que culpabiliza vítimas de violência sexual. Tem também em suas mãos o futuro de uma moça que perdeu sua vida enfrentando todas as instâncias da Universidade e do Estado para não ser violentada consecutivamente. E finalmente tem em suas mãos o poder de romper um paradigma pros próximos casos de violência sexual¨ que seguem ocorrendo e sendo violentamente silenciados.

     

    Esta matéria contém trechos de matéria da: Heloísa Buarque de Almeida (FFLCH), da Rede Quem Cala Consente

    Outros Links indicados por Heloisa: Catraca Livre: “Drauzio Varella faz vídeo arrebatador sobre estupros na USP” https://catracalivre.com.br/cidadania/drauzio-varella-faz-video-arrebatador-sobre-estupros-na-usp/ Renan Quinalha: “Cultura do estupro na USP”: https://revistacult.uol.com.br/home/cultura-do-estupro-na-usp/ Jornal do Campus: “Dois anos após CPI, casos de estupro não têm punição”: http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2016/11/dois-anos-apos-cpi-casos-de-estupro-nao-tem-punicao/ Ponte Jornalismo: “Justiça de SP absolve estudante de Medicina da USP acusado de estupro” https://ponte.org/justica-de-sp-absolve-estudante-de-medicina-da-usp-acusado-de-estupro/ Ponte Jornalismo: “MP recorre de sentença que absolve aluno da USP acusado de estupro” https://ponte.org/mp-recorre-de-sentenca-que-absolve-aluno-da-usp-acusado-de-estupro/ Agência Brasil: “Ex-aluno da USP acusado de estupro obtém registro de médico em Pernambuco” http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-06/ex-aluno-da-usp-acusado-de-estupro-obtem-registro-de-medico-em-pernambuco

  • Vitória! Por Dandara nenhum minuto de silêncio

    Vitória! Por Dandara nenhum minuto de silêncio

    Após 15h de sessão, a 1ª Vara do Júri sentencia cinco dos oito acusados pelo assassinato brutal de Dandara, na última quinta-feira (5). Quatro deles vão responder por homicídio triplamente qualificado e um por homicídio duplamente qualificado.

    Uma resposta quanto à elucidação de um assassinato como o de Dandara é fundamental para a luta por justiça. Uma resposta à barbárie transfóbica que assola o Ceará, como afirmou a acusação.

    Mas não encerra aí. É preciso seguir cobrando do Governo do Estado do Ceará a construção de políticas públicas que permitam à população Trans viver.

    Justiça para Dandara é lutar pela garantia de medidas que diminuam a vulnerabilidade, que permitam acesso à educação, saúde, emprego e moradia.

    Não foi só Dandara, é preciso seguir cobrando resposta por todas as outras e para que nenhuma mais se perca.

    Relembre o caso 

    No dia 15 de fevereiro de 2017, a travesti Dandara dos Santos, de 42 anos, foi assassinada no bairro Bom Jardim, em Fortaleza. Ela foi torturada e morta por um grupo de homens na rua, à luz do dia, enquanto pedia por ajuda. Um dos participantes do linchamento gravou um vídeo de 1 minuto e 20 segundos com seu celular, e o publicou na internet.

    Três homens dão chutes e batem em Dandara dos Santos com um chinelo enquanto ela se contorce no chão, ensanguentada e suja de terra. Eles ordenam que Dandara suba em um carrinho de mão. Atordoada, ela não consegue, vai ao chão, os agressores dão chutes em sua cabeça.

    Por: Ari Areia – jornalista cearense, artista e ativista LGBT

    Com Nexo jornal

     

  • “Vou pra Porto Alegre, tchau!”

    “Vou pra Porto Alegre, tchau!”

    Por Lais Vitória Cunha de Aguiar, especial para os Jornalistas Livres

    Três ônibus com cerca de 200 pessoas saíram do ponto de encontro, o Hotel Nacional, para Porto Alegre, em meio a férias de janeiro. Brasília, sendo uma cidade administrativa, torna-se vazia em férias. Que evento poderia reunir 200 pessoas de todo o entorno do Distrito Federal para viajar em pleno janeiro, e, ainda mais para uma viagem com cerca de 36 horas?

    O julgamento de um dos maiores líderes da América Latina é suficiente para tanto: Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidente com mais de 33 títulos de doutor honoris causa, e, mais importante do que qualquer título, o homem que retirou milhões de brasileiros da miséria.

    Cada um dos militantes das mais distintas categorias presentes na Caravana sabia o propósito daquele julgamento: retirar o Lula da disputa presidencial de 2018. Por isso, todos gritavam “Eleição sem Lula é Fraude!”

    Todos os ônibus foram pagos pelos próprios militantes: a cada 13 camisetas vendidas, um militante ia a Porto Alegre. Foram tantas vendas que afinal cerca 200 militantes conseguiram ir. Vocês tem ideia de quantas pessoas se mobilizaram para que tal fato ocorresse?

     

    Contando com militantes de diversos movimentos sociais, foi uma caravana repleta de diversidade, mas que no conjunto formava um panorama bem conhecido: a sociedade brasileira, bem ao contrário daqueles que julgaram Lula, em sua maioria homens brancos de classe média alta.

    O começo da viagem não apresentou grandes dificuldades ou diferenças em relação a qualquer outra viagem de ônibus. Teve gente que leu, dormiu, cantou. Eu diria, porém, que a ansiedade para chegar a Porto Alegre no dia 23 e acompanhar o julgamento permitiu que uma aura de tensão se instalasse por toda ida.

    Para piorar a tensão, o nosso ônibus quebrou no meio da estrada, na divisa entre São Paulo e Paraná. Como sempre é possível agravar a situação, não havia sinal de celular. Estávamos incomunicáveis, totalmente sem serviço.

    Um dos outros ônibus foi muito solidário ao nosso infortúnio. Parou também e nos fez companhia, enquanto iam buscar o necessário para consertar a corrente, ou seja, durante as três horas em que permanecemos conversando, estendendo faixas contra a condenação do Lula.

    As reações dos muitos caminhoneiros que passaram por nós foram interessantes. Como disse um colega, “se dependesse dos caminhoneiros o Lula já estava eleito”, o que  me deixou surpresa, afinal foram os caminhoneiros que fizeram uma grande greve contra a Dilma pouco tempo antes do golpe do impeachment. Na maioria das vezes em que passava um caminhoneiro, ele buzinava para nós.

    Os xingamentos foram bem escassos, ainda mais que os militantes ali presentes eram em parte do NDD, Núcleo Pela Democracia que se reúne todas segundas feiras na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em frente ao Palácio do Planalto, para denunciar o golpe. Na Praça dos Três Poderes sim, recebemos muitos xingamentos e poucas buzinadas simpáticas. Por isso mesmo, a cada buzinada o povo vibrava.

    A nossa água estava acabando, não havia comida, não havia um posto próximo, havia somente mato ao nosso redor: mesmo assim as faixas de apoio ao Lula permaneceram estendidas, seguradas por militantes, durante as três horas que permanecemos esperando pelo conserto do ônibus.

    Por coincidência a equipe dos Jornalistas Livres passou por nós, filmando em parte a alegria dos militantes que puderam ir a Porto Alegre, defender o Lula com sua presença e energia, a maior arma de quem não encontra sua voz representada nas instâncias do poder. Abaixo o vídeo dos Jornalistas Livres:

    Depois da imprevista parada de três horas, ainda tivemos que enfrentar uma chuva bem forte, o que fez com que fôssemos a uma velocidade bem menor. Ao chegarmos a Porto Alegre fomos tomar banho no clube da Caixa,  depois passamos pelo acampamento formado pelos movimentos sociais especialmente para o evento do dia, com Lula, e um dia depois, no julgamento.

    Assim que chegamos fomos para o evento com Lula,  lá encontramos uma senhora, vendedora de água e guarda-sol, que nos contou que não perdia um evento para defender Lula ou Dilma.

    Nós chegamos cedo, conseguimos acompanhar a marcha da Juventude Revolução até a Esquina Pela Democracia, no centro de Porto Alegre, um local simbólico da luta gaúcha pela Legalidade, durante a tentativa de golpe contra João Goulart, em 1961. Horas antes do discurso de Lula, o local já estava bem cheio. Algumas horas depois, não teria nem como se mover. Nós não conseguimos voltar para onde estávamos antes, por causa da incrível quantidade de pessoas (a Brigada Militar calculou em 70 mil manifestantes e os organizadores do ato, em 100.000. Era gente demais, então ficamos ouvindo todos os discursos na lateral, que também estava cheia, já que o evento não tomou apenas uma rua, mas todas as ruas próximas ao Mercado Municipal de Porto Alegre. Era muita gente.

    Caravana de Brasília no acampamento do MST, em Porto Alegre

    No dia 24, dia do fatídico julgamento, às sete da manhã, já estávamos no acampamento acompanhando as atividades. Sendo manhã bem cedo, pudemos ver gente do Nordeste e do Sul se juntando para cantar suas músicas típicas. Vimos um senhor tocando músicas que compôs na época da ditadura e explicando o significado para uma roda de jovens a sua volta.

    Depois houve uma reunião da juventude Mudança, que me deixou esperançosa e triste ao mesmo tempo: é muito bom ver  uma juventude de esquerda unida, de várias partes do Brasil, pensando em como transformar realidade da política.

    O mais interessante dessa reunião foi, sem dúvida, a fala do Patrick, de Minas, que apontou um problema específico, mas que se apresenta plural:  a política em geral não consegue chamar hoje o jovem da periferia, seja de esquerda ou direita. Esse é um papel que acabou sendo em boa parte assumido pelo crime organizado, que concede ao jovem a esperança de uma vida melhor por meio da venda de drogas. O crime organizado vende uma ideologia de individualismo, a qual o jovem compra com facilidade. Como ele pontuou: ‘A CUT não consegue parar o Brasil hoje, mas o PCC consegue.’

    Nessa reunião, após a fala de todos, como encaminhamento ficou decidido que iríamos fazer uma mesa sobre o assunto no Fórum Social Mundial, que nesse ano ocorrerá em Salvador do dia 13 a 17 de março.

    Apesar da tristeza com relação ao resultado do julgamento, era óbvio que o judiciário iria julgar Lula de forma injusta. Quantos Lulas não são presos todos os dias por roubar um pão, por fome? Imagine o que esses homens que prendem pessoas com fome não iriam fazer com um que defende as pessoas que eles prendem? Aqueles que os ditadores de toga não prendem são justamente os que se identificam com eles: a classe alta com contas na Suíça, os políticos com aviões de droga…

    Ao voltarmos para Brasília, ao menos o ônibus não quebrou. Nós pudemos, todavia, ouvir ao rap de alguns companheiros –Sander, Victor e Emerson– sobre a viagem. Termino aqui com o relato deles, que demonstra que ainda existe uma juventude de esquerda pronta para lutar pelo que acredita: