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  • O Brasil figadal

    O Brasil figadal

    Desfez-se, de uma vez por todas, o mito de um Brasil cordial. Nossa sociedade não é afável, sincera, calorosa ou franca, no sentido que dá Houaiss ao adjetivo cordial. O Brasil votou com o fígado, com o sentimento visceral de rancor. E elegeu Jair Messias Bolsonaro presidente do Brasil para os próximos quatro anos. A marca histórica de um país que impõe pesado sofrimento aos pobres evidenciou-se novamente.

    Como é possível achar que um deputado, que habita a Câmara dos Deputados há 28 anos, represente o “novo” na política? Como aceitar sua proposta de armar a população para aumentar a segurança? Por que apoiar seu desprezo pelas mulheres? Por que o país elegeu um sujeito que reverencia a tortura e o mais funesto torturador?

    A caminhada do Brasil está repleta de eventos e práticas que fazem corar a todos que julgamos que nascemos iguais e devemos ter os mesmos direitos. Nesse último período, no entanto, há conformações que é preciso salientar. O poder executivo, eleito pelo povo em 2014, foi destituído por uma conjunção do poder econômico, do poder dos meios de comunicação, do poder legislativo, do poder judiciário e do poder dos outros integrantes do sistema de justiça: ministério público e polícias. O silêncio, revelando aparente neutralidade do poder militar, foi quebrado em momentos decisivos em apoio ao objetivo maior.

    A desmoralização e demonização da política vêm desde o início da Ação Penal 470, conhecida como “mensalão”, em 2006. É público que Joaquim Barbosa escondeu provas e evidências que mudariam o rumo do julgamento. Inúmeros juristas denunciaram as ilegalidades desse processo. Suas vozes não foram, contudo, ouvidas. Sucumbiram, sob intenso apoio, e aliança, dos meios de comunicação aos desmandos do Supremo Tribunal Federal, Os mesmos jornais, canais de televisão, rádios e revistas que hoje se espantam com a aberração que gestaram.

    Mal sabíamos que as artimanhas do STF visavam tornar inelegível a maior liderança popular do país. E assim fizeram. Condenaram Luiz Inácio Lula da Silva sem provas de que o apartamento de classe média no Guarujá fosse seu. O futuro ministro do STF, Sérgio Fernando Moro, o condenou por uma matéria de jornal e uma delação de criminosos que declarariam o que fosse preciso para se verem livres da prisão. O Tribunal Regional Federal da Quarta Região confirmou, em tempo recorde, a condenação. O Supremo Tribunal Federal autorizou sua prisão, antes de terminadas as possibilidades de apelação do ex-presidente. E o Tribunal Superior Eleitoral o tronou inelegível.

    O bloco no poder tentou viabilizar outros nomes “novos” na política. Não teve êxito. Não conseguiram se unir em torno de um nome. Todos os balões de ensaio foram bombardeados por frações do poder, quando não pela simples falta de apelo popular. Afinal, a farsa de que teriam sido escolhidos pelo povo em voto livre precisava prevalecer.

    O Brasil de 2014 tinha o menor desemprego da história recente do país, tinha o maior salário-mínimo desde 1964 e tinha saído do mapa da fome elaborado pela Organização das Nações Unidas. A incerteza política gerada pelos inconformados com o resultado da eleição, o contágio de uma débil economia mundial e erros cometidos pelo governo de Dilma Rousseff redirecionaram a economia brasileira, desde 2015 até hoje, para a recessão e o desemprego.

    Em meio a esta grave crise, o país levou ao poder executivo um grupo que promete aprofundar o corte de gastos públicos, a retirada de direitos, as privatizações e a abertura aos produtos estrangeiros. Um conjunto de ações que, diminuindo o consumo e o investimento, debilitará, ainda um pouco mais, a economia do país.

    A retirada de direitos sociais e a autorização para que as forças da repressão policial matem quem julgar adequado tornaram nossa sociedade ainda mais insegura. Tememos pelos mais pobres e por todos aqueles que precisam da proteção do Estado.

    Os Jornalistas Livres, formado exclusivamente por voluntários, nascemos em 2015 para mostrar o que era invisível para os meios de comunicação hegemônicos. Denunciamos inúmeras falcatruas e mentiras, com frequência beneficiadas ou mesmo veiculadas pelos próprios meios de comunicação. Denunciamos perseguições, violências e mortes de pobres, de pretos, de índios, de sem terras, de gays, de trans. Ajudamos alguns a verem com clareza a luta pelo poder que se desenrolava.

    Gritamos “não vai ter golpe, vai ter luta”. Teve golpe e não teve luta. Gritamos “Marielle, presente”. Ela está morta e seus algozes livres. Bradamos “Mestre Moa vive”. E ele está morto. Bradamos “machistas, fascistas, não passarão”. E eles passaram. Clamamos “ele não”. E as urnas disseram “ele sim”. Clamamos “Lula livre”. E ele está preso e “apodrecerá na cadeia” a prevalecer o desejo do presidente ontem eleito.

    Junto com o povo brasileiro mais sofrido, nós perdemos esta batalha. Estamos de luto.

  • Fux: “o charlatão togado”

    Fux: “o charlatão togado”

    Charlatão, nos ensina Houaiss, é “que ou aquele que se apresenta nas praças ou nas feiras para vender drogas e elixires reputados milagrosos, seduzindo o público e iludindo-o com discursos e trejeitos espalhafatosos (diz-se de mercador ambulante)”. Ou, por extensão, no sentido pejorativo: “diz-se de ou pessoa muito esperta que, ostentando qualidades que realmente não possui, procura auferir prestígio e lucros pela exploração da credulidade alheia; mistificador, trapaceiro, impostor”.

    Por que Zé Dirceu assim qualifica Luiz Fux, em Zé Dirceu: Memórias?

    Precisamos voltar um pouquinho na história.

    O denunciante do Mensalão, Roberto Jefferson, teve seu mandato de deputado federal cassado por ter feito “acusações sem provas’. Foi o que concluiu a Câmara Federal. Sem se deter nesse “detalhe”, o Procurador-Geral da República, Antônio Fernando Souza, afirmou na sua denúncia ao STF: “Relevante destacar, conforme será demonstrado nesta peça, que todas as imputações feitas pelo ex Deputado Roberto Jefferson ficaram comprovadas.”

    “A expectativa era que o plenário do STF não aceitasse a denúncia. As próprias CPMIs não provaram que houvera compra de votos e muito menos minha participação nessa suposta compra”, afirma Zé Dirceu. A verdade é que o STF acolheu a denúncia e, em 2012, ele foi condenado.

    Joaquim Barbosa, em ato “demagógico” e apoiado numa figura de “trânsito em julgado parcial”, avalia Zé Dirceu, determinou sua prisão no dia de comemoração da proclamação da República em 2013.

    Como explicar as atitudes de Barbosa e de outros ministros do STF, indicados pelo próprio governo Lula?

    “Nunca me opus à [indicação} de Joaquim Barbosa, porque toda sua vida em Brasília, profissional e acadêmica, aconselhava. Ele era progressista, eleitor do PT, convivia em nosso meio, mas depois, já no cargo, revelou-se um autoritário e assumiu o papel que a mídia e o Ministério Público queriam”, declara.

    As pressões para a escolha de um ministro do STF vêm de todos os lados: do próprio STF, dos Tribunais de Justiça, do Congresso, da mídia etc. Afirma ele:

     

    “Nós não tínhamos força para fazer isso [indicar somente ministros progressistas], porque nós dependemos do Parlamento, do Senado, felizmente, vamos dizer assim. E dependemos dos poderes que existem no país. O Supremo influencia a indicação do ministro, o STJ nem se fale. O que o governo tem pendente lá no STJ bilhões, dezenas de bilhões e problemas gravíssimos, entendeu?”

     

    Mesmo assim, ele acredita que somente Cezar Peluso e Carlos Alberto Direito, dentre os indicados durante os governos do PT, eram declaradamente conservadores. Todos os outros indicados eram progressistas, alinhados com a causa da democracia e do PT. Houve, porém, desagradáveis surpresas com vários deles.

    Fachin, que fez uma veemente defesa de Dilma em um ato em que ele próprio pedira para falar, “se fazia amigo e aliado de todos os movimentos sociais, na academia e na advocacia – um engodo.”

    Barroso se considera “refundador da República”, ele acha “que os fins justificam o meios e hoje muda a Constituição, legisla, usurpa o Poder Legislativo, tudo com base no princípio constitucional da Moralidade, uma fraude”. Complementa Zé Dirceu: “Esse lenga-lenga que corrupção é de político, a corrupção está na essência e no coração do capitalismo, porque o dinheiro é que está na essência e no coração … isso não quer dizer que temos que aceitá-la.”

    Ele acredita que as prerrogativas dos juízes, como a vitaliciedade, a exposição conferida pela mídia e a submissão a grupos de pressão são os principais responsáveis pelas ações contrárias às histórias de certos ministros. “A única coisa que eu cobro é coerência com sua história, coragem para enfrentar os lobbies, coragem para enfrentar o poder da mídia, coragem para enfrentar esse punitivismo que tomou conta do Brasil”, pontua ele.

    Sobre Luiz Fux, Zé Dirceu é mais incisivo:

    “E tem o caso do Fux, que é um caso aberrante, porque ele procurou … todos os réus da Ação Penal 470, chamada de Mensalão, para … ele me assediou. Sabe o que é assediar uma pessoa até me encontrar? Para dizer … primeiro ele conhecia realmente o processo, as vírgulas do processo … para bater no peito e dizer que matava no peito, que nos éramos inocentes e que ia nos absolver. Esse é um charlatão ou não é?”

     

    A Ação Penal 470, conhecida como Mensalão, indicou, para ele, o início da “virada da Suprema Corte na direção do populismo judicial e do ativismo político, da judicialização da política, a Corte Suprema a serviço da luta contra a corrupção, quando os fins justificam os meios – era somente o começo”.

     

    Notas

    1 As declarações de José Dirceu foram extraídas i. do livro Zé Dirceu: Memórias. São Paulo, Geração Editorial, 2018. 496 p. (https://www.zedirceumemorias.com.br/) e da entrevista que Zé Dirceu deu à TV 247 (https://youtu.be/DLV6hRVmY3Q.)

    2 Essa matéria recebeu o selo 030-2018 do Observatório do Judiciário.

    3 Para ler outras matérias do Observatório do Judiciário:
    https://jornalistaslivres.org/categoria/observatorio-do-judiciario.

  • Como o golpe foi construído a partir da condenação de Zé Dirceu

    Como o golpe foi construído a partir da condenação de Zé Dirceu

    por Rodrigo Perez Oliveira*

    Tem tanta coisa envolvida no julgamento de Lula que fica até difícil recortar um aspecto específico para comentar. É esse o meu esforço neste pequeno ensaio. Quero discutir aquele que me parecer ser o núcleo central da crise que vivemos, algo que não é exatamente uma novidade, mas que já está circulando por aí (e nós não demos a devida atenção) desde 2005: a aplicação seletiva do paradigma indiciário ao Direito Penal.

    Começou lá, há 13 anos, no tão midiaticamente aclamado “julgamento do mensalão”: a Ministra Rosa Weber, na Suprema Corte, disse explicitamente que não tinha provas cabais contra José Dirceu, mas que ainda assim o condenaria, com base na bibliografia disponível.

    Como Zé Dirceu é um homem odiado à direita e à esquerda, aplausos foram ouvidos dos dois lados. A direita odeia Zé Dirceu porque sabe, perfeitamente, que ele é um dos maiores quadros da história da esquerda brasileira. A direita, que não é boba, tem todos os motivos do mundo para odiar Zé Dirceu.

    Alguns grupos da esquerda odeiam Zé Dirceu porque se sentiram desprestigiados no governo popular que ocupou parte do Estado em 2003. Odeiam por ressentimento. Poucos sentimentos humanos são tão baixos e amargos como o ressentimento.

    Enfim, o fato é que Zé Dirceu foi condenado e não aconteceu nada, e não fizemos nada. Ou melhor, Zé Dirceu foi para o sacrifício e tudo continuou caminhando como se nada tivesse acontecido.

    Mas aconteceu, aconteceu tudo: a matriz do golpe foi forjada ali, sob a forma da incorporação ao repertório do direito penal brasileiro de um paradigma teórico que pode até ser legítimo em outras ciências sociais ou mesmo em outros ramos do direito, mas jamais no direito penal. Jamais!

    Pra explicar melhor, apresento um autor que é muito conhecido pelos historiadores profissionais: Carlo Ginzburg, o historiador italiano que nos anos 1970 teorizou sobre o tal paradigma indiciário, em um ensaio cujo título é “Sinais: raízes de um paradigma indiciário”.

    Trata-se de um texto bastante lido nos cursos de graduação em História. Penso que dizer umas poucas palavras sobre o texto de Ginzburg pode nos ajudar a compreender algo a respeito da crise brasileira contemporânea. É que o conhecimento histórico é útil à vida.

    O argumento de Guinzburg é muito simples: no século XIX afirmou-se nas ciências humanas um paradigma científico que propõe o conhecimento da verdade através da interpretação de pequenos indícios. O autor toma como exemplo desse paradigma indiciário o “método moreliano” de verificação da autenticidade das obras de arte.

    Ao invés de buscar a “verdade da obra” nos traços mais notórios das escolas estéticas (que são mais facilmente imitáveis pelo falsificador), o especialista deve se debruçar sobre os detalhes que apontam para as características pessoais dos artistas. Aqui, no indício, no que o falsário não consegue imitar, estaria a “verdade da obra”.

    O paradigma indiciário rendeu bons frutos para a pesquisa histórica, tendo na segunda metade do século XX se transformando em um importante programa de estudos históricos que costumamos chamar de “micro história”.

    Ou em outras palavras, para que o meu argumento fique mais claro: o historiador pode basear suas hipóteses na interpretação criativa dos indícios. O juiz penal não pode. E isso pelo simples fato de que a função do historiador não é julgar, é compreender, como já disse Marc Bloch, outra importante referência para os historiadores profissionais. Já o juiz penal tem poder sobre aquilo que é o elemento mais sagrado do contrato social civilizado: a liberdade do corpo.

    O que acontece se um historiador, em um livro ou em um artigo, apresenta ao seu leitor uma tese baseada na interpretação criativa de indícios?

    Se o procedimento de pesquisa e escrita não for bem executado, estará trazendo a público um conhecimento pouco confiável, frágil, o que é um problema grave, mas que pode ser contornado por outro historiador, por outro especialista mais cuidadoso.

    Por outro lado, se um juiz penal procede assim, um inocente pode ser condenado. Não existe tragédia maior que a condenação de um inocente.

    O que o Juiz Sérgio Moro e seus colegas de Porto Alegre fizeram no caso Lula foi, justamente, a aplicação seletiva ao direito penal do paradigma indiciário, tal como a Ministra Rosa Weber havia feito em 2005.

    Se vocês tiverem tempo e paciência para ler a sentença do Juiz Sérgio Moro, verão que o argumento fundamental é: em “atos de ofício indeterminados”, Lula beneficiou a empreiteira OAS e recebeu o imóvel do Guarujá como propina. As visitas do casal Lula da Silva ao apartamento e as obras que teriam, segundo os delatores, sido coordenadas por Dona Marisa Letícia, são indícios que comprovam a culpa do réu.

    Meus amigos e minhas amigas, em direito penal, indícios não podem comprovar culpa. Cada um de vocês pode achar que o apartamento estava de fato sendo reservado para Lula, o que também não significa que ele o compraria com dinheiro sujo.

    Por que Lula não poderia comprar o imóvel com seus próprios proventos, com dinheiro legal, com fonte declarada? Só por que ele não tem berço, só por que ele nasceu no Nordeste, não pode, honestamente, comprar um tríplex no Guarujá? Este é outro aspecto do caso Lula que diz muito sobre a mentalidade do brasileiro médio. Mas não é disso que quero falar, não aqui.

    Retomando o fio.

    Vocês têm o direito de achar que Lula é culpado, que os indícios bastam, mas aí, como disse Reinaldo Azevedo (sim, estou citando Reinaldo Azevedo. Tempos estranhos!), já é uma questão de crença. E crença é assunto de foro íntimo. Cada um que se resolva com a sua.

    O fato, fato mesmo é: Sérgio Moro, que agiu como promotor desde o início do processo, não conseguiu provar a culpa e mostrar em quais “atos de ofício” Lula teria beneficiado a empreiteira. Se não provou cabalmente, meus amigos, não pode condenar. Simples assim.

    Aí você pode dizer: então é impossível combater a corrupção, pois crime de corrupção não deixa provas cabais.

    Quem disse?

    Quem disse que crime de corrupção não deixa provas cabais?

    E o Aécio? E o Temer? E o Cunha? E o Cabral? E o Gedel?

    Conta na Suíça, áudio, mala de dinheiro com 500 mil reais, apartamento à la Tio Patinhas. Tudo isso é prova cabal, taxativa.

    Ah, mas e quando essas provas cabais não existem?

    Se as provas cabais não existem, não pode condenar. Simples assim.

    Pode ser que com isso o culpado fique impune? Pode sim, paciência!

    É melhor o culpado ficar impune do que o inocente ser punido injustamente. Repito: a tragédia do Estado de direito não é a impunidade. É a punição injusta.

    Mas como nada é tão ruim que não possa piorar, o tal paradigma indiciário está sendo aplicado seletivamente por algumas frações do judiciário brasileiro, aplicado, apenas, contra lideranças do campo político progressista. A interpretação criativa dos indícios só serve se for para condenar políticos progressistas.

    É por isso que temos que tomar cuidado com uma máxima que está sendo verbalizada por algumas vozes da esquerda brasileira:

    “O que aconteceu com Lula já acontece há muito tempo com pobres e pretos, e não tem nenhuma novidade”.

    A leitura está errada. A máxima correta seria:

    “Aconteceu com Lula porque já acontece há muito tempo com pobres e pretos”.

    Entendem a diferença? Lula é uma importante liderança política, a mais importante do Brasil moderno. Foi Presidente da República, discursou na ONU, tomou chá com a Rainha da Inglaterra, mas nunca fez parte das elites. Ele pode até ter achado, em algum momento, que tinha sido aceito no clube, mas na real nunca foi.

    É por isso que o judiciário, poder historicamente conservador onde os grandes cargos são transmitidos como um tipo de herança familiar, está fazendo o que está fazendo com Lula.

    Por um motivo muito simples, meus amigos: Lula nunca fez parte das elites brasileiras. Para as elites da terra, Lula sempre foi preto, pobre, favelado, nordestino, peão analfabeto. E pior: sujeito abusado, insolente, que não “sabe o seu lugar”.

    Se eles estão fazendo isso com Lula, com alguém conhecido internacionalmente, o que não farão com pretos e pobres desconhecidos? A situação dessas pessoas ficará ainda pior.

    A condenação de Lula é simbólica, é como se as elites da terra estivessem dizendo: “vocês ousaram eleger um dos seus para governar esse país, ousaram consumir, ousaram estudar na universidade. A brincadeira acabou. Voltem para o seu lugar, de onde nunca deveriam ter saído”.

    Entendem, amigos? Sob todos os aspectos a condenação de Lula é uma tragédia: é uma tragédia para o contrato social civilizado, que não admite a interpretação criativa de indícios como procedimento do direito penal. É uma tragédia para a população brasileira mais pobre, que ficará ainda mais vulnerável ao arbítrio da lei.

    Defender Lula, de todas as formas, custe o que custar, é uma obrigação moral.

    • Rodrigo Perez Oliveira é historiador e professor de Teoria da História na Universidade Federal da Bahia.

    Notas

    1 Essa matéria foi publicada originalmente na Revista Forum em:  https://www.revistaforum.com.br/como-o-golpe-foi-construido-partir-da-condenacao-de-ze-dirceu/

    2 Essa matéria recebeu o selo 027-2018 do Observatório do Judiciário.

    3 Para ler outras matérias do Observatório do Judiciário:
    https://jornalistaslivres.org/categoria/observatorio-do-judiciario.

  • Quando corrigiremos as aberrações do Mensalão?

    Quando corrigiremos as aberrações do Mensalão?

    Reproduzimos a matéria “O papel da mídia” de Miguel do Rosário, de O Cafezinho, com introdução de César Locatelli, dos Jornalistas Livres.

    Introdução

    Passados alguns anos é hora de rever e corrigir as aberrações paridas pelo Supremo Tribunal Federal e pela Procuradoria Geral da República na Ação Penal 470, que ficou conhecida como “Mensalão”. Não há mais dúvidas que esse julgamento abriu a porteira para as ilegalidades e arbitrariedades cometidas no Brasil nesse último período. Da mesma forma, não hesitamos em atribuir categórico protagonismo às redes de televisão, rádios, jornais e revistas da mídia conservadora na ruptura democrática por qual passa o país.

    Comecemos pelo papel do sistema de justiça brasileiro.

    Não podemos mais dizer que o país vive em um Estado Democrático de Direito, se é que podemos dizer que um dia nele vivemos, dada a ausência de direitos que desde sempre aflige os pobres e os negros. A diferença é que, desde o Mensalão, os adversários políticos escolhidos pelas elites brasileiras passaram também a não ter direitos. São inúmeras as evidências de que a lei e a Constituição nunca regularam a convivência social e, agora, não mais regulam a convivência política.

    Relembremos a imaginosa versão dos fatos cantada em prosa e verso pelos meios de comunicação tradicionais brasileiros e aceita pelos ministros do STF:

    Henrique Pizzolato, na função de diretor de marketing do Banco do Brasil, desviou cerca de 74 milhões de reais do banco para a agência de publicidade DNA, de Marcos Valério. Pizzolato recebeu cerca de 300 mil reais desse montante e comprou um apartamento. Parte do dinheiro foi distribuído mensalmente a políticos, como os deputados do PTB capitaneados por Roberto Jefferson. Parte dos recursos foram para o PT via empréstimos falsos firmados com o Banco Rural. A estratégia elaborada por José Dirceu e outros membros do governo Lula tinha como objetivo comprar o apoio a projetos do governo como a reforma da Previdência. Delúbio Soares cuidava dos aspectos operacionais do esquema. O Supremo Tribunal Federal (STF), que tinha Joaquim Barbosa na função de relator do processo e presidente da casa, condenou cerca de 38 pessoas envolvidas com o que se apelidou de Mensalão.

    Assim é a versão dos fatos que está impregnada nas pessoas por todos os cantos do Brasil.

    A tragédia é que, nesse curto parágrafo acima, há 7 erros crassos cometidos pelo STF.

    1 Não havia dinheiro público

    Os 74 milhões não eram do Banco do Brasil, uma empresa pública, mas da Visanet, uma empresa privada. Se não há dinheiro público, não há peculato, ou seja, não há apropriação de dinheiro ou bens públicos por funcionário publico. A fantástica história teria morrido no nascedouro se os ministros do STF tivessem acatado esse fato.

    2 O diretor de marketing do Banco do Brasil não tinha gestão sobre os recursos

    O acordo do Banco do Brasil com a Visanet era que o banco determinava onde queria que os recursos fossem aplicados. A gestão financeira e a relação com as agências de propaganda eram de responsabilidade da Visanet. O banco sequer tinha contrato com a agência de publicidade. A agência de publicidade tinha que prestar contas à Visanet. No entanto, se inocentassem Henrique Pizzolato o caso todo desmoronaria.

    3 O dinheiro não foi desviado

    Há notas fiscais e documentos de transferência que comprovam que os 74 milhões foram efetivamente usados na promoção do cartão Ourocard Visa. Os recursos foram usados para patrocinar torneios de tênis, vôlei de praia, anúncios em aeroportos e muitos outros eventos de marketing. Foram feitos pagamentos inclusive para a TV Globo por campanhas de Dia dos Pais, Dia da Crianças e Natal. As comprovações de que não houve desvio dos 74 milhões foram, simplesmente, desconsideradas.

    4 Pizzolato tinha dinheiro declarado para comprar seu apartamento

    O exame do imposto de renda de Pizzolato não comprovou que os recursos, que o STF concluiu terem sido sua parte no desvio, foram usados na compra do apartamento. Pizzolato tinha poupado, ao longo de 20 anos de trabalho, um montante suficiente para a compra do apartamento.

    5 Nada foi comprovado contra José Dirceu

    Embora fossem quebrados os sigilos telefônico e bancário de José Dirceu, acusado de chefe do esquema, nada foi encontrado. Mesmo assim, ele foi condenado com base na teoria do domínio do fato: pelo alto cargo que ocupava no governo e no PT “era evidente” que José Dirceu tinha participação no desvio. A ministra Rosa Weber lançou mão da seguinte pérola ao condená-lo: “Não tenho prova cabal contra Dirceu – mas vou condená-lo porque a literatura jurídica me permite”.

    6 Não houve mensalão, não houve pagamentos mensais a congressistas

    A tímida reforma da Previdência feita durante o governo Lula contou com apoio dos políticos conservadores do Congresso que, embora fizessem oposição forte ao presidente, apoiaram a reforma. Além dessa evidência, o processo não comprova a tese de pagamentos mensais (mensalão) a congressistas.

    7 Os empréstimos do Banco Rural ao PT não eram falsos

    O Partido dos Trabalhadores pagou os empréstimos que tomou junto ao Banco Rural.

     

    Reproduzimos aqui a excelente matéria escrita por Miguel do Rosário, do blog O Cafezinho, publicada em 7 de junho de 2013.

    A conspiração

    O papel da mídia

    Uma das virtudes fundamentais no espírito de um jornalista é a ojeriza a teorias de conspiração. É uma virtude, no entanto, que beira um vício, porque o mesmo pensamento racional, a mesma objetividade, que nos aconselha a manter distância de discursos paranoicos e teorias de conspiração, nos obriga a aceitá-los quando estamos diante de documentos e provas irrefutáveis.

    A divulgação de milhares de documentos secretos da diplomacia norte-americana, pelo Wikileaks, consistiu, por exemplo, numa inesquecível vitória moral para milhares de pessoas que acusavam, há décadas, os EUA de promoverem golpes de Estado em países do terceiro mundo. Na época, um divertido argumento fez sucesso nas redes sociais: “sabe aqueles malucos que viviam culpando a CIA por tudo? Estavam certos.”

    A bem da verdade, não foi apenas o Wikileaks. Algumas leis que obrigam a divulgação de documentos do governo americano com mais de trinta ou quarenta anos, também ajudaram.

    Mas ser jornalista não é dizer a verdade. Essa é a função, talvez, de filósofos. Jornalistas divulgam documentos e fatos concretos, e a verdade que buscam é apenas aquela que podem comprovar com base neles. O uso da lógica, porém, não é vetado aos jornalistas. Nem a imaginação, desde que usada com parcimônia.

    No processo do mensalão, todavia, a imaginação se tornou a virtude fundamental do jornalismo político. Reportagens, colunas, análises, passaram a se descolar cada vez mais de qualquer prurido factual e inaugurou-se uma nova era quase psicodélica na imprensa brasileira. Teorias eram montadas e desmontadas sem qualquer escrúpulo. O fato de inúmeras denúncias serem desmentidas no dia seguinte não tinha mais importância. Um clima de total liberdade de expressão enfim se instalara nas redações nacionais.

    Quando os historiadores se debruçarem, daqui a alguns anos, sobre o mensalão, o tradicional rigor acadêmico possivelmente lhes obrigue a dividir o tema em várias seções: política, midiática, partidária, jurídica.

    Em meu modesto esforço para escrever sobre um caso ainda em curso, e portanto ainda influenciado pelo clima barra pesada, sufocante, de tribunal, eu vou tateando em todas as áreas, mas a corda que uso para não cair são documentos. Por isso tenho sido repetitivo quanto ao caso Pizzolato. É que me parece o caso mais surreal, kafkiano e… documentado. A sua inocência é documentada.

    Se a grande mídia fizesse uma ampla reportagem sobre os erros na condenação de Pizzolato, mostrando os documentos, apresentando-os a juristas conceituados e pedindo sua opinião, testemunharíamos uma sumária desmoralização da Ação Penal 470. Aliás nota-se hoje um barulhentíssimo silêncio nos grandes jornais e nas redes de TV sobre o debate tão aceso nas redes sociais e blogs, sobre os erros do STF. A ruptura da mídia com a sociedade se tornou completa. O artigo da Inês Nassif, por exemplo, abordando a suja história do Laudo 2828, que inocenta Pizzolato, tornou-se imediatamente o mais lido em todos os principais blogs políticos no país, mas o assunto é virtualmente proibido na grande imprensa. A mesma coisa vale para o erro crasso de Barbosa quanto a data da morte de José Martinez.

    A nossa presidenta gosta de repetir o clichê supostamente pró-democrático, sobre preferir o barulho da imprensa ao silêncio da ditadura. É uma frase bonita, mas a verdade é que o único barulho que a imprensa quer ouvir, no caso do mensalão, é o da tampa de um caixão se fechando. A nossa mídia não é boba. O espaço à divergência se dá apenas em questões não estratégicas. E o mensalão é um assunto absolutamente estratégico para os grandes grupos de mídia, que se tornaram, assumidamente, o grande partido do conservadorismo brasileiro.

    Entretanto, mesmo durante o julgamento, quando o assunto ocupava, diariamente, várias páginas de jornal, e hegemonizava o noticiário televisivo, havia muitos mais fogos de artifício do que conteúdo. Não havia um debate sério sobre o tema. O tal “barulho da imprensa”, tão ao gosto da nossa chefe de Estado, era apenas um rufar histérico dos tambores da oposição. Os réus, porém, não eram só aqueles perfilados na denúncia da Ação Penal 470, mas toda a sociedade, incluindo os elementos raivosos que pagavam anúncios no Facebook para promover páginas repletas de indizível rancor. Todos são vítimas do maior processo de manipulação da informação de que temos notícia.

    O mensalão foi o canto do cisne da grande mídia brasileira. O escândalo é deflagrado exatamente no momento em que a internet ainda não havia sido “apropriada” pela sociedade. Os únicos blogs políticos estavam em mãos da grande mídia de oposição: Noblat e Reinaldo Azevedo. A imensa ágora pública, caótica e democrática em que se tornou a internet brasileira não havia se constituído nos anos de 2005 e 2006. A imprensa reinava sozinha. Se hoje ela ainda tem um poder descomunal para influenciar o espírito nacional, naquela época esse poder era quase absoluto.

    Uma das seções mais importantes no estudo do processo do mensalão, portanto, é o papel da mídia. É um papel que ainda está sendo desempenhado. Hoje, sexta-feira 07 de junho, uma notícia deixou inteiramente perplexa a grande nação de internautas: o único jornalista convidado pelo ministro Luiz Fux para dar uma “aula pública” aos ministros do STF sobre financiamento de campanha será Merval Pereira, colunista e membro do conselho editorial do jornal O Globo.

    A promiscuidade entre a grande mídia, em particular a Rede Globo, e o STF, parece não encontrar limites. Até mesmo os juízes mais resistentes à pressão da mídia, como Lewandowski, ligavam para Merval, no dia seguinte a sessões, para “explicar” seus votos. Joaquim Barbosa, por sua vez, liga regularmente para Merval para justificar seus destemperos.

    E Ayres Britto escreveu o prefácio do livro de Merval Pereira sobre o mensalão enquanto ainda era presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)!

    Se a mídia é um poder terrível em qualquer parte do mundo, uma concentração absoluta numa só empresa empresta-lhe um ar perigosamente antidemocrático.

    A maior parte da “pressão social” alardeada pela grande mídia, e usada pelos próprios ministros do STF como justificativa para a incrível criatividade com que se portaram no julgamento da Ação Penal 470, a ponto de ser qualificado, de maneira promissoramente corajosa pelo mais novo ministro, Luís Roberto Barroso, de “um ponto fora da curva”, veio da Rede Globo. Com toda certeza, os ministros se portavam no tribunal com um olho não na população brasileira, não na História, mas em como seriam caricaturizados no Globo no dia seguinte. As notinhas de Ancelmo Gois sobre Joaquim Barbosa, alardeando sessões de aplauso no metrô de Ipanema e shows da Marisa Monte, e mencionando, orgulhosamente, a criação de um site para lançar sua candidatura presidencial, parecem ter surtido um efeito narcótico poderoso no espírito de todos os juízes. Da mesma maneira, a mídia incitava agressões verbais ou mesmo físicas contra Lewandowvki, único ministro que ousou se contrapor, e mesmo assim timidamente, à agressividade inacreditável do relator.

    No início do texto, eu falava na ojeriza a teorias de conspiração como importante virtude jornalística. Mencionei também que esta virtude pode se tornar um vício se nos recusamos, mesmo diante de evidências, em aceitar a existência de uma conspiração. O que vimos no processo do mensalão nos traz esse dilema. Todos os fatos, documentos, ações, discursos e posturas, apontam para uma conspirata política. Uma conspirata da qual participaram os dois procuradores gerais da república, Joaquim Barbosa, a oposição, a mídia. O próprio governo, vergado, intimidado, aterrorizado com a possibilidade de um golpe, talvez tenha pactuado, em parte, com tudo isso, sacrificando seus próprios companheiros em prol da sobrevivência. Enfim, estamos diante de um jogo político extremamente barra-pesada.

    Mesmo com evidências, porém, este é um terreno que devemos trilhar com cuidado. Não podemos largar a corda que nos impede de cair no abismo. O mensalão ainda é uma história cheia de segredos, desagradáveis para todos os lados. É um processo e um julgamento ainda em curso. No próximo capítulo, faremos algumas incursões na seara propriamente política da nossa história, comentando seus desdobramentos presentes e futuros.

    Notas

    1 Para ler os outros textos de Miguel do Rosário, em O Cafezinho:

    Prefácio: Mensalão, a história de uma farsa

    Capítulo 1: Acusações contra Pizzolato lembram Dreyfus e Kafka

    Capítulo 2: O caso Visanet

    Capítulo 3: As bombas lá fora

    Capítulo 4: Tirem as crianças da sala

    Capítulo 5: As bombas aqui dentro

    Capítulo 6: A história não anda de avião

    Capítulo 7: O julgamento do povo

    Capítulo 8: O maior fiasco da história

    Capítulo 9: O papel da mídia

    2 Essa matéria recebeu o selo 018-2018 do Observatório do Judiciário.

    3 Para ler outras matérias do Observatório do Judiciário:

    https://jornalistaslivres.org/categoria/observatorio-do-judiciario

     

     

     

     

  • Zé Dirceu e o desejo improvável

    Zé Dirceu e o desejo improvável

    Artigo de Rodrigo Perez Oliveira, professor de Teoria da História na UFBA, com ilustração de Humberto

    Sei bem que o foco está em Lula, como não poderia deixar de ser, mas peço licença ao leitor para falar um cadinho sobre Zé Dirceu, mais especificamente sobre sua última entrevista, publicada em 28 de abril na “Folha de São Paulo”.

    É que tenho a sensação que falamos pouco sobre Zé Dirceu, aquele que talvez seja o melhor quadro da história da esquerda brasileira.

    Falar pouco sobre Zé Dirceu é um erro gravíssimo, pois foi exatamente por isso que não demos a devida atenção ao que aconteceu na Ação Penal 470, no julgamento do “Mensalão”.

    Tudo começou ali: a criminalização da esquerda, a condenação seletiva de lideranças populares com base em indícios, o concubinato entre o Sistema de Justiça e a mídia hegemônica. O mensalão foi o ensaio geral do golpe. Mas não é disso que quero falar. Quero falar mesmo é da entrevista, pois temos ali uma aula de política.

    Mas como assim, “política”? O que é “política”?

    A definição mais antiga de política que sobreviveu ao tempo e chegou a nós foi desenvolvida por Aristóteles em algum momento no IV século a.c.

    O grego nos apresenta uma definição de “política” que me parece ser a chave ideal para a compreensão da trajetória pública de José Dirceu, algo que fica muito claro na entrevista que o ex-ministro concedeu à “Folha de São Paulo”.

    “EU NÃO POSSO BRIGAR COM A CADEIA.”

    Esse é o título, em letras garrafais, da entrevista.

    Sei que à primeira vista parece conformismo.

    Parece que Zé Dirceu é um velho fraco, entregue, passivo. Mas tão logo passamos pelo título essa sensação se dilui no ar. Não é fraqueza, não é fragilidade. É inteligência política. É inteligência política no sentido aristotélico.

    Vejamos como é possível esse salto da antiguidade grega ao Brasil contemporâneo, de Aristóteles a Zé Dirceu.

    No tratado “Ética a Nicômaco”, Aristóteles faz uma crítica à ética política platônica. Para Platão, a ética na política deveria ser fundada na ideia de “bem comum”. Ou seja, o político deveria agir conduzido por ideias universais, gerais, a respeito do bem e do mal.

    Aristóteles, antecipando em séculos o que seria formulado de maneira mais clara por autores como Tomás de Aquino e Maquiavel, diz que não é bem assim. Aristóteles diz que na política a ética precisa ser específica, que não pode deixar se levar por generalidades, pois cada evento político é único.

    Nas palavras do próprio Aristóteles:

    “Uma vez que a presente investigação não visa ao conhecimento teórico como as outras – porque não investigamos para saber o que é a virtude, mas a fim de nos tornarmos bons, do contrário o nosso estudo seria inútil -, devemos examinar agora a natureza dos atos, isto é, como devemos praticá-los; pois que, como dissemos, eles determinam a natureza dos estados de caráter que daí surgem. (ARISTÓTELES, 1991, p. 30)”.

    Sei que texto é meio truncado, confuso, mas o sentido é fácil, fácil de entender. O Grego tá falando que o objetivo do estudo político não é viajar em teorias, mas, sim, se debruçar sobre as especificidades dos fatos. Aristóteles chamou de “phronesis” essa ética circunstanciada, adequada aos eventos políticos.

    Caberia, então, ao homem político a atuação sempre contextualizada, levando em conta os limites das circunstâncias. Quando a realidade se apresenta na sua dimensão mais opressora, restaria ao político entendê-la, sabendo que somente é possível modificá-la parcialmente, dentro dos limites que já estão postos. O político seria, nesse sentido, o especialista nas possibilidades e não herói quixotesco que luta contra moinhos de vento como quem se debate com poderosos gigantes.

    Mas o que isso tudo tem a ver com Zé Dirceu?

    Para responder, voltamos ao título da entrevista.

    “EU NÃO POSSO BRIGAR COM A CADEIA”.

    Zé Dirceu sabe muito bem que o Estado é o objeto das disputas políticas. Na prática, o que as forças políticas fazem é disputar o Estado.

    Sempre que se envolvem em campanha eleitoral, sempre que fomentam um golpe ou sempre que trocam chumbo e pólvora em guerra civil, é o controle do Estado o objetivo dos grupos organizados politicamente.

    E o Estado é um latifúndio enorme, muito grande mesmo.

    Dificilmente, um grupo consegue ocupar sozinho todo o latifúndio do Estado. Por isso, as disputas pelo controle do Estado não se dão apenas fora dele, onde os grupos excluídos do poder tentam entrar. As disputas também acontecem dentro do próprio Estado, onde os grupos já estabelecidos disputam território, tentam aumentar o espaço do seu quinhão de poder e, por consequência, diminuir o tamanho do quinhão do grupo rival.

    Em 2003, quando Lula subiu a rampa, o campo popular ocupou um pedaço do Estado. um quinhão relevante e importante, mas apenas um lote. Os outros lotes, os pedações, sempre estiveram sob o controle das forças do atraso. Quem pensou diferente, quem achou que tendo apenas a Presidência da República seria possível revolucionar a sociedade brasileira foi ingênuo, muito ingênuo. Em política, a ingenuidade é o pior dos vícios.

    Zé Dirceu, que de ingênuo nunca teve nada, sabe muito bem que o Estado brasileiro está completamente ocupado pelas forças do atraso. Esse foi o resultado político mais nefasto do golpe. As forças do atraso, que já ocupavam o Legislativo e o Sistema de Justiça, agora estão também com o controle do Poder Executivo. Numa situação dessas, não sobra muito espaço para devaneios e esperanças tolas.

    “O país vive uma situação de insegurança e instabilidade, de violação dos direitos e garantias individuais. O aparato judicial policial se transformou em polícia política”.

    Zé Dirceu sabe que para sua própria saúde mental é importante não brigar com a cadeia. Ele sabe que precisa conviver amigavelmente com Eduardo Cunha, com Palocci e outros que estão por lá. Pouco importa se Cunha foi um dos principais artífices do golpe. Pouco importa se Palocci é o antigo companheiro desonrado. Dentro da cadeia são todos presos, dividem os mesmos metros quadrados. É bom que o convívio seja cordial.

    Não adianta brigar com uma realidade tão difícil, tão opressora. Não adianta evocar uma ideia abstrata de “justiça” segundo a qual inocentes não são presos e todos são iguais perante a lei. Não é isso que está acontecendo no Brasil, e já há algum tempo.

    Mas não confundam a agudeza de percepção com conformismo. Mesmo com todas as dificuldades, há algo a ser feito, e é disso que Zé Dirceu fala na entrevista. A entrevista tem, justamente, essa função. Zé Dirceu está falando para seus correligionários que a ação precisa ser calculada dentro das possibilidades abertas pela realidade.

    O campo popular não ocupou as Forças Armadas, não ocupou os aparelhos policiais do Estado. Não adianta acalentar o desejo de resistência pela força. Zé Dirceu já viveu muito, já passou por muita coisa, para saber que somente devemos usar a força quando temos alguma chance de vencer, quando temos algum poder de fogo. Não é esse o caso, não temos nenhum poder de fogo.

    Fazemos o que, então?

    Zé Dirceu explica, com didática de professor: “Como minha vida é o PT e o projeto que Lula lidera, eu tenho que me preparar para continuar fazendo política. Eu não posso me render ao fato de que vou ser preso.”

    O melhor a fazer, então, é se adaptar às circunstâncias continuar fazendo política. A agenda de José Dirceu está focada menos na sua liberdade pessoal e mais no seu direito de continuar fazendo política, mesmo que preso, ainda que de dentro da cadeia.

    Trata-se de Franciscanismo? De um sentimento nobre de abnegação? Zé Dirceu não deseja ser solto, ter o corpo livre, poder ir e vir sem constrangimentos?

    É claro que ele quer ser solto. Porém, ao olhar pra realidade, o cabra percebe que no atual estado das coisas, o desejo é improvável.

    Desejo improvável deve ser evitado.

    Desejo improvável inviabiliza a capacidade de desejar, pois quando desejamos o improvável, deixamos de desejar o possível.

    O possível, para José Dirceu, hoje, é continuar fazendo política, é continuar disputando o Estado, agora fora dele, completamente fora dele. Continuar fazendo política e esperando um momento político melhor, onde seja possível voltar a ocupar um quinhão do Estado.

    Pra isso, tem que investir na campanha eleitoral, tem que eleger senadores, deputados. Pra isso, é importante eleger um presidente que seja disputável. Zé Dirceu sabe que a candidatura de Lula é improvável, quase impossível.

    Zé Dirceu sabe que não existe um herdeiro claro e que já começarão as lutas fratricidas pelo legado de Lula. Por isso, o fundamental é evitar a eleição de um tucano puro sangue, de um candidato explicitamente vinculado aos interesses do mercado. A todo custo, o campo popular deve impedir a vitória de Geraldo Alckmin, que na prática significaria a lavagem eleitoral do golpe.

    Pra isso, diz Zé Dirceu, até mesmo a candidatura de Joaquim Barbosa pode ser importante, útil.

    Não custa lembrar que Joaquim Barbosa foi o principal algoz de José Dirceu.

    Dirceu, preso, cumprindo a pena que lhe foi imposta por Barbosa, afirma que a candidatura do seu carrasco pode ser cooptada pela esquerda. Na ausência de Lula, na ausência de um herdeiro viável, se só sobrar Joaquim Barbosa como adversário do candidato do golpe, o campo popular não deve hesitar em escolher um lado.

    Se o voto em Barbosa significar o veto a Alckmin, o campo popular não pode hesitar. O mesmo vale para Ciro Gomes, para Boulos ou para qualquer outra candidatura que seja minimamente disputável pela esquerda.

    Encerro com uma confissão pessoal.

    Aprendo sobre política sempre que leio Aristóteles. Aprendo sobre política sempre que leio e ouço Zé Dirceu. É que os dois estão dizendo algo muito parecido.

    Estão dizendo que, no limite, o homem político deve agir como Sancho, como o leal escudeiro que com alguma impaciência e com agudo senso de realidade diz a Quixote: “Moinhos de vento não são gigantes. Lide com isso e pare com os devaneios”.

     

  • Sem surpresas, mas infame; esperado, mas escatológico; previsível, mas vergonhoso.

    Sem surpresas, mas infame; esperado, mas escatológico; previsível, mas vergonhoso.

    Saber antecipadamente dos acontecimentos não nos livra da estupefação. Não porque algo nos faria supor que uma decisão diferente da que foi divulgada ontem viria. Mas porque a esperança de que um instante de sanidade, senso moral e coragem cívica, de repente perturbassem um soldadinho de chumbo que se utiliza do direito como meio para alçar-se ao egrégio lugar do representante mor da extrema direita no país. Não aconteceu, mas torcer não é pecado.

    Muitos agora estão ambicionando o cargo do líder da extrema direita no país:

    Bolsonaro, Dória e Moro.

    Joaquim Barbosa ensaia alguns passos,

    Jobim foi descartado e Gilmar Mendes está atualmente sobre suspeita.

    A direita se mexe e se articula e já apresenta seus candidatos para a sucessão de Temer pós Maia.

    Por justaposição de significantes e condensação da retórica simplória dos grupos de direita no país chegamos à conversão de Lula em condenado à prisão, sem provas, proclamado pelo juiz que obedeceu às ordens que lhe foram conferidas desde o início, assim como Dilma foi deposta sem crime de responsabilidade num processo liderado pelo encarcerado Cunha que cumpriu o prometido.

    Eles são executores de um nível de esvaziamento e captura da linguagem no seio do discurso. Isso é o discurso repetitivo, vazio de pensamento, sequestrador de ideias e atos que vem se sobrepondo às narrativas do pensamento, da ética e da justiça.

    O fiel executor da tramoia, desde o início anunciada, Sergio Moro era um ilustre desconhecido antes de demonstrar sua capacidade e ousadia em cometer arbitrariedades que o alçasse aos lugares mais altos dos pódios globais e de outras mídias do mesmo naipe. Confirmados por atos pusilânimes de operadores do direito, das camadas médias conservadoras e das elites nacionais Moro tinha como uma de suas razões de existir entregar a cabeça de Lula em bandeja de prata.

    Não poderá entregar o serviço completo.

    Não está em sua alçada, mas fez sua parte, como Cunha fez a dele.

    Legal Moro, agora dá licença. Dirão seus chefes deixando em suas costas o custo de sua sentença que quis tirar do jogo político o líder mais bem avaliado da história. Não era necessário gastar tanto do erário público com audiências, salários e benefícios à servidores públicos, custos advocatícios com a defesa apenas para encenar o já previamente sentenciado.

    É bem simples e já sabido: um dia após a aprovação das reformas trabalhistas que atingem no peito de todo trabalhador e trabalhadora assalariados do país, o juiz previsível solta sua “surpreendente” e “inesperada” sentença: prisão de Lula e sua inelegibilidade pelo resto da vida.

    Sobre qual líder de qual partido incide a sentença?

    O do partido dos trabalhadores.

    Esses mesmos sobre os quais recai a reforma trabalhista e previdenciária, os que verão sucateados os sistemas de saúde e educação após a aprovação da PEC do fim do mundo, aos quais terão de recorrer após arrochos salariais extraídos das negociações entre patrões empregados.

    Criticável ou não, o Partido dos Trabalhadores foi o único partido a ser eleito com uma pauta de esquerda no país. Respeitando ou não as aspirações da esquerda, condenável ou não quanto ao seu modus operandi e sua maneira de fazer política quando no poder, é o partido que ainda faz peso importante nas lutas contra a avalanche reacionária que assola o país inteiro.

    Resistiu à avassaladora campanha que, diuturnamente, tentou arrastar todos do partido para a lama. Nesse sentido Lula e o PT deram um baile. Nem seus líderes esperavam que toda a campanha difamatória de todas as mídias oficiais que lotearam todas as concessões de rádio e TV, além das famílias proprietárias da imprensa escrita diária e semanal com campanhas difamatórias abertas para desmantelar o partido fosse malsucedida. E foi. O PT foi o único partido que cresceu desde 2014.

    Mas também não se esperava que a patrocinadora oficial do golpe – o conglomerado Globo – viesse a atacar o seu menino prodígio Michel Temer até o ponto de destruí-lo. Mas aconteceu. Também não se esperava que o capitão caverna da lava-jato Rodrigo Janot tirasse o time de campo na disputa pela PGR. Tirou.

    A direita derrapa, fracassa, bate cabeça.

    Sabe que vai ter massacrar muitos brasileiros para manter essa onda flagrante de bestialidade e violência. A prisão de Lula, para eles, seria a última bandeira a fincar no panteão dos vende pátria.

    Hoje a luta é contra os trabalhadores e retornar ao tempo da escravidão não é mera retórica. Logo mais, a Câmara estará decidindo quantas chibatadas o trabalhador deve levar no lombo no caso de atrasos, faltas e insubordinação hierárquica e se não avançarmos quanto à clareza do que isso significa, a reação pode não ser contundente.

    Todos vociferarão retoricamente o absurdo, mas o Congresso fechará as portas, apagará as luzes e votará a medida que será sancionada pelo presidente em exercício.

    Prender sem provas; depor presidentes baseado em alegação de crime que, dois dias depois do impeachment da presidenta se transforma em lei que autoriza o mesmo crime; expor a mulher gestante a condições insalubres; retirar a autonomia do trabalhador sobre suas férias, descanso remunerado e almoço, hoje, se tornaram leis, mas elas são fracas, a política pode depô-las fazendo o caminho contrário.

    Logo mais, se sancionará a lei que permite à criança trabalhar a partir dos 7 anos anos, para que as famílias possam ter uma renda extra, diante da perda dos direitos arrancados. Uma calamidade justificando a próxima e sendo engolida como justificativa para que se amplie o exército de escravos sem direitos e se barateie a mão de obra pouco qualificada disponível. Grande chance da medida passar na CCJ e ter maioria no senado e na câmara. Retornamos ao século XIX.

    Vejamos o que escreve Marx no século XIX sobre os pequenos trabalhadores na europa:

    ..] Muitos, milhares desses pequenos seres infelizes, de sete a treze ou quatorze anos foram despachados para o norte. O costume era o mestre (o ladrão de crianças) vesti-los, alimentá-los e alojá-los na casa de aprendizes junto a fábrica. Foram designados supervisores para lhes vigiar o trabalho. Era interesse destes feitores de escravos fazerem as crianças trabalhar o máximo possível, pois sua remuneração era proporcional à quantidade de trabalho que deles podiam extrair. (…) Os lucros dos fabricantes eram enormes, mais isso apenas aguçava-lhes a voracidade lupina. Começaram então a prática do trabalho noturno, revezando, sem solução de continuidade, a turma do dia pelo da noite o grupo diurno ia se estender nas camas ainda quentes que o grupo noturno ainda acabara de deixar, e vice e versa. Todo mundo diz em Lancashire, que as camas nunca esfriam. (1988, p. 875-876)

    Não estamos distantes disso num país que virou piada de mau gosto. Nada é impossível no Brasil de hoje. Que gritem OIT, ONU e Comissão Interamericana de Direitos Humanos, os membros do parlamento e do judiciário dão e darão de ombros.

    Ainda perdura um problema, mesmo nas manifestações expressivas, aquelas que mobilizam centenas de milhares de pessoas; elas ainda contam com uma parcela pequena dos milhões trabalhadores brasileiros que estão sendo massacrados e atingidos pelos ataques do capital financeiro sem controle.

    Isso significa que há ainda milhões a mobilizar.

    Entre eles aqueles que veem a torneira pingar,

    o assoalho encharcado mas não creem no afogamento.

    Uma ampla campanha e estratégia de conscientização deve ser feita em cada recôndito do país e a preparação para paralização total dos trabalhadores por tempo indeterminado, deve ser construída e considerada pelos movimentos organizados que, hoje, lideram a resistência no país.

    O projeto de espoliação do país tem, no mínimo, vinte anos então qualquer coisa antes disso será bem vinda e politicamente importante. É a alternativa para se deter essa avalanche. Já não bastam mais as manifestações é preciso parar a produção de lucro e dividendos, atingir os que monitoram e comandam o conjunto de atrocidades que vem sendo aprovadas no legislativo.

    Tudo está sendo decidido à sete chaves sem a permissão sequer de que os trabalhadores ocupem as galerias no congresso nacional destinadas para isso. Tudo decidido em jantares sofisticados, reuniões engravatadas, mansões muradas.

    A maioria dos parlamentares persistem em cumprir o combinado à mando das elites financeiras e mancomunados com elas, dão as costas para as centenas de milhares de manifestantes nas ruas todos os dias que, para eles, são vagabundos que acordam tarde. É preciso levar essa retórica da direita muito a sério porque eles a estão levando. Dizem isso enquanto atiram contra manifestantes, humilham trabalhadores, assassinam pobres, elogiam torturadores e se preparam para assumir o poder por longos períodos.

    Ninguém precisa de militares nas ruas,

    já há mais de 400.000 milicos nas polícias estaduais,

    que jamais tocam nos excessos cometidos pelos muito ricos,

    mas pisam sobre o corpo de qualquer pobre que se lhes atravesse o caminho.

    O poder judiciário, as altas cortes pusilânimes não conseguirão estancar nem a mais absurda das decisões do legislativo que legisla o país destruindo, dia após dia, cada tijolo da democracia brasileira.

    Cunha presidindo o impeachment e um juiz de primeira instância mandando e desmandando no modo de julgar e condenar no Brasil. O que é difícil de imaginar é fácil de acontecer no Brasil de hoje.

    Precisamos analisar com calma, clareza e profundidade o que está se passando e pensarmos juntos nas novas estratégias, abrir mão dos projetos de poder desse ou daquele espectro, para manter o Brasil acima da devastação. Não vamos nós aprofundar as baboseiras dicotômicas também muito comuns entre as esquerdas. Se há uma utopia sobre a união das esquerdas já é passada a hora de realizá-la. Lula não precisa ser o chefe, como disse Tasso Genro, mas pode ser um líder favorecendo a emergência de outros.

    A comprovação de crimes cometidos por Lula não existiu.

    Mataram sua esposa atrás dessas provas e elas não apareceram. O objetivo agora é matar Lula política e literalmente. Temos testemunhado o quanto eles jogam pesado e atiram pra matar.

    Nas barbas da justiça, o presidente em exercício atua para paralisar a lava-jato, agora que ela o ameaça enquanto se prepara um Maia para presidente. É muito possível que consiga. O grande trunfo da lava-jato já foi conquistado.

    A um palmo dos narizes dos excelentíssimos ministros do supremo um juiz de primeira instância faz o que quer em suas sentenças e decisões estapafúrdias.

    Temer, Cunha e Moro fizeram seu trabalho exemplarmente, para que servirão agora?

    É a hora da troca.

    Maia, Bolsonaro, Dória, Dallagnol aguardam na fila para exercer seu protagonismo.

    Vão lançar a chapa Cunha para presidente e Feliciano vice? Ou Bolsonaro presidente e Moro vice? Tudo é possível no país dos banguelas se não se estanca essa sangria.

    O governo Temer acena para os sindicatos que serão ridicularizados e destruídos se aceitarem sentar para negociar sua lenta extinção. Trabalhadores sem direitos e sindicatos inúteis, eis aí o país do futuro para trabalhadores que ainda lutam para consolidar a CLT.

    A bela resistência que se construiu nesses últimos anos de adversidade, que pintaram e cantaram nas ruas disseminando esperança, alegria e compartilhamento de ideais tem tudo para reinventar a própria resistência, novas estratégias e outras narrativas. Daqui para frente talvez seja o caso de infestar, além de manifestar. Infestação do dever e da urgência em resistir em cada recanto do país que ainda se encontra sonolento e, ativamente, em algum momento no futuro próximo, parar o país.

    Mais do que nunca lutar por todos e pelo país é, também, salvar a própria pele.