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Tag: Impedimento de Moro

  • THE INTERCEPT EXPLICA PASSOS DA VAZA JATO À COMUNIDADE

    THE INTERCEPT EXPLICA PASSOS DA VAZA JATO À COMUNIDADE

    Leandro Demori: “Não podemos esperar porque há pessoas presas ilegalmente”

    “Se não fosse o impacto do escândalo, Sérgio Moro já teria nos prendido e tomado nossos equipamentos”, afirma Leandro Demori, em debate na UFSC

    Em dia de novas revelações da Vaza Jato, a comunidade universitária lotou o Auditório e o Hall da Reitoria da UFSC para ouvir Leandro Demori, editor-chefe do The Intercept Brasil, na manhã de sexta-feira, 5/7, em Florianópolis. Durante quase três horas, estudantes, pesquisadores e profissionais de jornalismo sabatinaram o premiado editor sobre os resultados e o futuro da investigação jornalística que desmascarou os esquemas entre a Lava Jato e o então juiz Sérgio Moro para condenar Lula e tirá-lo da disputa eleitoral. Assista aqui à cobertura ao vivo pelos Jornalistas Livres.

    Uma plateia entusiasta do trabalho do The Intercept, mas também crítica e curiosa, pediu explicações sobre a parceria com veículos da grande mídia que ajudaram a acobertar a “arbitragem ilegal e antiética” do atual ministro da Justiça, como ele próprio a qualificou. Demori afirmou que as parcerias são necessárias para acelerar o trabalho de apuração. Garantiu, contudo, que todas as produções resultantes dessas alianças são acompanhadas pelo site. “Nós franqueamos o acesso ao material bruto sob a condição de que as reportagens passem pelo nosso crivo.” Acrescentou ainda que ocupar a grande mídia, assim como dar entrevistas e fazer palestras diárias pelo país é fundamental “para que não vença a narrativa do governo e da direita criminalizando os jornalistas”.  Especializado em jornalismo investigativo e diretor da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, lembrou o discurso de Moro no Senado, afirmando que a intenção dos jornalistas era provocar um fato para serem presos e terem seus equipamentos apreendidos. Hoje Demori vê essa acusação como uma confissão: “Se não fosse a repercussão nacional e internacional do escândalo, Sérgio Moro já teria nos prendido e tomado nossos equipamentos no dia seguinte à primeira matéria da série”.

    As perguntas ao  ex-editor da Piauí giraram sobre o processo da investigação como um todo, mas também sobre a segurança dos jornalistas e as ameaças de bolsonaristas e do próprio ministro Sérgio Moro. O ministro tenta criar uma nova narrativa para jogar a sociedade contra a investigação ao dizer que nosso  objetivo é destruir a Lava-Jato, quando na verdade nós queremos fortalecer o combate à corrupção”, denuncia Demori. “Como se não estivesse mais do que na hora de denunciar as coisas erradas que eles fizeram, gerando injustiças em série. Formado em Jornalismo pela PUC do Rio Grande do Sul, 38 anos, natural de São Miguel D’Oeste, Demori vê com máxima gravidade a notícia do pedido da Polícia Federal de quebra de sigilo da conta bancária do jornalista Glenn Greenwald pelo COAF para descobrir as fontes do escândalo Vaza Jato. Na manhã do evento, essas notícias começaram a ser refutadas com veemência pelas instituições democráticas, como a OAB e a Associação Brasileira de Imprensa. (ABI).

    “Se for verdade esse anúncio, é uma violação inominável da democracia e da liberdade de imprensa, que só indica o caminho do fim da PF. Isso não será aceito no mundo inteiro. Na melhor das hipóteses, é mais uma mentira do site O Antagonista”, ironizou.

    Debate com Leandro Demori, mediado pela estudante Clarissa Levy e o professor de jornalismo Samuel Lima durou três horas

    “Não seria melhor ter divulgado todos os vazamentos de uma só vez?”, indagou uma pergunta encaminhada por escrito. Demori explicou que a equipe trabalha diária e intensamente na conferência dos dados, mas não poderia aguardar a finalização do trabalho para fazer uma denúncia com consequências direta na vida das pessoas. “Diferente de outras investigações, como o Panamá Papers, que não afetava ninguém diretamente, aqui não pudemos esperar porque a Vaza Jato mexe com a vida de uma pessoa que está na prisão”. E ele não se refere apenas ao ex-presidente Lula, mas a todos os que entraram ilegalmente nos processos de delação, muitos inocentes, segundo ele.

    Moderadas pelo professor de Jornalismo Samuel Lima e pela estudante de jornalismo Clarissa Levy, as perguntas da plateia foram respondidas com o humor, a ironia e a franqueza peculiares a Demori. Ele, contudo, preferiu não responder questões estratégicas relacionadas ao sistema eletrônico de investigação usado pelo The Intercept, à identificação das fontes e às próximas denúncias. Também esquivou-se de perguntas sobre o embate com a rede Globo. Explicou contudo, a origem da agressiva carta da direção da emissora, na qual ela acusava o caráter de Glenn e garantia ter sido receptiva à proposta de averiguação e divulgação d

    as denúncias..

    “Como a rede sempre utilizou dados obtidos por investigações exclusivas da nossa equipe sem citar a fonte, descobrimos que havia um veto antigo na emissora contra o The Intercept”. Esse veto foi mencionado na proposta de parceria com o Fantástico: “Perguntamos se isso seria impedimento para um trabalho conjunto, mas eles se limitaram a repetir que nunca houve qualquer tipo de restrição, sem responder a questão principal, que era a proposta de parceria”.

    O evento promovido pelo Departamento de Jornalismo da UFSC integra as comemorações do aniversário de 40 anos do curso. Fundado por célebres teóricos da área, como os já falecidos Adelmo Genro Filho e Daniel Hertz, críticos contundentes do sistema de monopólios da comunicação social no Brasil, o curso orgulhou sua tradição encorajando o trabalho do jornalismo investigativo com um longo e vigoroso coro de aplausos.

  • A razão jurídica e a paixão política

    A razão jurídica e a paixão política

    Por Ruy Samuel Espíndola
    advogado publicista e Professor de Direito Constitucional

    Precisamos retomar a racionalidade do direito e a sobriedade que nos deve fazer considerar, em debate público, todos os lados de uma controvérsia. Discordância jurídica não precisa ser repugnância política; objeção legal não precisa ser retaliação ideológica; contrariedade de julgamento não precisa ser subjugação do ponto de visto diverso. Um ponto de vista jurídico, sobre processos judiciais que envolvam pessoas de evidente importância na cena política nacional, não pode estar contaminado sobre as eventuais consequências que venha a ter sobre elas ou seus adversários no campo ideológico ou político-institucional.

    A razão, preponderantemente, deve presidir nossos julgamentos.

    E, no Direito, o critério da razão é a Constituição e as leis. E o direito posto não deve ser aplicado de acordo com a voz das ruas, das redes sociais, da opinião pública, da paixão política. Juiz não é mandatário do povo e sim da lei.

    A regra de direito não deve atender aos ventos da direita, do centro ou da esquerda. É supra ideológica em relação aos interesses envolvidos em cada uma dessas correntes de pensamento. Pode ter sido inspirada, quando de sua positivação pelas assembleias legislativas, mais à direita, mais à esquerda ou ao centro. Mas depois de promulgada dever ser cumprida pelo aplicador da lei sem quaisquer considerações de índole política, que possam favorecer ou desfavorecer instituições, pessoas, partidos ou programas ideológicos.

    Temas jurídicos, ainda que envolvidos com pessoas da mais alta densidade política, do mais alto aplauso ou repúdio da opinião pública, como são Moro e Lula, devem continuar sendo temas jurídicos, resolvíveis por critérios jurídicos, com a racionalidade do direito que inadmite juízo de conveniência e oportunidade, e sim exige juízo de legalidade. Em processos judiciais, absolver ou anular não é postura da esquerda e nem condenar é postura da direita. A regra, a prova, o juiz, o processo servem a todos os cidadãos e cidadãs, independentemente de suas colorações partidárias ou preferências políticas.

    Regras penais se aplicam à generalidade das pessoas imputáveis. Regras de suspeição e impedimento na atividade judicial ou ministerial aplicam-se a todos os juízes e membros do ministério público, sem qualquer exceção, ainda que diante dos mais fervorosos interesses em debate público.

    Processo justo, em uma democracia constitucional, é processo segundo as regras do jogo processual pré-estabelecido pela ordem jurídica. Se regras que estabelecem hipóteses de suspensão judicial forem transgredidas, cabe às autoridades judiciais avaliarem, com independência, sobriedade e justiça se será o caso de reconhecer-se ou não a suspeição de um juiz, diante do direito vigente e das provas apresentadas.

    Tema de suspeição de juiz não é tema de culpa ou inocência do acusado. A suspeição do juiz não leva necessariamente à absolvição do acusado. O acusado pode ser culpado, mas precisa ter um processo justo, diante de um juiz imparcial. E a imparcialidade do juiz é equidistância das partes, sem assumir o lado de quaisquer delas como sendo o seu próprio.

    Diálogo entre juízes, promotores e advogados é direito/dever de cada um desses atores, que se realiza na mutualidade de funções desempenhadas no processo judicial. E tudo isso é feito se não publicamente, nos autos de processo, mas republicanamente, sem qualquer tema que deva ou possa ficar segregado a apenas uma das partes e o juiz.

    No tema a ser solvido no dia de hoje pelo STF, Segunda Turma, em habeas corpus interposto pela defesa de Lula, no qual se busca o reconhecimento da suspeição do Juiz Moro e a consequente anulação de suas decisões tomadas em desfavor do ex-presidente, que prevaleça o direito e a análise isenta da prova e de sua valia para os fins próprios ao devido processo penal em uma Democracia clausulada com o Estado de Direito.

    Se houver suspeição, e esta for reconhecida no processo, haverá nulidade e a consequente liberdade do condenado. Se não for reconhecida a parcialidade judicial, tudo ficará como está.

    A impetração do habeas corpus foi muito antes do “The Intercept” ter levado ao conhecimento da opinião pública pretensos diálogos entre os membros da força tarefa da lava-jato e o juiz processante.

    Muitos outros argumentos e respectivas comprovações e refutações estão deduzidas desde há muito, pela acusação e defesa. Os pretensos diálogos podem fortalecer argumentos da defesa do ex-presidente ou serem anódinos na opinião dos juízes do Supremo, pelo argumento da desvalia da fonte, não conhecimento do tema por supressão de instância, etc.

    Mas o que diz o direito processual penal sobre tudo isso? A doutrina dos juristas? A jurisprudência dos nossos tribunais? E a experiência daqueles que militam na advocacia criminal, na judicância penal, na acusação pública? Isso deve ser respondido com sobriedade e sem os impulsos passionais de torcidas de times de futebol.

    Eu apresentarei as minhas respostas, segundo os critérios do direito. Conheço apenas os pretensos diálogos e não os demais argumentos dos autos. Assim ela será incompleta, precária e sem concretude no estudo integral da causa. É resposta de republico preocupado com o futuro da racionalidade do direito em solo pátrio:

    • é corrente na doutrina e na jurisprudência brasileira, que mesmo provas ilícitas, obtidas de maneira ilegal ou imoral, caso beneficiem a posição jurídica de liberdade do réu (“favor rei”, “favor libertatis”), podem e devem ser reconhecidas válidas para efeito de produzir a nulidade do processo condenatório ou a inocência do acusado, condenado ou não;

    • independentemente da legalidade da forma em que foram obtidos os pretensos diálogos, se eles forem reconhecidos verdadeiros pelos juízes, eles não revelam “conversas normais”, entre juiz e acusação. Segundo o meu olhar e análise sobre tudo o que li, nos diálogos apresentados ao público, há orientação judicial à acusação, aconselhamento com vista a determinado resultado que em nada seria benéfico à defesa e somente privilegiaria a acusação. Se verdadeiros os seus teores, enfatizo, revelam caso patente de parcialidade judicial e suspeição ministerial.

    • há impugnação de parcialidade e suspeição no caso é antiga. As pretensas revelações são posteriores. São fatos velhos, mas “provas novas”, que a parte a quem poderia beneficiar tomou conhecimento somente agora. Esses fatos velhos, como provas novas, são “fatos supervenientes” e podem e devem ser conhecidos e julgados pelo juízo de impetração do habeas corpus.

    • caso haja reconhecimento da parcialidade do juiz, poderá ser reconhecido também a parcialidade do acusador, o que poderá levar a anulação completa do processo do triplex, até a propositura da denúncia seria afetada, atingindo, reflexa e logicamente, todas as decisões do processo, tanto a que condenou em primeiro grau, como as que a confirmaram no TRF4 e no STJ.

    • caso se vá tão fundo no reconhecimento da invalidade do processo, desde sua origem, isso não significa imunidade para o acusado, pois poderá voltar a responder ao processo por novo impulso do ministério público que suscitará novo julgamento do judiciário.

    • enfim: reconhecida a parcialidade, haverá nulificação do processo e libertação do condenado, mas não sua imunidade ou impunidade.

    Vale lembrarmos pensamento célebre do Justice William O. Douglass — quando do julgamento, pela Suprema Corte americana, do caso Brady v. Maryland: “A sociedade ganha não apenas quando os culpados são condenados, mas também quando os julgamentos criminais são justos. Nosso sistema de administração da justiça sofre quando um acusado é tratado com injustiça.”

    Sei que meu ponto de vista jurídico não é isolado e nem majoritário. Ouçamos então a resposta do STF e que seus juízes tenham a independência moral e intelectual, a equidistância das partes e da política, para decidirem segundo o direito e as provas constantes dos autos, sem receio do resultado de suas decisões perante a opinião pública insuflada pela paixão política.